23/10/2013, Dmitry Minin,
Strategic Culture
Traduzido
pelo pessoal da Vila Vudu
A necessidade de uma 3ª Intifada... |
A
diplomacia norte-americana, que vem sofrendo fracasso após fracasso no Oriente
Médio, enfrenta agora a possibilidade de mais um fracasso gigante, que ameaça
fazer ruir de uma vez toda a estratégia da Casa Branca para aquela região.
Veem-se a
cada dia sinais cada vez mais claros, de que o indolente processo da
reconciliação palestinos-israelenses, que por hora permanece nas sombras, pode
ser rompido a qualquer momento, e converter-se na fase mais quente de uma 3ª
Intifada.
Tendo
arrogantemente posto de lado o “quarteto” de mediadores, Washington nada obteve
em termos de reconciliação, e isso pode levar a mais dores e dificuldades no
novo Oriente Médio. Para vários especialistas, ao fazer do processo de paz no
Oriente Médio sua absoluta prioridade, o secretário de Estado Kerry elevou de
tal modo a aposta que:
(...)
se seus esforços derem em nada, demorará
muito tempo para que outro volte a tentar.
Elliott Abrams |
Elliott
Abrams, por exemplo, que foi alto funcionário do Conselho de Segurança Nacional
do governo do presidente George W. Bush, disse que não vê possibilidade
realistas de que, agora, se possa alcançar qualquer tipo de acordo.
Só espero que haja duas equipes do
Departamento de Estado: uma para manter as conversações; e a outra para
planejar o que fazer quando as conversações derem em nada – disse
ele.
As ações
do “único mediador” deliberadamente condenaram as negociações ao fracasso. Os
EUA usaram um truque simples: prometeram aos dois lados que atenderiam todas as
respectivas “demandas legítimas”, e ofereceram cartas de garantia a israelenses
e palestinos. Os EUA prometeram aos palestinos que negociariam usando, como
base, as fronteiras de 1967; e prometeram a Israel que as fronteiras finais não
seriam as de 1967. Os palestinos reclamam que o secretário de Estado dos EUA,
John Kerry, lhes garantiu a inviolabilidade das fronteiras de 1967; e que só
por isso aceitaram retomar o processo de paz. Agora, os norte-americanos
refutam essa informação. Netanyahu também nega a existência de tais cartas de
garantias.
Noam Sheizaf |
Washington
concordou, essencialmente, com o que o primeiro-ministro israelense exigiu (que
não se discutissem, nas negociações, as questões das fronteiras de 1967 nem a
divisão de Jerusalém. Como Noam Sheizaf escreveu no jornal israelense Maariv, os esforços de John Kerry
para mostrar algum tipo de resultado de suas atividades no Oriente Médio
levaram-no a trair os acordos fundamentais firmados durante o doloroso processo
de negociação (que começou com o programa de Clinton e terminou com o “mapa do
caminho”).
Segundo
especialistas,
(...)
Netanyahu também enganou os americanos
(quem pagará o preço dessa vitória de Pirro é outra história). Depois de três
anos de obstinação, o governo Obama cedeu e aceitou que se anulassem todos os
acordos já firmados antes entre as partes, durante as negociações em Taba e
Annapolis.
Tzipi Livni |
No
momento, Netanyahu não está tão preocupado com a posição de Washington, mas com
as ações independentes da negociadora israelense oficial, a ministra da Justiça
Tzipi Livni, indicada por insistência dos norte-americanos e que tende a tomar
posições mais suaves que as do primeiro-ministro. Tzipi Livni apóia a ideia de
dividir Jerusalém; Netanyahu opõe-se totalmente. Livni pode vir a aceitar a
demolição parcial das construções israelenses em territórios palestinos
ocupados; Netanyahu insiste em que as construções nas colônias são intocáveis.
Livni está disposta a aceitar o uso de forças internacionais no vale do Jordão;
Netanyahu insiste na presença de forças israelenses.
Mas os
medos do primeiro-ministro de Israel são muito exagerados. Livni tem de
conseguir aprovação do chefe de governo, para as posições que defenda, o que
implica que o governo tem a palavra final. Além disso, Yitzhak Molcho,
representante pessoal de Netanyahu, participa de todas as negociações e
monitora as ações de Livni.
No campo
palestino, ninguém, tampouco, conta com alguma possibilidade de sucesso.
Decidimos reagir positivamente aos
pedidos infindáveis dos EUA para que se reiniciasse o tal “processo de paz”,
para satisfazê-los e evitar possíveis acusações de que estaríamos fazendo alguma
política de recusa eterna – admitiu um dos negociadores da
OLP.
Os
palestinos sabem que, na atual situação,
(...)
Israel jamais concordará em devolver a
terra que roubou na guerra de 1967, nem, e muito menos, em admitir o retorno
dos refugiados palestinos.
Os
palestinos, sobretudo, entendem que, se
se levam em conta os sentimentos que hoje predominam em Israel,
(...) qualquer governo
israelense que aceite devolver a Cisjordânia e retirar-se de volta para as fronteiras
de
4/6/1967
estará cometendo suicídio político.
É verdade
que, resultado de muitos anos de propaganda, a grande maioria dos israelenses
não estão inclinados a apoiar qualquer concessão aos palestinos. Resultados de
pesquisa feita no país, com 4.774 respondentes, são desanimadores. 70% dos
pesquisados, por exemplo, sentem que não faz sentido algum assinar qualquer
tratado de paz com o governo de Mahmud Abbas. Apenas 17,5% dos respondentes
entendem o contrário disso. Mais de 87% creem que não será possível chegar à
assinatura de um tratado de paz entre Israel e a Autoridade Nacional Palestina,
como resultado das atuais negociações. Só 2% creem que tal resultado seja
possível. 73% entendem que o conflito Israel-Palestino jamais terá solução. 14,5%
entendem que, sim, chegará ao fim; mas só depois de 2030.
