18/10/2012, Daniel Ellsberg*, Commondreams
Traduzido pelo
pessoal da Vila Vudu
Entreouvido na Vila
Vudu: Isso aí é o
retrato acabado do fracasso da “democracia” norte-americana, “democracia” de
araque, movida a televisão, jornais, jornalistas, sionismo e “mercado” -- onde
nenhum pensamento de esquerda jamais teve vez. Sem pensamento de esquerda, todas
as oposições são só firulas e discurso sem rumo. Coitado do cara! É Ellsberg,
aos 81 anos, 41 anos depois de ter sofrido O DIABO, por ter divulgado os Papéis
do Pentágono, que revelaram aos EUA o que os EUA estavam fazendo no Vietnã, em
1971! Chávez está coberto de razão: cabô. EUA, babaus!
Romney e Obama apontam-se dedos às respectivas caras, no debate da 3ª-feira, 16/10/2012, à noite |
A
eleição está próxima, e quero pedir aos que cultivam valores semelhantes aos
meus – ativistas, sobretudo – que façam do objetivo de derrotar Romney uma de
suas prioridades até o dia de votar.
Um
ativista amigo meu disse-me recentemente: “Ouvi que você está apoiando Obama”.
Levei um susto. Até me senti ofendido: “Apoiando Obama? Eu?!”
Daniel Ellsberg |
“O
que faço” – disse a ele – “é nunca perder ocasião para demonstrar que Obama se
identifica completamente com Wall
Street, presidente que legalizou a tortura, é cúmplice de torturadores,
assassino que mata civis na guerra dos drones, sujeito que ordenou guerra
ilegal contra a Líbia, que apoia sequestros, prisão por prazo indefinido sem
processo, e que já processou mais “vazadores” de informação verdadeira (como
eu!) que todos os presidentes anteriores somados. E você me diz que eu apoio
Obama? Eu?!”.
Meu
amigo disse: “Mas em Democracy Now você disse que as pessoas nos estados
indecisos votassem em Obama! Como pôde dizer isso? Não
moro em estado
indeciso. Mas eu, em nenhum caso, sob nenhum argumento, votaria
em Obama”.
Respondi-lhe
que: em nenhum caso algum governo Romney/Ryan pode ser melhor que o governo
Obama – sequer pode ser diferente – em nenhum dos crimes graves que listei,
cometidos, todos, pelo governo Obama; nem em qualquer outro setor. Em todos os
casos, um governo Romney/Ryan será pior, talvez catastroficamente pior, em
várias outras questões importantes: pode atacar o Irã, pode indicar juízes ainda
piores para a Suprema Corte, pode fazer ainda mais mal à economia do país, pode
agredir ainda mais as mulheres e seu direito de decidir sobre o próprio corpo,
pode reduzir ainda mais a assistência pública à saúde, pode agredir ainda mais o
meio ambiente, pode nos afundar ainda mais na economia do petróleo.
Expliquei:
“Não apoio Obama. Oponho-me completamente ao atual Partido Republicano. Não é
eleição entre Barack Obama e algum candidato progressista. Os eleitores, em meia
dúzia de estados indecisos, ou em uma dúzia de estados onde a disputa ainda é
apertada, vão decidir se Mitt Romney e Paul Ryan terão ou não muito poder pelos
quatro, talvez oito, próximos anos, ou não”.
Noam Chomsky |
Como
Noam Chomsky disse recentemente, “A organização Republicana é hoje extremamente
perigosa, não só para os EUA, mas para o mundo. Vale a pena empenhar muito
esforço para impedir que cheguem ao poder, mesmo sem alimentar qualquer ilusão
sobre as alternativas Democratas”.
Seguindo
essa lógica, Chomsky disse a um entrevistador o mesmo que eu disse a Amy
Goodman: “Se eu vivesse em estado indeciso, votaria contra Romney/Ryan, o que
implica votar em Obama porque não há escolha”.
A
eleição, agora, virou loteria. Significa que estamos numa daquelas ocasiões nas
quais nós, os progressistas – uma pequena minoria do eleitorado – podemos
realmente fazer diferença significativa e influir no resultado de eleição
nacional, conforme pendamos para um lado ou para o outro.
O
único modo acessível aos progressistas e Democratas, de impedir que Romney
chegue ao poder, agora, é convencer gente nos estados indecisos, a votar em
Obama: sair de casa, ir votar e votar em Obama. É preciso, agora, mobilizar os
votos, naqueles estados, de progressistas e liberais decepcionados que, hoje,
estão tendendo a não votar ou a votar em algum dos candidatos dos partidos
menores (porque, como eu, estão, além de decepcionados, também furiosos,
indignados, com muito do que Obama fez nos últimos quatro anos e, provavelmente,
continuará a fazer).
Amy Goodman |
Aqueles
eleitores têm de ser persuadidos a votar e, nos estados decisivos, votar em
Obama, não em qualquer outro candidato, apesar dos feitos terríveis do candidato
menos-pior, o presidente. Não é fácil. Como o entendo, aí está precisamente o
“esforço” de que Noam falou, que vale a pena fazer agora, para impedir que esses
Republicanos cheguem ao poder. É preciso que os progressistas – alguns dos quais
lerão isso, espero – façam empenhadamente esse esforço de persuasão.
O
mantra sempre repetido do “terceiro” partido (“Não há diferença alguma entre os
grandes partidos”) implica, afinal, dizer que os Republicanos não são piores que
Obama. Aí está o absurdo. É justificativa que favorece os Republicanos, embora
não pensada com essa intenção. E é ideia alucinadamente divorciada da realidade
dos EUA, hoje.
