17/11/2012, Ahdaf Soueif, The Guardian, UK
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Israel é uma democracia cujos
políticos podem ordenar o assassinato de crianças, como “ferramenta” de campanha
eleitoral. Sempre, claro, crianças palestinas. Mas as multidões, em todo o mundo
árabe, não são racistas.
Ahdaf Soueif |
Protestos em Londres e em mais de
100 cidades em todo o mundo exigem o fim do ataque de Israel contra Gaza e o fim
do cerco.
Martírio
em Gaza:
Vídeo de um cineasta e ativista britânico, filmado na cidade de
Gaza
Sábado,
17/11, das 14h às 16h
Embaixada
de Israel em Londres (2 Palace Green)
London W8 4QB
SE
VOCÊ CLICAR AUDIOBOOS,
ouvirá os ataques de Israel contra Gaza.
Ouvem-se
as explosões, o zunido dos drones, a sirene das ambulâncias. É a trilha
sonora da vida dos palestinos nesse exato momento. Os sons estão sendo gravados
e retransmitidos e ouvidos em todo mundo. Todo o mundo
árabe está ouvindo. Todos os amigos de Gaza, em todo o planeta, tremem de
indignação. Gaza não está só.
Todos
passamos a noite lendo e repassando tuítes e distribuindo matérias de blogs de
jovens palestinos, em Gaza e em todo o mundo, e todos estamos vendo as imagens
que eles distribuem
Hisham Kandil |
Naquele
mesmo hospital Shifa
em Gaza,
hoje cedo, o Primeiro-Ministro do Egito, Hisham Kandil, pela primeira vez em 42
anos, estava onde os egípcios querem ver seu primeiro-ministro: solidário ao
povo palestino.
Pela
primeira vez em 42 anos, um representante do governo egípcio não mentiu ao falar
primeiro ao povo egípcio, antes até de se dirigir ao presidente do
Egito.
Antes disso, Mursi falara de “coordenar
a segurança” com Israel no Sinai; começou por fechar os túneis, que são o único
canal de sobrevivência para os que vivem sitiados em Gaza; rejeitou a propostas
de uma área de livre comércio na fronteira entre Egito e Gaza; e enviou um
embaixador a Telavive com uma carta
a Shimon Peres.
E assim se viu muito desconfortavelmente associado aos restos do governo Mubarak
e seus seguidores da ditadura militar.
O
pessoal da Fraternidade Muçulmana e seu partido Liberdade e Justiça muito se
empenharam em justificar as ações de seu representante no palácio presidencial,
ante o resto do país.
Progressistas
e todo o campo da esquerda no Egito zombaram do muito que eles falavam e do nada
que faziam para defender os palestinos ao longo dos anos em que viveram na
oposição, tanto quanto do espantoso silêncio que sobreveio, depois que chegaram
ao poder. Os muros e paredes do Cairo cobriram-se de grafitis que zombavam da
“carta de amor” que Mursi enviara a Peres. A zombaria que começou nos muros da
cidade alastrou-se online e na blogosfera.
Abdel Moneim Aboul-Fotouh |
Agora,
afinal, os próprios israelenses decidiram por Mursi. Agora, afinal, o presidente
do Egito poderá dar melhor sentido à sua presidência, mais sintonizada com o
desejo do povo egípcio.
Grandes
caravanas de jovens egípcios já marcham em direção a Gaza. Com eles
vai também minha sobrinha mais jovem. Toda a sociedade civil em todo o planeta
está mobilizada; já partiram vários barcos em direção a Gaza , civis
egípcios, de todo o país, estão em viagem para Gaza.
No
plano mais “oficial”, o governo egípcio já enviou médicos, enfermeiros e
remédios, que já chegaram a Gaza. Abdel Moneim Aboul-Fotouh,
que é médico e foi candidato a
presidência do Egito já partiu para Gaza
– como também fez em 2008,
durante a “Operação Chumbo Derretido”, muito antes de pensar em concorrer à
presidência do Egito. O Sindicato de Médicos Árabes já está organizando o
transporte de doações e de médicos voluntários para Gaza.
Israel
sempre tentou vender-se à opinião pública ocidental como se fosse a única
democracia, num mar de fanáticos. A Primavera Árabe desmentiu e destruiu essa
narrativa, talvez para sempre. Então os políticos israelenses passaram a
trabalhar a favor de uma guerra contra o Irã. E, enquanto esperam, entraram num
frenesi de assassinatos em massa em Gaza.
Se
Israel queria instigar violência crescente contra o próprio governo, não poderia
ter encontrado meio mais garantido do que assassinar Ahmed al-Jaabari,
comandante do Hamás que, pelos últimos cinco anos, trabalhou para impedir
ataques contra Israel.
Momento do assassinato de al-Jaabari |
Assassinado
o comandante Jaabari, imediatamente recomeçaram os ataques, exatamente o que se
vê agora.
Assim,
Israel supõe que possa sequestrar a narrativa da Primavera Árabe e fazer andar
para trás o relógio da história. Israel quer voltar ao tempo em que ainda havia
quem acreditasse em “terroristas islamistas versus israelenses
civilizados”. Simultaneamente, desviam o foco do morticínio na Síria e, claro,
ganham pontos para a política de linha duríssima de Benyamin Netanyahu e Ehud
Barak, em período de campanha eleitoral, em população anestesiada pela
propaganda.
De
fato, a única coisa que conseguiram foi expor ao mundo a prova definitiva de que
Israel é uma democracia em que os políticos podem ordenar o assassinato de
crianças, para vencer eleições. Sempre crianças palestinas, é claro.
Os
cidadãos do mundo já não se deixam enganar. Na 5ª-feira começaram protestos em
todo o mundo em defesa de Gaza.
Continuam na 6ª-feira e no sábado. E isso é apenas o começo.
Em
todos os países árabes nos quais a população levantou-se para exigir respeito
aos seus direitos, as multidões voltam às ruas para exigir respeito também aos
direitos dos palestinos.
A Tunísia já informou que seu ministro de Relações
Exteriores já está em
Gaza. Na Jordânia , hoje, centenas de milhares estão nas ruas e,
ali também, ao mesmo tempo em que exigem o fim da monarquia jordaniana, exigem
justiça para o povo palestino. Há protestos na Líbia. Do Egito já partiram
várias caravanas e outras preparam-se para partir para Rafah e, dali, para Gaza.
Essas
multidões em movimento carregam a verdadeira representação popular e manifestam
o desejo dos povos da região. Daqui em diante, os governos terão de trilhar o
caminho que está sendo aberto, hoje, pelos homens e mulheres que caminham rumo a
Gaza, para defender Gaza.
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