Publicado
em 19/02/2012 por
*Mário Augusto
Jakobskind
É
carnaval. Muita gente vai perguntar: e daí? Daí que a maioria cai na folia e
muitas vezes não se dá conta que a festa está deixando de ser popular para se
institucionalizar na base do deus mercado. As escolas de samba entraram nessa
lógica e hoje os desfiles viraram espetáculo industrializado com regras
castradoras. E para assistir no sambódromo o custo é
alto.
O
tema é polêmico por natureza. Outro exemplo é dos blocos de rua. Agora, o senso
comum anda entoando a cantiga segundo a qual o carnaval de rua ressurgiu com o
monobloco etc e tal. Não é verdade, antes da apropriação industrial dos blocos
como começa a acontecer, o carnaval de rua sempre se fez presente. Neste 2012
tem até bloco que nem apresenta samba ou marcha, optando pelos Beatles e se
dizendo responsável pelo “ressurgimento” do carnaval de
rua.
As
exigências que a prefeitura cria para permitir o desfile dos blocos são tantas
que muitos desistiram de seguir as normas. A burocratização do carnaval faz
parte do esquema industrial que visa a tornar a festa apenas uma fonte de
lucros para poucos, como determina a lógica do capital.
Mas,
enfim, como o tema é muito sério e complexo, tem muito folião que considera tal
discussão chata. Prefere então embarcar na festa, sem perceber que com o andar
da carruagem em pouco tempo o carnaval vai se afunilar e será para poucos
pagando muito, como exige o mercado.
Tem
mais. Nestes dias de Carnaval, muita coisa que acontece por aqui e pelo mundo
afora fica em segundo plano. A mídia de mercado aproveita o embalo e não divulga
questões relevantes. É o caso da repercussão que poderia ter um fato ocorrido na
França e que envolve uma empresa conhecida nesta plagas abençoadas por Deus e
bonita por natureza.
A
empresa estadunidense Monsanto foi julgada por um Tribunal da cidade de Lyon, na
França, e considerada legalmente “responsável” pela intoxicação de um
agricultor. Foi uma decisão judicial em primeira instância e a empresa deverá
apelar, o que retardará a decisão final. Mesmo assim, a primeira decisão pode
ser considerada uma vitória, pois remete a questão para o debate e
questionamento da Monsanto.
É
importante os brasileiros serem informados a respeito do acontecido na França,
porque de um modo geral a Monsanto por aqui tudo pode e conta com total apoio
dos meios de comunicação de mercado, que ignoram os protestos e denúncias contra
a empresa acusada de provocar sérios danos ao meio ambiente e à saúde das
pessoas ou manipulam o noticiário criminalizando os movimentos de
protesto.
Outro
tema que continua a ocupar grandes espaços de discussão e matérias mesmo na
mídia de mercado é o que se passa em Cuba. Recentemente, por exemplo, a TV
Bandeirantes apresentou uma série de matérias completamente manipuladas e
equivocadas.
O
repórter ouviu apenas um dos lados, ou seja, exatamente o que faz oposição ao
regime e sempre com o estímulo dos setores extremistas radicados em Miami que
nunca se conformaram com a perda de privilégios.
Foram
mostradas imagens com o objetivo de o telespectador concluir ser Cuba um inferno
na Terra e que seu povo vive no pior dos mundos. O repórter apurou mal certos
fatos, um deles ao afirmar que o CUC, a moeda do turismo, pode ser convertido em
dólar pelos cubanos e assim sucessivamente. Esqueceu de dizer o principal, ou
seja, que o turista troca a sua moeda, dólar ou euro, pelo CUC para então usar
para os gastos em território cubano. Se reconverter, cubano ou turista, para
dólar ou euro vai perder, claro. Mas o repórter ignorou essa
obviedade.
Os
CUCs deixados pelos turistas, que em 2011 vieram num total de dois milhões e 700
mil, permitem ao Estado cubano aplicações nas áreas de saúde, educação, moradia
etc. Ou seja, as divisas do turismo são destinadas exatamente para a utilização
em favor do povo. Aí o senso comum prefere dizer apenas que apesar de permitido
são pouco os cubanos que têm acesso aos locais frequentados pelos
turistas.
Saúde
e educação de boa qualidade e de graça é salário indireto. Se contabilizado,
utilizando como termo de comparação muitos países latino-americanos, europeus e
mesmo os Estados Unidos, chega-se a cifras altas e até astronômicas. E tem mais
um detalhe: saúde cara não raramente pouco acessível a muitos assalariados sem
condições de pagar planos de saúde de empresas particulares. E em não poucos
países com a saúde pública em péssimas condições.
Mas
como as reportagens objetivam apenas reforçar o sentimento contra Cuba, mostrar
a realidade sem manipulações não interessa à mídia de mercado, muito menos ao
esquema Barack Obama, que corre atrás dos votos de Miami, onde os
cubano-americanos têm peso eleitoral.
*Mário
Augusto Jakobskind é
correspondente no Brasil do semanário uruguaio Brecha. Foi colaborador do
Pasquim, repórter da Folha de São Paulo e editor internacional da Tribuna da
Imprensa. Integra o Conselho Editorial do seminário Brasil de Fato. É autor,
entre outros livros, de América que não está na mídia, Dossiê Tim Lopes -
Fantástico/IBOPE.
Enviado
por Direto
da Redação
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