domingo, 5 de maio de 2013

Entrevista: Sergey Lavrov, ministro de Relações Exteriores da Rússia


29/4/2013, Ministério das Relações Exteriores da Rússia (Vídeo e entrevista traduzida)
Traduzido da transcrição em inglês pelo pessoal da Vila Vudu

Gritos e palavras de ordem (e suspiros) ouvidos na Vila Vudu:
-- Tudo muda, nesse mundo! Até a Guerra Fria já é passado! Sóóó o grupo GAFE (Globo-Abril-FSP-Estadão) não muda NUUUUNCA?
-- Pêqêmêpê! Será que algum dia a ridícula imprensa-empresa brasileira e seus ridículos “especialistas” e “colunistas” udenistas chatos conseguirão sair da Guerra Fria?!
-- Ma ke negóço mais atrasado & chato é esse “jornalismo” brasileiro, pêqêmêpê?! Até quando?!
-- A Zefa Véia só suspirava: Sô lôôôka por esse Lavróvi! Que voz! Que voz!”
-- E o Edirlando comentou: “Mas comunista, meeeeeeesmo, na entrevista, é aquele relógio! Êta relógio leninista porreta, sô! Vai, relóóóógio! Vaaaai, tempos! Vaaai história! Venceremos!”) [Pano rápido]


Sergey Lavrov, Ministro das Relações Exteriores da Federação Russa
Foreign Policy: Ministro Lavrov, obrigado por nos receber. É um prazer falar com o senhor. Estamos preparando edição especial da revista Foreign Policy, que sairá em maio, que tratará de várias manifestações do poder. Excelente oportunidade para ouvi-lo. Obrigado por nos receber.

S.Lavrov: Obrigado.

Foreign Policy: Para começar, estamos interessados nas relações russo-norte-americanas. Gostaria que o senhor, por favor, nos fale sobre o que o senhor imagina que virá depois do ‘reset’. Sabemos que essa palavra não foi criada pelo senhor.

S.Lavrov: É. Não foi. Você sabe, a Federação Russa e os EUA são as duas maiores potências nucleares do mundo. Mas, além do poder nuclear, temos muito em comum: temos vastos territórios, recursos naturais, ciência, tecnologias, educação e, claro, valioso capital humano. E os dois países são basicamente autossuficientes, mas nem um nem outro busca o isolamento. O mundo atual já não ama o isolacionismo. E, porque os problemas proliferam como cogumelos depois da chuva, os desafios, as ameaças, são transnacionais, transfronteiras, e só mediante esforço coletivo podemos lidar com esses problemas e desafios e reduzir as ameaças: terrorismo, tráfico de drogas, crime organizado, proliferação de armas de destruição em massa, atenção ao meio ambiente, segurança alimentar, segurança no campo da energia. Nenhum desses problemas pode ser resolvido unicamente por um país, mesmo que seja grande potência. Por isso, damos grande valor às nossas parcerias com outros países. Os EUA são a potência dominante.

Nossas relações têm, eu diria, vários elementos positivos. Conseguimos andar à frente, na questão do desarmamento nuclear. Assinamos o Tratado START. [2] Conseguimos assinar e ratificar o acordo chamado Acordo 123, de cooperação para usos pacíficos da energia nuclear, que muito beneficiou os EUA e a Federação Russa e é muito importante para garantir a seguridade e a segurança nuclear também de outros países. Conseguimos criar um mecanismo sem precedentes de relações bilaterais, a comissão presidencial, com mais de 20 grupos de trabalho que examinam todas as áreas administráveis de cooperação. Conseguimos assinar um acordo para facilitar o fornecimento de vistos para turistas e empresários dos dois países. Tudo isso interessa muito diretamente aos nossos povos.

Deve-se lembrar também a cooperação cultural. Ano passado, celebramos os 200 anos da primeira colônia de russos na Califórnia – Fort Ross. E os 75 anos do primeiro voo sem escalas por cima do Ártico, da URSS para os EUA, feito de V.Chkalov. Muitos outros eventos culturais ligam realmente nossos dois povos.

