17/5/2013, Pepe Escobar
(de Paris), Asia Times Online - The Roving
Eye
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Ver também:
12/3/2013, redecastorphoto, em: Pepe
Escobar : “A Queda da Casa da Europa”
Amantes
do turboneoliberalismo, rejubilem – e levem suas garrafas de Moet para os
assentos do gargarejo, junto ao ringue; nenhuma luta livre vale-tudo superará,
nessa temporada, os rounds de abertura do combate entre dois gigantes
ocidentais. Esqueçam o tal de “pivoteamento” do Pentágono para a Ásia sem nunca
sair do Oriente Médio; nada se compara a essa viagem às entranhas do turbocapitalismo digna de um neo-Balzac.
Falamos
aqui de um novo Santo Graal – negócio de livre mercado entre EUA e a União
Europeia: e o advento de um mercado transatlântico gigante, interno (25% das
exportações globais; 31% das importações globais; 57% do investimento externo),
no qual bens e serviços (mas não pessoas) circularão “livremente”, coisa que, na
teoria, extrairá Europa do fundo de seu atual poço.
O
problema é que, para chegar a esse Valente Novo Mundo presidido pela Deusa
Mercado, a Europa terá de renunciar a parte considerável de seu complexo de leis
(sobre a administração da justiça, ambientais, culturais e sanitárias).
Nesse
paraíso burocrático kafkiano/orwelliano também conhecido como Bruxelas, hordas
de homens sem rosto parecidos
com os homens de
chapéu coco de Magritte
já começam a reclamar dessa “aventura”. Há consenso crescente de que a Europa
tem tudo a perder e pouco a ganhar nesse arranjo, em contraste com os muito
ridicularizados inimigos da integração europeia, caso dos fanáticos a favor de
uma Europa “pró-EUA” e “ultraliberal”.
Outra
vez, é aquele tal de perigo amarelo
O Perigo Amarelo |
A
coisa vai ficando cada vez mais e mais esquisita, se se observa que a grande
maioria das nações europeias vêm desejando, há tempos, um negócio desse tipo, de
livre mercado – bem diferente dos EUA sempre protecionistas.
A
Comissão Europeia (CE) estima que o PIB da União Europeia como um todo crescerá
0,5% – nada que se descreva como “números chineses”. Os norte-americanos, esses
sim, estão excitadíssimos: o Senado norte-americano estima que, sem barreiras
aduaneiras, as exportações para a Europa crescerão coisa próxima de 20%.
O
xis da questão, para fechar o negócio, será harmonizar leis e regras que têm
sido acusadas de bloquear totalmente a livre circulação de bens. “Harmonizar”
significa diluir todas as regras e leis europeias. E é aí que a coisa pega:
Washington não quer só um acordo transatlântico. A meta final é implantar, pedra
sobre pedra, um acordo “venha quem quiser” livre global, que em seguida passará
a ser imposto por todo o planeta; é a chave para a abertura total do mercado
chinês, absolutamente sem qualquer limitação, para as corporações ocidentais.
O German Marshall Fund of the United
States vai direto ao ponto: o capitalismo
ocidental terá de continuar como norma universal, contra a “ameaça” do
capitalismo chinês administrado pelo Estado. A ironia é que o capitalismo chinês
foi, é – e continuará a ser – a salvação e o salvador, na crise massiva pela
qual passa o capitalismo ocidental.
O negócio entre EUA e UE está
previsto para ser a cereja do bolo dos negócios que os EUA já estão fechando com
nações asiáticas, uma a uma. Não há absolutamente qualquer dúvida sobre qual o
lado mais forte. O presidente Barack Obama dos EUA já está mergulhado
em
operação de Relações Públicas de alto risco, repetindo, cada
vez que abre a boca, que a Europa não está encontrando fórmula que a faça
crescer. E os EUA podem contar também com elementos quinta-coluna, como o
Comissário Europeu para o Comércio, Karel De
Gucht,
para quem os franceses – que defendem inúmeras exceções – já estão isolados.
