21-27/6/2012, Khaled Amayreh (de Ramallah), Al-Ahram Weekly, n. 1103,
Cairo
Traduzido pelo Coletivo de
Tradutores da Vila
Vudu
ATUALIZAÇÃO às 11h30 de 24/6/2012: Mohamed Mursi, da Fraternidade Muçulmana, é declarado vencedor das eleições no
Egito [CNN, pela televisão]
Khaled Amayreh |
Os
palestinos islâmicos, que acompanharam de perto durante a semana o desenrolar
das eleições no Egito, reagiram com grande entusiasmo à possível vitória do
candidato da Fraternidade Muçulmana Mohamed Mursi, sobre seu adversário secular,
Ahmed Shafik, último primeiro-ministro do governo deposto de Hosni Mubarak.
Antes
das eleições, dirigentes do Hamás limitaram-se a comentários apenas
“diplomáticos” sobre os acontecimentos políticos no Egito, dizendo que se
mantinham igualmente distanciados de todos os atores políticos na arena egípcia.
Mas já era evidente, nas entrelinhas das declarações oficiais, o partido e o
candidato preferidos do Hamás e de outros grupos islâmicos na
região.
O
Hamás é “filho” político da Fraternidade Muçulmana, com a qual sempre manteve
laços estreitos e vitais. Alguns dos principais nomes do Hamás têm cidadania
egípcia, como Mahmoud Al-Zahhar, cuja mãe é egípcia.
A
mãe do presidente do Parlamento Palestino, Aziz Duweik, atualmente preso em
Israel, sem acusação ou julgamento, também é egípcia, o que o qualifica para
obter a cidadania egípcia, segundo leis recentemente aprovadas.
Muitos
líderes políticos palestinos islâmicos também estudaram, graduação e
pós-graduação, no Egito.
Em
Gaza, palestinos distribuem doces, sob uma bandeira do Egito,
frente a um cartaz
com foto do candidato da Fraternidade
Muçulmana no Egito, Mohamed
Mursi.
|
Na
Faixa de Gaza, centenas de jovens palestinos tomaram as ruas para celebrar a
esperada vitória de Mursi,
depois que o candidato da Fraternidade Muçulmana foi à televisão e declarou
vitória nas eleições presidenciais. Outros distribuíram doces e trocaram abraços
de congratulações.
“É vitória da Palestina, tanto quanto vitória
do Egito. Esperamos que, com presidente islâmico na chefe do maior e mais
poderoso estado árabe, Israel terá de ser menos arrogante” – disse Mohamed
Amr, ativista do Hamás em Hebron, no sul da Cisjordânia.
“Estamos vivendo um terremoto político de
proporções históricas. É a primeira vez que temos presidente islâmico
em país árabe.
Os efeitos psicológicos e a repercussão psicológica e política
desse envento serão imensas, de longo alcance” – disse Amr.
Ismail Haniyeh |
Ismail
Haniyeh e Moussa Abu Marzouk foram os primeiros dirigentes do Hamás a
congratular-se com a Fraternidade Muçulmana pela vitória. Ambos manifestaram
esperanças de que o Egito, sob a presidência de Mursi, saberá assumir posição
mais firme em relação
a Israel.
Haniyeh,
primeiro-ministro do governo do Hamás em Gaza, saudou as eleições como
“verdadeiro casamento democrático”; disse que espera que o Egito alcance logo a
estabilidade política e a prosperidade econômica. Acrescentou que o povo
palestino deposita grandes esperanças no triunfo da revolução egípcia.
O
Hamás tem, de fato, boas razões para otimismo, com a ascensão da Fraternidade
Muçulmana à presidência do mais importante estado árabe.