Evidentemente, o relacionamento entre dois países tão grandes jamais seria completamente sem nuvens. E ainda há coisas que nos separam. Os mísseis de mísseis é uma delas. Mas ainda acreditamos que, se a Federação Russa e os EUA conseguirem construir pensamento convergente, poderemos desenvolver sistema comum, que seria eficiente para proteger a região euroatlântica contra ameaças externas à região. No momento, a situação está num impasse. Os EUA e a OTAN, que apoia os EUA, entendem que o sistema proposto pelos EUA seja perfeito, sem falhas, que não se pode modificar uma polegada. Mas o Gabinete de Transparência do Governo [orig. Government Account Office (GAO)] do Congresso dos EUA, divulgou recentemente um relatório em que discorda da configuração proposta para esses mísseis de defesa na Europa. Não significa que os especialistas russos concordem 100% com o relatório do GAO, mas indica que, mesmo nos EUA, há divergência de opiniões sobre como enfrentar o problema da proliferação de mísseis. Estamos portanto reiterando que permanecemos abertos para discutir a questão com os EUA, desde que trabalhemos juntos e desde que não se questione nossa capacidade intelectual. Estamos convencidos de que trabalhar juntos – com os EUA e a Europa – não é só o modo mais eficiente para encontrar uma resposta à ameaça da proliferação de mísseis; é encaminhamento que poderá levar nosso relacionamento com a OTAN – digo, o relacionamento entre Rússia e OTAN – a um outro patamar, a um nível qualitativamente novo. Seria passo importante, na direção de nos tornarmos outra vez aliados como fomos durante a 2ª Guerra Mundial.

Há outros problemas que afetam negativamente o relacionamento entre Rússia e EUA. O encaminhamento que o Congresso dos EUA deu à situação que se criou depois da chamada “Lei Magnitsky” [3] é um desses problemas. Não tenho dúvida de que os senadores que patrocinaram essa lei foram motivados pelo desejo de ter outra lei, que não fosse a emenda Jackson-Vanik, que se tornou um impedimento para os empresários norte-americanos depois que a Rússia foi admitida na Organização Mundial do Comércio. Quando perceberam que a velha emenda estava prejudicando interesses norte-americanos, tentaram inventar outra coisa, para substituí-la. Foi quando surgiu a “Lei Magnitsky” – lei completamente anômala e artificial, cuja única serventia é substituir uma emenda antissoviéticos, por uma lei anti-russos.

Evidentemente, os norte-americanos sabiam que nós reagiríamos como reagimos. E reagimos, como você sabe: o Parlamento russo aprovou a “Lei Dima Yakovlev”. Não escolhemos essa via, mas essa é a lei da política. Nada pode ficar sem resposta, seja positiva, seja negativa. Aí está algo que não se pode mudar. Os russos não inventamos nada disso: é uma lei das relações internacionais. A chave de todas as negociações é a reciprocidade.

Foreign Policy: O senhor disse que os EUA esperavam alguma resposta, e é claro que esperavam, mas mesmo assim a resposta dos russos surpreendeu – e surpreendeu inclusive muitos russos. Incluir na lei russa a cláusula sobre crianças russas adotadas pareceu ser resposta assimétrica.

S.Lavrov: Esse é outro assunto. O problema com as crianças adotadas por famílias norte-americanas não envolve só crianças russas. Há inúmeros relatos confiáveis de organizações que trabalham nesse campo e que demonstram que não só crianças russas, mas de outras nacionalidades e também crianças norte-americanas adotadas, são submetidas a tratamento inadmissível, pelas famílias que as adotam. O que lhe posso assegurar é que tentamos muito empenhadamente construir algum acordo de cooperação no campo da adoção de crianças. Por aquele acordo, os russos insistíamos em que funcionários da chancelaria russa pudessem supervisionar os casos de adoção de crianças russas no caso de haver denúncias de maus tratos. Infelizmente, esse acordo não se materializou. Não tivemos acesso a alguns casos, porque os tribunais norte-americanos não permitiriam que oficiais da chancelaria da Rússia visitassem as crianças russas adotadas, nas famílias nas quais os problemas foram descobertos e divulgados.

Raramente se noticia, mas outros países, não só a Rússia, enfrentam o mesmo problema. O Cazaquistão, por exemplo, suspendeu a implementação de acordo semelhante, sobre adoção, com os EUA. O Vietnã também. E, se não estou enganado, também a Guatemala. O problema é sistêmico dentro dos EUA, e acho que a maior atenção da população para essa questão ajudaria as autoridades norte-americanas a tomar alguma providência. Ao mesmo tempo, a atmosfera emocional que cerca a adoção, também ajudou as autoridades russas a dar mais atenção às crianças órfãs. Tenho certeza de que faremos mais e melhor do que antes, para que encontrem novas famílias, nas quais sejam bem tratadas. Aumentou a alocação de recursos para estimular a adoção dentro da Federação Russa, e não tenho dúvidas de que o efeito será positivo para toda a sociedade.

Foreign PolicyEntão, o senhor não vê qualquer tensão remanescente entre EUA e Rússia, que tenha resultado daquelas duas leis.

S.Lavrov: Nada disso foi escolha nossa. Não queremos nenhum agravamento, seja em que área for, nas relações com os EUA. Entendo que o governo Obama também não quer. No fim de fevereiro nos reunimos com John Kerry, e senti nele o mesmo desejo de andar adiante, claro que sem atropelar as diferenças, e tentando encontrar soluções aceitáveis para os dois lados. Mas em várias áreas, algumas das quais já citei, temos interesses comuns e devemos continuar a trabalhar como parceiros, cooperando em inúmeras questões regionais e internacionais.