Que
ninguém se engane: Washington está partindo para a degola, estilo Homem-de-ferro
3 – para atropelar-esmagar as regras sanitárias e de fiscalização
fitossanitárias, para “liberar” todo e qualquer alimento, tudo que seja ou venha
a ser geneticamente modificado, de carne inchada com hormônios a Frango ao
Cloro. As regras estabelecidas pelos homens sem rosto de Bruxelas têm sido
regularmente ridicularizadas em Washington como “não científicas”, ao contrário
da regra-nenhuma que os norte-americanos pregam.
Jose
Manuel Barroso: o mais chapéu coco dos homens do chapéu coco
Cidadãos
europeus surpreendidos, só agora se dão conta de que foi a União Europeia quem
propôs o negócio todo aos EUA – não o contrário. União Europeia, aqui, significa
a Comissão Europeia. E é quando bile chega à goela: tudo é, sobretudo, efeito da
ambição de um único homem (um português) contra a honra de um país inteiro (a
França).
José Manuel Barroso |
Acrescente-se
que a negociação recebeu luz verde diretamente, pessoalmente, de Obama; e, com o
Congresso dos EUA interferindo em todos os níveis, o resumo é que para os
norte-americanos “tudo está sobre a mesa” – frase-código para “queremos tudo e
não cederemos nem um palmo de terreno”.
A
França – já apoiada pelos ministros da Cultura de 12 nações – quer que a
indústria do audiovisual seja excluída de todas as negociações, em nome de sua
muito premiada “exceção cultural”. A França é um dos raros países no planeta – a
China é outro assunto, completamente diferente – ainda não afundado no pântano
dos produtos hollywoodianos.
Se
não for assim, Paris vetará tudo – embora, off the record, funcionários
franceses admitam que não têm poder para vetar coisa alguma: as corporações
francesas desejam furiosamente fechar o negócio.
Seja
como for, Paris combaterá contra tudo, da “exceção cultural” às normas
sanitárias/ambientais, mais cruciais. A Itália acompanhará a França em várias
frentes: já há revolta declarada na Itália, sublimemente artesanista, contra o
futuro horrendo que aguarda a humanidade, obrigada a consumir formaggio parmigiano, prosciutto di Parma e vinhos Brunello, made in USA.
Formaggio parmigiano, prosciutto di Parma i vino Brunello (made in USA?) |
Em
front diferente é garantido que
Washington não abrirá o mercado dos EUA aos serviços financeiros ou transportes
marítimos europeus. Só um exemplo do muito que a Europa tem a perder, sem ganhar
praticamente coisa alguma.
No
frigir dos ovos, tudo se resume na ambição cega de um burocrata europeu,
funcionário de carreira, inigualavelmente medíocre – o presidente português da
Comissão Europeia, Jose Manuel Barroso. Barroso espera obter um mandado para
negociar em nome de todos os estados-membros, dia 14 de junho. E espera que as
negociações estejam concluídas antes do fim de sua presidência, que terminará em
novembro de 2014.
Diplomatas
da União Europeia, audivelmente enfurecidos, confirmaram off the Record a
esse Asia Times Online, que Barroso montou essa formidável operação
praticamente sozinho, à espera de uma simpática futura recompensa de seus
patrões (em Bruxelas?
Nada disso! Em Washington). Barroso
quer ser secretário-geral, ou da ONU ou da OTAN. Ninguém chega a qualquer desses
postos sem luz verde de Washington.
Isso
explica que o chefe de Gabinete de Barroso, nomeado embaixador da União Europeia
em Washington, esteja furiosamente lobbyando para os norte-americanos, com
os embaixadores de Portugal nos EUA e na União Europeia.
Estão
abertas as apostas: quem vencerá esse combate de luta livre vale-tudo no mundo
do capital? É possível, sim, que os estados membros da União Europeia votem,
mesmo, contra os próprios interesses. Mas outra coisa, completamente diversa,
seria uma ensurdecedora irrupção de fúria, na ruas, dos próprios cidadãos
europeus, já tão duramente supliciados.
É.
Essa nova saga do turbocapitalismo
ocidental reúne todos os elementos para ser... bastante
revolucionária.
Nota dos
tradutores
[1] Orig. catfight, que designa
briga a tapas, mordidas, puxões de cabelo e unhadas, quase sempre entre
mulheres.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Registre seus comentários com seu nome ou apelido. Não utilize o anonimato. Não serão permitidos comentários com "links" ou que contenham o símbolo @.