quinta-feira, 3 de novembro de 2011

A economia da polarização

David P.Goldman



1/11/2011, David P Goldman, Spengler, Asia Times Online 
Traduzido pelo Coletivo da Vila Vudu






Entreouvido na Vila Vudu:
Esse, que adiante se lê, é o discurso polarizado e polarizante dos economistas da direitona liberal nos EUA. Aí está bem pintado um quadro completamente catastrófico da economia (liberal) norte-americana. 

A mesma catástrofe, os fascistas das empresas-imprensa brasileiras e seus braços teóricos & Consultoria Tendência tentam construir também para o Brasil e impô-la nos discursos da sociedade, pela “mídia”.

Mas qualquer um vê que nada do que abaixo se lê aplica-se ao Brasil – exatamente o que os fascistas das empresas-imprensa e do Instituto Milênio não sabem ver.

Seja como for, pareceu-nos útil constatar que os economistas liberais tem, sim, seus instrumentos e seus discursos. Mas também constatamos que são instrumentos e discursos que só servem para explicar economias capitalistas liberais fracassadas. Essa parte nós já entendemos. OK.

Falta então, para nós, o discurso do sucesso da economia brasileira. Os nossos governos Lula-Dilma aí estão, fazendo o prodigioso sucesso da economia brasileira, que todo mundo vê. Mas nós não temos os discursos que nos permitiriam defender o sucesso da economia brasileira. Tivéssemos os discursos, seria facílimo fazer nossa 'mídia'! Mas não temos os discursos... e sem eles não teremos os jornais & televisão e blogs e tal que nos interessa ter. 

Nós só sabemos amar Lula e votar em quem ele mandar. É muito. Mas é pouco.

Por enquanto, como se lê abaixo, já se sabe que a economia liberal só vê uma saída: “taxar o capital privado, ou expropriá-lo de facto ou de jure – por exemplo, estatizando bancos e orientando-os para financiar projetos considerados politicamente preferenciais, à moda das repúblicas de bananas da América Latina”. Quem disse é o liberal lá. Não fomos nós.

Esse argumento é liberal e apareceu num discurso liberal. Mas, estranhamente, ele NUNCA apareceu na “mídia” brasileira pressuposta liberal. O que só comprovou o que já sabemos a “mídia” brasileira não é liberal: é golpista e fascista. OK. Essa parte nós também já entendemos.

O caso é que mesmo esse argumento liberal é totalmente imprestável, para nós, porque não temos interesse algum em defender os nossos governos Lula-Dilma como “governos (liberais) de república de bananas da América Latina”, que não somos. 

E, ora bolas! Tampouco nos interessa ser república liberal dos drones da América do Norte. Pensando bem, muito melhor, as bananas.

Compete aos nossos partidos (e, porque eles nos faltam, nós temos de ir assim, fazendo tudo sozinhos!) construir os discursos desse sucesso dos governos Lula-Dilma, que se constrói sem taxar ou expropriar o capital privado, e com Belo Monte, doa o que doer nos ongueiros cabeça fraca. 

Cá na Vila Vudu, nós desejamos e do fundo do coração pedimos a Oxalá, todos os dias, que os nossos governos Lula-Dilma não estejam trabalhando para nos converter em república (liberal) de bananas da América Latina, nem em república (liberal) dos drones da América do Norte.

Desejamos e pedimos a Oxalá, que estejam trabalhando para nos converter em China, no que tenha a ver com capitalismo com comunismo, com pelo menos um pouco de “comum” construído, mesmo que mal construído, pra começar. Aos poucos, dá-se jeito.

Ninguém aqui sabe o que significa esse nosso desejo. 

A gente, só, segue desejando e traduzindo, despolarizando, o que o presidente Lula sempre fez, mas o PT nunca se preocupou em ensinar a fazer.

A luta continua. Só a luta ensina.
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Os EUA enlouqueceram? Desde os anos 1930s, a política jamais esteve tão polarizada, do movimento Tea Party, de um lado, e, de outro, o espectro dos protestos do movimento Occupy Wall Street. Por que a direita opõe-se tão veementemente a qualquer gasto do governo? E por que a esquerda ataca o capital privado com paixão equivalente? A resposta não está na psique norte-americana, mas nas estatísticas.

Os EUA estão em plena guerra de classes, mas não do tipo que se discute na grande imprensa. Os verdadeiros pobres – negros jovens, por exemplo, a maioria dos quais estão hoje desempregados – pouco têm a fazer nessa guerra. A maioria das grandes empresas também se mantêm à margem; negociarão a paz com o lado que vencer. Essa é guerra de vida e morte que se trava entre, de um lado, a classe média que produz e, de outro, os que dependem do estado.

A aversão que o movimento Tea Party manifesta contra qualquer tipo de gasto do governo é pura expressão racional de autointeresse, como já vimos acontecer na história dos EUA. Como qualquer movimento novo, atrai muita gente que nada tem a ver, diretamente, com o movimento. Mas o fato de um movimento liderado por amadores continuar a ter tanto poder prova que há boas razões para que o Tea Party exista.