Foreign Policy: A.Pushkov descreveu ambos, o senhor e o Secretário Kerry, como “profissionais pragmáticos” e sugeriu que haveria boa base para que o senhor e ele se entendessem bem, talvez, se se consideram os secretários que antecederam Kerry, a Secretária Rice, principalmente, com a qual o senhor teve relações bastante conturbada. O que pensa sobre isso?

S.Lavrov: Não costumo fazer esse tipo de comparação. Só posso dizer que tenho boas relações pessoais com todos os secretários de Estado com os quais trabalhei. Outro assunto é que nem sempre essas boas relações pessoais – também no plano presidencial – se traduzem em movimentos práticos positivos. Mas, sim, Kerry é profissional. É pragmático. E essa é qualidade muito importante num diplomata e, ainda mais, num secretário de Estado. Conhece muito bem as coisas do mundo. Tem claro interesse em fazer andar alguns dos velhos problemas e arrancá-los do impasse. Discutimos com ele esforços conjuntos para a questão do programa nuclear iraniano, o problema nuclear da Península Coreana e, claro, tudo que tenha a ver com a chamada “Primavera Árabe”. É realmente uma situação que está gerando mais ameaças que incentivos positivos.

Foreign Policy: Bem, não há dúvidas de que queremos falar também sobre as conversações que tiveram sobre a Síria. Kerry manifestou disposição para e interesse em continuar a buscar uma solução que Rússia e EUA possam fazer avançar, na questão da guerra civil. Mas também criticou os russo, na Arábia Saudita, por continuar a vender armas ao regime sírio.

S.Lavrov: Quanto à venda de armas, os russos nunca, nunca tentamos esconder que estamos implementando contratos assinados há bastante tempo, muito antes de tudo isso começar. E esses contratos têm a ver com fornecer ao governo sírio equipamento aéreo de defesa. E não cabe dúvida alguma de que a Síria precisa, legitimamente, construir capacidades de defesa, porque as ameaças que tem recebido não são ficção – são bem reais. E qualquer país tem direito legítimo de ter capacidade para defender-se. Não há lei nem tratado internacional que proíba qualquer país de construir e manter capacidades para defender-se. Os sírios portanto não violam lei alguma.

Considero muito mais importante prestar toda a atenção ao outro lado do drama, porque a oposição ao governo sírio está recebendo armas ofensivas, armas de ataque, as quais tem sido também, como você sabe, infiltradas a partir da Líbia, inclusive armamento antiaéreo portátil [orig. Man-portable air-defense systems (MANPADs [4]), que são armas extremamente perigosas. Tivemos de levar em consideração essa informação, no contexto em que líderes do Exército Sírio Livre têm feito declarações públicas, de que aviões e aeroportos civis, inclusive aviões civis, serão declarados alvos. Isso é muito perigoso.

Sobre a situação síria, falando em geral e sobre a posição dos EUA e a posição russa, estamos, já há vários anos, ouvindo. Estamos ouvindo desde o primeiro mandato do governo Obama. Ouvimos apelos e mais apelos para mudarmos nossa posição. Os representantes oficiais do Departamento de Estado ou da Casa Branca não se cansavam de repetir “Conclamamos Rússia e China a mudar de posição”. Isso mostra que a Casa Branca está convicta de que sua posição é correta. Sinto-me gratificado, afinal, ao ver que há mudança positiva na opinião dos que negavam qualquer possibilidade de diálogo político enquanto durar o governo do presidente Assad na Síria.

Os russos não mudaram de opinião. Fomos sempre consistentes. Dissemos, desde o início, que nossa principal prioridade é pôr fim ao banho de sangue e salvar vidas. E que, portanto, a cessação das hostilidades e o início de um diálogo sem precondições é o melhor meio para obter esse resultado. E quando nos dizem que “podemos apoiar a Rússia, mas só se o presidente Assad desaparecer”... significa uma coisa e só uma coisa: para eles a prioridade não é salvar vidas, mas derrubar o governo e conseguir “mudança de regime”.

De fato, você sabe, estamos vendo acontecer uma mudança bem-vinda. Não só da parte de Washington, Paris e outras capitais europeias, mas também da parte de estados árabes, os quais começam  dizer coisas que antes não diziam; e aí pode estar uma possibilidade para iniciar um diálogo. O líder da chamada Coalizão Nacional Síria das Forças Revolucionárias, ou coisa parecida, Mr. Khatib [5], com o qual estive reunido em fevereiro na Alemanha, disse publicamente que poderia iniciar um diálogo. Sim, ainda está impondo algumas precondições, como a aceitabilidade dos negociadores. E o governo sírio também tem feito movimento semelhante.

