17/2/2012,
Pepe Escobar, Asia Times
Online
Traduzido
pelo pessoal da Vila Vudu
Pepe Escobar |
O
que afinal pensavam os
poodles europeus? Que
Teerã se encolheria e absorveria o embargo do petróleo imposto pela União
Europeia, marcado para começar dia 1º de julho?
Não
surpreende que Bruxelas tenha sido apanhada pela galhada, como veado pirateado
da Gucci, quando começaram a aparecer notícias de que Teerã se antecipará
preventivamente e imporá seu próprio bloqueio de petróleo a seis países da União
Europeia – os países europeus Club Med em crise: Portugal, Itália, Grécia e
Espanha, mais França e Países Baixos atingidos pela recessão.
Imediatamente,
os ministérios do Petróleo e das Relações Exteriores do Irã negaram tudo; a
decisão de impor bloqueio ou embargo teria, tecnicamente, de ser anunciada
oficialmente pelo Conselho Supremo de Segurança nacional, encarregado também das
negociações sobre as questões nucleares.
Mas
só cegos-surdos-mudos não entenderam a mensagem: é a volta do chicote no lombo
das ridículas, contraproducentes sanções/embargo inventadas pela União Europeia,
que só conseguirão lançar vastas fatias da União Europeia em sofrimento
econômico ainda mais profundo.
O
Irã fornece 500 mil barris/dia de petróleo à União Europeia. A simples ameaça
(desmentida) de que o Irã imporia embargo a alguns países já fez explodir os
preços do petróleo.
Assumindo-se
que os países Club Med fossem capazes de obter petróleo de outras fontes – o que
não é de modo algum garantido; a Arábia Saudita quer preços altos para o
petróleo, como vingança – mesmo assim teriam de reconfigurar suas refinarias
para processar o petróleo que recebam de outras fontes. Inevitavelmente faltaria
gasolina; o italiano médio, por exemplo, já está furioso com o aumento
desembestado do combustível nas bombas.
Talvez
aquelas dezenas de milhares de inúteis burocratas belgas carregando de um lado
para outro os seus arquivos multicoloridos devessem tomar alguma atitude que
fizesse algum sentido, e escrever a Washington, congratulando-se oficialmente
por terem conseguido empobrecer ainda mais dezenas de milhões de cidadãos da
União Europeia.
Na
dúvida, invente mais sanções
Mas
os abutres, chacais e hienas da mudança de regime/guerra jamais saciarão sua
luxúria que exige sempre mais sanções. Os EUA estão agora forçando a União
Europeia a excluir o Irã da rede SWIFT, que tem base em Bruxelas. A rede SWIFT –
é um mecanismo/rede de compensação independente, de telecomunicações, usada por
todos os bancos do mundo para trocar dados financeiros (o nome oficial é Society for Worldwide Interbank Financial
Telecommunication [Sociedade para
as Telecomunicações Financeiras Interbancárias Mundiais]) [1]. O próprio Banco Central do Irã
pode ser a próxima vítima.
Em
síntese, a rede SWIFT é a correia de transmissão que movimenta as transações
financeiras e o comércio globais. Se isso não é declaração de guerra
ampliada, remixed, de guerra
econômica total contra um país – nada será.
Funcionará?
Pouco provável. Com certeza implicará mais ampla devastação imposta ao “povo
iraniano” – essa vaga entidade à qual os EUA “não fazem oposição”. Mais de 40
bancos iranianos usam a rede SWIFT para processar transações financeiras; os
iranianos usam a rede como todos, em todo o mundo, na economia globalizada.
Arrastará
para a lama a reputação da rede SWIFT, tão atentamente preservada, como
instituição neutra e confiável; imaginem a reação de outros países membros, ao
verem que qualquer país membro pode ser totalmente marginalizado, conforme os
impulsos-desejos dos EUA.
Para
nem comentar que Washington não pode dizer à rede SWIFT o que fazer. E nem se
trata de “pressionar” sutilmente, ao estilo da Máfia, os países europeus: a
“mensagem” foi entregue pessoalmente por David Cohen, subsecretário do
Departamento do Tesouro dos EUA para assuntos de inteligência financeira e
terrorismo.
E
tudo isso, para quê? Segundo a incansável, ininterrupta, sufocante artilharia
dos ‘especialistas midiáticos’ na imprensa-empresa ocidental, para “talvez”
ganhar algum tempo para que o governo Obama consiga “persuadir” o governo
obcecado-com-criar-guerras-e- dono-de-enorme-arsenal-nuclear do partido
Likud israelense a não atacar o Irã na próxima primavera.
Fiquem
de olho no camelo norte-americano
Enquanto
isso, segundo a Organização de Energia Atômica Iraniana, o Irã desenvolveu
centrífugas de quarta geração, feitas de fibra de carbono, que são “mais
rápidas, geram menor quantidade de resíduos e ocupam menos espaço” ao operar em
velocidades supersônicas para purificar urânio.
