29/10/2011, Al-Jazeera (entrevista transcrita e
traduzida)
Tradução do
Coletivo da Vila
Vudu
Introdução
Do Oriente Médio
às ruas de Londres e cidades por todos os EUA, há descontentamento com o status quo. Seja contra a mão de
ferro de governos que se eternizam, seja a distância cada vez maior que separa
ricos e pobres e os que lutam para vencer essa distância. Mas para onde andam
esses que tanto clamam por mudanças? Sua visão de longo prazo para transformar a
sociedade será suficientemente profunda?
Slavoj ZIZEK:
“O
sistema atual perdeu a autoevidência, a legitimidade automática. Agora, o campo
está aberto”.
O
filósofo esloveno Slavoj Zizek, cuja crítica radical tanto ao capitalismo quanto
ao socialismo valeu-lhe reconhecimento internacional, fala aqui a Tom Ackerman
da rede Al Jazeera sobre as mudanças que acontecem no plano
da finança global e do sistema político. Analisa a Primavera Árabe, a crise na
eurozona, o movimento “Occupy Wall
Street” e o crescimento da China. Interessado no futuro do capitalismo
democrático ocidental, para Zizek, o “sistema atual perdeu a autoevidência, a
legitimidade automática. Agora, o campo está aberto”.
Transcrição da Entrevista
Tom Ackerman:
Começamos
perguntando a ele sobre os violentos tumultos do verão, em Londres. Aqueles
manifestantes tinham uma agenda política?
ZIZEK:
Os
manifestantes na rua, o modo como agiram na rua, e falei com manifestantes na
rua... Não havia demandas, eles não eram sequer capazes de formular demandas.
Foi pura violência. Não formularam uma ‘causa’, chame como quiser, “somos
comunistas utópicos”, ou “somos religiosos”... A única agenda, ali, era pura
violência, nas ruas, a agenda era imitar o consumismo [sobre isso, ver “Assaltantes
de lojinhas do mundo, uni-vos!”, Slavoj Zizek,
19/8/2011, London Review of
Books, vol. 33, n. 16, em
português. É muito triste...
TA:
E
aqui nos EUA? Você esteve lá. Viu alguma demanda ideológica
coerente?
ZIZEK:
Não,
mas não os culpo, veja bem. Não sou comunista ingênuo. Fui o primeiro a dizer –
o que me valeu muitos inimigos: encaremos o que foi o comunismo do século 20.
Precisamente porque começou com tantas esperanças e terminou num pesadelo, numa
imensa catástrofe, talvez a maior catástrofe ética da história da humanidade,
maior que o fascismo.
Em termos bem
simples: no fascismo, chegaram os “bandidos” e disseram “nosso programa é fazer
tais e tais e tais coisas ruins”. Então, tomaram o poder e fizeram aquelas
coisas ruins. Não houve surpresa. No comunismo tivemos autêntica tragédia, com
dissidentes, com lutas internas sempre. Mas, mesmo assim, aquilo
acabou.
Isso significa
que... Não blefemos. Nós vemos as limitações do sistema existente. Dizem que sou
utopista. Me desculpem, mas... E aqui declaro a minha posição básica: para mim,
a única verdadeira utopia é acreditar que as coisas possam continuar
indefinidamente como são num determinado momento. Veja como foram as coisas no
início da quebradeira de 2008. Nossas leis sobre bancos não são boas? OK. Então,
ok, vamos corrigir umas coisinhas, e pronto. Não, não é assim. Sim, temos de
fazer alguma coisa. O fato é que não sabemos o que fazer. Temos de encarar isso
abertamente. Que fórum efetivo temos, que pode substituir o sistema do
capitalismo democrático como o temos hoje?
Cito aqui alguém a
quem me oponho completamente [com ênfase] no campo político, mas ela às vezes
não é totalmente estúpida: Ayn Rand, que escreveu Atlas Strugles (1957). Em Hymn to Money [um fragmento de Atlas Strugles], ridículo, mas lá ela
diz uma coisa aproveitável. Diz que o dinheiro, em certo sentido, é um meio para
a liberdade. No sentido de que temos de dividir as coisas, trocar etc. Diz ela
que o dinheiro significa que podemos fazer as coisas por via pacífica. Eu pago,
você só me vende se quiser. Sem o dinheiro, só resta alguma espécie de dominação
brutal direta, a extorsão etc. Não concordo com ela nisso, mas não há aqui um
ponto aproveitável? Não é uma grande experiência do comunismo do século 20?
