29/10/2013, [*]
Ralph Nader – Counterpunch
Traduzido
por João Aroldo
Liberdade pessoal? Independência? Democracia? |
Os
EUA foram fundados nos ideais de liberdade pessoal, independência e democracia.
Infelizmente, a espionagem em massa, vigilância e a infinita coleção de dados
pessoais ameaça minar as liberdades civis e nossos direitos à privacidade. O que
começou como meio necessário de reconhecimento e coleta de inteligência durante
a Segunda Guerra Mundial se transformou em um estado espião fora de controle em
que entidades tanto governamentais como comerciais estão desesperadas por
coletarem o máximo de dados que conseguirem. Nós estamos no meio de uma invasão
total do que não é da conta deles e isso parte tanto de fontes governamentais
quanto corporativas. Espionagem e coleta de dados virou um grande negócio. Nada
está fora do alcance deles.
Edward Snowden |
A
Agência Nacional de Segurança (National Security Agency - NSA)
fortalecida pelo Patriot Act certamente abriu uma trilha. As revelações
proporcionadas por Edward Snowden trouxeram à luz os piores medos que os
críticos do Patriot Act expressaram em 2001. O estado nacional de
segurança deu um cheque em branco para a paranoica comunidade de inteligência a
fim de coletar dados sobre quase todo mundo. Internet e comunicação telefônica
de milhões de cidadãos norte-americanos e milhões de cidadãos e líderes de
outros países. Mesmo de países amigos como Alemanha, França e Brasil foram
alvos de espionagem – mais de 30 líderes estrangeiros, como a chanceler alemã
Angela Merkel e a presidente brasileira Dilma Rousseff foram alvos dessa
espécie de arrastão de coleta de dados. Mais flagrantemente, dispositivos secretos
teriam sido colocados em escritórios da União Europeia e, antes, pelo
Departamento de Estado de Hillary Clinton nas Nações Unidas para espionar
diplomatas. Os líderes mundiais não estão satisfeitos, para dizer o mínimo.
Muitos americanos também não estão satisfeitos. E
enquanto a maioria na recente revolta pública nos EUA tem sido direcionada para
casos de espionagem do governo, empresas privadas gigantes são tão ou mais culpadas
da preocupante invasão da privacidade. Empresas como Google, Apple, Microsoft e
Facebook descaradamente coletam e comercializam dados pessoais - muitas vezes
disfarçando suas ações com complicados contratos de usuário em letras miúdas
que a maioria das pessoas, que são seus proprietários, “aceita” sem qualquer
consideração. Ao clicar em “Eu concordo” em um contrato de usuário amplo, não
negociável, para um site ou um programa de software
é, para a maioria das pessoas, apenas mais um clique sem sentido do mouse no processo de inscrição.
Esses
contratos “pegar ou largar” deixam o consumidor com pouco poder para proteger
seu próprio interesse. Leia em
Fair Contacts, artigo
de 25/10/2013 “Cat
Lobster Warns: Save Your Face!”, nosso extenso trabalho sobre esta
questão. Visite também o blog “Terms of Service; Didn’t Read” (“Termos
de Serviço; Não Li”) para obter um recurso valioso que resume e revisa contratos online e para que os usuários possam ter
um melhor entendimento do que estão aceitando.
Gato-Lagosta (Cat Lobster) |
Na semana passada, foi noticiado que o Google
planeja lançar um novo recurso de publicidade chamado “Apoios compartilhados”. Esta política permite ao Google o direito de criar
endossos de usuários em anúncios online. Assim, se um usuário do Google partilhar sua preferência
por um determinado produto online, o
seu endosso pode acabar em destaque em um anúncio sem qualquer aviso prévio ou
pagamento. Claro, os usuários podem optar (“opt-out”) por não fazerem
parte deste programa — mas quantos milhões vão continuar ignorantes do fato de
que eles involuntariamente optaram por participarem ao clicar seu consentimento
aos termos do contrato que eles não se deram ao trabalho de ler por falta de
hábito. (A declaração oficial do Google
afirma que a ação é para “assegurar que suas recomendações cheguem às pessoas
que se preocupam”).
Opting-out (Optar por sair) deve ser a opção padrão para todos
estes tipos de acordos.
Crianças em idade escolar também estão sendo alvo
dos coletores de dados em
massa. InBloom, uma organização sem fins lucrativos
com sede em Atlanta, oferece uma solução de banco de dados para registro de
estudantes entre as classes K-12 (ensino pré-escolar até o início do médio). Em
teoria, este serviço deveria tornar mais fácil para os professores utilizarem
produtos e ferramentas educacionais emergentes. Mas, na prática, muitos pais
estão preocupados com a forma como esses dados serão utilizados – em um caso,
por exemplo, os números de segurança social dos alunos foram enviados para o
serviço. Um pai disse ao New York
Times:
É uma nova experiência para centralizar uma quantidade
enorme de metadados sobre as crianças para compartilhar com os fornecedores...
e, em seguida, os vendedores irão lucrar com a comercialização dos seus
produtos de aprendizagem, suas aplicações, seus materiais curriculares, os seus
videogames, de volta para os nossos filhos.
O
Facebook apresenta outro risco de data
mining para crianças. Embora o Facebook
não permita crianças com menos de 13 anos — a lei de proteção da privacidade
infantil online (Children’s Online Privacy Protection Act) previne a
coleta de dados online sem permissão dos pais — mais de cinco milhões de
crianças usam as redes sociais. Isto as expõe (e sua informação) a milhares de
anunciantes que usam o Facebook para
coletar dados de marketing e promover seus produtos.