O presidente Bashar disse [6] que está aberto ao diálogo com qualquer grupo, inclusive os grupos da oposição armada, exceto os grupos que têm participado de ataques terroristas. Quer dizer: o governo também está impondo suas precondições. Mas o principal é que os dois lados manifestam desejo de dialogar. Todo o resto é factível, por meios diplomáticos. E, nesse ponto, a mediação internacional pode ajudar, seja L.Brahimi [7], seja o secretário-geral da ONU, seja qualquer um disposto a contribuir para construir os parâmetros de um diálogo, o local, da data, a composição das delegações. Infelizmente, a disposição manifestada por Mr. Khatib não foi apoiada pelo resto da “coalizão”, e eles, de fato, cancelaram a oferta de diálogo, o que não se compreende.

Se essa guerra na Síria continua, temo que a solução militar só fará radicalizar ainda mais o país. Uma solução militar só admite dois desfechos: ou o governo vence, ou a oposição vence. Se a oposição vencer, temo que todos os envolvidos nessa coalizão nacional, os membros do Conselho Nacional Sírio serão expulsos da Síria, porque os extremistas, os terroristas, as gangues armadas estarão no controle de tudo.

Essa evidência é raramente discutida publicamente, mas, quando os EUA incluíram a “Frente al-Nusra” na lista de organizações terroristas, os membros da “coalizão” de oposição síria – protestaram publicamente, apresentando aqueles terroristas como “combatentes da liberdade”. Esse ponto é muito importante, porque os terroristas da “Frente al-Nusra” estão recebendo quantias gigantes de financiamento externo, muitas armas e, segundo várias avaliações, é a mais eficiente força de oposição em combate. E é grupo afiliado da al-Qaeda.

Por tudo isso, é preciso compreender bem o que se está fazendo quando se apoia um lado ou o outro. Os terroristas que franceses e africanos enfrentam hoje no Mali são os mesmos grupos que os europeus apoiaram na Líbia. Muitas armas hoje usadas contra os franceses, já se sabe com certeza, são armas que a oposição líbia recebeu da França.

O que quero dizer é que é indispensável ter visão mais ampla sobre todo o quadro. Não basta dizer que a Líbia não é a Síria, que a Síria não é o Mali, que Mali não é a Tunísia, que Tunísia não é Egito. Tudo isso é verdade: cada país tem suas especificidades. Mas o processo que está em curso, no contexto desse Despertar Árabe é, com certeza, questão ampla, abrangente, que envolve tantos aspectos, que nós não podemos nos dar o luxo de nos limitar exclusivamente a cada momento, a cada circunstância, num país X, esquecendo todas as ramificações.

Foreign Policy: O senhor sente que estava equivocado na Resolução da Líbia? Que o senhor apoiou uma posição que a Rússia, de fato, não apoia? (Pergunta “jornalística” flagrantemente enviesada, mal-intencionada, que visava a dirigir a resposta do entrevistado. O embaixador Lavrov, inteligentemente, não caiu na provocação, não respondeu e aproveitou para dizer o que não lhe perguntaram e a “jornalista” não esperava ouvir [NTs]).

S.Lavrov: O que declaramos bem claramente foi que a autorização que a ONU aprovou, em votação na qual nós e os chineses nos abstivemos, foi flagrantemente violada. A zona aérea de exclusão, como foi aprovada, nunca foi autorização para que os aviões da OTAN destruíssem a Líbia. E isso foi o que aconteceu. A OTAN não chegou à Líbia como missão de patrulha. Ela chegou como missão de ataque. Atacou alvos em solo, teve participação direta no conflito interno.

Foreign Policy: O senhor acha que há situações nas quais se justifica a intervenção humanitária?

S.Lavrov: Ora... Essa questão foi muito discutida, inclusive na ONU. O que se aceita, em termos gerais, que é lei internacional, é que a soberania não pode ser usada para violar direitos humanos, promover limpeza étnica, genocídio, crimes militares. E tudo isso ficou bem esclarecido em 2005, quando a Assembleia Geral da ONU reuniu-se e aprovou uma declaração na qual explicitou sua “responsabilidade de proteger”.

Essa declaração diz claramente que os estados devem priorizar, nos seus esforços para cumprir seus deveres – e o dever primário é proteger a população – os meios políticos. E que só no caso de um estado ter esgotado todas as suas possibilidades e não conseguir proteger a população, só nesse caso, a comunidade internacional pode intervir, mas só se o Conselho de Segurança da ONU aprovar a intervenção. Essa questão já está decidida. As regras foram discutidas e votadas e aprovadas. Há uma declaração, vale dizer, é resolução de consenso. Minha resposta portanto é sim: há algumas situações em que a interferência é inevitável. E quem decide se é ou não é e quando, é o Conselho de Segurança da ONU.