O Tea Party é movimento de uma classe média mais velha, mais bem educada e mais rica que a média, mas não é movimento que atraia os muito ricos – muito evidentemente ausentes naquelas fileiras. Aquela classe média sabe, por experiência pessoal ou familiar, que os impostos estão destruindo a classe média dos EUA. Aproximam-se do momento da aposentadoria e a maior parte de seu patrimônio está preso na casa onde vivem, como acontece com a grande maioria dos norte-americanos.

GRÁFICO 1: Valor da casa e percentual da renda líquida, por renda (2004)

Fonte: Federal Reserve
A carga tributária nos EUA distanciou-se drasticamente do governo federal, e mudou-se para estados e municípios, nos EUA. E os impostos sobre a propriedade pesam cada vez mais, na carga tributária total. Isso está matando o mercado imobiliário, setor moradias.

A arrecadação federal estacionou em 10% menos que o pico pré-crise, mas as arrecadações estadual e municipal não param de aumentar. Isso acontece, em parte, porque estados e municípios não podem contrair déficits de orçamento, diferentes do governo federal, e são obrigados a arrecadar para cobrir suas despesas, mesmo que cortem despesas. O emprego nos estados e municípios já caiu em mais de meio milhão, desde agosto de 1998, e as demissões continuam.

Mas grande parte dos gastos de estados e municípios são gastos ligados a programas federais, especialmente na área de saúde. Os estados recebem fundos em bloco do governo federal e, em troca, assumem a responsabilidade por garantir assistência médica e outros programas. E gastos não financiados só fazem empurrar os estados, cada vez mais, para problemas fiscais.

Gráfico 2: Arrecadação federal, por arrecadação estadual/local 

Census Bureau
Com a renda e as vendas deprimidas, os governos estaduais e locais dependem, mais que nunca, da arrecadação de impostos sobre a propriedade.

Gráfico 3: Impostos sobre a propriedade. % do total da renda de estados e municípios 

Fonte: Census, Case-Schiller 20 City Índex
A arrecadação de impostos sobre a propriedade continuou a subir, apesar de os preços das casas terem despencado no mercado. A avaliação local das propriedades caiu nos anos da bolha, mas não caiu de modo a refletir a queda de 40% no preço das residências.

Gráfico 4: Arrecadação do imposto sobre a propriedade, por preço das casas

Fonte: Census Bureau
O imposto sobre a propriedade subiu tanto que, hoje, um potencial comprador pagará tanto, em impostos sobre a propriedade, quanto em juros de hipoteca. (O juro de hipoteca é calculado à base da taxa atual de hipotecas, refletindo os custos para compradores potenciais, não para os atuais proprietários).

Gráfico 5: Impostos sobre a propriedade [em vermelho], por juros de hipoteca [em azul], em $US bilhões

Fonte: Census Bureau, Federal Reserve
Essa situação é surpreendente: no passado, os juros de hipoteca sempre foram duas ou três vezes o valor do imposto a pagar. Dito de outro modo, os custos combinados dos juros de hipoteca e dos impostos sobre a propriedade estão hoje próximos de um trilhão de dólares por ano, praticamente no mesmo patamar em que estavam no pico da bolha imobiliária. O aumento nos impostos sobre a propriedade apagou o impacto da redução dos juros e dos menores preços de mercado de moradias. Os dados de impostos sobre a propriedade incluem impostos comerciais e residenciais, sim, mas mais de 2/3 do total da arrecadação de impostos sobre propriedade correspondem à arrecadação de residências.

Isso explica por que a classe média compara a própria revolta à dos revolucionários norte-americanos que atacaram a empresa exportadora de chá East India Company no porto de Boston. A modesta riqueza que pouparam na casa em que vivem e como aposentadoria futura está em risco. Os ativistas do Tea Party parecem amadores, porque são recém-chegados ao mundo da política. Na maior parte, é gente que vivia calmamente, sem alarde, até que a crise chegou à porta de casa. Muitos fatores contribuíram para radicalizar a ação dessa parte do espectro político, mas os impostos os empurraram porta a fora.

No outro ponto extremo, temos os que dependem do estado. Nem todos são pobres. Como mostrou um estudo de 2011 da Heritage Foundation[1], o governo federal está pagando salários muito mais altos para trabalhadores da construção em projetos financiados pelo pacote de estímulos à economia de 2009, que os salários do mercado. A lei Davis-Bacon estipulou um piso arbitrário inferior ao piso do sindicato, e o governo Obama pagou de 30 a 60% acima dos valores de mercado, como favor aos sindicatos que o apoiavam.