Aboliram o dinheiro do mercado, adveio a dominação direta mais brutal, como
vingança.
TA:
Li
alguma coisa do que você escreveu sobre o fascismo de esquerda, que somos
obrigados a tolerar... O que quis dizer com “fascismo de
esquerda”?
ZIZEK:
Foi
uma das coisas que eu disse para provocar meus amigos liberais. Disse até coisas
muito piores. Gosto de provocar. Disse, por exemplo... e quase causou ataque
cardíaco em alguns de meus amigos liberais...
TA:
Você
está dizendo que não disse literalmente? É isso?
ZIZEK:
Não.
Mas... Por que não? O problema é sempre o problema da violência. Claro que me
oponho à violência, quando significa matar, torturar etc. Mas, para mim há uma
violência verdadeira, que temos de suportar, não é violência física. Na Praça
Tahrir, por exemplo, foram violentos, no sentido formal de que eles tinham de
fazer todo o sistema parar de funcionar. Por que não? A frase famosa, que eu
disse, que me valeu tantos inimigos, que Hitler não foi suficientemente
violento... é parte de uma frase, em que eu disse que Hitler não foi
suficientemente violento no sentido em que Gandhi foi mais violento que Hitler.
Toda a violência de Hitler foi para fazer o sistema funcionar. E Gandhi queria
fazer parar todo um sistema.
O problema para
mim é o ânimo obsessivo na demonização da violência. Claro que temos de
demonizar a violência, mas, antes de demonizar a violência, temos de ver também
todas as formas da violência, a violência invisível. Não só a paranóia, por
causa da mídia bandida controlada por não sei quem, que impede que se veja não
sei o quê, etc. etc. Mas... Querem falar de violência? Falem da República do
Congo, hoje. Morrem milhões, o estado não funciona, os senhores da guerra
mandam, etc. Essa é a violência sobre a qual nada se sabe, não por causa da
‘mídia’, mas porque aquela violência que está destruindo o Congo é parte do
sistema. Não se fala da violência nocional, não se expande a noção de
violência.
Escrevi a mesma coisa no Guardian sobre a Cisjordânia [1]. Claro que condeno a violência
contra os palestinos e também o terrorismo. Mas quero saber também o que
acontece lá... quando nada acontece. Os palestinos suportam, todos os dias, a
violência sufocante, diária, da ocupação burocrática pelos israelenses, que
ninguém vê, que não é grande o bastante para a mídia. Querem falar de violência,
falem também dessa violência mortal. Essa é a realidade. Sem falar dessa
violência, não se tem o quadro completo.
TA:
Você
não está falando de uma solução ideológica para o conflito palestino,
está?
ZIZEK:
O
que significa, para você, “solução ideológica”?
TA:
Você
diz que quando as coisas não mudam, seja qual for a
norma...
ZIZEK:
Estou
falando da violência, nesse estado que funciona
normalmente.
TA:
Sim...
E Haveria uma abordagem ideológica para responder a isso, quando todos estão
concentrados nos conflitos nacionalistas,
religiosos?
ZIZEK:
O
problema está no que significa a palavra “ideologia”. Para mim, a ideologia está
cada vez mais presente no plano da vida diária. Pelo menos no ocidente, vivemos
numa estranha era em as pessoas creem que vivam fora da ideologia. Fale com
qualquer um hoje. Qual é o ... implícito que se obtém da educação, da sociedade
etc.? Não é ‘sacrifique-se por uma grande causa’. Nada disso. É sempre coisas
como ‘seja fiel a você mesmo’, ‘tenha uma vida plena’, ‘realize seus
potenciais’, o que chamo de um hedonismo espiritualizado.
As pessoas não
experienciam isso como ideologia, mas, para mim, estamos na ideologia. Para mim,
ideologia é o modo como você vê e como você não vê as coisas, de tal modo que
você possa funcionar na vida diária. Por exemplo: não podermos imaginar uma
mudança é sinal de ideologia.
