23/5/2013, Pepe Escobar,
Asia Times Online – The Roving
Eye
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Pepe Escobar |
Entreouvido
na Vila Vudu:
Pela primeira vez, em anos, houve veto, na nossa Roda de Conversa, contra
traduzirmos artigo de Pepe Escobar – nossa unanimidade mais longeva, até ontem
inabalada.
O
argumento que instruiu o veto da Zefa foi:
Ma
ke porra de negócio é esse, agora, de escrever como se o Irã estivesse cometendo
algum crime, por não ser nem querer ser “democracia” à moda do williamwaack?!
Melhor
Khamenei – uma muraaaaalha na Resistência contra os EUA e Israel – que qualquer
porra de “reformista” here,
there and everywhere.
Zefa (Malalai Joya) |
(E
se o porra de reformista for “jovem”, chegado ao mundo quando o neoliberalismo
já havia sido “naturalizado”, então, pior ainda, sô!). Queria o quê, o Pepinho
Querido?! Queria que, numa briga desstamanhão, como a briga em que o Supremo
Líder tá metido, contra EUA e Israel inteirinhos, ele deixasse
os panacas do dedo verde udenista metidos a éticos, a laicos e a democráticos à
moda williamwaack fazer o que quisessem?
É
claro que não podia deixá! A revolução não é um piquenique.
Dado
que nós não somos democráticos, nós
traduzimos – porque o Elói quis traduzir; e registramos, apoiando integralmente,
por unanimidade, o veto da Zefa.
Irã, 686 candidatos a candidatos à presidência nas eleições de 14/6/2013 |
Nada
será deixado ao acaso. – Não se verá sequer algum tênue sinal de onda de
protesto dos dedos verdes.
Em
2009, 475 candidatos registraram-se para concorrer à presidência do Irã. Só
quatro foram aprovados pelo Conselho dos Guardiões – o todo-poderoso comitê de
clérigos, com poder para revisar leis. Esse ano, nada menos que 686
registraram-se para concorrer às eleições de 14 de junho próximo. Foram
aprovados oito.
Dentre
os aprovados, não aparecem os dois pré-candidatos realmente controversos. Estão
fora o ex-presidente Ali Akbar Hashemi Rafsanjani, codinome “O Tubarão” – na
essência, conservador pragmático – e Esfandiar Rahim Mashaei, conselheiro e
braço direito do presidente que sai, Mahmud Ahmadinejad.
Os
que competirão nas urnas não são exatamente grandes estrelas: Mohammad Reza
Aref, ex-vice-presidente; Hassan Rowhani, ex-chefe da segurança nacional;
Mohammad Gharazi ex-ministro das telecomunicações; Saeed Jalili, secretário do
Conselho Supremo da Segurança Nacional do Irã; Mohammad Bagher Qalibaf, prefeito
de Teerã; Ali Akbar Velayati, conselheiro do Supremo Líder Aiatolá Khamenei para
questões de política externa; Mohsen Rezaei, secretário do Conselho dos
Experientes; e Gholam-Ali Haddad-Adel, presidente do Parlamento. Mas aí está,
sim, uma espécie de lista ‘'quem é quem'’ dos agregados do núcleo mais central da
República Islâmica – os chamados “principistas”.
Os oito candidatos à Presidência do Irã escolhidos pelo Conselho dos Guardiões |
Tubarão
fora d’água
Segundo
o ministério do Interior, O Tubarão está fora de jogo, por causa da idade
avançada (78). Não é bem assim. O Tubarão está fora porque era o principal nome
dos moderados – já catalizando o apoio de muitos reformistas (excluídos).
Esfandiar Rahim Mashaei |
Mashaei
está fora porque representaria uma continuação de Ahmadinejad – apoiado por
vários ministros do gabinete de Ahmadinejad e beneficiado por uma formidável
máquina política populista que ainda seduz os iranianos pobres nas cidades e no
interior do país. Faria avançar o movimento de Ahmadinejad a favor de Executivo
independente. Nada é coisa consumada – ainda. Embora nem Rafsanjani nem Mashaei
possam apelar, o Supremo Líder em pessoa pode dar uma mãozinha. Mas é pouco
provável que dê.
Rafsanjani
esperou até o último dia, 11 de maio, para registrar sua candidatura a
candidato. O ex-presidente Khatami – afamado pelo “diálogo de civilizações” –
não se registrou e, um dia antes de esgotado o prazo, anunciou seu apoio a
Rafsanjani. Pode-se facilmente adivinhar que soaram sinos de alarme no aprisco
do Supremo Líder.
Ali Akbar Hashemi Rafsanjani |
O
Tubarão foi recentemente confirmado presidente do poderoso Conselho dos
Experientes – que supervisiona o governo (Khamenei ocupava o mesmo posto,
enquanto viveu o Aiatolá Khomeini). Pode ser interpretado como uma espécie de
prêmio de consolação.