Gráfico 6: Governo federal paga 30-60% acima dos salários de mercado da construção civil 

Fonte: Heritage Foundation 
À custa de inchar os orçamentos estaduais e municipais, criou-se uma nova espécie de pseudo classe média, dos trabalhadores que ganham mais de $100 mil dólares ao ano com algumas horas extras. A generosidade das pensões pagas pelo estado tornou-se escandalosa; a California Foundation for Fiscal Responsibility [Fundação California de Responsabilidade Fiscal] denunciou que mais de 6 mil funcionários aposentados do estado da Califórnia recebem pensões que ultrapassam os $100 mil dólares ao ano; cerca de metade são policiais, bombeiros e guardas penitenciários. Os estados não podem pagar por essa prodigalidade. O American Enterprise Institute calculou que os processos por não pagamento das pensões abusivas que estados norte-americanos podem vir a ter de pagar chegaria a $2,8 trilhões, considerado o atual estado de retorno dos investimentos.

Os sindicatos de funcionários públicos rodaram na onda do fim da bolha imobiliária, como outros proprietários, e governos locais os recompensaram com concessões insustentáveis, na forma de salários, pensões e benefícios de saúde. O poder político desses sindicatos cresceu muito, paralelamente ao poder de gasto dos estados e municípios. Hoje, os sindicatos de funcionários públicos são a espinha dorsal do Partido Democrata. Controlam os bancos de telefones das campanhas eleitorais, enchem os comitês de pesquisa eleitoral e vivem de convencer os eleitores a votar.

O risco de calote nas dívidas dos estados aumentou os custos dos empréstimos para muitos estados. Na Europa, o problema é Grécia, Irlanda, Portugal. Nos EUA, há 11 estados nos quais os déficits orçamentários ultrapassam 16% do orçamento total.

Gráfico 7: Estados dos EUA, com maiores déficits orçamentários 

Fonte: Center on Budget and Policy Priorities 

Bônus emitidos por estados e municípios dos EUA aproximam-se do ponto mais alto de risco de toda a história. O rendimento desses bônus não é taxado pelo governo federal, por isso o rendimento ajustado é usualmente 28% inferior ao de bônus comparáveis do Tesouro. Depois do ajuste, o Bond Buyer Index mostrou que os bônus municipais de 20 anos nos EUA pagavam apenas 35 pontos básicos (0,35%) acima dos bônus de 20 anos do Tesouro dos EUA. Hoje, pagam 230 pontos básicos, a mais. 

Gráfico 8: Rendimento de bônus municipais de 20 anos, por bônus municipais de 20 anos do Tesouro 
Yeld = rendimento / Spread = taxa de risco [linha preta]

Fonte: Bond Buyer, Federal Reserve

No pico da crise da dívida no início de 2009, a taxa de risco (ajustada conforme os impostos) estava em cerca de 400 pontos básicos – praticamente a diferença que há hoje entre as dívidas dos governos alemão e italiano. Os estados norte-americanos têm de reduzir seus déficits, ou o mercado se recusará a financiá-los.

Mas os governos estaduais e municipais, nos EUA, já exauriram sua base fiscal, e o aumento continuado dos impostos sobre a propriedade, com a queda vertiginosa dos preços das propriedades, manteve o mercado imobiliário em depressão muito maior do que as condições econômicas poderiam indicar. Aumentar ainda mais os impostos levará a menor arrecadação. 

De fato, o governo teria de taxar o capital privado, ou expropriá-lo, de facto ou de jure – por exemplo, estatizando bancos e orientando-os para financiar projetos considerados politicamente preferenciais, à moda das repúblicas de bananas da América Latina. 

Não sendo essa a solução, só resta renegociar as pensões e benefícios de saúde já prometidos aos sindicatos de funcionários públicos. 

Nos dois casos, as famílias que se sentiam confortavelmente instaladas na classe média e anteviam futuro confortável e seguro, veem-se, elas mesmas, à beira da calamidade. 

Durante os anos da bolha 1998-2007, quando os EUA importaram $6 trilhões de capital de fora, foi fácil. Quando todo o mundo mandou suas poupanças para os EUA, gente sem qualquer competência ou formação ou treinamento e com péssimos hábitos de trabalho podia pagar para morar em belas casas, gastar a rodo em férias caras, e receber (à custa do contribuinte) gordas aposentadorias. Por que os norte-americanos contavam com viver bem para toda a eternidade, contando com a prodigalidade de investidores estrangeiros, não é problema para economistas: é problema para psiquiatras. 

A crise trouxe à tona, em movimento político, a classe média exasperada – o movimento Tea Party. Apagou do quadro a imagem dos sindicatos de funcionários públicos como defensores de causas progressistas, e os expôs como “a aristocracia do trabalho” (expressão de Marx), parasitando as rendas públicas. 

Tudo isso favorece inerentemente o Partido Republicano. A dívida – nome de fantasia para a insuportável carga tributária – tornou-se assunto batata-quente para muitos Democratas. Mas as próximas eleições serão disputadas muito mais desesperadamente, muito mais imundamente, que qualquer outra em que se possa pensar, no século passado. Será guerra para não morrer, guerra de sobrevivência política para a classe média norte-americana. Se os sindicatos do governo caírem durante o combate, o Partido Democrata de Barack Obama deixará de existir na forma que existe hoje. Isso, sim, pode ser bom resultado para os EUA.

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Nota dos tradutores

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