Veja o modo como
problemas como racismo e sexismo, problemas muito reais, estão hoje
automaticamente traduzidos em problemas de intolerância. É pura ideologia. Veja
Martin Luther King. Praticamente nunca falou em “tolerância”. Para ele, os
problemas raciais nada tinham a ver com os negros lutarem para serem mais
tolerados como negros, dentro da sociedade dos brancos. Para ele, o racismo era
problema de exploração econômica dos negros pelos brancos, que os negros tinham
de conquistar direitos sociais e leis que os garantissem, que era preciso
enfrentar o racismo na vida diária. Ao perceber esses problemas, como problemas
de “tolerância”, você automaticamente já aceitou as regras da sociedade em que
vivemos hoje, em que já naturalizamos as diferenças culturais e só falta
aprendermos a tolerar os outros e tal e tal. Aqui, a política propriamente dita
já praticamente desapareceu.
TA:
Você
vê algum lugar do mundo em que a esquerda esteja trabalhando para atualizar tudo
isso?
ZIZEK:
Já
está acontecendo, aos poucos. Mas a mídia não cobre suficientemente o que
acontece no mundo. Veja como a mídia cobre Índia e China. China é sempre o
bandido, comunistas que aterrorizam o Tibete e tal e tal. Uma notinha, cá e lá,
às vezes, mas a cobertura é sempre insuficiente. Ninguém sabe, por exemplo, que,
na Índia, há um mega movimento rebelde, maoísta, mais de um milhão de rebeldes
armados. É muita gente, mesmo para a Índia. E a Índia faz coisas horríveis, o
neocapitalismo indiano, tentando desocupar áreas tribais, para explorar minas
etc. Há vasta rebelião ali, e não se vê. Ficamos sempre na superfície. Mas mesmo
na Europa as coisas estão acontecendo.
Para explicar, por
um, dentre vários meios possíveis, lembro sempre de uma pergunta que Freud fez,
ridícula, ingênua, quando já estava velho: “O que quer uma mulher?” Hoje, muita
gente pergunta “O quer a Europa?” A Europa não consegue decidir entre, de um
lado, o capitalismo global puramente tecnocrático, o que fazer para sermos
competitivos no mercado global; e, de outro lado, os movimentos nacionalistas
contra os imigrantes. Duas coisas terríveis.
É muito triste
viver num mundo em que as duas únicas opções sejam essas. O mundo hoje, me
parece, está pedindo alternativas reais, que não sejam, só, de um lado viver o
neoliberalismo anglo-saxão e, de outro, para dizê-lo poeticamente, viver um
capitalismo chinês-cingapureano, comunismo com valores asiáticos, quer dizer,
capitalismo autoritário que, hoje é até muito mais efetivo que o capitalismo
liberal ocidental. Essa é a primeira tragédia europeia. A outra... Sou muito
pessimista sobre a Europa. A Europa, me parece, infelizmente, está regredindo
muito depressa. Dou-lhe um exemplo, um incidente.
Você sabe que a
União Europeia resiste a acolher a Turquia como membro. Porque não seria
suficientemente democrática (ou por ser muito islâmica), seja lá o que for. Pois
bem. Esse verão, houve uma parada gay gigante em Istanbul, 10 mil homossexuais
desfilando na rua [9/6/2011]. E nenhum
incidente. Tente fazer coisa semelhante em país pós-comunista, do bloco
ex-soviético da Europa oriental que seja já membro da União Europeia. Fizeram,
numa cidade da Ucrânia. Eram 700 homossexuais, protegidos por 2 mil policiais,
que protegiam os homossexuais contra uma multidão de 10 mil locais que queriam
linchá-los.
Costumo dizer,
para provocar meus amigos liberais, que não sou contra a direita europeia, que
diz que o legado cristão-judeu está ameaçado. Mas esses são os falsos protetores
da Europa, contra os muçulmanos. E eu não temo os muçulmanos na Europa, temo os
protetores da Europa. Digo aos meus amigos judeus: vocês não estão vendo o
verdadeiro perigo. Já viram o que fez aquele Bravik, na Noruega que matou
estudantes. É caso claro, paradoxal, do que está emergindo: o sionismo
antissemista.