Para
começar, o
Hamás tem certeza de que o Egito, no governo de Mursi, não chantageará o grupo
islâmico e os palestinos em geral, a aceitar acordos com Israel que não
interessam aos palestinos, como tantas vezes aconteceu durante o reinado de
Mubarak, quando o governo egípcio era usado – pelos EUA – como garrote, para
obrigar a Autoridade Palestina a fazer concessões a Israel. De fato, a grande
maioria dos palestinos sempre consideraram o governo de Mubarak mais como
ameaça, do que como aliado da causa palestina. Os que acalentavam alguma
esperança foram afinal desiludidas na campanha genocida de Israel contra Gaza,
há mais de três anos (“Operação Chumbo Derretido”/ing.: Operation Cast
Lead).
Em
segundo lugar, o
Hamás, que sofreu terrivelmente por causa dos esforços do governo de Mubarak
para sufocar economicamente a Faixa de Gaza e, dentre outras medidas violentas,
construiu um muro (profundo o suficiente para tentar bloquear a rede de túneis
que atravessam a fronteira e é vital para o abastecimento da população da Faixa
de Gaza) na fronteira Gaza-Sinai, espera que, com Mursi na presidência, estará
acabada a “política” de cerramento das fronteiras e bloqueio a Gaza.
Em
terceiro lugar, o
Hamás espera que o Egito, doravante, passe a conectar seu compromisso com o
Acordo de Paz de Camp David ao modo
como Israel se relacione com os palestinos. Vários dirigentes da Fraternidade
Muçulmana já se manifestaram favoráveis a essa conexão.
Em
quarto lugar, o
Hamás espera – e provavelmente já trabalha com essa possibilidade real, no
planejamento estratégico dos próximos passos – que o Egito se mostrará mais
atento e compreensivo em relação à posição do Hamás vis-à-vis seu
adversário local, o Fatah.
Mohamed Mursi, vencedor - Fraternidade Muçulmana |
No
passado, o regime de Mubarak sempre foi
visto como tendencioso a favor do Fatah, nas conversações de reconciliação e de
constituição da frente de unidade nacional palestina, patrocinadas pelo Egito.
O
Fatah ainda não comentou oficialmente os resultados das eleições no Egito, à
espera do anúncio oficial no Cairo. Porta-vozes do Fatah têm dito que o
presidente Mahmoud Abbas não tem preferências em relação às eleições no Egito.
Mas, entre os quadros intermediários e inferiores do Fatah, o sentimento era de
consternação e, mesmo, de indignação, ante a possível vitória de Mursi. E
comentário publicado na página internet do Departamento de Cultura e informação
do Fatah dizia que “agora a Fraternidade
Muçulmana será desmascarada”. (...)
O
autor do comentário, Yehia Rabah, obviamente ignorava que a Fraternidade
Muçulmana foi eleita e não usurpou qualquer direito que não lhe caiba por
decisão dos eleitores. Rabah continua: “O
exército é o único partido qualificado no qual os egípcios podem confiar para
garantir a paz e a segurança”.
Secularista
anti-islâmico, Rabah escreveu que o Egito sempre esteve “em melhores mãos”
enquanto foi comandado com mão de ferro pelo exército, sem considerar as forças
políticas populares. (...)
Quanto
a Israel, a reação à eleição de Mursi foi sombria. Um deputado do Parlamento de
Israel disse que “a chegada dos
islamistas ao centro de poder no Egito é ameaça existencial mais grave a Israel,
que as bombas atômicas do Irã”.
Alex
Fishman, conhecido analista da política de Israel escreveu no jornal Yedith
Aharonot, de grande circulação, que Israel terá de aprender a conviver com a
perturbadora realidade de um governo hostil, no Egito, governado por islâmicos.
“Nenhum
governo egípcio comandado por islâmicos eleitos conseguirá admitir que Israel
continue a bombardear Gaza. O dia em que, com Mursi no governo do Egito, os
aviões do Exército de Israel atacarem a Faixa de Gaza, destruindo propriedades
de palestinos e matando palestinos inocentes será, muito provavelmente, o último
dia em que haverá relações diplomáticas formais entre Israel e o
Egito”
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