18/10/2013 [*] Pepe Escobar, Asia
Times Online - The Roving Eye
Traduzido por
João Aroldo e enviado pelo
pessoal da Vila Vudu
A vida é boa se você é membro do Clube
Contrarrevolucionário do Golfo, oficialmente conhecido como Conselho de
Cooperação do Golfo (CCG). Você pode esmagar a Primavera Árabe à vontade. Você
pode contratar mercenários por todo Dar-al-Islã para propagar uma divisão
sectária sunita-xiita. Você pode se envolver profundamente na destruição da
Síria. Você pode tratar uma parte significante de sua própria população como
cidadãos de terceira-classe.
Você não apenas se safa dessa; você é
premiado com brinquedos caros. E em um caso particular - Arábia Saudita – até
mesmo com um assento de dois anos no Conselho de Segurança da ONU.
Sem falar que a Casa de Saud
espertamente se safa ao manipular o Islã como pilar de sua “legitimidade”. A
Casa de Saud controla o Hajj – que ocorreu esta semana; uma enorme operação
logística que “legitima” seu papel como líder do Islã sunita e,
automaticamente, de todo o mundo islâmico. Apesar disso, muçulmanos
bem-informados são muito conscientes da falácia – assim como são conscientes de
como a Casa de Saud está rapidamente transformando Meca num resort de luxo pay-per-prayer estilo Las Vegas. Quem ganha? Certamente não os
peregrinos.
Esta semana, a Agência Americana de
Cooperação de Segurança e Defesa anunciou que notificou o Congresso sobre a
venda de mais munição pesada avançada para a Arábia Saudita e os Emirados
Árabes Unidos (EAU). Isso quer dizer “várias munições e equipamento
relacionado, peças, treinamento e apoio logístico” a Riad por 6,8 bilhões de
dólares e para Abu Dhabi por quatro bilhões.
Armar “nossos” bastardos wahhabi é um
doce negócio para o complexo militar-industrial-orwelliano-panópticon. Shutdown? Orçamento apertado? Quem se
importa? Há uma orgia de contratos sem fim no Golfo – embutida na narrativa de
superpoder “benfeitor” daqueles monopólios monárquicos de petróleo e gás se
defendendo contra variados malfeitores; um dia o malfeitor é o Iraque, no
outro, Irã, um dia pode ser seu próprio povo, então, é melhor se preparar.
Mc Donell Douglas F-15 Eagle decolando |
De vez em quando Israel ergue
uma sobrancelha, mas só pela aparência. Israel e o CCG têm uma aliança de facto contra o bloco conhecido
regionalmente como o eixo da resistência - Irã, Iraque, Síria e Hezbollah.
Israel não impediria o CCG de se esbaldar com os F-15 Eagles, F-16 Desert
Falcons, mísseis de cruzeiro ar-terra, bombas guiadas por satélite e muito
equipamento de comunicação high-tech.
É só a sua “cooperação militar e de defesa” normal, inocente.
F-16 Desert Falcon completamente armado e camuflado |
Há falhas nessa relação confortável,
claro. Atualmente, a Casa de Saud está lívida encarando a possibilidade de uma
solução negociada para o dossiê nuclear do Irã – imediatamente após o acordo
Rússia-EUA sobre as armas químicas da Síria. Contudo, a Casa de Saud conseguiu
mesmo arranjar um púlpito para expressar sua raiva; a Arábia Saudita acabou de ganhar
um assento de dois anos no Conselho de Segurança da ONU pela primeira vez –
tomando o lugar do Paquistão como um representante da Ásia-Pacífico.
A Casa de Saud sempre se absteve de
competir por um assento no Conselho de Segurança no passado. Mas agora -
confrontada com sua versão fabricada de uma “ameaça existencial”, que não é
apenas o Irã, mas também Assad na Síria – é hora de agir.
Então se preparem para ver um reino
medieval do petróleo, com raiva e temeroso e notório pelo seu histórico de direitos
humanos e direitos das mulheres e tão apreciador de chicoteamentos e
decapitações, pontificando na arena global sobre… direitos humanos. Isto é o
que a think tanklândia estadunidense descreve como “procurando um papel mais
ativo em organismos internacionais chave”. Quando isso se aplica aos “nossos”
bastardos, claro; senão, tratam-se de “estados terroristas” tentando subverter
a ordem internacional.
Rei Abdullah |
Vários príncipes da Casa de Saud estão
agora envolvidos numa batalha letal pela sucessão saudita – já que o Rei
Abdullah está prestes a encontrar seu criador. Será que esses príncipes são
dignos de Maquiavel? Não contem com isso.
Maquiavel nos ensinou que a vontade
individual é tão crucial como o jogo de forças internacional ao determinar
decisões de política externa. O florentino sublinhou como a fortuna pode ser caprichosa e como a
história pode ser contingente. Então, como um grande Príncipe conduz seu
estado? Empregando virtù (virtude).
Oh não, isto não tem nada a ver com uma
maçaroca de culpa cristã, que também é um pilar crucial do conceito de
“excepcionalismo americano”. Tem tudo a ver com valores clássicos predominantes
na Antiguidade – da Grécia à Pérsia. Virtude como em conhecimento, força,
coragem e astúcia.
Então, por
este padrão de ouro, Vladimir Putin certamente se qualifica como um Príncipe
valoroso. Deng Xiaoping certamente o foi. Hassan Rouhani no Irã pode revelar-se
do mesmo calibre. Mas, e aqueles príncipes árabes raivosos, temerários,
intolerantes e pesadamente armados? Você não precisa ser um peregrino à
Meca-como-Disneylândia para saber sua resposta.
[*] Pepe Escobar (1954) é jornalista, brasileiro, vive em São Paulo, Hong Kong e
Paris, mas publica exclusivamente em inglês. Mantém coluna (The Roving Eye) no Asia Times Online; é
também analista político e correspondente das redes Russia Today, The Real News Network Televison e Al-Jazeera. Seus artigos podem
ser lidos, traduzidos para o português pelo Coletivo de Tradutores da Vila
Vudu, no blog redecastorphoto.
Livros
- Globalistan: How the Globalized World is Dissolving into Liquid War, Nimble Books, 2007.
- Red Zone Blues: A Snapshot of Baghdad During the Surge, Nimble Books, 2007.
- Obama Does Globalistan, Nimble Books, 2009.
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