Uma das
perguntas dessa pesquisa foi:
Que concessões você considera
aceitáveis, em nome de alcançar-se um acordo de paz com o governo da Autoridade
Palestina?
Cerca de
48% responderam “Nenhuma”. 1,5% consideram aceitável a volta dos refugiados
palestinos ; 2,4% consideram aceitável a completa evacuação de toda a população
de judeus da Cisjordânia; 3,1% consideram aceitável o retorno às fronteiras de
1967; e menos de 7% dos entrevistados consideram aceitável dividir Jerusalém.
Essas
reações e pensamentos são alimentados por argumentos doutrinários dos
estrategistas israelenses. Merece destaque um relatório preparado pelo Centro
Begin-Sadat (BESA) para Pesquisa Estratégica, que leva o característico título
de “O Tempo corre a favor de Israel”. O relatório argumenta que a vantagem de
Israel sobre os adversários regionais, em termos de medidas agregadas de poder
nacional, jamais foi tão ampla quanto hoje, e que essa tendência continuará no
longo prazo. Em vasta medida, essa situação foi consequência da
desestabilização de países vizinhos, depois da “Primavera Árabe”. Os argumentos
do campo da esquerda em Israel, para um rápido acordo da questão palestina,
podem ser considerados sem substância. Não há qualquer real ameaça contra
Israel e, assim, não se vê qualquer necessidade, para Israel, de fazer
concessões.
O
desacordo entre os países árabes e o Irã cresceu ao ponto de que a preocupação
deles com a questão palestina foi deslocada para o fundo da cena, e eles vão-se
tornando potenciais aliados de Israel. Essa é a razão pela qual Telavive
insiste tanto sobre “a ameaça iraniana”. Depois de 65 anos de existência,
Israel já pode confiar que superará os desafios que apareçam pela frente.
Por mais que a paz seja desejável,
não é condição necessária para a sobrevivência – conclui
Efraim Inbar, autor do relatório do BESA
Center.
Não
surpreende que algumas das sugestões de Israel, nesse ponto das negociações,
sejam deliberada e acintosamente inaceitáveis, para não dizer que são
acintosamente zombeteiras. Por exemplo, segundo informação do jornal Maariv, nas negociações com os
palestinos, os israelenses têm planos de oferecer um acordo parcial, sob o
princípio da “anexação em troca de anexação”. Na essência, Israel oferecerá
anexar parte da Cisjordânia ao sul (Gush Etzion), em troca de Israel transferir
parte do território da Cisjordânia ao norte (na área de Shechem), hoje sob
controle dos israelenses e da Autoridade Palestina. Em outras palavras,Israel
oferece aos palestinos não território israelense, como definido nos acordos de
Camp David em 2000 e de Annapolis em 2008, mas... território palestino! O
próprio Ariel Kachane, autor do artigo, admite que há poucas chances de os
palestinos aceitarem essa oferta.
O jornal
pan-árabe Al-Hayat noticia que Israel insiste em manter o
controle e a presença de soldados israelenses no vale do rio Jordão; quer criar
estações de alerta ao longo do rio; monitorar a movimentação de pessoas entre a
Cisjordânia e a Jordânia; e preservar as bases militares nos pontos mais altos
da Cisjordânia. O vale do Jordão seria parte do futuro estado palestino, mas
será transferido a Israel, em “empréstimo” de longo prazo. Os israelenses
continuam a insistir que toda a fronteira com a Jordânia permaneça sob controle
do exército de Israel.
Naturalmente,
todas essas sugestões são absolutamente inaceitáveis para os palestinos. Na Assembleia Geral da ONU, o presidente
palestino [Abbas] disse claramente que só há acordo possível, nas fronteiras de
1967. Os palestinos recusam-se a:
(...)
entrar no sorvedouro de um novo acordo
provisório que vai eternizando – disse Abbas. Nosso objetivo é obter acordo amplo e permanente, e um acordo de paz
entre os estados da Palestina e de Israel que decida todas as grandes questões
e responda todas as perguntas; que nos permita declarar oficialmente o fim do
conflito e das exigências.
Mahmoud Abbas discursa na Assembleia Geral da ONU |
E alertou
que essa, provavelmente, é a última oportunidade para que Israel e
Palestina decidam o conflito pela via pacífica.
Nos dois
campos vai-se instalando a conclusão de que é cada dia mais inevitável o início
de uma terceira Intifada. O jornal israelense Haaretz escreveu que:
Se o processo de negociação desandar
completamente, por causa da inabilidade de Netanyahu, incapaz de enfrentar a
pressão dentro de seu partido, começarão os tumultos nos territórios, que podem
converter-se numa nova Intifada.
O atual
governo de Israel está convicto de que se se mantiver irredutível, acabará por
conseguir impor-se. De fato, não há dados de realidade que justifiquem toda
essa autoconfiança; afinal, os desafios que aguardam Israel podem ser mais
assimétricos. Um novo levante palestino é perfeitamente capaz de complicar
muito a situação em toda a região e de gerar graves perdas econômicas e diplomáticas
para Telavive.
Como
alerta o Haaretz, Netanyahu
está pondo seu país em risco. Tradicionalmente, o fracasso de
negociações sempre foi o gatilho para o início de mais uma onda de violência no
Oriente Médio. O fracasso dessa específica rodada de negociações, escreve o
jornal,
(...) comprometerá
ainda mais o status de Israel. O mundo está farto de ocupações, e nenhuma
explicação, nunca mais, conseguirá eximir Israel de sua responsabilidade.
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