O conflito não começou com
foguetes lançados contra Israel
18/11/2012, Phyllis
Bennis , The Real News Network,
TRNN
Vídeo-entrevista traduzida pelo
pessoal da Vila
Vudu
JESSICA DESVARIEUX, produtora,
TRNN:
Bem-vindos à The Real News Network. Sou Jessica Desvarieux, em Baltimore.
Dia
14/11, o governo de Israel atacou Gaza, atando um dos comandantes militares do
Hamás. Para falar sobre isso, temos conosco Phyllis Bennis. Phyllis é diretora
do Novo Projeto Internacionalismo, do Instituto para Estudos Políticos
em Washington,
D.C. É autora de Before and After: U.S. Foreign Policy and
the September 11th Crisis, de Ending the U.S. War in Afghanistan: A
Primer,Understanding the U.S.-Iran Crisis: A Primer e
de Understanding the Palestinian-Israeli Conflict: A Primer. Obrigada por
nos receber, Phyllis.
PHYLLIS BENNIS: Ótimo. Obrigada pelo convite,
Jessica.
DESVARIEUX:
Por favor, Phyllis, qual sua opinião sobre o que acaba de acontecer em Gaza?
BENNIS: Acho que estamos assistindo a uma
grande escalada de Israel contra Gaza, em tudo semelhante à Operação Chumbo
Derretido, de 2008-9, que também começou imediatamente depois – então, foi a
primeira eleição – do presidente Obama, e antes de o presidente eleito tomar
posse, nos dois casos.
Agora,
vimos essa escalada gigante logo depois, dois dias depois de um cessar-fogo
negociado pelo Egito e que parecia aceito pelos dois lados. Mas Israel respondeu
ao cessar-fogo com o assassinato de um líder em Gaza, Ahmed al-Jaabari , o
qual, dentre outras coisas era, sim, comandante do braço militar do Hamás, mas
também, nos últimos anos, trabalhara como principal negociador com Israel e
negociou, dentre outras coisas, a libertação do soldado israelense Gilad Shalit, que o
Hamás capturara, em troca da libertação de mais de 1.000 palestinos que eram
prisioneiros em Israel.
Nesse
contexto, Jaabari negociava com vários intermediários, do movimento de
pacifistas israelenses e de grupos egípcios, e tentava construir um cessar-fogo
de longo prazo entre o Hamás e Israel. Jaabari estava nessa posição e – como já
aconteceu outras vezes, quando havia negociações em andamento entre israelenses
e palestinos, o governo de Israel respondeu à tentativa de acordo, assassinando
palestinos que trabalhavam para o acordo de paz.
Aconteceu
exatamente assim há vários anos, quando outro líder do Hamás foi assassinado em
Gaza enquanto analisava o texto de uma proposta de acordo de paz. Isso aconteceu
em 1996. Quero dizer: não há novidade.
É
preciso entender tudo isso no contexto da guerra de drones dos EUA e da
prática, já estabelecida no EUA, dos “assassinatos predefinidos”, assassinatos
de alvos predefinidos, “targeted assassination”. Torna-se ainda muito
mais difícil, para todos que trabalhamos para modificar essa política de
assassinatos na qual os EUA já se engajaram, agora, exigir que os EUA pressionem
Israel para que interrompam a prática desses assassinatos com alvo predefinido,
se se sabe, como sabemos, que essa prática, precisamente, é a principal política
dos EUA no Afeganistão, no Paquistão, no Iêmen, na Somália e, talvez,
em outros pontos.
Esse é um dos aspectos do que está acontecendo em Israel.
Outra
questão é saber quem responde a quem. A história, como você sabe, é sempre
predeterminada, desde os primeiros passos. Nesse caso, ouve-se falar muito –
toda a imprensa-empresa nos EUA diz a mesma coisa –, que Israel estaria reagindo
a foguetes disparados pelos palestinos: os palestinos lançaram foguetes, os
foguetes dos palestinos, sempre a mesma conversa; e que Israel estaria
respondendo. Só muito raramento há notícias sobre mortes entre os palestinos; a
imprensa só tem olhos e ouvidos para os foguetes palestinos e o dano que causam
em Israel; e o que fazem os palestinos.
No
caso atual, é verdade que, antes do assassinato de Jaabari, houve fogo
antitanque disparado por uma das facções de palestinos armados, contra um grupo
de soldados israelenses e vários deles foram feridos. A pergunta, nesse caso,
passa a ser: “Mas por que os palestinos atiraram contra o tanque israelense?”.
Na
segunda-feira passada, por exemplo, forças israelenses mataram um adolescente,
em Gaza, que se aproximou da cerca de fronteira. A família do menino e outras
testemunhas disseram que se tratava de deficiente mental, que não sabia onde
estava. Os israelenses alegam que lhe ordenaram que se afastasse da cerca. O
menino ou não ouviu ou não entendeu ou não prestou atenção, e os israelenses o
mataram. Noutro ataque, dois dias depois desse, na quinta-feira, os militares
israelenses mandaram tanques e um blindado para Gaza, em território ocupado, em
Gaza, e os soldados atiraram e mataram outro adolescente, de 13 anos, que estava
num campo de futebol, a cerca de 1.200 m , mais e 1 km de distância do ponto onde
estavam os soldados.
Isso
é o que acontece em Gaza, praticamente é a rotina, e ninguém parece dar qualquer
atenção. Só quando há uma grande escalada, quando Israel mobiliza uma grande
operação militar (ou, como nesse caso, quando os isrealenses assassinam um
comandante do Hamás), é que se vê alguma indignação e mais gente presta atenção
ao que acontece em Gaza.
O
que eu temo é perigo ainda maior que essa desatenção. Temo que o mundo comece a
discutir como se essa situação fosse alguma espécie de ‘nova normalidade’.
Israel reage assim, por essa ou aquela ração, e só se discutem as respostas de
Israel. Aos poucos, todos esquecerão que, ali, sempre e necessariamente a
questão central é a ocupação ilegal, por Israel, de terras palestinas. A questão
central é essa: a ocupação.
A
modalidade de ocupação em Gaza é diferente. Não há soldados israelenses em
campo. Os colonos e soldados israelenses retiraram-se, oficialmente, em 2005.
Mas a legislação internacional é muito clara: há ocupação quando um território é
controlado de fora para dentro, por governo externo. E essa, precisamente, é a
realidade em Gaza. Há ali uma modalidade bem clara de sítio; os militares
israelenses controlam as fronteiras, decidem quem pode entrar e quem pode sair,
que bens e produtos podem entrar ou sair, controlam o mar que cerca Gaza,
construíram muros de apartheid, controlam o espaço aéreo, bombardearam o
aeroporto, de tal modo que nenhum avião pode pousar em Gaza, impedem os
pescadores de Gaza de avançar, no mar, além de uma milha da costa – isso é
ocupação, em
formato diferente. E até que se compreenda bem essa realidade
de fundo, que é a raiz da violência que se vê hoje, ninguém terá condições de
trabalhar para pôr fim ao massacre dos palestinos.
Evidentemente,
a primeira coisa a fazer é impor um imediato cessar-fogo. Mas, a menos que se
compreendam com clareza que a base de todos os conflitos é a ocupação ilegal de
terras palestinas, nenhum cessar-fogo será estável ou duradouro.
DESVARIEUX:
Obrigada, Phyllis, por nos receber. O canal The Real News Network, TRNN continuará a
cobrir os conflitos em Gaza.
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