28/11/2012, Kaveh L
Afrasiabi, Asia Times Online
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Kaveh L. Afrasiabi |
NEW
YORK – Agora que a poeira de sete dias de guerra contra Gaza já baixou, vê-se
que a roda da fortuna geoestratégica da guerra girou, sem dúvida alguma, a favor
do apoio militar que o Irã dá ao Hamás.
Os
líderes israelenses podem falar o quanto queiram do pesado dano que teriam
infligido à capacidade de ataque do Hamás, fato é que Israel não alcançou seu
principal, quase único objetivo: comprometer a capacidade dos foguetes do Hamás.
É fato, sim, também, que o dano que tenha havido será rapidamente reparado pelo
Hamás, o qual, nos meses vindouros, poderá reabastecer e fortalecer seus
arsenais.
A
impressionante capacidade dos foguetes do Hamás, que resistiu à fúria de cerca
de 1.500 incursões dos jatos israelenses que bombardearam sem cessar área
densamente povoada, e o fracasso do “Domo de Ferro” de Israel, que não impediu
que cerca de 420 foguetes atingissem Israel, reflete o que está sendo chamado no
ocidente de novo “equilíbrio do terror”, denominação que já se afasta
consideravelmente da versão tradicional da supremacia militar de Telavive e
aponta para novas áreas de vulnerabilidade dos israelenses, as quais, por sua
vez, incidem de forma dramática sobre a posição anti-Irã, de Israel.
Ali Baqeri |
É
o que já se depreende da declaração de Ali Baqeri, subsecretário do Conselho
Superior de Segurança Nacional do Irã:
Se
o regime sionista já não tem condições para derrotar a Resistência na Faixa de
Gaza sitiada, é claro que, definitivamente, já não tem o que dizer, tampouco,
sobre a força e a potência da República Islâmica.
Sentimentos
semelhantes foram manifestados também pelos comandantes militares iranianos,
entre os quais o comandante dos Guardas Revolucionários, General Mohammad Ali
Jafari, que já admitiu publicamente que o Irã forneceu ao Hamás a tecnologia
para montar os foguetes Fajr-5, e que “os foguetes foram produzidos
rapidamente”.
Mohammad Ali Jafari |
“Se
a intenção de Israel ao provocar essa guerra foi usá-la como prelúdio para um
ataque contra o Irã, foi fracasso completo, principalmente porque a guerra
terminou com vitória do Hamás, do Irã e do Hezbollah [libanês], triunvirato de
poder que impõe hoje desafio formidável, em qualquer cenário de guerra contra o
Irã” – disse um professor de ciência política da Universidade de Teerã, que
pediu para não ser identificado.
A
impressão generalizada de que qualquer ataque de Israel contra o Irã é hoje
ainda menos provável do que no passado, como resultado direto da guerra de Gaza,
deve, com certeza, influenciar o clima de negociações entre o Irã e as nações do
grupo “5+1” – os membros permanentes do Conselho de
Segurança da ONU plus Alemanha – marcadas para breve.
A
“opção militar” que Israel usou para coagir o Irã na mesa de negociações perdeu
agora, embora pouco se fale sobre isso, grande parte da serventia prevista, o
que faz pesar a balança geral, consideravelmente, na direção de solução
diplomática.
“No
mínimo, o resultado favorável ao Irã, da Guerra de Gaza, implicou abertura mais
ampla da janela diplomática, o que se traduz em maior flexibilidade e maior
disposição, entre os governos ocidentais, para negociar e para ceder” – disse o
professor de Teerã.
Conversações
nucleares: estrada aberta à frente
Antes
da próxima rodada de conversações multilaterais, reuniões bilaterais entre o Irã
e a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), marcadas para a segunda
semana de dezembro em Teerã, podem preparar o caminho para uma modalidade de
“cooperação estruturada” que vise a resolver as questões invocadas no mais
recente relatório da AIEA, de novembro desse ano.
Yukiya Amano |
O
diretor-geral da AIEA, Yukiya Amano, já admitiu tacitamente que parte do
relatório de inteligência citado no “Anexo” do relatório que a Agência divulgou
em novembro de 2011 pode ser considerado ‘questionável’, posto que, como disse o
diretor-geral, “todo” aquele anexo é pouco confiável; em outras palavras, a AIEA
já sabe que nem todas as informações de inteligência que lhe foram encaminhadas
merecem ser tomadas como material confiável.
