O
que todos os jornalistas perguntam e o que nenhum jornalista
pergunta
26/10/2012, FAIR-Fairness and
Accuracy in Reporting
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Entreouvido
na Vila Vudu:
Sinal de avanço considerável nos debates pré-eleitorais no Brasil é que, aqui,
os jornalistas empregados das empresas-imprensa já estão contidos,
exclusivamente, na função de cronometradores.
Só
depois de encerrada a votação, as empresas-imprensa liberam seus empregados para
que digam, ao vivo, todas as asneiras que lhes ocorram às cabeças mal
informadas, à guisa de “análises”, e façam todas as perguntas viciadas e
preconceituosas que lhes ocorram às cabeças idem.
Assim
se preserva no Brasil, melhor do que nos EUA, a lisura democratizatória das
eleições: resistindo o mais possível à ação DES-democratizatória de jornalistas
empregados de empresas-imprensa viciosas, quando não são empresas ativamente
fascistizantes.
Mas
não se conclua daí que os jornalistas das empresas-imprensa brasileira sejam
qualitativamente melhores que outros. Não são.
Os
jornalistas das empresas-imprensa no Brasil são os piores do mundo e impingem
aqui, a consumidores PAGANTES,
o pior jornalismo do mundo.
No
Brasil, de diferente, é que a democracia que está hoje em reconstrução já é
muito melhor que a decrépita e já quase completamente inoperante democracia
norte-americana.
Jornalistas
e jornais são, em todo o mundo em que reina a empresa-imprensa do capital,
agentes de uniformização da opinião das massas, agentes de criação de
consumidores para mercados de opinião & consumo, que são mercados como
quaisquer outros e exigem comportamento/ pensamento/ opinião uniforme, de manada
– o que o próprio jornalismo existe para construir, e as empresas-imprensa para
modelar como produto e vender (Gramcsi dixit).
Mas
é interessante ver que, nos EUA, o negócio é MUITO PIOR do que
aqui!
________________________________________________________
Os
jornalistas do establishment das empresas-imprensa que moderaram os
debates eleitorais dos candidatos dos dois principais partidos às eleições
presidenciais de 2012 nos EUA mantiveram a discussão contida numa pauta
absurdamente estreita. Os analistas de FAIR comentam.
Imensa
quantidade de temas não foram trazidos à discussão pública coordenada por
jornalistas, nas seis horas totais de debates televisionados. Dentre temas
econômicos, ninguém perguntou a ninguém sobre miséria, desigualdade de renda,
crise de moradia, sindicatos, agricultura ou sobre a ação do Fed - Federal
Reserve.
As
questões sociais também foram truncadas: nenhuma pergunta sobre raça, racismo,
direitos dos gays (inclusive o direito ao casamento, para pessoas do
mesmo sexo), liberdades civis, justiça criminal ou legalização de drogas. Apesar
de haver quatro juízes na Suprema Corte já com idade superior a 70 anos, nenhum
jornalista perguntou aos candidatos sobre que nomes têm em mente para futuras
indicações à Suprema Corte ou a outros postos do Judiciário cuja indicação é
prerrogativa do presidente.
Nem
uma única referência à mudança climática, que, para muitos eleitores é a
principal ameaça que pesa hoje não só sobre os EUA, mas sobre a humanidade – e
foi a primeira vez que essa questão não veio à tona em ciclo de debates
presidenciais desde 1984 (Treehugger,
22/10/2012).
Nenhum tópico da pauta dos ambientalistas foi discutido – a menos que se inclua
como tal a pergunta sobre preços da gasolina, proposta por um dos eleitores no
debate em que havia eleitores presentes.
Temas
internacionais, só sobre fatia estreitíssima do mundo; nenhuma pergunta sobre
América Latina, África Subsaariana ou Europa, Rússia incluída.
O que
perguntaram os jornalistas?
FAIR
analisou os temas levantados nas perguntas propostas pelos jornalistas
moderadores nos três debates presidenciais e no debate entre os candidatos a
vice-presidente, e as perguntas propostas por candidatos indecisos selecionados
pela jornalista Candy
Crowley para o debate de 16/10
(tema surgido em mais de uma pergunta em cada segmento do debate foi contada
como única referência ao tema).