Leiam o que
escreveu aquele Bravik. Era claramente antissemita, repetia todos os slogans dos
antissemitismo do estado-nacional europeu. Noutros pontos, era totalmente a
favor do sionismo israelense! Muitos disseram: “É um doido. Não se pode
considerar o que dizem esses malucos”.
Mas é exatamente o
mesmo discurso dos norte-americanos conservadores cristãos fundamentalistas!
Glenn Beck, por exemplo, foi demitido da Fox News onde trabalhava, por ter feito
comentários antissemitas. Como outros sionistas antissemitas, Glenn Beck sempre
foi a favor do sionismo israelense e, ao mesmo tempo, sempre foi antissemita.
Esses, para mim, são o pesadelo máximo.
Israel, parece,
não vê o que seu governo está fazendo. Basicamente, o governo de Israel vendeu a
alma ao diabo. Quero dizer o seguinte: Israel fez aliança com todas as forças
políticas ocidentais mais reacionárias, que, por definição, são antissemistas.
Disseram: “vocês façam seus jogos racistas aí, e nos deixem em paz para fazermos
o que quisermos, aqui, com os palestinos”. Não me canso de repetir: as maiores
vítimas dessas alianças catastróficas serão os próprios judeus. Correm o risco
de perder toda a sua grandeza. Correm o risco de perder o que os tornou únicos
em toda a história do mundo.
TA:
Em
que ponto você vê sinais de que estejam acontecendo mudanças reais,
revolucionárias, no mundo?
ZIZEK:
Entendo
que o que está acontecendo hoje já dá motivo para algum otimismo modesto. Não se
pode esperar que aconteçam milagres. O começo é, simplesmente, o povo começar a
perceber que as dificuldades que enfrentamos hoje não são só as dificuldades
causadas por um sistema ruim, ganancioso, contra um outro sistema bom. É
preciso, isso sim, começar a propor algumas perguntas sobre o sistema como tal.
E essa percepção está nascendo. Os protestos de rua têm a ver com isso. Acho que
no atual estágio, não importa tanto oferecer soluções
rápidas.
Trata-se de
quebrar o que eu chamo, ironicamente, “o tabu de Fukuyama” (o fim da história,
etc.) Fukuyama não é um idiota. Em certo sentido, todos fomos, até agora,
fukuyamistas. Nem a esquerda radical está perguntando o que temos a oferecer,
para substituir o capitalismo. Só fazem pedir mais direitos sociais, mais
direitos para as mulheres, mais justiça social, etc., sempre dentro do sistema.
È hora de fazer essas perguntas mais fundamentais.
O sistema perdeu a
autoevidência, perdeu sua legitimidade automática. O campo, agora, está aberto.
Essa é conquista muito importante.
TA:
Sim,
o campo está aberto. Mas... quem vai preencher o
vácuo?
ZIZEK:
Concordo
com você. Sempre há um perigo. Sabemos muito bem quem ocupou as aberturas, nos
anos 1930, na Europa. A novidade traz seus próprios riscos. OK. Mas mesmo assim
temos de aproveitar a chance. Por quê? Porque cada vez mais podemos ver através
de uma série de fenômenos. Por exemplo: cada vez mais a crise econômica vai-se
convertendo em estado de emergência, de crise, permanente.
E há um fenômeno
para o qual temos de estar muito atentos. É um interessante paradoxo. A economia
mundial progride, mas... O muro de Berlim caiu, mas nasceram novos muros, novas
divisões muito maiores, por todos os cantos, dentro da maioria dos estados. Não
só simplesmente entre ricos e pobres, mas...
Quem vive nas
favelas da América Latina,
slums, em outros lugares, por exemplo, e em outros lugares, não
são só “pobres”. Eles pensam de modo muito mais radical. Estão explodindo no
espaço público, adotando soluções radicais, abraçando o engajamento político,
vários caminhos. Não se trata de se devemos ou não assumir riscos ou não. A
abertura nos está sendo imposta.
Muitos me dizem
“por que você não fica quieto e vamos em silêncio, no rumo que as coisas
seguirem?” Sempre respondo que, se não fizermos alguma coisa, nos
encaminharemos, gradualmente, para um novo tipo de sociedade autoritária (não
será o velho fascismo, é preciso dizer bem claramente). Mas um novo tipo de
sociedade autoritária. Aí vejo a grande importância histórica mundial do que
está acontecendo na China, porque... Falemos claramente. Até hoje... Há pelo
menos uma coisa muito boa no capitalismo: mais cedo ou mais tarde, o capitalismo
trouxe sempre uma demanda por democracia. Houve ditaduras por dez, vinte anos,
Coreia do Sul (sic), Chile, mas...
