sábado, 19 de outubro de 2013

“Nossos” bastardos Wahhabi armados


18/10/2013 [*] Pepe Escobar, Asia Times Online - The Roving Eye
Traduzido por  João Aroldo e enviado pelo pessoal da Vila Vudu


A vida é boa se você é membro do Clube Contrarrevolucionário do Golfo, oficialmente conhecido como Conselho de Cooperação do Golfo (CCG). Você pode esmagar a Primavera Árabe à vontade. Você pode contratar mercenários por todo Dar-al-Islã para propagar uma divisão sectária sunita-xiita. Você pode se envolver profundamente na destruição da Síria. Você pode tratar uma parte significante de sua própria população como cidadãos de terceira-classe.

Você não apenas se safa dessa; você é premiado com brinquedos caros. E em um caso particular - Arábia Saudita – até mesmo com um assento de dois anos no Conselho de Segurança da ONU.

Sem falar que a Casa de Saud espertamente se safa ao manipular o Islã como pilar de sua “legitimidade”. A Casa de Saud controla o Hajj – que ocorreu esta semana; uma enorme operação logística que “legitima” seu papel como líder do Islã sunita e, automaticamente, de todo o mundo islâmico. Apesar disso, muçulmanos bem-informados são muito conscientes da falácia – assim como são conscientes de como a Casa de Saud está rapidamente transformando Meca num resort de luxo pay-per-prayer estilo Las Vegas. Quem ganha? Certamente não os peregrinos.

Esta semana, a Agência Americana de Cooperação de Segurança e Defesa anunciou que notificou o Congresso sobre a venda de mais munição pesada avançada para a Arábia Saudita e os Emirados Árabes Unidos (EAU). Isso quer dizer “várias munições e equipamento relacionado, peças, treinamento e apoio logístico” a Riad por 6,8 bilhões de dólares e para Abu Dhabi por quatro bilhões.

Armar “nossos” bastardos wahhabi é um doce negócio para o complexo militar-industrial-orwelliano-panópticon. Shutdown? Orçamento apertado? Quem se importa? Há uma orgia de contratos sem fim no Golfo – embutida na narrativa de superpoder “benfeitor” daqueles monopólios monárquicos de petróleo e gás se defendendo contra variados malfeitores; um dia o malfeitor é o Iraque, no outro, Irã, um dia pode ser seu próprio povo, então, é melhor se preparar.

Mc Donell Douglas F-15 Eagle decolando
De vez em quando Israel ergue uma sobrancelha, mas só pela aparência. Israel e o CCG têm uma aliança de facto contra o bloco conhecido regionalmente como o eixo da resistência - Irã, Iraque, Síria e Hezbollah. Israel não impediria o CCG de se esbaldar com os F-15 Eagles, F-16 Desert Falcons, mísseis de cruzeiro ar-terra, bombas guiadas por satélite e muito equipamento de comunicação high-tech. É só a sua “cooperação militar e de defesa” normal, inocente.

F-16 Desert Falcon completamente armado e camuflado
Há falhas nessa relação confortável, claro. Atualmente, a Casa de Saud está lívida encarando a possibilidade de uma solução negociada para o dossiê nuclear do Irã – imediatamente após o acordo Rússia-EUA sobre as armas químicas da Síria. Contudo, a Casa de Saud conseguiu mesmo arranjar um púlpito para expressar sua raiva; a Arábia Saudita acabou de ganhar um assento de dois anos no Conselho de Segurança da ONU pela primeira vez – tomando o lugar do Paquistão como um representante da Ásia-Pacífico.

A Casa de Saud sempre se absteve de competir por um assento no Conselho de Segurança no passado. Mas agora - confrontada com sua versão fabricada de uma “ameaça existencial”, que não é apenas o Irã, mas também Assad na Síria – é hora de agir.

Então se preparem para ver um reino medieval do petróleo, com raiva e temeroso e notório pelo seu histórico de direitos humanos e direitos das mulheres e tão apreciador de chicoteamentos e decapitações, pontificando na arena global sobre… direitos humanos. Isto é o que a think tanklândia estadunidense descreve como “procurando um papel mais ativo em organismos internacionais chave”. Quando isso se aplica aos “nossos” bastardos, claro; senão, tratam-se de “estados terroristas” tentando subverter a ordem internacional.

Rei Abdullah
Vários príncipes da Casa de Saud estão agora envolvidos numa batalha letal pela sucessão saudita – já que o Rei Abdullah está prestes a encontrar seu criador. Será que esses príncipes são dignos de Maquiavel? Não contem com isso.

Maquiavel nos ensinou que a vontade individual é tão crucial como o jogo de forças internacional ao determinar decisões de política externa. O florentino sublinhou como a fortuna pode ser caprichosa e como a história pode ser contingente. Então, como um grande Príncipe conduz seu estado? Empregando virtù (virtude).

Oh não, isto não tem nada a ver com uma maçaroca de culpa cristã, que também é um pilar crucial do conceito de “excepcionalismo americano”. Tem tudo a ver com valores clássicos predominantes na Antiguidade – da Grécia à Pérsia. Virtude como em conhecimento, força, coragem e astúcia.

Então, por este padrão de ouro, Vladimir Putin certamente se qualifica como um Príncipe valoroso. Deng Xiaoping certamente o foi. Hassan Rouhani no Irã pode revelar-se do mesmo calibre. Mas, e aqueles príncipes árabes raivosos, temerários, intolerantes e pesadamente armados? Você não precisa ser um peregrino à Meca-como-Disneylândia para saber sua resposta.


[*] Pepe Escobar (1954) é jornalista, brasileiro, vive em São Paulo, Hong Kong e Paris, mas publica exclusivamente em inglês. Mantém coluna (The Roving Eye) no Asia Times Online; é também analista político e correspondente das redes Russia Today, The Real News Network Televison e Al-Jazeera. Seus artigos podem ser lidos, traduzidos para o português pelo Coletivo de Tradutores da Vila Vudu, no  blog redecastorphoto.
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