sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Pepe Escobar: “A Volta dos Guerreiros dos Teclados”


11/2/2012, Pepe Escobar, Asia Times Online
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu

Waiting for the end of the world, 
Waiting for the end of the world, 
Waiting for the end of the world.
Dear Lord, I sincerely hope you're coming ‘cause you really started something. 

*Elvis Costello, “Waiting for the end of the world”

Pepe Escobar
Temei! Temei muito. A volta dos Guerreiros dos Teclados – a premiada Volta dos Mortos Vivos ‘especialistas’ da mídia – está aí. Dos falcões-frangas Republicanos aos intelectuais públicos, a direita dos EUA irrompe em renovada revolta neoconservadora. 2012 é o neo-2002; o Irã é o neo-Iraque. Seja pela estrada que for – homens de verdade vão para Teerã via Damasco, ou homens de verdade vão direto para Teerã, sem escala – eles querem guerra. E querem já. 

“Vá em frente e se jogue”[1] 

A prova A é coluna publicada no Wall Street Journal (1) – semelhante a incontáveis outras colunas que pipocam praticamente todos os dias nesse veículo dos Mestres do Universo, mas também no Washington Post e em miríades de outros panfletos, por toda a “civilização ocidental”. 

O festival de falácias vai da rotineira “a diplomacia esgotou-se” até “as sanções chegaram tarde demais” – e culmina com a arma preferencial da direita: “o Irã está a menos de um ano do ponto em que terá capacidade para montar uma bomba exatamente quando quiser.” Por que perder tempo e ler o que escreveu a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA)? E nem se fala de ler o relatório “Situação da Inteligência Nacional [orig. National Intelligence Estimates] publicado pela comunidade de inteligência dos EUA. 

E por que não acrescentar também muito desprezo imperial tingido de racismo, como em “o Irã é país do Terceiro Mundo que não consegue nem proteger a vida de seus próprios cientistas, no centro da cidade de Teerã”. Claro! Os cientistas iranianos estão sendo assassinados pelo grupo terrorista iraniano Mujahideen-e-Khalq, jubilosamente treinado, financiado e armado pelo Mossad israelense, como a imprensa-empresa dos EUA acaba de descobrir (2). No Irã, toda a população já sabe disso há meses. 

No auge, mais uma falácia – “a República Islâmica está decidida a destruir Israel” – revela a verdadeira agenda: “o objetivo mais amplo é pôr fim ao regime”. Ah, se tivéssemos de volta a nossa guarda-armada persa do Golfo! 

Isso é o que passa por análise geopolítica na mídia-empresa dos EUA controlada por Rupert Murdoch, lida e repetida e relinkada diariamente pelos Mestres do Universo. 

Monstros assustadores, super frangas  [2]

A prova B é uma coluna publicada em The Daily Beast de Tina Brown (3) assinada por Niall Ferguson, professor de história em Harvard, pesquisador sênior adjunto no Colégio de Jesus, Oxford, e membro sênior da Hoover Institution, Stanford. 

De fato dei-me o trabalho, recentemente, de ler o mais recente livro de Ferguson, Civilization: The West and the Rest [Civilização: o ocidente e o resto], durante meu voo preferido Ocidente-Resto, 16 horas de New York a Hong Kong (do século americano ao século asiático). 

Ferguson aplica-se a refutar as razões pelas quais Israel não deveria atacar o Irã. Assume que “os sauditas estão prontos para bombear suprimentos adicionais” de petróleo (o que é falso). Assume que uma “humilhação militar” levará o regime em Teerã ao colapso (o que também é falso). Diz que Teerã não se tornará “discípula sóbria, calculista, da escola realista de diplomacia (...) porque, afinal, conseguiu ter armas de destruição em massa” (falso, falso, erradíssimo: o Supremo Líder Aiatolá é muito sóbrio e calculista e baniu todas as armas nucleares do Irã; declarou-as anti-islâmicas). 