FAIR contou
28 tópicos mencionados, no total, 53 vezes, em 35 segmentos de debate. 22
menções foram classificadas como “questão econômica”; 20, como “política
externa”; e 10, como “políticas sociais”. Outras oito menções foram
classificadas como “outros” – sobre caráter, táticas de campanha ou o legado
George W. Bush. (Alguns tópicos – como “comércio” – foram classificados em mais
de uma categoria).
Embora
a questão n.1 entre os
eleitores seja,
com larga diferença à frente das demais, “empregos”, e tenha sido tópico citado
com frequência nas perguntas, os jornalistas perguntaram duas vezes mais sobre
“empregos” no quadro amplo da economia e em relação ao orçamento federal, que
tratado como tema autônomo: 11 vezes na modalidade “diluída” versus 5 vezes em pergunta direta.
A questão do déficit apareceu três vezes; impostos, quatro
vezes; Seguridade Social e Medicare
apareceram duas vezes cada tema, sempre no contexto dos gastos federais. O tema
“comércio” só foi mencionado uma vez.
As
perguntas de política internacional concentraram-se pesadamente no Oriente Médio
e nos conflitos nos países de maioria muçulmana. Líbia e Afeganistão foram
citados três vezes nos debates; Irã e Síria, três vezes cada; e Israel,
Paquistão e Egito, só foram referidos num único segmento. À parte um momento, em
que falaram da China, nenhum jornalista perguntou a nenhum candidato sobre
qualquer outra região do planeta.
Nem
todas as questões de política internacional, consideraram só uma parte do mundo;
em seis outros segmentos dos debates houve questões sobre os militares, política
de segurança ou política internacional em geral. Uma dessas foi sobre a guerra
de drones; mas o jornalista moderador Bob
Schieffer (22/10/2012) assumidamente
nada perguntou ao presidente responsável pela guerra dos drones:
“Pergunto
ao senhor, governador, porque já conhecemos a posição do presidente Obama sobre
isso: qual sua posição sobre o emprego dos drones?”
Nas
relativamente poucas perguntas sobre políticas sociais, atenção à saúde apareceu
três vezes – incluídos dois segmentos em que a pergunta foi sobre a contribuição
do Medicare para o aumento do déficit. Por duas vezes levantaram-se questões de
gênero; controle de armas, só uma vez.
Importante
– e absolutamente sem importância
Não
houve tempo para discutir número altíssimo de temas políticos criticamente
importantes, mas os jornalistas moderadores encontraram tempo para fazer
perguntas absolutamente sem sentido. Por exemplo, Jim
Lehrer (3/10/2012) perguntou
aos candidatos a presidente: “O governo federal tem alguma responsabilidade na
melhoria da educação pública nos EUA?” (Esperava talvez que Romney dissesse que
não? Obama?) Ou o que Martha Raddatz perguntou aos candidatos
a vice-presidente
(11/10/2012):
“Se
eleito, o que podem os senhores oferecer a esse país, como homem, como ser
humano, que ninguém poderia dar, se não cada um de vocês?”
As
perguntas selecionadas pelos moderadores nos debates refletem, presumivelmente,
as questões que os jornalistas conhecidos da imprensa-empresa do
establishment veem como importantes – e como desimportantes. Bem
claramente, os jornalistas moderadores consideram mais importantes as questões
do orçamento federal, do que os eleitores, ao serem convidados a indicar o principal
problema que
o país enfrenta.
As
perguntas podem também refletir pressões partidárias: consideradas as perguntas
propostas pelos moderadores, a principal questão de política internacional que
os EUA enfrentariam hoje seria o assassinato do embaixador dos EUA na Líbia –
importância difícil de explicar, se não se considera que a campanha de Romney
definiu esse evento como uma das fontes principais de críticas contra a política
externa do governo de Obama.
As
influências partidárias e do próprio establishment da imprensa-empresa
não devem surpreender ninguém, dado que a Comissão para os Debates Presidenciais
é absolutamente controlada pelos dois principais partidos, e as campanhas podem
vetar nomes de jornalistas para operarem como moderadores (FAIR Media Advisory,
3/10/2012) –
modelo de debate que jamais permitirá que se façam perguntas realmente
relevantes, sobre temas realmente importantes e
diversificados.
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