30/4/2013, MK
Bhadrakumar*, Indian Punchline
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Barack Obama ao telefone |
O
segundo telefonema do presidente dos EUA Barack Obama, em semanas consecutivas,
ao presidente Vladimir Putin, 2ª-feira passada, mostra claramente o quanto é
crucialmente necessário, para os norte-americanos, obter a cooperação da Rússia,
nas atuais circunstâncias, no front da política externa.
O
resumo
da conversa, distribuído
pela Casa Branca, informa que falaram sobre terrorismo e Síria, como questões
mais prementes. A verdade é outra: as bombas na Maratona de Boston evoluíram e
já são questão russo-norte-americana.
A
rádio Free Europe/rádio Liberty, criada pelo governo dos EUA, divulgou comentário muitíssimo
controverso
– curiosamente sem qualquer crédito de autoria – que se detém a um milímetro de
insinuar que a inteligência russa pode saber bem mais sobre Tamerlan Tsarnaev do
que se deu o trabalho de revelar.
Putin atende... |
O
comentário, do fim de semana, revela, surpreendentemente, que, enquanto visitava
a Rússia – onde a inteligência russa “não se mexeu para impedi-lo nem de entrar
nem de sair da Rússia” – Tamerlan desapareceu da face da Terra por
longos dois meses, na região do Daguestão no norte do Cáucaso.
Mas
Obama optou por “reiterar o quanto apreciou a empenhada cooperação” que a Rússia
ofereceu na questão dos ataques à Maratona de Boston. Em troca, Obama ofereceu
a cooperação dos EUA, para enfrentar os desafios de segurança durante as
Olimpíadas de 2014 em Sochi, um resort no Mar Negro (bem próximo da
Trans-Caucasus), questão que Moscou está tratando como prioridade nacional de
segurança.
O
resumo da Casa Branca dizia que Obama manifestou sua “preocupação com as armas
químicas sírias”. É formulação cuidadosa. O resumo não diz que o governo sírio
teria usado armas químicas. Em vez disso, reiterou a importância de “consultas
próximas” entre Washington e Moscou sobre a situação síria.
Fato
é que Obama está fazendo bem triste figura, ao ter de reformular sua própria
definição de “linha vermelha” na Síria. É improvável que os EUA algum dia
encontrem prova conclusiva de que o regime sírio tenha usado armas químicas.
Simultaneamente, reina grave divisão no campo ocidental, também, no plano da
construção de políticas: o comandante das forças britânicas manifestou-se
fortemente contrário a
qualquer tipo de intervenção militar na Síria, pelo risco de “arrastar a
Grã-Bretanha para uma guerra total”.
Por
outro lado, a Rússia avança na ofensiva diplomática. O ministro das Relações
Exteriores da Rússia, Sergey Lavrov, atacou de modo inusitadamente forte:
Sergey Lavrov |
“Há estados e atores externos que
supõem que quaisquer meios sejam bons, se levarem à derrubada do governo sírio.
Mas a questão do uso de armas de destruição em massa é grave demais, e ninguém
deveria jogar com ela. Considero inadmissível servir-se dessa questão e
especular sobre ela. A culpa por ninguém ter investigado até agora o específico
evento do dia 19 de março e que ainda provoca indignação universal deve ser
atribuída às nações que tentam impedir que o secretário-geral da ONU ofereça
resposta simples e direta a uma pergunta simples e direta”. Tradução de excerto da fala de
Lavrov em 29/4/2013, Rússia Today:
“Political intrigue
hampers honest investigation of WMD use in Syria – Lavrov”
Ainda
não se sabe se Obama telefonou ao Kremlin antes ou depois da fala de Lavrov.
Seja como for, Moscou não dá sinal algum de disposição para colaborar em
qualquer ação ocidental na direção de inventar outro “caso de armas de
destruição em massa”, à moda Iraque, dessa vez contra a Síria, na ONU. Ponto.
Parágrafo.
Assim
sendo, onde fica Obama? Por um lado, a Casa Branca tenta pedalar para trás: é
preciso “muito
mais trabalho”, antes
de acusar o regime sírio de ter usado armas de destruição em massa. Pelo outro
lado, o Congresso vai-se tornando cada vez mais furioso: dizem que Obama tem de “fazer
mais” contra a Síria.
O
caso é... E o que Obama pode fazer?! Até a operação de armar os “rebeldes” é
arriscada demais. Vozes
mais sãs têm aconselhado cautela.
Quanto a impor uma “zona aérea de exclusão”, com certeza a tentativa seria
contestada, à falta de mandado da ONU que autorize ato de beligerância contra
estado membro.
Pelo sim, pelo não, a Rússia está
deslocando sua força tarefa naval da Frota do Pacífico para o Mediterrâneo, para
estacionamento prolongado próximo à Síria; deve chegar em meados
de maio. Interessante:
os navios de guerra russos pararam, em visita de cordialidade, no porto iraniano
de Bandar Abbas, na viagem para o Mediterrâneo via o Canal de Suez.
________________________
*MK Bhadrakumar foi diplomata de carreira do Serviço Exterior da Índia. Prestou serviços na União Soviética, Coreia do Sul, Sri Lanka, Alemanha, Afeganistão, Paquistão, Uzbequistão e Turquia. É especialista em questões do Afeganistão e Paquistão e escreve sobre temas de energia e segurança para várias publicações, dentre as quais The Hindu, Asia Online e Indian Punchline. É o filho mais velho de MK Kumaran (1915–1994), famoso escritor, jornalista, tradutor e militante de Kerala.
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