Foreign Policy: Qual sua visão das relações internacionais? Muita gente com quem conversei sugeriram que o senhor seja, no fundo, um realista – um realista russo – e que o senhor defende o interesse nacional russo, sem se preocupar com ideologia. É opinião aproveitável?

S.Lavrov: Pelo menos, é o que acho que estamos fazendo. Não acredito em ideologias, nas relações internacionais. Você sabe... Comecei minha carreira como diplomata, ainda na Rússia soviética, e, por mais que a ideologia tivesse muita importância na agenda do Partido Comunista, posso garantir a você que, em termos práticos, sempre tentamos ser pragmáticos. Como hoje.

A Federação Russa está promovendo internacionalmente uma política que visa a unir os países, não estamos trabalhando para criar linhas ideológicas artificiais, para dividir coisa alguma. No mundo contemporâneo já há muitas divisões por linhas ideológicas, demais. A situação na Europa, por exemplo.

A OTAN perdeu completamente a razão de ser depois que desapareceram a União Soviética e o Tratado de Varsóvia. Naquele momento, o Afeganistão foi fator de unificação. E está aí, às portas, o ano de 2014, quando a OTAN terá de deixar o Afeganistão, embora não totalmente.

Mas, bem claramente, a OTAN está à cata, basicamente, de uma razão de ser, de uma razão para continuar existindo. O novo conceito que a OTAN apoiou na última reunião levanta algumas questões, porque a OTAN, que foi criada como aliança de defesa, vive agora a proclamar seu direito de agir militarmente em qualquer ponto do planeta, onde quer que a OTAN entenda que seus interesses estejam sendo afetados. É visível que há aí uma nova ideia. E sabe-se que ela cria, que ela entra em aberto confronto com todos os compromissos que os estados membros da OTAN também assinaram, como membros da ONU, nos termos da Carta das Nações unidas e da  Organização para Segurança e Cooperação na Europa [orig. Organization for Security and Co-operation in Europe, OSCE]. Porque na OSCE nós proclamamos o princípio da segurança indivisível e dissemos que nenhum país membro trabalharia para aumentar a própria segurança à custa da segurança dos demais estados.

Exemplo bem claro desse impasse é a questão dos mísseis de defesa, porque os mísseis de defesa, na visão da Rússia, criam problemas para nossa segurança. Por isso, temos de voltar e voltar a esse assunto. O ideal seria converter esse princípio da segurança indivisível em obrigação legal, convertê-lo em lei; por enquanto, não passa de declaração política.

Aí está, portanto, um bom exemplo de fatores ideológicos, que ainda atravancam a política externa de vários países. Estou convencido de que a OTAN está-se convertendo cada vez mais em organização ideológica, e sua expansão está sendo artificialmente promovida, criando novas linhas, desnecessárias, é claro, de divisão, como já disse. Porque a verdade é que não há coisa alguma, nada, em termos práticos, que nos separe. Todos temos as mesmas preocupações, sofremos as mesmas ameaças, enfrentamos os mesmos desafios. Preservar uma aliança militar só de alguns, quando todos temos de agir universalmente, absolutamente não ajuda.

Foreign Policy: O novo conceito de política externa da Rússia, que o presidente Putin assinou, em fevereiro, fala da Rússia como fator “de equilibramento” no mundo. Conta quem a Rússia ‘pesaria’, para fazer esse ‘reequilibramento’? O senhor vê os EUA ou a OTAN como adversários?

S.Lavrov: Não, não. Não os vemos como adversários. Para começar, a doutrina militar russa diz que vemos um perigo, não na OTAN, como tal, mas na OTAN tentando desempenhar um papel global, pela via militar; a OTAN tornando universal a sua postura militarista. Não a OTAN como tal, mas a intenção da OTAN de tomar conta de tudo. E em segundo lugar – não como ameaça, mas como perigo para o mundo – vemos que a OTAN, além de se expandir noutras direções, também está deslocando infraestrutura militar para cada vez mais perto das fronteiras russas.

Quando se criou o Conselho OTAN-Rússia, quando se desmantelou o Tratado de Varsóvia, quando os soviéticos estavam saindo da Europa, antes de se criar o Conselho OTAN-Rússia, houve um acordo, que foi repetido depois, segundo o qual a OTAN não caminharia para o oriente, para leste. Depois, esse compromisso apenas verbal foi desrespeitado, e quando a Federação Russa e a OTAN fixaram os termos de seu relacionamento, no final dos anos 1990s, renovou-se formalmente o compromisso que de a OTAN não deslocaria capacidade substancial de combate para os territórios das novas repúblicas. Esse compromisso também foi desrespeitado.

Por tudo isso, os russos tendemos hoje a buscar aprimorar e fazer valer a lei escrita, sem depender só de promessas políticas. Essas são as razões das nossas posições atuais sobre os mísseis de defesa, por exemplo, de que já falamos.

