8/11/2011, Major-general Liang Qiao, professor
da Escola de Comando da Força Aérea da China (entrevista), People’s Diary, Pequim
Traduzido
pelo pessoal da Vila
Vudu
Qiao Liang, Major-General da Força Aérea da China |
Pergunta: Alguns analistas dizem
que a China alcançou desenvolvimento pacífico, enquanto os tropeços estratégicos
consumiam os EUA nas guerras no Oriente Médio. O senhor concorda com
isso?
Qiao:
Não. Essa
análise parece pressupor que uma única decisão errada teria posto os EUA nos
locais onde hoje estão. Os ataques no 11/9 não foram previstos, mas a Guerra do
Iraque foi inevitável.
A guerra entre EUA e Iraque não
começou porque o Iraque tivesse armas de destruição em massa, mas porque Saddam
Hussein pôs fim ao acordo que obrigava o comércio de petróleo a usar o dólar.
Por que os EUA tanto fazem para controlar o petróleo? Não é só para manter para
eles os altos ganhos da venda do petróleo, mas, sobretudo, porque o petróleo
mantém a dominação global do dólar.
O petróleo é indispensável ao
desenvolvimento de qualquer país, mas enquanto o comércio global do petróleo for
feito em dólares, nada abalará a posição hegemônica dos EUA. Por isso,
imediatamente depois de terem ocupado o Iraque, os EUA exigiram que o novo
governo iraquiano retomasse o velho acordo, que Saddam suspendera, que obriga
que todos os negócios com petróleo sejam feitos em dólares.
Os ataques do 11/9 aprofundaram os
conflitos entre os EUA e o mundo islâmico. O islamismo é considerado
incompatível com o mundo ocidental. Os EUA fizeram guerras contra o Afeganistão
e o Iraque para eliminar inimigos ideológicos do ocidente, mas o objetivo básico
naquelas guerras sempre foi manter, para os EUA, o controle sobre a
transferência da riqueza global.
A guerra no Iraque demonstra que os
EUA ainda conseguem controlar o mundo mediante a força militar e a força do
dólar. Mas a mesma guerra também está acelerando o declínio dos EUA.
Simultaneamente, o declínio dos EUA também é resultado de um sistema que não se
pode sustentar. Os EUA estão curvados sob dívida pública gigantesca. Muitos
norte-americanos trabalham nos setores financeiros e de serviços financeiros,
mas, até para suprir as mais básicas necessidades também desses trabalhadores, o
país depende de produtos que não são produzidos nos EUA. Que país conseguiria
qualquer desenvolvimento, nessa situação?
Pergunta: A China observa alguma
mudança no foco estratégico dos EUA para a região Ásia-Pacífico?
Qiao: Os EUA estão dando alguma atenção,
do ponto de vista estratégico, à região Ásia-Pacífico, mas o que mais interessa
aos EUA é manter sob estrita vigilância a Europa. A transferência de poder é
processo que inclui vários aspectos. A ordem internacional e econômica e as
regulações que operam hoje em todo o mundo foram todas construídas conjuntamente
por EUA e Europa. A Área Econômica Europeia ainda é a maior área econômica e o
sistema de valor criado por EUA e Europa continua aceito pela maioria dos povos
do mundo.
Embora a China
tenha alcançado sucessos significativos no desenvolvimento econômicos nos
últimos anos, a China está muito longe de substituir os EUA. Se os EUA se
autodestruírem, serão substituídos, não pela China, mas pela Europa. Isso
significa que o foco estratégico dos EUA não será completamente alterado, nem se
concentrará completamente na região Ásia-Pacífico, apesar de o desenvolvimento
da China ter levado os EUA a pôr o pé outra vez nessa parte do
mundo.
Pergunta: Qual o lugar do Mar do
Sul da China na estratégia dos EUA?
Qiao: Comparada à urgência com que os EUA
têm de manter a hegemonia do dólar, enfraquecer o euro e atrair mais capitais
para os EUA, os EUA não têm qualquer pressa para desafiar a China no Mar do Sul
da China. Portanto, o Mar do Sul da China não é campo de batalha entre EUA e
China.
Os EUA estão ocupados na luta
antiterrorismo e em evitar avanços europeus, embora, evidentemente, não se
espere que assistam, de braços cruzados, ao crescimento da China. Por isso, usam
países vizinhos da China, como Japão, Filipinas, como seus
“agentes”.
Como resolver as disputas sobre o
Mar do Sul da China? Na China, alguns têm sugerido meios militares, culpando a
China por agir de modo tímido, fraco, para alguns, ante as provocações que temos
recebido. Não concordo com isso.
Nos primeiros 20 anos depois que se
estabeleceu a nova China em 1949, a China tomou medidas decisivas
para salvaguardar seus interesses nacionais, servindo-se de meios militares.
Hoje, quando a China tornou-se fortemente interdependente com outros países,
temos de ser muito mais cautelosos quando se tratar de usar ou não usar meios
militares.
Os EUA o todo o ocidente estão à
espera de que a China cometa erros. Por mais que seja legítimo que a China
sirva-se de meios militares para proteger seus interesses, temos de considerar a
reação dos países com os quais a China está hoje interligada, no caso de
realmente se chegar a situação de conflito armado.
O tempo e a oportunidade são
importantes para resolver disputas territoriais. Para resolver as disputas que
envolvem o Mar do Sul da China, temos de ter paciência estratégica, esperar o
momento certo. Enquanto esperamos, podemos, evidentemente, impor pressões
diplomáticas, econômicas e militares aos que nos provoquem.
Fazer guerra para
resolver disputas e tornar cada vez mais tensas relações que já são tensas entre
vizinhos é perfeita estupidez. A China deve aprender a usar a seu favor as
vantagens econômicas que já temos. A China tornou-se o motor da economia
mundial. Temos de fazer os países nossos vizinhos depender de nossa economia,
para que conheçam os benefícios e as possibilidades de cooperar
conosco.
Pergunta: Por que os EUA criticam a
China mais do que a China critica os EUA?
Qiao: O PIB da China não é a única coisa
que importa. É importante que a China, o quanto antes, mude essa sua forma de
pensar. Para ser grande potência mundial, é preciso avaliar e propor
corretamente tanto o investimento comercial quanto o investimento
estratégico.
O investimento
comercial pode criar riqueza nacional, mas o investimento estratégico pode mudar
o mundo.
Até agora a China
alcançou excelentes resultados econômicos, mas a China ainda não é potência
mundial. Por quê? Porque não temos nem visão nem projeto estratégicos. Sem isso,
não temos como obter vantagens estratégicas. Nesse campo, precisamente, a China
tem muito o que aprender com os EUA.
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