19/11/2012, Ramzy Baroud,
Asia Times
Online
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Ramzy Baroud |
Apareceram
muitas e muitas frases para explicar o mais recente massacre israelense contra
Gaza, de já fez legiões de mortos e feridos. O primeiro-ministro israelense
Benjamin Netanyahu estaria flexionando os músculos, em preparativos para as
próximas eleições gerais em janeiro, disseram alguns. É o modo de Israel testar
o novo governo egípcio, comentaram outros. Seria dura mensagem ao Irã, ensinavam
uns poucos. Ou Israel estaria simplesmente testando sua capacidade de
“contenção”. E assim por diante.
Mas
há mais a dizer, além dessas análises prêt-à-porter. Já lá se vão quatro
anos, desde que Israel embaralhou as cartas, no mais recente show de
força. Daquela vez, em 2008-9, foram 22 dias de guerra batizada de “Operação
Chumbo Derretido”. Na ocasião, Israel matou mais de 1.400 palestinos e feriu
mais de 5.000. Excluindo-se os apoiadores de linha mais dura de Israel, o
consenso, que incluiu muitas organizações da ONU e outros grupos de direitos
humanos, dizia que Israel cometera crimes de guerra e crimes contra a
humanidade, e que merecia enfrentar tribunais internacionais e pagar pelo que
fizera.
Claro
que nada disso aconteceu. O governo dos EUA e a imprensa-empresa construíram
escudo impenetrável a separar os crimes de guerra atribuídos a Israel e os que
se atreveram a fazer as acusações. Quatro anos depois, pouca coisa mudou. Então,
como hoje, Israel entrava em período pré-eleitoral e, dado que a “segurança” á a
única estratégia de Israel tanto para políticas nacionais como internacionais,
Israel, mais uma vez, deu-se conta, repentinamente, de que Gaza implicaria
“ameaça à segurança”. Assim sendo, teria de ser suprimida ou, no mínimo, teria
de tomar uma lição.
Não
fez qualquer diferença que estivesse sendo negociada uma trégua, já praticamente
acertada; que Israel tenha atacado primeiro, em clara provocação, como se
pedisse que as facções palestinas retaliassem. Imediatamente depois do primeiro
ataque, a retaliação já estava sendo apresentada como ato original de agressão,
“versão” fielmente confirmada por todas as empresas-imprensa ocidentais.
Em
2008, Barack Obama acabava de ser eleito e o governo Bush, em seus últimos dias,
escapou praticamente de qualquer “envolvimento’, não fosse a incansável
repetição de que Israel teria direito de defender-se contra hordas de palestinos
terroristas e tal, e tal, a conversa de sempre. Naquele momento, houve quem
sugerisse que a Operação Chumbo Derretido seria um balão de ensaio para testar
Obama, que Israel sempre viu com muita desconfiança apesar das muitas reuniões
entre Obama e o lobby israelense, que Obama usou para convencer Israel
que, embora tivesse um “Hussein” no nome, jamais se atreveria a pedir contas a
Israel.
Obama
acabou por corresponder às expectativas israelenses e, apesar de um ou outro
soluço eventual em suas relações, o novo governo foi praticamente idêntico a
todos os governos que o antecederam. No governo de Obama, Israel continuou a ser
prioridade absoluta para a diplomacia, as políticas e as ajudas militares e
financeiras dos EUA. Nem assim Israel deu-se por satisfeita.
Analistas
políticos citam alguns incidentes que induziram Netanyahu a absolutamente não
confiar em Obama, e desde o primeiro momento. Obama começou o governo mandando
um enviado de paz ao Oriente Médio, e queria que Israel voltasse a se dedicar ao
chamado “processo de paz”. Pior, mais perigoso ainda, que isso, Obama falou sem
meias palavras sobre a necessidade de congelar a construção de colônias nos
territórios palestinos ocupados, como primeiro passo indispensável antes de
voltarem todos à “mesa de negociações”. Até a secretária de Estado Hillary
Clinton, que entende bem a importância do apoio de Israel para o futuro de
qualquer político norte-americano ambicioso, falou com clareza, sobre as
colônias ilegais: o presidente Obama, disse ela: “quer ver uma parada nas
colônias – nada de só algumas colônias, nada de postos avançados, nada de
exceções de ‘crescimento natural’.”.
Polêmica capa da New York Review |
Aos
poucos, essa posição também enfraqueceu, ou se converteu, de fato, no oposto
dela mesma. Com o passar dos meses e anos, o governo Obama recuou para a zona de
conforto da vela política externa dos EUA para Israel: dar, dar, dar
generosamente (mesmo em tempos de grave recessão econômica), e nada esperar em
troca; e, regra geral, sempre, não fazer perguntas. Nem isso bastou para aplacar
governo que tudo exige para si, como o de Netanyahu.
O
primeiro-ministro de Israel já enfrenta problemas que cheguem, só de pensar que
o apoio visível que deu ao candidato Republicano, Mitt Romney e a arrogância
(marca registrada de Netanyahu, que não consegue conter-se e vive a tentar dar
aulas a Obama sobre o Irã), podem vir a custar-lhe caro no próximo mandato de
Obama. Não que Obama tenha dado algum sinal menos entusiástico de seu empenho em
continuar a apoiar Israel. A questão é que o governo israelense teme que o
governo dos EUA possa deixar de adotar os interesses da política externa de
Israel como se fossem interesses dos EUA, como verdadeira doutrina
norte-americana (o que tem sido feito sempre, ou, pelo menos, há muitos anos).