Lembre como protestamos, com França e Alemanha, contra a guerra no Iraque em 2003; lembre a posição que assumimos na Líbia; e a posição que assumimos hoje na Síria. E vários parceiros ocidentais nos diziam “vocês vão pagar por isso. Vocês estão perdendo o mundo árabe” e coisas parecidas. Tudo errado. No Iraque, lá está o governo que resultou da intervenção dos EUA, e é governo que busca entender-se bem com a Rússia. Na Líbia, as novas autoridades querem que os russos não interrompamos os projetos, a ajuda econômica, a colaboração que sempre mantivemos com o governo do general Gaddafi, não porque prefiram a Rússia, mas porque sabem que, no mundo contemporâneo não se deve confiar só num lado e perder condições de negociação com o resto do mundo. Isso, também, porque a Rússia tem muito a oferecer.

A Rússia tem longa história de cooperação com o mundo árabe. Temos longa história com países africanos, onde sempre apoiamos firmemente a descolonização. As fronteiras artificiais deixadas pela colonização são hoje, como se sabe, a maior fonte de dificuldades e conflitos na África, onde grupos étnicos foram artificialmente divididos – Ruanda, Uganda, Mali, são muitos. O Sudão, por exemplo.

Os países sabem que os russos sempre fomos coerentes. Os russos nunca disseram que apoiam alguém na Líbia para, ao mesmo tempo, combater o mesmo grupo no Mali.

Terroristas são terroristas, e se não se contêm aqueles instintos agressivos, começam as tragédias. Por tudo isso, minha resposta é clara: os russos não mentem. Sempre dizemos a verdade.

É o que escreveu nosso famoso diplomata, A.Gorchakov, e foi dos mais eficientes e brilhantes diplomatas na Europa. Sempre disse que a chave do sucesso é a abertura. Em política exterior, é preciso dizer com clareza quais são seus interesses, de modo que as pessoas compreendam – e mesmo que esses interesses não coincidam com os interesses da outra parte, mesmo que contradigam os interesses da outra parte. Se os interesses têm inspiração legítima, se são expostos com clareza, o resultado é sempre melhor do que tentar a via das intrigas palacianas bizantinas.

Foreign Policy: O senhor é ministro de Relações Exteriores da Rússia por mais tempo que qualquer outro, no período pós-soviético. O senhor vê mudanças na política exterior russa nesse período? Vê diferenças entre a presidência de Medvedev e o novo governo do presidente Putin?

S.Lavrov: Quanto a mudanças na política exterior russa, sim. Temos mais força doméstica, digamos assim. Tornamo-nos economicamente mais fortes; conseguimos encaminhar com sucesso os problemas sociais, melhorando o padrão de vida da população. Sim, há muito por fazer. Mas as mudanças são visíveis. Todos os russos sentimos a mudança. A Rússia sente-se mais assertiva – não mais agressiva, mas mais assertiva. E conseguimos sair da situação em que nos encontrávamos no início dos anos 1990s, quando desapareceu a União Soviética e surgiu a Federação russa sem fronteiras, sem orçamento, sem dinheiro e com problemas gigantescos, a começar pela falta de comida. A Rússia hoje é país muito diferente. E é claro que podemos dar mais e melhor atenção aos nossos interesses legítimos, em áreas das quais estivemos ausentes por algum tempo, depois do fim da União Soviética. Bom exemplo disso é a África. Hoje, temos empresas russas interessadas em negociar na África. E os africanos têm interesse em nos ter por lá. Não querem ficar na mão de um ou dois investidores. Não querem ser dominados por um ou dois grandes investidores. Querem ver lá vários países – o que me parece desejo muito saudável. E a América Latina – já estamos economicamente fortes para poder, também, olhar naquela direção. E há muitos projetos para mútuo benefício, entre nós e a América Latina. E, claro, no Pacífico Asiático – somos uma potência do Pacífico, e é absolutamente importante para nós, incluindo o desenvolvimento do Extremo Oriente e do leste siberiano no Extremo Oriente, firmemente integrados no processo econômico do Pacífico Asiático. Basicamente, é o que estamos fazendo agora, além da tradicional diplomacia na Europa, com China, Índia. Temos hoje agenda muito mais ampla, porque, antes de tudo, temos mais capacidade econômica.

Foreign Policy: O senhor trabalhou com tantos embaixadores dos EUA, na ONU, e com secretários do Departamento de Estado. O que é que os norte-americanos não entendem sobre a Rússia? Quais os erros deles? Por exemplo, sobre a Síria, em Washington, ano passado, o que mais se ouvia era “os russos, dessa vez, mudarão de posição” ou “sentimos que vão mudar de opinião”. Mas os russos não mudaram de opinião. É possível que alguém não tenha entendido alguma coisa...

