domingo, 19 de fevereiro de 2012

Pepe Escobar: “O exército rebelde sírio pulula de agentes da Al-Qaeda”


18/2/2012, Pepe Escobar (de Bangkok, Tailândia), Russia Today 
“Escobar: Al-Qaeda agents worm into Syrian rebel army”
(entrevista transcrita e traduzida pelo pessoal da Vila Vudu) 


Os estados da União Europeia pedem que se abram corredores humanitários na Síria, que alguns temem que abram a porta para intervenção estrangeira. O correspondente de Asia Times Online, Pepe Escobar, diz que a intervenção já está em andamento.

Pepe Escobar: De fato, a intervenção já está acontecendo. Não esqueçamos que a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) tem um centro de comando na província de Hatay, no sul da Turquia, muito próximo da fronteira síria. Já noticiamos e comentamos isso há vários meses.  É uma via aberta para agentes de inteligência, que vão e vem pela fronteira; para armas, é claro, e armas que são financiadas, basicamente pelo Conselho de Cooperação do Golfo (CCG), especialmente os sauditas e sobretudo os qataris, envolvendo inteligência, é claro, e monitores e instrutores em campo. E há outra via também, através dessa fronteira. Há duas estradas pela fronteira do Líbano: uma delas vai até os subúrbios de Damasco; a outra vai até Homs. Essas vias estão abertas e operantes há três, quatro meses, no mínimo desde outubro, novembro do ano passado. Quero dizer, a intervenção estrangeira já está lá.

No que tenha a ver com o Conselho Nacional Sírio (CNS), por exemplo, é apoiado diretamente por Nicolas Sarkozy e David Cameron, pelo governo turco e pelos qataris. E há também o Exército Sírio Livre (ESL), que até analistas, pode-se dizer, isentos, na Europa e inclusive em Londres, dizem que não é sírio nem é exército, são bandos de insurgentes infiltrados por afiliados da Al-Qaeda com jihadis salafistas. A intervenção estrangeira já está lá. 

As coisas vão ficar ainda muito mais hardcore daqui por diante, porque os árabes do Conselho de Cooperação do Golfo, que agora controlam a Liga Árabe, as monarquias do Golfo, já estão dizendo publicamente que, sim, vamos armá-los cada vez mais.

Russia Today: Rússia e China estão tentando mediar o conflito, chamando os dois lados para um diálogo. A OTAN e os árabes dizem que estão criando um grupo chamado Amigos da Síria [Friends of Syria, FOS]. O que estão de fato tentando obter com essas iniciativas?

Pepe Escobar: [risos] Com amigos como esses... Observe a lista de amigos: Washington, Grã-Bretanha e França, ex-potências coloniais que, de fato, dividiram o Oriente Médio entre elas, inclusive a divisão da própria Síria. Esse câncer, que já existe há um século, ainda está lá, ativo, em toda a região. Foi responsabilidade de britânicos e franceses, há cem anos. E o governo turco, ex-império otomano, também com ambições de neo-otomanismo. E as monarquias do Golfo, aquelas democracias exemplares do Golfo, que pregam mudanças democráticas, mas não querem democracia em benefício dos sírios, e só o que querem é governo muçulmano sunita linha dura da Fraternidade Muçulmana, em vez de Assad.

Russia Today: O senhor falou de Washington. Washington já admitiu que a Al-Qaeda está na Síria, aliada aos grupos de oposição na Síria. E se Washington estiver considerando ampliar o apoio àqueles grupos, o senhor acha que Washington pensa realmente em aliar-se a terroristas?

Pepe Escobar: Sim. E foi exatamente o que Washington já fez na Líbia! Não esqueça que a Líbia, a Líbia “libertada”, é hoje governada por aquilo que chamam de “milícias”, 250 pelo menos, em Misrata, e eu diria que 40 ou 50 também em Trípoli. E o comandante militar de Trípoli é ex-membro, ex-alto dirigente da Al-Qaeda. Washington e os terroristas já trabalham juntos há, no mínimo, dez meses, na Líbia; e há três ou quatro meses, pelo menos, na Síria. É o mesmo modus operandi, sem a zona aérea de exclusão, porque, agora, Rússia e China, traçaram a linha limite que não poderá ser ultrapassada: esqueçam, porque vocês não vão conseguir uma “Líbia 2.0”.

Por tudo isso, a situação é muito mais complicada hoje, porque há na Síria uma guerra clandestina, oculta, que já se combate há alguns meses e que de agora em diante vai-se ampliar. Está em curso na Síria uma guerra clandestina, oculta, guerra de sombras, que se soma a uma guerra civil. O único grande perdedor nisso tudo é o chamado “povo sírio”, do qual esses mestres de democracia, ou de medíocre-cracia, como Sarkozy e Cameron, lembram-se, vez ou outra.

Russia Today: Muito obrigada por nos receber em Bangkok, Tailândia, para essa entrevista.

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