A
descoberta chave do mais recente relatório, divulgado no início desse mês de
novembro, é que os inspetores não encontraram qualquer tipo de prova de que o
material nuclear declarado esteja sendo utilizado para fins não declarados pelo
Irã – considerados os dados obtidos por todos os mecanismos de verificação,
inclusive inspeções anunciadas em prazo curtíssimo, amostras de material
recolhido no meio ambiente em períodos regulares de tempo e o emprego de câmeras
de vigilância em todas as praças de enriquecimento de urânio no Irã.
Outra
constatação chave é que o Irã já converteu alta porcentagem de seu urânio
enriquecido a 20% em bastonetes e placas de combustível, e mantém hoje limitada
em cerca de 110 kg a quantidade de material enriquecido – provável sinal de
boa-vontade, uma vez que o país não reabasteceu metade das centrífugas
instaladas na usina superprotegida conhecida como Fordo.
No
caso de as conversações Irã-AIEA mostrarem progresso real, como preveem
funcionários do governo do Irã, com certeza criar-se-ão condições de melhorar-se
o tom da conversa iraniana com os representantes dos “5+1” liderados pela secretária de
Relações Externas da União Europeia, Catherine Ashton, a qual, em recente
reunião em Bruxelas, destacou a importância de negociações diplomáticas
sustentadas.
Catherine Ashton |
A
questão, evidentemente, é de se os negociadores ocidentais estarão dispostos a
levar em consideração o fortalecimento da posição do Irã, resultado da Guerra de
Gaza, desenvolvimento que deve ter reduzido o ímpeto de ataque militar contra o
Irã. Se raciocinarem nesses termos e nessa direção, é preciso saber ainda como a
ideia traduzir-se-á em maior disposição a reduzir as sanções contra o Irã, em
comparação ao que se viu em rodadas anteriores, quando os governos ocidentais
recusaram-se a considerar qualquer abrandamento nas sanções, mesmo no caso de o
Irã concordar com suspender completamente o enriquecimento do urânio a 20%.
Hoje,
depois de três rodadas inconclusivas de negociações, no início de 2012, o
cenário parece preparado para que se cultive otimismo moderado em relação em
relação à próxima rodada. Outro desenvolvimento importante que afeta aquelas
conversações, também a favor do Irã, foi a decisão dos EUA de forçar o adiamento
da muito esperada conferência sobre um Oriente Médio livre de armas de
destruição em massa, prevista para acontecer na Finlândia.
Ali Asghar Soltanieh |
A decisão dos EUA, interpretada
por muitos como concessão a Israel – principal agente de proliferação de armas
de destruição em massa em todo o Oriente Médio –,
foi fortemente condenada pelo Irã e por vários países árabes, que denunciaram o
papel dúbio que os EUA desempenham, atentos, sempre, a excluir Israel de
qualquer tratado ou decisão antiproliferação de armas de destruição em massa. O
enviado do Irã à AIEA, Ali Asghar Soltanieh, criticou duramente os EUA sobre
esse tema; e Irã e Rússia uniram-se a favor de antecipar-se a data da
conferência do próximo ano, na Finlândia. [1]
Certamente,
na próxima rodada, o Irã e as nações do “5+1” muito terão a conversar sobre o
estimulante objetivo de implantar-se uma zona sem armas nucleares no Oriente
Médio – circunstância que muito favorece aos interesses do Irã, interessado em
destacar as intenções exclusivamente pacíficas de seu programa.
A
possibilidade de que o representante do Irã encontre, como parece afinal
possível, público mais receptivo na mesa de negociações, como acima se discute,
parece ser efeito, em não pequena medida, da guerra de Israel contra Gaza, que,
bem claramente, não levou a bons resultados para Israel.
Nota
de rodapé
[1]
Ver entrevista com o embaixador Ali Asghar
Soltanieh (9/6/2012, “Iran prepares for
Moscow”, Kaveh Afrasiabi, Asia Times Online, (em
inglês).
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