Crianças no Facebook, uma péssima ideia... |
Veja o recente
relatório do Centro para Democracia Digital (Center for Digital Democracy),
“Five Reasons Why Facebook is Not Suitable For Children Under 13”.
Recentemente, o Facebook mudou sua política de privacidade para permitir que
adolescentes entre 13 e 17 anos pudessem compartilhar seus posts com
todo mundo, ao invés de apenas com sua rede de amigos.
O
apetite insaciável por dados também está atingindo além do âmbito digital.
O
Washington Post recentemente informou que a Mondelez International,
a empresa atrás das marcas de snacks Chips Ahoy e Ritz,
tem planos para usar sensores de câmeras em prateleiras de salgadinhos para
coletar dados de consumo. Estas “prateleiras inteligentes” podem fotografar e
armazenar a estrutura facial do consumidor, idade, peso e mesmo detectar se
eles pegaram alguma coisa das prateleiras. Este dispositivo depois pode usar os
dados coletados para atingir consumidores com “anúncios personalizados”. Por
exemplo, na fila do caixa, uma tela de vídeo pode oferecer um desconto de 10%
de uma caixa de biscoitos que você pegou, mas depois desistiu de comprar. O Post
informa:
A empresa espera que a prateleira ajude a levar mais os
produtos certos diretamente para os consumidores certos, e até mesmo convença
os indecisos a se comprometer com uma compra por impulso.
Câmera Kinect da Microsoft (sensor) |
Esta
prateleira inteligente é feita com a tecnologia de câmera “Kinect” da
Microsoft, que tem a capacidade de escanear e lembrar de rostos, detectar
movimentos e até mesmo ouvir as batidas do coração. A Microsoft desenvolveu a
câmera Kinect como um dispositivo de controle de videogame caseiro. À luz da
relatada conexão da Microsoft ao programa de coleta de dados PRISM da NSA, por
que alguém conscientemente levaria uma sofisticada câmera espiã para sua sala
de estar?
Imagens (à esquerda) obtidas com a Câmera Kinectic |
Na
mesma linha, alguns varejistas estão usando smart phones para rastrear o
movimento de clientes em sua loja para obter informações sobre os produtos que
eles olham e por quanto tempo — semelhante à forma como Amazon rastreia hábitos de
compradores on-line para que possa
encaminhá-los para outros produtos que
os algoritmos decidam ser interessantes. O O senador Chuck Schumer
(Democrata-NY) pediu para a Comissão de Comércio Federal (FTC) regular essa prática
perturbadora.
Ele anunciou recentemente um acordo com oito
empresas analíticas para instituir um “código de conduta” para a utilização
desta aparente tecnologia orwelliana. O senador Schumer disse à Associated Press:
Quando
você entra em sua loja para suas compras de Natal, haverá um sinal que diz que você está sendo monitorado e,
se você não quiser, você pode muito simplesmente optar por sair.
Os
detalhes sobre como exatamente alguém sai (opt-out) desta tecnologia
invasiva, sem ter que deixar seu celular em casa, ainda não está claro.
Com todos esses exemplos invasivos do Big
Brother, poder-se-ia querer optar por sair completamente do mundo digital, e
evitar supermercados e lojas que espionam os clientes. Infelizmente, isso está
se tornando cada vez mais difícil em um mundo cada vez mais obcecado pela
tecnologia.
É hora de os cidadãos se levantarem e exigirem
seus direitos à privacidade, que é uma propriedade pessoal. A vigilância em
massa e a coleta de dados desenfreada não são aceitáveis e não devem ser o status
quo. Lembre-se que houve uma época em que o governo federal poderia
defender o nosso país sem o acesso ilimitado aos registros de computador, e-mails,
histórico de busca on-line e escutas telefônicas sem autorização judicial. As
empresas poderiam ter sucesso sem rastrear e registrar seus hábitos de compras
e os registros dos alunos não são mercadorias para serem negociadas. Por que
eles agora fazem o que fazem? Porque
podem.
Lembre-se, o que você permite ser tirado de você
pelas empresas privadas também pode acabar nos arquivos de órgãos
governamentais.
Neste
sábado, uma coalizão de grupos incluindo a ACLU, Public Citizen, Electronic
Privacy Information Center (EPIC), o Partido Libertáro, (Libertarian
Party) e muitos mais estão se reunindo no National Mall para
protestar contra a vigilância em massa pela National Security Agency.
Este é um positivo primeiro passo para avisar nossos representantes eleitos que
cessar a coleta de informação pessoal privada sobre você é importante e a
vigilância em massa deveria ser proibida.
Visite
Stop Watching Us para mais
informações sobre a passeata deste domingo (é passado) (27/10/2013). Junte-se ao movimento
para acabar com esses abusos crescentes que fortalecem a tirania exercida pelas esquivas
agências federais.
________________________
[*] Ralph
Nader é um
defensor dos consumidores, advogado e autor de Only the Super-Rich Can Save Us! É co-autor de Hopeless:
Barack Obama and the Politics of Illusion,
publicado pela AK Press. Hopeless também está disponível como edição Kindle .
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Registre seus comentários com seu nome ou apelido. Não utilize o anonimato. Não serão permitidos comentários com "links" ou que contenham o símbolo @.