15/6/2012, MK
Bhadrakúmar*, Indian Punchline blog
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Príncipe
Coroado Nayef Bin Abdul Aziz |
A morte repentina do Príncipe
Coroado Nayef, saudita, traz de volta às manchetes o problema saudita. O país
enfrenta terríveis desafios [1] – sistema monárquico arcaico,
corrupção e venalidade rampantes, dificuldades socioeconômicas que só se
aprofundam, o fortalecimento dos xiitas, levantes regionais e vizinhança nada
amistosa. Mas a ironia mãe de todas as ironias começa a desenrolar-se agora, no
período de 30 dias, entre Nayef ser sepultado e selecionar-se outro Príncipe
Coroado para ocupar o seu lugar.
A Arábia Saudita aparece ante o
mundo como campeã pró-“reformas” e “democracia” e “direitos humanos” na Síria.
Simultaneamente, mantém, internamente, um dos sistemas políticos menos
democráticos e obscuros do planeta [2]. 34 cavalheiros desconhecidos do
mundo externo, declarados descendentes diretos do fundador do Império,
Abdul-aziz Ibn Saud (que teve 34 filhos), tomarão a difícil decisão de escolher
quem será o Príncipe Coroado que sucederá o rei Abdullah. Não devem explicações
ou satisfações a nada e a ninguém. Trata-se de perfeita cabala [3] que zomba da democracia
representativa ocidental.
O
fator “desconhecido desconhecido” é, claro, que o establishment de
segurança e inteligência dos EUA tem influência quase total sobre esses
“decisores”, cujos respectivos patrimônios milionários repousam, todos, nos
cofres de bancos ocidentais.
Príncipe Nayef sendo homenageado pelos familiares |
A lista dos dignitários presentes
aos funerais de Nayef serve como bússola para navegar pelas tormentosas águas da
política regional. Do Paquistão, irão dois, o Primeiro-Ministro, Yousuf Gilani e
o comandante das Forças Armadas, Ashfaq Kayani. Kayani também? Sim, sim.
[4] O que dirão disso os especialistas
colunistas de tantos jornais indianos, segundo os quais os laços que ligam o
Paquistão e a Arábia Saudita estariam “estremecidos” por algum tipo de movimento
“gravitacional” dos sauditas em direção à Índia?
Não faltarão líderes ocidentais
que se derramarão em elogios ao legado de Nayef. Melhor fariam se se limitassem
a louvar o petróleo da Arábia Saudita e desfilassem, em silêncio reverencial,
ante uma pira de petrodólares. Afinal, bem feitas as contas, qual o legado de
Nayef? Curiosamente, morreu no mesmo dia em que um pequeno grupo de mulheres
sauditas decidiram desafiá-lo [5] – e desfilaram dirigindo, elas
mesmas, os próprios carros.
Povo comemora a morte do príncipe nas província ocidentais da Arábia Saudita |
Nayef usou violência extrema e
recorreu à brutalidade [6] para livrar-se de ditos membros da
al-Qaeda, de islamistas, de liberais e de mulheres, de xiitas e de todos os
tipos de dissidência, como se fossem todos a mesma dissidência e os mesmos
dissidentes. A volta do chicote, que talvez tarde, mas vem, obrigará a reavaliar
todo o papel de Nayef durante um período crítico de transição na região. Foi
figura chave na intervenção saudita no Bahrain, que ainda está em julgamento,
nas ruas. E muitos islamistas radicais xiitas baseados no Iêmen esperam para
promover o acerto final.
Nayef nunca foi figura
“popular” [7] na própria terra, mas, afinal,
quem gosta de chefes de polícia? Problema é que, nas províncias ocidentais da
Arábia Saudita, seu passamento está sendo, como mostram algumas fotos,
festejado. [8]
Notas de
rodapé
[1] 17/6/2012, The Guardian
(Reuters), em: “Saudi
royals face challenges as heir dies”
[2] 17/6/2012, Reuters, Angus
McDowall em: “Saudi
succession: how oil kingdom picks its kings”
[3] 17/6/2012, Reuters, em:
“Factbox:
Saudi Arabia’s Allegiance Council”
[4] 16/6/2012, Pakistan Times
News, em: “Gilani,
Kayani leave for Saudi to attend Nayef's funeral”
[5] 18/6/2012, Sidney Herald,
Ruth Pollard em: “Saudi
heir's death fails to curb women at wheel”
[6] 16/6/2012, Reuters, Angus
McDowall em: “NEWSMAKER-Saudi
Crown Prince Nayef left security legacy”
[7] 16/6/2012, Wall Street Journal, Ellen Knickmeyer,
em: “Saudi
Arabia’s Enforcer of Internal Security”
[8] 18/6/2012, Fars News, em: “People in East S.
Arabia Celebrate Death of Crown Prince Nayef Bin Abdul Aziz”
_________________________
*MK
Bhadrakumar foi diplomata de carreira do Serviço Exterior da Índia. Prestou
serviços na União Soviética, Coreia do Sul, Sri Lanka, Alemanha, Afeganistão,
Paquistão, Uzbequistão e Turquia. É especialista em questões do
Afeganistão e Paquistão e escreve sobre temas de energia e
segurança para várias publicações, dentre as quais
The
Hindu, Asia Online e
Indian Punchline. É o filho mais velho de MK Kumaran (1915–1994), famoso
escritor, jornalista, tradutor e militante de Kerala.
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