Sheldon Adelson |
Horas
depois de os resultados oficiais das eleições apontarem Obama como o novo
presidente dos EUA, a imprensa israelense começou a lamentar a falta de
temperança do primeiro-ministro. Os jornais expunham manchetes como “Desculpe,
presidente Obama! Por favor, perdoe Netanyahu” (Haaretz) e “Bibi perdeu,
nós teremos de pagar” (Yedioth Ahronoth) viraram lugar comum em Israel. A
derrota de Romney foi particularmente sofrida para Israel, porque, pela primeira
vez, o poder do lobby sionista e seus infinitos milhões (dentre outros,
os milhões do magnata dos cassinos, Sheldon Adelson) não conseguiram determinar
o resultado eleitoral, não, pelo menos, a ponto de fazerem o presidente.
Verdade
seja dita, Obama não é impopular só entre as elites israelenses; também é
detestado entre os israelenses médios. “De todo o planeta, Israel é o único país
no qual Romney venceria eleição presidencial contra Obama” – informou a rede
ABC; disse também que, em Israel, Romney venceria por
larga margem.
Nascia
o dia, na manhã daquela 4ª-feira, 7/11, em Israel e nos Territórios Palestinos
Ocupados, quando se divulgaram os resultados finais oficiais. O gabinete
israelense entrou imediatamente em ação; o exército de Israel imediatamente
deslocou blindados e soldados para as fronteiras de Gaza, para provocar os
palestinos.
Ahmad al-Nabaheen, assassinado por Israel |
Houvera
incidente anterior, dia 5/11, no qual um jovem aparentemente afetado de doença
mental, Ahmad al-Nabaheen, fora assassinado por soldados israelenses; o
incidente aumentou a tensão, mas, de fato, não chegou a abalar a trégua então
vigente. Mas dia 8/11, já não há como não ver que Israel ativamente procurava
seu casus belli: o exército israelense entrou em território de Gaza , com
tanques e helicópteros de ataque. Uma das primeiras vítimas foi um adolescente
de 12-13 anos, metralhado quando jogava futebol. Os palestinos retaliaram, mas
os foguetes lançados contra Israel não causaram dano nem vítimas. Um soldado
israelense foi ferido em área próxima da fronteira de Gaza e houve notícia de
troca de tiros entre combatentes palestinos e um jipe militar israelense, da
qual resultaram quatro feridos. Duas outras crianças foram mortas num campo de
futebol, dia 10/11, o que gerou nova retaliação, ainda contida, dos palestinos.
Mais um civil foi morto em Gaza no dia seguinte, quando Israel bombardeou uma
tenda montada para os serviços fúnebres e o funeral das vítimas mortas nos dias
anteriores.
Ahmed al-Jaabari |
Dia
12/11, o Egito estava concluindo mais um acordo de trégua entre Israel e grupos
da resistência palestina. Em seguida, tudo virou grave embaraço diplomático para
o Egito, porque o negociador que aceitara os termos do acordo em nome dos grupos
palestinos, comandante do braço armado da resistência do Hamás, comandante Ahmed
al-Jaabari, foi, ele próprio, assassinado por um míssil israelense, assassinato
predefinido [orig. targeted assassination], dia 14/11.
Não
há outro significado a extrair do assassinato premeditado de Jaabari, se não o
fato de que Israel decidiu arrastar os palestinos para guerra total. Depois do
assassinato de Jaabari, muitos palestinos, a maioria dos quais civis, foram
mortos. Os palestinos recorreram a foguetes de mais longo alcance e
aproximaram-se de Telavive e dos arredores de Jerusalém. Registraram-se duas
vítimas fatais entre os israelenses.
A
obsessão dos israelenses com segurança muitas vezes, se não sempre, arrastou
Israel a situações em que os militares e o governo israelenses põem em risco a
segurança dos próprios israelenses... o que ajuda os militares e o governo a
“demonstrar” que os israelenses vivem sob grave ameaça e que, “portanto”, a
obsessão com segurança faz sentido...
Obama, subordinado da AIPAC |
Essa
estranha lógica é tão velha quanto o próprio estado de Israel. Mas o
timing da mais recente guerra inventada pelos israelenses contra Gaza,
exatamente como no caso da guerra de 2008-9, indica fortemente que o governo de
Israel, mais uma vez, quer impor a preocupação com a segurança de Israel como
principal obsessão do próximo governo dos EUA, já sobrecarregado de crises e
desafios. Nenhum governo nos EUA jamais se atreverá a começar o mandato em
situação de aberto confronto com Israel. Reza a sabedoria convencional em
Washington que, em tempos de guerra, Israel sempre tem razão, até quando não
tem, e raramente tem. Nem Barack Hussein Obama é suficientemente forte para
mudar essa verdade estabelecida.
“Condenamos
veementemente o fogo de artilharia de Gaza contra Israel” – disse Jay Carney,
porta-voz da Casa Branca. “Nada justifica a violência que o Hamás e outras
organizações terroristas empregam contra o povo de Israel”.
Bandeira do Hezbollah |
Então...
agora que Israel mais uma vez conseguiu impor a agenda de Israel como principal
item da agenda dos EUA, é chegada a hora de provocar mais e mais, e de ameaçar
mais e mais, também o Irã, o Hezbollah e seja lá quem for que Israel defina como
inimigo de Israel. Cada israelense morto será usado para “provar” a alegada
vulnerabilidade de Israel.
Os
palestinos mortos serão apagados ou, então, exibidos como troféus, a comprovar
que a direita que Netanyahu representa em Israel é guardiã efetiva, competente
para eliminar todos os que se atrevam a impor “ameaça existencial” ao estado
judeu. A verdade será, mais uma vez, esquecida, por
irrelevante.
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