Publicado
em 06/11/2012 por Mário Augusto
Jakobskind*
Quando
se fala em torturas e assassinatos ocorridos nos anos de chumbo no Brasil e em
outros países do Cone Sul não se pode esquecer do local onde centenas de
militares brasileiros foram treinados por oficiais estadunidenses. A referência
é a Escola das Américas, que funcionava no Panamá e hoje funciona nos Estados
Unidos. Em 2001, a escola, agora no Forte
Benning, na Geórgia, mudou de nome e país, passando a se chamar Instituto de
Cooperação e Segurança do Hemisfério Ocidental.
Para
se ter uma ideia, pela Escola das Américas passaram, entre outros, o general
chileno Manoel Contreras, que chefiou a polícia política da ditadura de Augusto
Pinochet e cumpriu até pena por assassinatos e torturas a presos
políticos.
Na
escola também conhecida como de assassinos, instrutores estadunidenses
adestrados para esse fim seguem ensinando a oficiais latino-americanos a melhor
forma de torturar. Só depois de 1996 o Brasil deixou de mandar militares
treinarem na escola de assassinos.
Nos
Estados Unidos, grupos progressistas que não aceitam como norma o ensino da
tortura a opositores realizam protestos na entrada de Fort Benning (foto). Este
ano está marcado para os próximos dias 16 e 18 de novembro novos protestos que
deverão contar com a participação de milhares de ativistas e religiosos, como
tem acontecido em outros anos.
Em
alguns países, entre os quais a Argentina, onde crimes contra a humanidade foram
cometidos, os responsáveis foram ou estão sendo julgados. Seria tema de pauta
saber quantos dos condenados passaram pela Escola das
Américas.
Não
se pode esquecer também que pelo menos desde 1996 foram tornados públicos
manuais utilizados na escola de assassinos que recomendavam a aplicação de
torturas, chantagens, extorsão e pagamento de recompensas por inimigos dos
regimes. O tempo passou e poucos anos depois se tornaram conhecidas as torturas
praticadas por militares estadunidenses no Iraque. Foram aplicados os mesmos
métodos que os da escola de assassinos que adestrou oficiais militares
latino-americanos.
Mesmo
o Brasil, deixando para trás o regime de exceção implantado no país depois de
abril de 1964, na Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN), os cadetes
continuaram a aprender nos currículos de formação as mesmas matérias do período
da Guerra Fria, que moldaram a mentalidade dos militares. Em 1964, por sinal, o
comandante da AMAN era nada mais nada menos que o então Coronel Garrastazu
Médici, imposto posteriormente à condição de Presidente da República e
responsável por um dos períodos mais duros em matéria de violência
institucional.
E
por incrível que pareça, os currículos praticamente não mudaram, tanto assim que
Médici já foi indicado como patrono de formandos da AMAN. Hoje, quando o Brasil
avança, (lentamente, mas avança) na área de direitos humanos, está na hora de
mudar os currículos e aprimorar na formação dos cadetes a questão dos direitos
humanos.
É
recomendação inclusive da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da
Organização dos Estados Americanos (OEA), aceito pelo Estado brasileiro, ampliar
o ensino dos direitos humanos no currículo de formação militar, conforme
previsão da Estratégia Nacional de Defesa.
Nesse
sentido, o Estado brasileiro se compromete a realizar estudo sobre a
possibilidade de firmar convênio de cooperação com o Instituto Interamericano de
Direitos Humanos, cujo objetivo é assegurar, através do curso de capacitação,
que a formação dos praças e oficiais das Forças Armadas do Brasil atenda aos
padrões internacionais de proteção de direitos humanos.
Marcio Lapoente da Silveira |
Todas
essas questões se devem ao acordo, mediado pela OEA, entre o Estado e a família
do cadete Marcio Lapoente da Silveira, morto na AMAN em 1992 quando participava
de exercícios. Lapoente sofreu violências por parte de um instrutor e morreu. A
família apelou para a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA, que
fez as recomendações para o Estado brasileiro.
Pelo
acordo foi fixada uma placa na AMAN em homenagem ao Cadete
Marcio Lapoente da Silveira e outros 22 cadetes mortos em
circunstâncias semelhantes na AMAN.
Militares
da reserva, os tais óleos queimados da história que a todo ano reverenciam no
Clube Militar o golpe civil militar de abril de 64, chegaram a lançar até nota
condenando a aceitação do acordo. As ameaças feitas contra o ato de grandeza do
Estado brasileiro só foram lidas por eles mesmos.
A
propósito do golpe de 64, já que neste momento se fala tanto em quadrilhas, ou
punir quadrilhas, como a do mensalão, não seria o caso de se condenar de fato os
remanescentes da quadrilha que tomou o poder a força há quase 50 anos e conduziu
o país a uma longa noite escura? Quando se fala nisso, os defensores da
impunidade lembram que os ministros do STF confirmaram a vigência da lei da
Anistia. No Chile, apesar da vigência da lei da anistia da época de Pinochet,
responsáveis por crimes contra a humanidade continuam sendo
julgados.
Em
tempo:
derrotar Mitt Romney será um alívio para toda a humanidade. Não é à toa que o
presidente Hugo Chávez declarou que se fosse norte-americano votaria em Barack
Obama.
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Mário Augusto Jakobskind* é correspondente no Brasil do semanário uruguaio
Brecha. Foi colaborador do Pasquim, repórter da Folha de São Paulo e editor
internacional da Tribuna da Imprensa. Integra o Conselho Editorial do seminário
Brasil de Fato. É autor, entre outros livros, de América que não está na mídia,
Dossiê Tim Lopes - Fantástico/IBOPE.
Enviado por Direto
da Redação
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