10/7/2012, Pepe Escobar,
Asia Times Online - THE ROVING
EYE
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Pepe Escobar |
A
secretária de Estado dos EUA Hillary Clinton está ficando sem munição retórica,
na Guerra Santa dos EUA contra a Síria. Talvez seja o estresse de declarar uma
guerra da OTAN, pelas costas do Conselho de Segurança da ONU. Talvez, o estresse
de ser almoçada e jantada, todos os dias, pelo ministro das Relações Exteriores
da Rússia, Sergei Lavrov.
Hillary Clinton |
Hillary
acaba de convocar “as potências ocidentais” e seus fantoches árabes – o CCGOTAN,
aglomerado de Conselho de Cooperação do Golfo plus Organização do Tratado
do Atlântico Norte, que ela apresenta como se fosse alguma “comunidade
internacional” – para que “deixem claro que Rússia e China pagarão, por impedir
o progresso” (da mudança armada de regime na Síria).
Em
não-novilíngua, significa: “Se impedirem nossa nova guerra, haverá retaliação”.
Não
obstante as gargalhadas ouvidas pelos corredores do Kremlin e do Zhongnanhai, a
coisa mostra o quão desesperado está o conglomerado CCGOTAN para forçar a
mudança de regime na Síria, a ser usado como meio para interromper a conexão
privilegiada que liga o Irã ao mundo árabe. Isso tudo, enquanto o
primeiro-ministro Recep Tayyip Erdogan da Turquia – no comando do flanco
oriental da OTAN – comicha de vontade de atacar a Síria, mas não encontra jeito
de vender a ideia à opinião pública turca.
Nesse
contexto incandescente, aparece WikiLeaks – que divulgou grande quantidade de
mensagens de e-mail contra, simultaneamente, o sistema de Assad e os
“rebeldes” da OTAN. Um dos efeitos colaterais possíveis, os e-mails
talvez inspirem ondas de chamados “progressistas” em todo mundo, que se porão a
defender a Guerra Santa contra a Síria. Efeito mais realista, talvez evidenciem
o quanto, de fato, os dois lados são horríveis: tanto o estado policial de Assad
quanto a oposição armada.
Explosão
de carro de turismo: alguém se interessa?
Útil,
nesse momento, é examinar o preço que a própria Washington, para nem falar nos
seus estados fantoches na OTAN, está pagando por tanto insistir esse neo-ramo de
guerra santa guerreada contra – nada mais, nada menos – que o mesmo bando de
“terroristas” que, até ontem, ameaçavam destruir a civilização ocidental,
convertendo-a num Califato tamanho gigante.
Conselho de Segurança da ONU |
Washington,
Londres e Paris tentaram – duas vezes – arrancar do Conselho de Segurança da ONU
a “licença” para mais uma guerra. Foram bloqueadas pela Rússia e pela China. O
plano B, então, é esquecer a ONU e deflagrar guerra da OTAN. O problema é que a
OTAN não tem estômago – nem dinheiro – para meter-se em guerra de alto risco
contra país capaz de se defender.
Plano
C: se nem A nem B, o plano C é apostar tudo numa longa guerra civil, usando para
tal fim o Exército Sírio (nada) Livre, que pulula de mercenários e
jihadis, e o bando exilados oportunistas que atende pela sigla de
Conselho Nacional Sírio (CNS).
O
CNS já pediu uma zona aérea de exclusão ao estilo líbio, sobre a Síria –
expressão que é sinônima de “guerra da OTAN”. A Turquia também requisitou
formalmente à OTAN a dita zona aérea de exclusão. Os comandantes da OTAN são
incompetentes, mas até eles aprenderam alguma coisa com as grandes enrascadas em
que se meteram e o correspondente embaraço que lhes causam (no Afeganistão, por
exemplo). Responderam “não” aos pedidos do CNS e da Turquia.
