22/2/2012, Pepe
Escobar, Asia Times Online – The Roving
Eye
Traduzido
pelo pessoal da Vila
Vudu
Pepe Escobar |
Imagine
o sonho molhado clássico dos neoconservadores dos EUA: olham o Irã num mapa e
salivam, vendo entroncamentos entre Europa e Ásia, entre o mundo árabe e o
subcontinente indiano, entre o Mar da Arábia e a Ásia Central, com 10% das
reservas comprovadas de petróleo (mais de 150 bilhões de barris) e 15% das
reservas comprovadas de gás do mundo – um complexo de energia maior que a Arábia
Saudita e fiscal das rotas de energia do Golfo Persa para o ocidente e a Ásia,
pelo Estreito de Ormuz.
É
feito um capitão de poltrona gordo e flácido, hipnotizado por bailarina
competente que dança em seu colo. Você será minha, honey. É mudança de regime na veia.
Vamos expulsar de lá o dono daquele boteco. Se não... O pessoal vai começar a
falar: que porcaria de potência hegemônica franga é essa?!
E
assim os neoconservadores ganharam seu pacote de Ano Novo, com as
sanções/embargo do governo de Obama contra o Irã, devidamente replicadas
pelos poodles europeus. Mas não era para dar no que deu. A
bailarina de lap dance saltou e aplicou uma chave de pescoço no
capitão de poltrona: agora, quem está sufocando é ele, não ela. A coisa toda
está... dando chabu! Exatamente como a outra Grande Ideia dos neoconservadores –
a invasão, ocupação e inevitável derrota no Iraque, que já custou mais de US$1
trilhão.
Baby, me
embargue de novo
Revisemos
algumas das provas mais recentes. Teerã mandou dois navios de guerra pelo Canal
de Suez, rumo ao Mediterrâneo; bloquearam – nada mais nada menos – o porto sírio
de Tartus. Nem faz muito tempo, o ditador já caído em desgraça e amigo íntimo da
Casa de Saud teria, provavelmente, bombardeado os dois navios.
Teerã
cortou as exportações de petróleo para os dois principais europeus poodles de guerra, Grã-Bretanha e França. É só 1%
das importações britânicas e 4% das francesas – mas a mensagem é clara: se os
países Club Med já em depressão insistirem em acompanhar os doidos-por-guerra
anglo-franceses, os próximos serão eles.
O
barril de cru já está custando $121 – preço mais alto, em oito meses. West Texas Intermediate, negociado em New York, está em torno de $105. O
cru Brent é crucial, porque determina o preço da
gasolina ao consumidor em quase todos os EUA e Europa Ocidental. Os
neoconservadores juraram sobre suas Bíblias e Torahs que o preço não subiria. Já
subiu – funcionando como relógio e provando mais uma vez que eles sabem, sobre
especulação, o que sabe um bebê de dois anos (com todo o respeito pelos
bebezinhos).
O
que Teerã está perdendo por causa das sanções – em termos de menores exportações
para a Europa – está sendo largamente compensado pelo aumento do preço do
petróleo causado pela obcecação por guerras dos neoconservadores doentios. Como
se não bastasse, Teerã venderá mais petróleo para seus principais clientes
asiáticos – China, Índia, Japão e Coreia do Sul; e até a Turquia, vejam só, em
planos variados de diplomacia, já disse que Washington vá lamber sabão e cuidar
da própria vida.
Como Asia Times Online já noticiou, demorou um pouco, mas Irã e
China acabam de selar um novo acordo de preço do petróleo. E o gasoduto
Irã-Paquistão é questão resolvida. E Afeganistão e Paquistão – como o Irã –
querem muito ser admitidos à Organização de Cooperação de Xangai [ing. SCO],
acelerando a integração econômica regional.
O
fato de os lobbystas pró-Israel que
redigiram o pacote de sanções não terem previsto que tudo isso aconteceria só
prova, mais uma vez, que vivem a vida vegetativa de homens “de ação” de capitães
de poltrona.
Os
papagaios neoconservadores ficaram agarrados à conversa fiada das “sanções
debilitantes” e blá-blá-blá. Ou à porta-voz do Departamento de Estado, Victoria
Nuland, casada com o neoconservador Robert Kagan, que garantia que todos esses
países seriam pressionados a fazer o que pudessem “para aprofundar as sanções,
sobretudo para que se desliguem do cru iraniano”. Ninguém está “se desligando”
de coisa alguma, exceto os
poodles europeus
especialistas em se autoderrotar.
Está
também aí, afinal exposto, o mito da “capacidade reserva” da Arábia Saudita. Não
existe. As reservas sauditas diminuem à velocidade de 3% ao ano (a Arábia
Saudita está exportando 11,8 milhões de barris/dia, e diminuindo). Além do mais,
a Casa de Saud não quer extrair mais óleo, porque precisa dos altos preços, para
continuar subornando a própria população, para que ninguém pense em primaveras
árabes.
