sexta-feira, 16 de novembro de 2012

EUA defendem Israel: “Reunião de urgência do Conselho de Segurança da ONU”


16/11/2012, Vijay Prashad, The Real News Network, TRNN
 Vídeo-entrevista traduzida pelo pessoal da Vila Vudu


JESSICA DESVARIEUX (produtora da TRNN): Bem-vindos à The Real News Network. Sou Jessica Desvarieux, em Baltimore.
Semana muito importante para a ONU e os EUA. Temos hoje conosco Vijay Prashad, professor de Estudos Internacionais no Trinity College em Hartford, Connecticut. Dentre seus livros mais recentes estão Uncle Swami: South Asians in America e Arab Spring, Libyan Winter. Vijay é colaborador regular das revistas Frontline eCounterPunch. Obrigada por nos receber, Vijay.

VIJAY PRASHAD: Obrigado a vocês.

DESVARIEUX: Então, Vijay, fale-nos sobre a reunião do Conselho de Segurança da ONU, que aconteceu dia 14/11.

PRASHAD: Dia 14 de novembro, à noite, os representantes de Marrocos e do Egito convocaram uma reunião de emergência do Conselho de Segurança da ONU para discutir o ataque israelense contra Gaza. Você sabe, a questão de Gaza é sempre sensível. Houve várias discussões na ONU, não só sobre Gaza, mas também sobre a política das colônias de Israel na Cisjordânia. Recentemente, dia 6/11, houve uma reunião importante, na qual a ONU alertou Israel sobre o que foi apresentado como flagrante violação em áreas cultivadas na Cisjordânia. Você sabe, Israel iniciou e, de fato, nunca parou, de arrancar oliveiras, mas, dessa vez, a ação aconteceu em época de colheita das azeitonas. Quero dizer: a ONU várias vezes tentou levantar questões sobre a ação dos israelenses nos Territórios Ocupados e em Gaza.

Fato é que essas áreas estão sob ocupação israelense. Não há nação palestina soberana. Gaza não tem soberania. Não existe Gaza soberana. Assim, quando o ataque acontece contra Gaza, não se trata de um país atacando outro país ou em disputa contra outro país. O que há ali é uma potência ocupante que usa força desproporcional contra uma região mantida sob ocupação desde 1967.

Hardeep Singh Puri
Nesse contexto, Egito e Marrocos e outros países convocaram uma sessão de emergência do Conselho de Segurança. Nessa sessão de emergência, vários países, os 15 membros do Conselho, dessa vez, todos disseram que alguma coisa tem de ser feita. O presidente do Conselho de Segurança, atualmente, é o representante da Índia e membro permanente, Hardeep Singh Puri. Depois da reunião, ele disse que houve unanimidade no Conselho de Segurança, que todos concordam que é preciso fazer alguma coisa, que a situação dos palestinos é atroz.

O problema foi que não houve acordo sobre o que fazer. E o Conselho de Segurança ficou paralisado. Em outras palavras, a maioria dos 15 membros disseram que Israel tem de ser condenado por usar força desproporcional, não só pelo assassinato premeditado de membros do Hamás, mas, também, pela prática de bombardear estações de tratamento de água e outras instalações indispensáveis à sobrevivência da população palestina. O que uma estação de tratamento de água em Khan Yunis teria a ver com foguetes lançados de Gaza, contra Israel? Por que destruir uma caixa d’água? As questões levantadas lá foram desse tipo.

Susan Rice
Mas os EUA bloquearam qualquer tentativa de tentar redigir algum tipo de Resolução. A embaixadora Susan Rice insistiu e deixou bem claro que os únicos culpados de tudo são os membros do Hamás, não o governo de Israel.

É muito estranho, porque ela fala do conflito como se fosse guerra entre dois governos, entre dois Estados soberanos e, portanto, a ONU teria de interferir e condenar os dois “estados”. O que ela quer é alguma espécie de “proporcionalidade” na condenação, apesar de todos saberem que se trata de guerra fundamentalmente desproporcional. Isso, aliás, foi o que disseram s representantes do Egito.

Mas Susan Rice segue uma doutrina criada em 2002, chamada de “Doutrina Negroponte”. Leva o nome do embaixador John Negroponte, o qual, quando estava na ONU, estabeleceu bem claramente que os EUA sempre bloqueariam qualquer ação da ONU que implicasse qualquer tipo de crítica a Israel. Essa posição é conhecida como “Doutrina Negroponte”. E desde 2002, de fato desde antes de 2002, isso é exatamente o que os EUA fazem.