O que eu temo é
que, com esse capitalismo com valores asiáticos, cheguemos a um capitalismo
muito mais eficiente, mais dinâmico (ou, pelo menos, parece) do que o nosso
capitalismo ocidental. Mas não partilho as esperanças dos meus amigos liberais,
que dizem, “deem a eles mais dez anos, mais manifestações na Praça da Paz”. Não.
Não será assim. Acabou o casamento entre capitalismo e democracia.
TA:
Se
o capitalismo, como você disse não é o melhor exemplo, como você disse... Quero
dizer: você sempre reclama que o consumismo é a força que tem levado à ambição e
também à insatisfação. Há algum lugar onde as coisas estejam acontecendo de
outro modo?
ZIZEK:
Mesmo
na China há tentativas para organizar a sociedade civil, no sentido dos
movimentos sociais, pela ecologia, por direitos dos trabalhadores, etc. Entendo
que, especialmente na China, tudo isso pode ser ainda mais importante que nas
democracias ocidentais. Estão acontecendo coisas incríveis, na China. Quer ver
onde se pode ter uma pista de o quanto a situação é explosiva, na China? Lembro
da última sessão do Parlamento chinês. Você pensa que a questão era aumentar o
orçamento militar? Não. O que eles dobraram foi o orçamento para despesas com a
segurança interna. A China é hoje o único, dentre os grandes países, que gasta
mais na segurança interna que com o exército e a segurança contra ataques que
venham de fora. Há protestos lá.
E há a Primavera
Árabe. Sabe por que gostei tanto disso? Porque nós, no ocidente, ficamos nos
clichês: dos árabes não se conseguirá um movimento a favor de uma democracia
secular. Eles só se mobilizam em movimentos racistas, antissemistas,
fundamentalistas religiosos, nacionalistas, etc. Não se conseguirá movimento por
democracia secular. Quer saber? O que se viu acontecer foi exatamente o que o
ocidente pensava que não aconteceria por lá.
A parte triste
parece que está começando agora, e espero que não aconteça. Mas há sinais que
apontam na triste direção de que o final daquilo lá será um pacto perverso entre
a Fraternidade Muçulmana e o exército. Rezo para que não aconteça, mas, em
termos simples, a Fraternidade Muçulmana avança no controle religioso
ideológico, na escola do controle, e o Exército, em troca, preserva seus
privilégios, a corrupção etc.
Mas, mesmo assim,
as coisas estão acontecendo. Veja a Europa, a Grécia. De início, muitos zombaram
da Grécia, “ora os gregos, aquele povo primitivo, mediterrâneos atrasados...”
Mas aconteceu. E aconteceu na Espanha, na Inglaterra. E a coisa se espalha. Não
se trata hoje de se haverá ou não haverá uma revolução.
Temos hoje de
lutar a luta mais difícil: o que faremos para, dito de modo ingênuo, para nos
apropriar da energia dos protestos. Nos EUA, por exemplo, a grande energia dos
protestos, até agora, foi apropriada pelos Tea Parties. Veja como se apropriaram
daquela energia. Como os movimentos operários de 50 anos atrás! Ouvi uma cantora
pop que apóia os Tea Parties. O que
ela diz é “somos trabalhadores, trabalhamos muito, somos explorados por Wall Street, etc. etc.” A luta se
travará aqui. E será luta muito dura, não tenho ilusões.
Mas você conhece
aquela praga, o que dizem os chineses quando detestam alguém: “Que você viva
tempos interessantes”. É isso. Nos aproximamos de tempos interessantes.
[fim da entrevista]
[fim da entrevista]
_____________________
Nota dos
tradutores
[1]
18/8/2009, Slavoj Zizek, Guardian, UK: “Condemnation
of 'illegal' settlements and violence only blurs the reality of what the Israeli
state is sanctioning, day by Day” [A condenação da ilegalidade das
colônias só faz encobrir a realidade de tudo que o estado de Israel sanciona
todos os dias], (em inglês).
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