Mas há
ainda uma cereja sobre o bolo, deliciosa demais para deixar sem anotar. Apesar
das “sanções debilitantes”, o banco de investimentos Goldman Sachs não excluiu o
Irã de sua seleção dos “Next 11”
[1]
nem do
cálculo do novo índice que regerá um novo fundo de investimento nos N-11 e que
Goldman Sachs criou no ano passado
[2]. O Irã
continua avaliado como uma das cinco nações em desenvolvimento que têm
“produtividade e sustentabilidade de crescimento acima da média”. Talvez uma
Britney Spears persa devesse cantar “Baby, me embargue de novo”.
Baby,
estou chegando p’ra pegar você [3]
Do
ponto de vista de Washington, a única coisa que realmente conta na interminável
disputa nuclear é se o Irã pode ou não chegar a ter capacidade para construir
uma bomba atômica em tempo recorde, para o caso de a liderança em Teerã ficar
absolutamente convencida de que o Irã será atacado pelo eixo EUA-Israel.
É exatamente o que disse o diretor da Inteligência
Nacional dos EUA James Clapper, em audiência na Comissão das Forças Armadas do
Senado, na 5ª-feira passada: que o Irã “é mais que capaz de produzir urânio
enriquecido em quantidade suficiente para uma bomba, se os líderes políticos,
especificamente, o Supremo Líder, decidir que assim seja.”[4]
O
que Clapper não esclareceu é que Teerã está enriquecendo urânio a apenas 3,5%;
para bomba atômica, teria de chegar a 95% de enriquecimento – o que seria
imediatamente detectado pela Agência Internacional de Energia
Atômica.
Se
acontecer – e há aí um imenso “se” – não haverá como impor “mudança de regime”
por lá, se a mudança tiver de vir de fora. E, assim, bye bye ao Grande Prêmio em petróleo e gás sonhado
por todos, do realista Dr. Zbig Brzezinski ao ex-Darth Vader, Dick Cheney.
E
lá estará a Ouroboro, tudo de novo – a serpente que morde o próprio rabo. Temos
de bombardear para mudar o regime, e a bailarina lambuzada de petróleo dançará
no nosso colo de rico.
O
problema é que nem o governo Obama nem os principais generais do Pentágono estão
convencidos de que seja bom negócio.
Para
o comandante do estado-maior das forças conjuntas dos EUA, general Martin E.
Dempsey, “Seria prematuro decidir exclusivamente que tenha chegado a hora, para
nós, da opção militar”.
E
o tenente-general Ronald Burgess, diretor da Agência de Inteligência da Defesa,
disse ao Congresso na 5ª-feira que “é pouco provável que o Irã inicie ou
provoque intencionalmente um conflito”. Não surpreende: o próprio Dempsey
admitiu que a liderança em Teerã, ao contrário do que nunca se cansam de repetir
os “especialista” da imprensa neoconservadora, “é ator racional”.
E
isso faz alguma diferença para os neoconservadores e sua legião de lambe-botas
midiáticos? Não. De fato, não lhes faz qualquer diferença. Até que consigam
algum idiota para guerrear por eles – como, por exemplo, um presidente
Republicano – os verdadeiros covardes continuarão indo para Teerã, dia e noite,
no mais molhado de seus sonhos molhados.
Notas
dos tradutores
[1]
Os
“Next Eleven” ( N-11,
“próximos 11” ) são 11 países – Bangladesh, Egito,
Indonésia, Irã, México, Nigéria, Paquistão, Filipinas, Turquia, Coreia do Sul e
Vietnã – que Goldman Sachs e Jim O'Neill identificaram, no relatório do banco de
investimentos de 12/12/2005, como países com alto potencial de virem a ser, ao
lado dos países BRICS, as maiores economias do mundo no século
21.
[2]
Ano passado, o banco de investimentos Goldman Sachs lançou novo fundo para
investimentos nos mesmos países N-11, no qual o Irã continua incluído para
efeitos de cálculo do índice que rege o novo fundo. De novo, só, que o índice que rege o novo fundo mudou de
nome! Sobre isso, ver 27/1/2011, “Investing
in the 'Next eleven' in EM: Goldman Sachs launches new fund”, Atholl
Simpson: “O novo fundo será regido por um novo índice chamado MSCI GDP Weighted
N-11 (ex-“Índice Irã”), baseado no PIB dos países N-11” .
O
Banco de Investimentos Goldman Sachs portanto, não dá qualquer sinal de
acreditar que as sanções econômicas impostas pelos EUA tenham potência para
“debilitar” a economia iraniana, evidência que Pepe Escobar anota no artigo de
hoje. Em nota
que se lê hoje na página do banco de investimentos, Goldman Sachs apenas
esclarece que: “O Fundo não investirá em
empresas organizadas sob as leis iranianas, ou domiciliadas no Irã nem em outras
empresas, como seja necessário para respeitar as sanções econômicas que os EUA
impuseram ao Irã” [nota autorizada pelo autor, por
e-mail].
[3] Orig. “Baby, I'm coming to
get ya”. É
título de canção gravada por Lisa Stanfield. Em cenário e circunstâncias
diferentes (e sem “baby”), é fala famosa do filme Rambo, dita por Stalone, nas
circunstâncias que se veem no filme.
[4]
Sobre isso, ver também 20/2/2012, MK Bhadrakumar, “EUA
e Irã avançam (devagar) rumo a conversações”.
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