O ex-vice-presidente Dick Cheney teria orgulho de contratar Ferguson para as funções de apparatchik; para Ferguson, “guerra preventiva pode ser um mal menor”; e é defensor empenhado da “destruição criativa”. 

Ferguson classifica Israel como “o posto avançado mais oriental da civilização ocidental”. Nada mau para uma teocracia/etnocracia racista suprematista isolada e armada com, no mínimo, 200 ogivas (jamais declaradas) nucleares, e cujo esporte favorito é aterrorizar palestinos e, mais recentemente, cientistas iranianos. É como se um patrocinador do terrorismo de Estado tivesse brotado do ventre da “civilização ocidental”. 

A fusão tóxica de ignorância e arrogância que há em Ferguson – sobre o Oriente Médio, sobre a cultura persa, sobre a Ásia, sobre a questão nuclear, sobre a indústria do petróleo, sobre, afinal de contas, “o resto” – seria inócua, não fosse o homem louvado como importante intelectual público. O melhor da coluna de Ferguson são os comentários, que vão de “É chocante que um pesquisador sênior adjunto no Colégio de Jesus recomende que se bombardeiem os muçulmanos”, até “Qual é o problema desses britânicos, que olham para os EUA como plataforma de re-lançamento de seus sonhos imperiais?" 

Se isso é o que passa por análise intelectual no estrato superior do eixo anglo-EUA, não surpreende que a empresa Império esteja falida. 

Ainda mais danoso que a Invasão dos Guerreiros do Teclado é o efeito que a invasão teve sobre o Guerreiro-em-Chefe, o presidente Barack Obama. Recentemente, Obama fez-se de “marketeiro” para posicionamento de produto do novo livro de Robert Kagan, The World America Made [O mundo que os EUA construíram]. Kagan, baluarte afamado dos neoconservadores, é conselheiro de Mitt Romney – que talvez seja, talvez não seja candidato Republicano à presidência, se conseguir vencer a repulsão visceral que provoca em círculos da extrema direita. 

Como observou Andrew Levine do Institute for Policy Studies (4), Obama-O-Neoconservador pode ser jogada esperta para conter preventivamente Mitt e conquistar ainda mais votos. OK. Mas pode também ser exercício de transparência, porque Obama, desde antes do discurso “State of the Union” já andava repetindo Kagan sem tirar nem pôr: “esqueçam a Ásia; será outro século norte-americano” e eu estarei ao timão; portanto, lembrem que quem inventou a única mudança na qual se pode acreditar... fui eu. 

É quando o filme vira filme de terror: se Obama-O-Neoconservador concluir que, para chegar até o tal novo século de dominação norte-americana, ele, antes, terá de pulverizar e em seguida passar o aspirador de pó em  todo o Sudoeste da Ásia, com volta do chicote no lombo de quem bateu ou não, ele fará tudo isso – para delícia da Brigada dos Guerreiros dos Teclados.
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Notas dos tradutores

(1). (How) Should Israel Bomb Iran?, Bret Stephens, Wall Street Journal, 7/2/2012.
(4). Why the Neo-Con Turn? by Andrew Levine, Counterpunch, 9/2/2012.



*“Esperando pelo fim do mundo / esperando pelo fim do mundo / esperando pelo fim do mundo / Santo Jesus, sinceramente espero que você esteja voltando, porque você deu a partida para algo [estranho] por aqui”  em gravação do final dos anos 1970s. (pode ser vista/ouvida a seguir).

[1] Orig. Go ahead and jump”, do rock Jump , da banda Van Halen (California, 1972).


[2]  Orig. Scary monsters, super freaks. Há ecos aí de Scary Monsters (and Super Creeps) [Monstros Assustadores (e Super Calafrios)], título de um álbum de David Bowie, lançado em 1980, na linha do rock. Pode ser ouvido a seguir.


Alimentado da mesma fonte, há um livro, Scary Monsters and Super Freaks, que foi best-seller em 2003, de Mike Sager, jornalista e escritor, conhecido sobre “o poeta beat do jornalismo norte-americano”. 

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