S.Lavrov: Não sei ler pensamentos dos outros, portanto, não sei por que diziam tais coisas. Mas, quando se fala com os profissionais sérios, de Estados Unidos ou Europa, sobre a Síria ou assuntos similares no Oriente Médio, todos, basicamente, fazem análise semelhante à que acabo de fazer. Não sei por que, quando falam em público, recomeçam sempre aquela história de “Assad tem de sair, ou a coisa não pára”. Eles entendem perfeitamente os riscos de o extremismo se alastrar na região e entendem perfeitamente que é indispensável conversar, negociar, construir algum acordo. Quero dizer... não entendo.

A ONU é experiência muito útil para quem queira desenvolver habilidades de negociador, porque a diplomacia multilateral é eterno desafio, quando se tem de levar em conta as posições de tantos atores. No Conselho de Segurança são 15, na Assembleia Geral, quase 200. Sempre se tem de considerar os interesses de muitos estados.

Já mencionei A.Gorchakov, e uma de suas maiores realizações foi ter restaurado a influência da Rússia na Europa, depois da derrota na Guerra da Crimeia. E o fez - como disse o poeta russo, F.Tyutchev, que escreveu sobre ele – sem mover uma arma. Fez o que fez exclusivamente com recursos diplomáticos, baseado em seu maravilhoso, profundo conhecimento das nuanças da política da Grã-Bretanha, França, Itália, Prússia, Áustria. É um exemplo. Trouxe até uma frase de A.Gorchakov sobre como organizar os negócios mundiais.

Ele escreveu que “A paz universal é uma base para relações naturais entre Estados, e essa base garante a igualdade de todos os países, grandes e pequenos. Qualquer intervenção externa em questões domésticas será sempre inaceitável. O uso da força será sempre inaceitável nas relações internacionais, especialmente por países que se considerem líderes de civilização”.

Acho que foi a primeira tentativa para pôr por escrito um conceito que, depois, seria a Carta das Nações Unidas. Realmente admiro esse homem, e ele prestou grande serviço ao seu país. Tentamos promover essa tradição.

(...)[8]

Foreign Policy: Há muitos que criticam a ONU hoje e sugerem que perdeu parte de sua capacidade para ajudar construtivamente a resolver problemas. O senhor concorda que a ONU já não cumpre o papel que antes teve?

S.Lavrov: A ONU não “um animal”. A ONU é os estados membros. E, como a ONU, especialmente, o Conselho de Segurança. O Conselho de Segurança não é o que é, não foi construído como é, por acaso. A começar, pelos cinco membros permanentes.

Foram os EUA que insistiram em que se criasse essa instituição, com cinco membros permanentes, na ONU, porque os EUA não queriam que se repetisse o fracasso da Liga das Nações, que não garantia às grandes potências papel especial. O modelo escolhido e apoiado pela ONU, me parece, é modelo operativo e eficiente. Diz-se que Rússia, China, vetaram uma resolução e que, portanto, a organização foi paralisada. Não é bem assim, há aí uma distorção da ideia original.

O veto foi introduzido também por insistência dos EUA, para garantir que as decisões tomadas tivessem condições para influir diretamente na paz e na segurança internacional, que as decisões fossem viáveis e implementáveis. Os que redigiram a Carta da ONU entendiam claramente que, se uma das grandes potências não aprovasse alguma coisa, a decisão não funcionaria. Por isso o veto foi incluído na Carta. Implica que quando os países assinam e ratificam a Carta, eles aceitam e subscrevem o direito de vetar. O veto não é ‘um capricho’. É parte do processo de tomada de decisões: se há veto, não faz sentido aprovar alguma coisa.

Basicamente o que acontece é que, quando se fala em eficiência da ONU, as pessoas só têm uma ideia na cabeça: se o Conselho de Segurança apoia a posição do Ocidente, é “eficiente”; se não apoia, é “ineficiente”. Porque os meios de massa são dominados pelo Ocidente.

Então, se o presidente de um país ocidental diz “Fulano ou beltrano não governará tal país. É minha decisão” e o Conselho de Segurança não aprova resolução confirmando essa decisão, os meios de massa põem-se a repetir que a ONU e o Conselho de Segurança paralisaram uma ou outra ação e, portanto, são ineficientes. É sempre assim. Em certo sentido, é um jogo. Mas a atenção pública caminha sempre para onde haja escândalos, conflitos, matanças, assassinatos, guerras.

Não esqueçamos que a ONU é um sistema de quase duas dúzias de organizações: eletricidade, aviação civil, transporte e comércio marítimo, padrões sanitários universais, padrões universais de trabalho e outros. Muitas das coisas que tomamos naturalmente por asseguradas, todos os dias, vieram à luz ou são preservadas com a ajuda do sistema ONU e suas agências especializadas. Infelizmente, a mídia não vende essa ideia.

