segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Correa reeleito: “No Equador, os bancos e as empresas de mídia já não governam”


17/2/2013, The Real News Network (vídeo)
Falas transcritas e traduzidas pelo pessoal da Vila Vudu


Domingo, Rafael Correa foi reeleito para mais quatro anos de mandato presidencial, com 61% dos votos. Essa é a 7ª eleição que Correa vence, em sequência: três vezes presidente eleito, uma eleição para a Assembleia Constituinte, uma confirmação na presidência, depois de aprovada a nova Constituição; e duas eleições parlamentares, de meio de mandato.

Apesar da intensa polarização em alguns setores da sociedade equatoriana, os 61% conquistados nessa reeleição, dão a Rafael Correa capacidade e poder políticos para continuar a implementar seu projeto. Sobretudo, porque a oposição não conseguiu unir-se e organizar-se e apresentar projeto alternativo consistente.

Rafael Correa: Tenham a certeza, todos, que o principal foi conseguido e confirmado hoje, nesse domingo. Quero dizer: que aqui a bancocracia já não governa. Que aqui já não manda a partidocracia. Que aqui o poder “midiático” já não manda. Que aqui já não manda nenhum poder fático, em nome de interesses grupais. Que aqui já não mandam os países hegemônicos. Com todos os erros que venhamos a cometer, tenham certeza, todos, de que no Equador, com essa revolução, vocês governam, vocês mandam, os equatorianos, as equatorianas.

Quando terminar esse novo mandato, em 2017, Correa terá permanecido no poder por dez anos ininterruptos. É recorde, num país onde, na década passada, entre 1997 e 2007, houve 10 presidentes, inclusive cinco em 25 horas, dia 21 de janeiro, quando foi derrubado Jamil Mauad.

Simon Pachano, de FLACSO, Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais, entende que há duas principais razões que explicam a popularidade e o sucesso de Rafael Correa:

Simon Pachano: Primeiro que os dez anos anteriores foram anos de crise e instabilidade, com eventos que chocaram muito o povo do Equador, como a crise dos bancos e a derrubada de sucessivos presidentes. Esses anos marcaram muito os equatorianos e levou-os a procurar solução em algum líder forte. Viu-se essa procura em várias eleições. Até que os eleitores encontraram Rafael Correa. Depois que os eleitores encontraram quem lhes pareceu que correspondesse ao tipo de governante que desejavam, os eleitores deram-lhe, como se diz, um ‘cheque em branco’. Foi como se os eleitores dissessem “Encarregue-se de tudo, que nós nos retiraremos para nossa vida privada. Em grande medida é o que se vê até hoje: desapareceram as grandes manifestações de rua, as pessoas já não fazem manifestações ou protestos.

Rafael Correa é graduado em Economia pela Universidade Católica de Louvain, na Bélgica, com pós-graduação e doutoramento também em Economia pela Universidade de Illinois, nos EUA. Para a presidência, optou por abordagem firme no esforço para arrancar o país do que, para muitos, foi uma década perdida e que o presidente reeleito do Equador chama frequentemente de “a grande noite neoliberal”.

Para Mark Weisbrot, do Centro de Pesquisa Política Econômica, em Washington, o povo do Equador fez escolha bem clara.

Mark Weisbrot: O motivo pelo qual Correa foi reeleito com larga margem e está firmemente plantado no governo do Equador é que seu governo promoveu progresso social. O povo não tinha nada nem semelhante ao que tem hoje, há muitos anos. Desemprego em níveis baixíssimos, redução acentuada dos níveis de pobreza, aumento forte nos investimentos em educação pública.

A principal razão para o apoio popular com o qual Correa conta hoje parece ser a ênfase que o governo dá em atender às necessidades do povo, mais que qualquer interesse privado. Em vez de governar com vistas a alguma “austeridade”, em obediência servil às instituições financeiras e grandes corporações, o governo de Rafael Correa investe em infraestrutura e em educação, fiscalizando de perto a aplicação dos orçamentos públicos.

León Trujillo, autor, professor e intelectual: Rafael Correa implantou várias políticas que foram bem recebidas pela população, sobretudo a política de redistribuição mais equitativa da riqueza. Essas políticas foram possíveis, porque o Equador foi um dos países beneficiados pelos altos preços do petróleo. Desde que Rafael Correa assumiu, o preço do petróleo nunca parou de subir, 13, 30, 50, 70, já chegou a 110 e está hoje em 95 dólares o barril. Concretamente, implica que o orçamento nacional passou, de 5 bilhões, quando Correa assumiu a presidência, para os 28 bilhões que temos hoje. O Estado tem hoje quase seis vezes mais dinheiro do que antes de Correa, o que permite que ele cumpra todas as suas promessas eleitorais.

A nova legislação eleitoral hoje vigente no Equador proíbe a participação de financiamentos privados nas campanhas eleitorais – o que modificou radicalmente a paisagem política do país. Antes, o dia das eleições era dia normal de trabalho: hoje, é feriado nacional. Nas duas eleições presidenciais às quais concorreu, Correa venceu no primeiro turno de votação direta, com mais da metade dos votos.

Na opinião de Mark Weisbrot, o Departamento de Estado dos EUA erra ao supor que o processo político na América Latina seja resultado da ação de um punhado de líderes, quando, de fato, o que se vê é um processo social que em muito ultrapassa governantes como Rafael Correa ou Hugo Chávez.

Mark Weisbrot: A política externa dos EUA para a América Latina é regida por muito mais do que só por interesses de grandes corporações. No caso da Venezuela, por exemplo, as grandes petroleiras norte-americanas, Chevron e Exxon, por exemplo, não têm qualquer interesse em opôr-se a Hugo Chavez, mas o Departamento de Estado vive a tentar desestabilizar aquele governo.

A impressão que se tem é que o Departamento de Estado vê todos os governos de esquerda, inclusive o governo do Brasil, pode-se dizer, em termos, ainda, da Guerra Fria: o Departamento de Estado simplesmente não quer que aqueles governos existam, não os quer por ali... Por isso, já trabalham para implantar na opinião pública a ideia de que Correa seria “o próximo Chávez”, que teria o mesmo tipo de empenho político de Chávez. De fato, é opinião que se baseia só nas fantasias do Departamento de Estado, para o qual só um “homem forte” faria mudar a história da América Latina. Nada disso é bem assim.

O que de fato se vê é que as muitas instituições que se foram constituindo na região, UNASUL, CELAC, ALBA e outras, criaram mecanismos pelos quais os países da região passaram a conseguir operar em harmonia, a tal ponto que até um governo de direita, como Santos, na Colômbia, acabou por seguir os passos dos governos de esquerda, contra os desejos dos EUA, em várias questões.

Rafael Correa enfrentará quatro anos críticos para o Equador. O grande desafio agora é conseguir manter a atual trilha de crescimento, que vai transformando o país, de país monoexportador dependente, em país sustentável e mais inclusivo. (Aqui, Óscar León, do Equador, para The Real News Network.)

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