É
verdade que as diferenças entre os grandes partidos não são, nem de longe, tão
grandes quanto apregoam os candidatos, e menores, também, do que eles gostariam
que fossem. Pode-se dizer, como disse Gore Vidal, que os dois partidos “são duas
alas (e já se disse, também, “duas alas direitas”) do mesmo partido, o Partido
da Plutocracia, o Partido da Propriedade ou, como diz Justin Raimondo, “o
Partido da Guerra”.
Ainda
assim, a realidade política é que são alas distinguíveis entre elas, e uma é
consistentemente pior que a outra; hoje, é muito pior. Entrar em modo de negar a
realidade ou agir com displicência ante a realidade só induzirá a vitória do
pior.
E
propagar aquela falsidade absurda não é ato sem consequências. Implica a
consequência de estimular os progressistas, também nos estados indecisos, a não
votar ou votar contra Obama e, ainda mais grave, influenciar outros a fazerem o
mesmo. Essa é atitude que só ajuda os Republicanos e, no limite, os 1%.
Estar
indignado com o governo Obama não é apenas compreensível: é adequado. Eu estou
indignado. Obama cometeu crimes, o que é mais grave do que agir “timidamente” ou
ter-nos “decepcionado”. Se um impeachment fosse politicamente imaginável
em termos legais, Obama já teria feito por merecer (como George W. Bush, e
muitos dos seus antecessores!) É humano desejar punir Obama, não “recompensá-lo”
com a reeleição ou com um voto que poderia ser tomado como voto de confiança,
esperança ou aprovação.
Mas
a ira não é boa conselheira. E não raras vezes opera contra vítimas inocentes,
como aconteceria aqui, hoje, nos EUA, se muitos decidirem nem votar e disso
resultar vitória de Romney nos estados indecisos que decidirão o resultado
eleitoral.
Qualquer
ideia de punir Obama negando-lhe a reeleição – negando-lhe os votos de que
precisa nos estados indecisos e entregando assim a presidência a Romney e Ryan –
puniria, sobretudo, os mais pobres da sociedade norte-americana, trabalhadores e
também a classe média, e não só nos EUA, mas em todo o mundo, em termos
econômicos (creio firmemente que os Republicanos ainda podem converter a atual
recessão, em Grande Depressão). Rapidamente significaria atacar o Irã (ataque
contra o qual Obama conseguiu resistir, contra pressões, até, de seu próprio
partido). E marcaria o fim, mediante indicações de nomes para a Suprema Corte,
até dos ocasionais empates ou decisões apertadas sempre que, na Suprema Corte
dos EUA, voltarem a ser atacadas a Constituição dos EUA e os direitos civis.
A
reeleição de Barack Obama, ela própria, não implicará nenhuma mudança
progressista, nem o fim do militarismo com ambições imperiais, nem restaurará
nos EUA o respeito à Constituição ou ao Estado de Direito. Essas são tarefas que
caberão a nós, depois da eleição e pelo resto de nossas vidas – mediante
organização, com agitação, com os movimentos.
Em
oito dos 12 estados em que a disputa está apertadíssima – especialmente na
Florida, Ohio e Virginia, mas também no Colorado, Iowa, Michigan, Nevada, New
Hampshire, North Carolina, Pennsylvania, Virginia e Wisconsin – progressistas
que encorajem outros progressistas a votar em candidatos dos partidos “pequenos”
aceitam – digo-lhes eu – ser cúmplice na eleição de Romney e Ryan, com todas as
consequências que daí advirão.
Pensar
nisso como se implicasse que as pessoas nos estados indecisos “têm o direito de
votar conforme a própria consciência” é, me parece, ideia perigosamente
enviesada. Eu diria aos progressista que, se sua consciência lhe diz que, em
estado indeciso, vote voto que não seja em Obama, você precisa ouvir uma segunda
opinião. Sua consciência o aconselha mal.
Repito
sempre uma linha de Thoreau que teve impacto forte na minha vida: “Ao votar, use
seu voto inteiro: não apenas um pedaço de papel, mas toda a sua influência”.
Naquele ensaio, referia-se à desobediência civil ou, como Thoreau sempre
preferiu, à “resistência contra a autoridade civil”.
Para
mim, significa exatamente isso e nada mudou. Mas esse ano, para gente que pensa
como eu e que, diferentes de mim, vota nos estados indecisos, o “pedaço de
papel” também é importante. E usar “toda sua influência”, até as eleições, para
convencer outros a votarem em Obama é ainda mais importante.
Isso significa para os
progressistas, nas próximas semanas – além das manifestações, passeatas,
petições, lobbying (principalmente contra as políticas atuais e futuras
do presidente Obama, inclusive o orçamento de “austeridade”, mês que vem), ação
nos movimentos e para novos movimentos e ações de desobediência civil,
indispensáveis o ano inteiro, todos os anos – usar também a voz, o
e-mail, todos os lugares onde se possa escrever e publicar e as mídias
sociais para estimular os cidadãos, nos estados indecisos, a votar contra a
vitória de Romney, votando na única alternativa objetivamente existente:
Obama.
Nota
dos tradutores
*Daniel Ellsberg, 81 anos, é
ex-analista militar norte-americano, ex-empregado da RAND Corporation e depois funcionário do
Pentágono, que, em 1971, entregou ao jornal The New York Times,
documentos secretos do Departamento de Defesa dos EUA contendo detalhes
ignorados nos EUA sobre as atividades das Forças Armadas dos Estados Unidos
durante a Guerra do Vietnã [Ellsberg e os Pentagon Papers].
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