Foreign Policy: Em anos recentes, Rússia e China têm frequentemente votado juntas, quando se trata de vetar ou de usar a ameaça de veto. A China é hoje principal parceiro da Rússia?

S.Lavrov: Rússia e China somos parceiros estratégicos. Acho que seja porque como nós, a China também olha cara a cara as questões internacionais; e porque nós e a China desejamos que se alcancem objetivos semelhantes nas relações internacionais: democracia e Estado de Direito. Nossos amigos ocidentais só promovem o Estado de Direito para políticas domésticas – só no nível dos estados-nação. Quando se cobra deles alguma posição sobre Estado de Direito internacional, já não parecem tão interessados.

Foreign Policy: É verdade, embora muitos deles digam que Rússia e China uniram-se no Conselho de Segurança, porque ambos querem assegurar o poder para impor políticas autoritárias internas, sem ameaça de qualquer intervenção externa.

S.Lavrov: É. É explicação que parece bem consistente com a visão que o Ocidente faz-se sobre Rússia e China. Ou é o que dizem todos que, no Ocidente, têm interesse em apresentar Rússia e China como “uma dificuldade” nas relações internacionais.

Nossas posições são tomadas a partir do nosso entendimento das situações e a partir da necessidade de fortalecer o pluralismo nas relações internacionais, fortalecer as regras democráticas nas decisões internacionais e garantir a supremacia da lei nas relações internacionais. Esses não são objetivos muito apreciados pelos que se apresentam como donos de saberes superiores aos demais, quando se trata de analisar a situação em algum país do Oriente Médio, ou da África, ou da América Latina. Essas são posições antiquadas.

Todos temos de nos habituar ao fato de que há mais de um centro na política mundial, que o mundo unipolar jamais deu certo, que outros centros estão em crescimento, que há potências econômicas emergentes, que emergem também com influência política. E que a China tem seu modo independente de ver o mundo e as transformações mundiais. A Rússia tem o mesmo direito e a mesma competência para construir pensamento próprio. E que independência não é sinônimo de isolacionismo. Queremos e seremos independentes em nossa política externa, mas somos absolutamente favoráveis à promoção de aproximações coletivas, também no caso das ameaças e desafios globais. A única via possível, para abrir caminho sustentável à frente, é desenvolvermos decisões coletivas, coletivamente construídas.

Foreign Policy: Então, quando se diz que o senhor é nossa versão moderna de Mr. Não, por causa dos vetos russos, o senhor não vê problema algum para a Rússia, no sentido de que o veto é ferramenta poderosa, mas é ferramenta negativa?

S.Lavrov: No caso da Síria votamos com vários sólidos parceiros – não só a China: a Índia também votou conosco. E Rússia, China e Índia são três atores, na arena internacional, que não faz sentido fingir que não existem. Tampouco se pode fingir que os EUA não existem. E os EUA – só eles – vetaram dúzias de propostas, quando todos os demais membros do Conselho de Segurança votavam a favor. O melhor é pensar com realismo, se quiser, e filosoficamente: é lei. Está na Carta da ONU. Vetar é um direito, estabelecido na Carta da ONU. E todos ali assinaram a Carta e ratificaram e aceitaram esse direito para todos.



Notas dos tradutores

[1] Assista vídeo da entrevista (em inglês) a seguir :


[2] O Tratado START (STrategic Arms Reduction Treaty/Tratado de Redução de Armas Estratégicas) é acordo bilateral assinado por EUA e URSS, dia 31/7/1991, que entrou em vigor dia 5/12/1994. 

[3] Magnitisky Act, é lei de 2012, proposta e aprovada, para punir funcionários russos acusados da morte de Sergei Magnitsky; a lei proíbe os acusados de entrar nos EUA e usar o sistema bancário norte-americano. 


[5] Ahmad Mouaz Al-Khatib Al-Hasani, político sírio, tido como islamista moderado, serviu como presidente de uma chamada Coalizão Nacional Síria da Oposição e das Forças Revolucionárias, desde novembro de 2012. Renunciou dia 24/3, um mês antes desta entrevista. 

[6] Ver entrevista traduzido do presidente Bashar al-Assad em 18/4/2013, redecastorphoto: Bashar al-Assad: “O ocidente, outra vez, vai-se arrepender muito por ajudar a al-Qaeda”.
  
[7] Lakhdar Brahimi é político e diplomata argelino, atual enviado especial da ONU e da Liga Árabe, para mediar a crise na Síria. Dia 5/2/2013, segundo o Washington Post cogitava renunciar ao cargo.

[8] Pergunta “jornalística” perfeitamente imbecil, que recebeu resposta diplomática:

Foreign Policy: Há outros nomes que o senhor admire, entre os diplomatas com quem trabalha?
S. Lavrov: Todos.

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