Nada
menos representativo que o Conselho Nacional Sírio e o Exército Sírio (nada)
Livre. Os “Amigos da Síria” – “Hillary & seus Patetas” – nem tomam
conhecimento da existência do Corpo Nacional de Coordenação para Mudança
Democrática [orig. National Coordination Body for Democratic Change
(NCB)], principal movimento de oposição verdadeira, composto de 13 partidos
políticos, a maioria dos quais da esquerda, nacionalistas árabes e um partido
curdo. Esse NBC denuncia insistente e firmemente todas as formas de
militarização do conflito e desautoriza absoluta e radicalmente o Exército Sírio
(nada) Livre.
Hoshyar Zebari |
O
ministro de Relações Exteriores do Iraque, Hoshyar Zebari – que é curdo –
alertou que jihadis salafistas de molde copiado da al-Qaeda estão-se
mudando aos magotes para a Síria. Aparentemente, esses magotes ainda ouvem muito
atentamente o que prega o ideólogo “invisível” da al-Qaeda, Dr. Ayman
al-Zawahiri. Há cinco meses, al-Zawahiri deu ordem de marcha aos jihadis
no Iraque, Jordânia, Líbano e Turquia. E acontece também que muitos deles estão
recebendo armas – por diferentes redes – da Casa de Saud e do Qatar.
Já
há meses, todos sabem que o Grupo de Combate Islâmico Líbio [orig. Libyan
Islamic Fighting Group (LIFG)] de Abdul Hakim Belhaj, ligado à al-Qaeda,
está ativo na Síria; como todos também sabem que há remanescentes da al-Qaeda no
Iraque, responsáveis por explosões de carros até em Damasco.
No
caso de uma Síria pós-Assad dominada por sunitas linha-dura infiltrados por
jihadis wahhabitas e salafistas, a retaliação garantida fará a jihad
antissoviética no Afeganistão pós-80’s parecer Disneylândia em Hong Kong.
Aceitam-se Yuan e Rublos
Quanto
à China, ri do desespero de Hillary no caminho até o banco. Enquanto cresce a
paranóia na Casa de Saud contra o que os sauditas veem como flerte de Obama com
a democracia no mundo árabe, Pequim aquece as turbinas comerciais e entrega a
Riad um buquê de novos mísseis.
A Guerra Santa do Ocidente contra o Oriente (antiga) |
E,
enquanto o “ocidente” flerta com a Guerra Santa, as empresas estatais chinesas
compram mercadorias feito doidas, por todo o Oriente Médio, Norte da África e
América do Sul – além de ampliar seus estoques de terras raras nas reservas
estratégicas. A China produz nada menos que 97% das terras raras do planeta –
necessárias para tudo, de iPads àqueles novos mísseis que lá fritam hoje, sob o
sol do deserto da Arábia.
Outros
efeitos colaterais em matéria de “o preço a pagar” por atropelar a ONU e pela
obsessão com a OTAN como Robocop global serão inevitáveis para os EUA. Não se
deve esquecer que a Guerra Santa contra a Síria é pit stop na estrada
para Teerã. Por exemplo: pode estar nascendo um novo sistema de seguro marítimo,
além de um novo mecanismo de câmbio internacional – que ignorará o diktat
do ocidente.
Mesmo
assim, o elemento mais importante parece ser o movimento, de Rússia, Irã e
China, para reorganizar o mercado global de energia, via transações que
marginalizam o petrodólar.
Quer
dizer: Washington corta o Irã do sistema SWIFT (Society for Worldwide Interbank Financial
Telecommunication)? O banco central iraniano contra-ataca: se vocês quiserem
negociar conosco, podem pagar em qualquer moeda, exceto o dólar norte-americano;
também aceitamos ouro.
Esse
é o Santo Graal da Guerra Santa – não a Síria. Uma coisa, para Teerã, é aceitar
euros em pagamento pelo óleo e gás iranianos; outra coisa é aceitar ouro. E,
como se não bastasse, com pleno apoio de Rússia e China.
Em
resumo: toda a síndrome da Guerra Santa está apressando o fim do dólar
norte-americano como moeda global de reserva.
E então? Agora,
acontecerá o quê? Uma Primavera Norteamericana? Ou as elites dos EUA terão –
feito a Máfia – colhões e musculatura para forçar Rússia e China a pagarem o
preço?
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