Sempre que houve qualquer tentativa de censurar Israel, fosse pela invasão do Líbano em 2006, pela Operação Chumbo Derretido contra Gaza em 2009, ou agora, dia 14 de novembro, pela Operação Pilar de Nuvens, que depois passou a ser chamada Pilar de Defesa, [1] em cada momento desses, os EUA bloquearam qualquer possibilidade de discussão séria sobre a ocupação israelense de terras palestinas e sobre a violência dos ataques israelenses – os jatos F-16s, os helicópteros Apache, violência sempre altamente desproporcional.

A verdade é que, quando se fala em “foguetes” palestinos, fala-se de canos de chumbo disparados pela combustão de um produto feito com esterco; e a bomba propriamente dita é feita de TNT e ureia, quer dizer, de mais esterco. Nada disso se compara aos jatos F-16 super equipados, à frota de barcos de guerra atracados ao largo e que bombardeiam Gaza, ou aos helicópteros Apache.

Fato é que a reunião do Conselho de Segurança deu em nada, porque a reunião foi paralisada. É importante lembrar os discursos moralistas da Embaixadora Susan Rice, quando russos e chineses bloquearam a resolução que os EUA desejavam ver aprovada, em fevereiro de 2012, contra o governo da Síria. Ela esbravejava que o sangue derramado na Síria estaria manchando as mãos de chineses e russos. Se se acredita nela, pode-se dizer que o sangue derramado em Gaza a partir de 14 de novembro mancha, hoje, as mãos do governo Obama. Parece-me muito grave, mas, de fato, é raciocínio que os EUA inventaram.

Comandante Ahmed al-Jaabari, do Hamás, ferido, 14/11/2012 
(Haaretz, Israel)
DESVARIEUX: Vijay, e sobre o líder do Hamás que foi assassinado? A mídia o apresenta como comandante militar, Ahmed al-Jaabari. Você tem melhor informação, de fontes que não sejam norte-americanas?

PRASHAD: Não há qualquer dúvida de que Jaabari era comandante da ala militar do Hamás. Isso é verdade. Mas muito mais importante é uma matéria publicada dia 15 de novembro, matéria de capa do jornal Haaretz  [2], que é jornal liberal publicado em Israel, em que se diz que, algumas horas antes de ser assassinado, o comandante Jaabari recebera a mais recente versão de um documento a ser negociado, o que sugere que o Hamás e alguns setores do governo de Israel já estavam em negociações por canais paralelos ao governo de Netanyahu, para construir um acordo de paz.

Ahmed al Jaabari
A matéria do Haaretz foi a primeira vez que ouvi falar sobre essa negociação “paralela” é um desenvolvimento, de fato, surpreendente. Se o comandante Jaabari estava, de fato, trabalhando com vistas a algum tipo de acordo de paz e nesse preciso momento é assassinado pelo governo Netanyahu... o que se deve pensar sobre a seriedade ou sobre a confiabilidade de quem quer que, dentro do governo israelense, estivesse negociando alguma paz com o Hamás?

Deve-se lembrar também que, em 2006, quando o Hamás venceu as eleições no setor Gaza dos Territórios Palestinos Ocupados, quando o Hamás foi eleito, o líder do Hamás escreveu ao presidente George W. Bush dos EUA e declarou que o seu grupo estava pronto a assinar uma trégua com Israel, desde que Israel devolvesse os Territórios Ocupados e retornasse às fronteiras de 1967.

Na mesma carta, tratou-se também de outros assuntos. E aquela carta, que era simples movimento para começar a abrir negociações, jamais obteve resposta. O governo Bush jogou a carta no lixo e declarou o Hamás “organização terrorista”. Esses fato, a carta sem resposta, de 2006, e, se é verdade que o comandante Jaabari estava trabalhando em algum tipo de negociação de paz, e é assassinado... Tudo isso obriga a desconfiar muito da honestidade dos EUA como negociadores; e obriga a desconfiar também de qualquer suposta agenda de paz que envolva Israel. De fato, tudo isso mostra que Israel não tem interesse algum em fazer paz alguma com o povo palestino, e só se interessa por manter a atual ocupação, sempre modificando os fatos em campo, sempre sufocando Gaza, até que, como por milagre Israel consiga fazer sumir o problema palestino...

DESVARIEUX: Vamos continuar cobrindo os eventos na Palestina, pelo The Real News. Muito obrigado, Vijay, por nos receber.



Notas dos tradutores
[1] Sobre o nome que Israel deu à operação de ataque contra Gaza, ver 16/11/2012, “O fanatismo religioso de Israel”.
[2] 15/11/2012, Haaretz, Israeli peace activist: Hamas leader Jabari killed amid talks on long-term truce[Líder do Hamás assassinado no início das negociações para uma paz de longo prazo].  

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