domingo, 11 de novembro de 2012

A CEIA DOS CARRASCOS


11/11/2012, enviado por Raul Longo

Enquanto os criminosos da ditadura militar continuarem se banqueteando, os condenados ao atraso, a classe média brasileira, não deixarão essa ceia autofágica.

Raul Longo
Houve tempo de se dar o direito de escolher a última refeição aos condenados à execução. Mórbida tradição que talvez ainda se mantenha em países humanamente atrasados onde, até hoje, se aplicam penas de morte.

Mas há dos mais atrasados ainda, onde aos condenados não se dá direito algum e se os mata sem qualquer julgamento, apenas com a desculpa de que é matando que se mantêm a ordem.

Isso de atraso humano não é particularidade de país algum, mas de períodos da história mesmo de nações consideradas mais notáveis e evoluídas em determinados aspectos. Como o Japão, por exemplo. Difícil imaginar que aquele país hoje tecnologicamente tão desenvolvido, tenha promovido tamanhas barbáries ao invadir a China.

A Alemanha é exemplo ainda mais gritante: berço dos maiores pensadores da alma e do comportamento das sociedades humanas, foi a responsável por um dos mais bárbaros períodos da história da humanidade.

Não se justifica incriminar os povos por estes lamentáveis momentos. Foram levados à barbárie por aqueles que então detinham o poder sobre suas instituições. O resultado dessa errônea premissa de julgamento é sempre o mesmo: preconceito.

Ontem mesmo participei de um diálogo que ia se descambando por aí. Começou com a lembrança do nazismo germânico, para grande incômodo do casal de brasileiros que tanto exaltava a cultura ocidental do hemisfério norte e com pessoal orgulho e vaidade nos proferiam como sub-raça. Não estou inventando! Foi exatamente isso o que deles ouvi.

Gotham City (não confundir com São Paulo)
Com muita dificuldade eu tentava suportar a conversa e para amenizar lembrei que pessoas de índole perversa como os executores dos pais de família na guerra cotidiana de São Paulo, existem em todos os países. Antes já havia provocado certo mal estar ao lembrar que, hoje, o governador daquele estado é o mesmo de quando sequestraram a Gotham City brasileira e sem Batman. Tergiversaram e não fui atrás. Deixei pra lá, mas a incapacidade de raciocínio da classe média é insistente e quando retornaram ao assunto para nos apontar como subcultura periférica, lembrei dos estupros coletivos praticados pelos europeus da Bósnia. Quiseram escapar pela multiplicidade étnica e religiosa dos antigos iugoslavos e suas reminiscências orientais, me obrigando a reportar ao exemplo do IIIº Reich.

O mestre dos MILICANALHAS
Condenavam a eugenia nazista quando, para meu espanto, arrematam com a brilhante conclusão que tudo aquilo foi um lamentável desvio provocado pelo condicionamento do povo germânico que não é uma sub-raça como nós, os brasileiros.

Num inaudito e desusado esforço de contemporização procurei manter a tese de que os seres humanos são todos iguais, mas me desmentiram, demonstrando que a classe média brasileira é mesmo um caso a parte, ao se enveredarem em lembranças e descrições de barbáries cometidas nos conflitos entre as etnias africanas. Tentar demonstrar-lhes que a manutenção daqueles conflitos interessa aos do hemisfério norte que tanto admiram iria me dar muito trabalho e apenas somei aos exemplos uma breve citação sobre o genocídio de palestinos pelo estado sionista de Israel.

Salvadora lembrança que pôs fim a conversa antes que me fizessem perder a paciência já de per si reduzida, mas retomo aqui como exemplo de que isso de barbárie é mais coisa de condicionamento de massas por sistemas de poder, do que das índoles dos povos e muitas vezes até mesmo das instituições de poder. Portanto, só há uma forma de combater a barbárie e promover a evolução da civilização: condenando aqueles que a estimularam e praticaram em períodos que por algum meio foram alçados ou ilicitamente ocuparam esse poder, pervertendo-o.

No entanto, a questão que se me suscita ao receber por um desses acasos internéticos o desabafo do obscuro carrasco Brilhante Ustra, é sobre qual seria a função do ritual da última refeição do condenado.

Brilhante Ustra
Pergunto-me se seria provocar a reflexão do criminoso sobre tudo o que perdeu por não reconhecer a humanidade de seus semelhantes? Enquanto mastiga e saboreia os últimos bocados de um prato de sua preferência, obrigá-lo a avaliar todos os outros sabores e prazeres da vida que se lhe tornou imerecida por sua miserável existência?

Se não for para isso, esse ritual é injusto com as vítimas desses criminosos, pois aquelas não tiveram direito de pedido algum. Torturadas, violentadas, seviciadas, executadas sem qualquer rito e o mínimo de humanidade.

E o banquete descrito pelo Brilhante Ustra, o que é? O que é essa confraternização de carrascos?

Não foram condenados à morte, pois não há mesmo que se igualar à desumanidade representada em suas existências, mas o grande risco de mantê-los impunes se denota na própria displicência do coronel ao se referir sem o menor constrangimento aos adultos, mulheres e crianças que fez suas vítimas. Aquela frieza de criminoso que provoca engulhos em magistrados sérios.

Exatamente como os carrascos julgados em Nuremberg, Ustra alega ter cumprido ordens. Mas em uma coisa ele está certo, não pode nem deve ser o único a ser julgado pelos crimes cometidos naquele período de barbárie da história brasileira.

MILICANALHAS escondem seus crimes
Claro que também não se pode julgar toda a instituição que fraudaram. O Exército Brasileiro, em verdade, também foi vítima daquelas mentes doentias que então subverteram as funções e a razão da existência da instituição. E o Exército Brasileiro tem uma imagem, um histórico que não pode ser enlameado por elementos que espuriamente o comandaram escrevendo o mais execrável período de sua história.

Ponderando essa evidência, considerando quão injusto e inócuo seria tornar o Brilhante Ustra em bode expiatório, creio ter descoberto uma função para a ceia dos carrascos, descrita por um deles, inclusive citando nomes de alguns presentes. É como naquelas festas promovidas pelos chefes do tráfico, onde a polícia filma e depois sai catando um a um. Afinal, conviva de confraternizações de criminosos é o que? Tá fazendo o que ali?

A ceia dos carrascos é uma ótima oportunidade para o Exército Brasileiro resgatar a imagem da gloriosa instituição. Mas claro que tudo dentro de padrões civilizados e sem repetir a barbárie, pois seria tão arriscado quanto manter a impunidade desses comensais subversores da ordem que com tão mal exemplo ainda hoje impedem o progresso mental da classe média brasileira que gosta de parecer que pensa, mas não consegue nem reconhecer o absurdo em condenar o mito da supremacia racial germânica e ao mesmo tempo se auto-classificar como sub-raça.

Enquanto os criminosos da ditadura militar continuarem se banqueteando, os condenados ao atraso, a classe média brasileira, não deixarão essa ceia autofágica.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Registre seus comentários com seu nome ou apelido. Não utilize o anonimato. Não serão permitidos comentários com "links" ou que contenham o símbolo @.