Ahmadinejad,
por sua vez, deu sinais de estar disposto a fazer chantagem – ameaçou cuspir
todos os feijões de corrupção dentro da família do Supremo Líder, de que tem
conhecimento. Ahmadinejad que não espere qualquer favor.
Aiatolá Khamenei |
Assumindo
que o Supremo Líder permaneça imóvel, ele próprio e seus subordinados em toda a
elite política conservadora expuseram-se a grave risco – o risco decorrente de
terem alienado completamente duas facções políticas muito significativas na
República Islâmica. Mas, até as eleições, o Conselho dos Guardiãos já terá
desimpedido o caminho para garantir vitória fácil a Qalibaf, ex-comandante da
Força Aérea dos Guardas Revolucionários e atual prefeito de Teerã.
Qalibaf
seria o mais perfeito veículo, politicamente correto, para o que tenho descrito
desde 2009 como a ditadura militar do mulariato – a dominação, pelo Corpo dos
Guardas Revolucionários Islâmicos e clérigos conservadores, sob o comando do
único que realmente decide, o Supremo Líder Khamenei, de toda a vida
institucional no Irã.
Mohammad Bagher Ghalibaf |
Matéria
publicada em al-Monitor faz
referência a um lado nada gentil, de Qalibaf. O fato em si não surpreende.
Infinitamente mais crucial é a questão sobre se Khamenei e os ultraconservadores
conseguirão manter-se preservados numa torre de marfim, enquanto deteriora-se a
situação econômica interna, e um altissonante eixo árabe sunita – amplamente
instigado pelos EUA e apoiado por Israel – já late às portas do Irã.
Vote!
Se não...
Nas
próximas eleições, o Supremo Líder precisa muitíssimo de grande número de votos,
para impulsionar a legitimidade do sistema. Por isso, as eleições municipais e
rurais acontecerão, pela primeira vez, no mesmo dia em que se disputa a eleição
presidencial.
Por
um rápido período, pareceu que seria capaz de catalisar toda a oposição. Agora,
os reformistas pregam o boicote, pregação que talvez se dissemine. Mas há um
grande problema. Votar é obrigatório no Irã; se você não vota, suas chances de
conseguir emprego no governo ou em organização semioficial ficam ameaçadas.
Significa adeus a um precioso emprego fixo, com moradia grátis, nenhuma conta a
pagar, salários decentes e benefícios.
Todos
portam uma carteira de Identidade, com selos que comprovam o comparecimento às
urnas, ano a ano. Muitos jovens urbanos letrados vão às urnas, mas votam em
branco.
No
Irã rural, as coisas são muito mais fáceis para o governo. Em dezembro de 2011,
acabaram-se inúmeros subsídios para energia e bens domésticos. Para compensar o
aumento da inflação, o governo começou a fazer pagamentos diretos a muitas
famílias iranianas – assegurando o apoio dos eleitores em muitas províncias
rurais.
Mir Hossein Mousavi |
Para
os ultraconservadores, nada é suficiente para impedir que se repitam os eventos
de 2009,
a onda verde, a vitória de Ahmadinejad sobre o reformista
Mir Hossein Mousavi (que foi contestada), fúria nas ruas, demonstrações
massivas, repressão violenta.
Mousavi, sua esposa (a artista
Zahra Rahnavard), e o ex-presidente do Parlamento Mehdi Karroubi – todos figuras
de destaque do Movimento Verde – estão em prisão domiciliar desde os grandes
protestos de rua de fevereiro de 2011. A repressão não diminuiu – ao
contrário (ver, por exemplo, matéria
do Guardian). E também respingou no campo de
Ahmadinejad: até clérigos pró-Ahmadinejad foram perseguidos ou presos pelos
serviços de segurança em algumas províncias, e cinco páginas de campanha pró
Mashaie na Internet foram extintas.
Todas
as redes virtuais privadas [orig. VPNs (virtual private networks)] foram
fechadas, nos muitos cibercafés que há no Irã, e a velocidade da internet foi
reduzida a passo de cágado.
Ainda
que todo esse “aparelho de prevenção” funcione, e ainda que o Supremo Líder
consiga eleger seu candidato (possívelmente, Qalibaf), a visão geral não é
agradável.
O
presidente pós-Ahmadinejad herdará uma paisagem política ultra fragmentada.
Muita gente culpa a má administração do governo, tanto quanto as sanções
internacionais, pelas imensas dificuldades do dia a dia. E a mesma hostilidade
linha-duríssima contra os EUA, Israel e o eixo sunita. Uma espécie de desespero
silencioso parece ser hoje meio de vida popular no Irã.
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