E
os primeiros bastões de combustível radiativo enriquecido a 20% fabricados no
Irã já foram instalados no Reator de Pesquisas de Teerã – que não é fábrica de
bombas, mas instalação civil construída para produzir isótopos radiativos usados
no tratamento contra o câncer; o Reator de Pesquisas pode afinal operar, sem
depender de interferência estrangeira.
E
ainda mais: Teerã enviou carta à União Europeia, “saudando e acolhendo com
simpatia” o grupo P5+1 – os membros do Conselho de Segurança da ONU que têm
poder de veto, mais a Alemanha – caso estejam seriamente interessados em voltar
à mesa de negociações para retomar seriamente discussões sobre o dossiê
nuclear do Irã.
Vejamos
o que significa isso.
É
uma pequena e sofisticada miniatura persa – a ser decifrada pelos europeus que
se deem o trabalho de decifrá-la. Teerã está dizendo: desejamos sinceramente
conversar com os senhores; mas não desistiremos de nosso programa nuclear civil;
e, se continuarem a nos tratar como cachorros, com sanções, embargo e, agora, o
golpe SWIFT, podemos também pressionar muito as suas já muito abaladas
economias.
Com
certeza perderá dinheiro quem apostar que os políticos europeus e seus
burocratas subalternos ignorantes entenderão a mensagem.
E
há ainda o argumento estúpido de que os recentes atentados à bomba e as bombas
que não explodiram em Delhi, Georgia e Bangkok seriam a retaliação de Teerã,
vingança pelo assassinato de cinco cientistas nucleares civis iranianos – que
foi trabalho do grupo terrorista
MeK, no Irã, obedecendo ordens do Mossad israelense.
Se
e quando Teerã decidir atacar interesses israelenses, poderá fazê-lo bem mais
perto de casa. O Irã tem todos os agentes operadores competentes necessários
para fazer o que quiserem e sem deixar pistas. A ideia de que Teerã enviaria
agentes iranianos a países asiáticos aliados, como Índia e Tailândia – e que
agentes iranianos se comportariam como os Três Patetas, e andariam por Bangkok
exibindo os passaportes e malas cheias de moeda iraniana – é ridícula,
inverossímil. Não há dúvida de que a coisa foi encenada: a questão é saber quem
manipulou os Três Patetas.
Se
a histeria promovida por Washington/Telavive já está chegando à estratosfera,
esperem só até 20 de março, quando a Bolsa de Petróleo iraniana começará a
vender petróleo em outras moedas, e o dólar perderá a exclusividade, movimento
que marcará o nascimento de um novo marcador-precificador para o petróleo,
baseado em euros, yens, yuans, rúpias ou numa cesta de moedas.
Será
ótimo para os clientes asiáticos do Irã – dos BRICSs Índia e China, aos aliados
dos EUA Japão e Coreia do Sul, para nem falar da Turquia, membro da OTAN. Mas
também será ótimo para os clientes europeus, que poderão suas próprias moedas
para pagar pelo petróleo que comprarem de Teerã. E também interessará a muitos
atores chave no mundo em desenvolvimento, que não desejam continuar ligados ao
petrodólar. Essa pode bem ser a palha que quebrará a espinha dorsal do já
carregadíssimo camelo norte-americano.
Nota dos
tradutores
[1] SWIFT
é sigla de Society
for Worldwide Interban k Financial
Telecommunication [Sociedade para as Telecomunicações
Financeiras Interbancárias Mundiais], à qual o autor refere-se adiante.
A
sociedade SWIFT opera uma rede mundial de mensagem que interliga bancos e outras
instituições financeiras. A sociedade SWIFT também comercia softwares e outros serviços para instituições
financeiras, a maior parte deles para serem usados na própria rede SWIFTNet, e
códigos de identificação bancária [ing.
bank identifier codes, BICs] ISO 9362, conhecidos como “códigos
SWIFT”. A maioria das mensagens internacionais interbancos são feitas pela rede
SWIFT.
Em
setembro de 2010,
a rede SWIFT interligava mais de 9 mil instituições
financeiras em 209 países e territórios, que em média, até aquela data, trocavam
entre si mais de 15 milhões de mensagens por dia (em 1995, essa média diária era
de 2,4 milhões de mensagens).
A
rede SWIFT-Net é considerada altamente segura para transporte de mensagens
financeiras, mas não mantém registros dos membros. A rede SWIFT não facilita
transferência de fundos; em vez disso, emite ordens de pagamento, que podem ser
convertidas em dinheiro via contas correspondentes que as instituições mantêm
umas nas outras. A instituição financeira, para completar as transações de
câmbio, deve ter algum tipo de contato com bancos (a instituição tem de ser
banco, ou ser associada a um ou mais bancos), para poder usufruir esses
específicos serviços da rede SWIFT-Net.
A
SWIFT foi fundada em 1973 e é constituída como cooperativa de várias
instituições financeiras, nos termos da lei belga. Mantém escritórios em todo o
mundo. A sede está localizada em La Hulpe, Bélgica, próxima a Bruxelas.
Também
pode-se ler a estranha história da SWIFT no
Brasil.
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