quarta-feira, 9 de novembro de 2011

O último golpe da propaganda israelense contra o Irã


8/11/2011, *MK Bhadrakumar, Indian Punchline
Traduzido pelo Coletivo da Vila Vudu

Israel começou a perder o domínio estratégico que teve no Oriente Médio, quando encontrou pela frente o Hezbollah, que o desafiou na guerra do Líbano, em 2006. Mas continua como mestra incontestável da propaganda global. O ponto alto dessa performance parece ter sido o famoso ousadíssimo ataque, por pilotos israelenses, contra uma instalação nuclear secreta da Síria, em 2007 [1]. 

2007 foi a culminância da propaganda israelense. Leiam o relatório, na página do governo holandês. Ou no blog do Washington Post. O que teria provocado aquela magnífica onda de divulgação e propaganda, há quatro anos? Evidentemente, para encobrir a derrota que o Hezbollah aplicou-lhe, Israel planejou a operação militar e a operação de propaganda, que, acreditavam os israelenses, lhes devolveriam a imagem de antes, de marcianos descidos no Oriente Médio. 

Não é em tudo semelhante ao que vemos hoje? Não estamos assistindo ao replay daquele raro momento de gênio para a autopromoção e a propaganda –, que Israel está forçando ao máximo, para atacar o Irã? 

Tenho quatro motivos pelos quais chamo de propaganda a propaganda israelense. 

(1) Os líderes israelenses com certeza sabem o mesmo que sabe o ex-chefe do Mossad, Ephraim Halevy, que repetiu várias vezes, semana passada, que o programa nuclear iraniano não representa, de fato, ameaça existencial a Israel. 

(2) Os líderes israelenses entendem a política. Entendem que na Europa e nos EUA, os líderes foram colhidos no redemoinho da crise econômica e mal conseguem manter-se à tona. Sabem bem que Israel não tem capacidade para combater sozinhos, em guerra para a qual não contem com total apoio dos EUA; e que os EUA, por sua vez, não têm fôlego para envolver-se hoje em mais uma guerra – menos ainda se for guerra no Oriente Médio que faça subir o preço do petróleo. (Evidentemente, a primeira reação do Irã será fechar o Estreito de Ormuz, por onde passa 1/3 do petróleo que o mundo consome.)

(3) Os três mais altos comandantes das forças armadas de Israel e os chefes do Mossad e do Shin Bet já se manifestaram contra um ataque ao Irã. Os líderes israelenses sabem bem porque todos esses se opõem tão firmemente à guerra contra o Irã. Sabem que o Hezbollah fará chover dezenas de milhares de foguetes sobre todas as cidades pequenas e grandes e sobre todas as colônias de israelenses, o que provocará número colossal de mortes entre os civis. Digam o que disserem, políticos como Benjamin Netanyahu e Ehud Barak sabem que efeito essa tragédia terrível teria sobre suas bem-sucedidas carreiras eleitorais. E, por fim, 

(4) os israelenses são mentes brilhantes e com certeza, antes de iniciar um ataque contra o Irã, não deixariam de perguntar a pergunta fundamental: Qual o objetivo do ataque? Destruir o programa nuclear do Irã? Mas, para tanto, Israel teria, antes, de saber exatamente onde se localizam as instalações nucleares do Irã – informação que, hoje, Israel não tem. Em resumo, a liderança israelense estaria pondo em risco a vida de centenas de milhares de israelenses inocentes, numa guerra sem objetivo claro. E de fato, no final da história, o Irã que emergisse depois do ataque israelense, sem dúvida construiria sua bomba atômica, a qual, essa, sim, seria ameaça existencial contra Israel por, no mínimo, alguns milênios. 

Assim sendo, por que essa onda de propaganda israelense que está enlouquecendo o planeta? 

Vejo três fatores em operação:

(1) As políticas regionais de Israel chegaram a um beco sem saída. E o iminente reconhecimento da Palestina pela Assembleia Geral da ONU é pílula amarga demais para engolir. Agora, o anel de isolamento regional que cerca Israel fechou-se.

(2) Os movimentos sociais de protesto em Israel estão ganhando ímpeto. A política econômica de Israel carece desesperadamente de reformas; mas o governo foi apanhado de calças curtas e não tem dinheiro.
O governo israelense precisa muito de alguma coisa que distraia a atenção da população, afastando-a das questões 1 e 2, acima. O espectro da guerra contra o Irã é o derradeiro golpe de propaganda ao qual os políticos israelenses estão recorrendo, em desespero, para mobilizar a nação.

(3) Não poderia haver melhor momento para “apertar” Barack Obama. Evidentemente, Netanyahu sabe o quanto Obama é supremamente “apertável” – desde que Obama foi forçado a recuar do que disse no famoso discurso do Cairo, em 2009. Com Obama começando sua campanha eleitoral para a reeleição, Netanyahu o vê como vulnerável a chantagem – e chantagem é jogo em que Israel é mestra. A experiência mostra que sempre que a pressão aumenta no Oriente Médio, os EUA instintivamente soltam os cordões do dinheiro para Israel. Obama está à beira de fazer isso.

A parte engraçada é que não há nenhum sinal de que o Irã tenha, de fato, trabalhado muito para sua dramática aparição como potência regional. Não é autor da coreografia da Primavera Árabe, nem nada teve a ver com os EUA invadirem o Afeganistão e o Iraque. Praticamente tudo aconteceu naturalmente – resultado das tolices dos EUA e das políticas israelenses. 

A primeira implicação disso tudo é que os israelenses não são infalíveis e invencíveis. Não são, mas não acho que os líderes israelenses sejam idiotas. Precisam, isso sim, desesperadamente, dos efeitos de uma onda de propaganda espetacular – como em 2007 – que mostre Israel como nação potente e valorosa, contra um Irã covarde e fraco. Para que a coisa funcionasse, Israel teve de pressupor que o Irã atacado permaneceria encolhido e não retaliaria. O problema é que o Irã não está cooperando. Estaremos assistindo à última onda de propaganda de Israel?


Nota dos tradutores
[1] “Operação Pomar” [ing. Operation Orchard], 6/9/2007 (em inglês). 

*MK Bhadrakumar foi diplomata de carreira do Serviço Exterior da Índia. Prestou serviços na União Soviética, Coreia do Sul, Sri Lanka, Alemanha, Afeganistão, Paquistão, Uzbequistão e Turquia. É especialista em questões do Afeganistão e Paquistão e escreve sobre temas de energia e segurança para várias publicações, dentre as quais The Hindu, Asia Online e Indian Punchline. É o filho mais velho de MK Kumaran (1915–1994), famoso escritor, jornalista, tradutor e militante de Kerala.

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