15/10/2013, Al-Manar TV, Líbano (trad. árabe-inglês de Sara Taha Moughnieh)
Traduzido para o português pelo pessoal da Vila Vudu
(...) Moussawi entende que o
período pré-Genebra-2 é mais importante que qualquer anúncio que se faça
durante a conferência, porque os resultados da conferência internacional já estão
sendo negociados hoje [outubro/2013, data desta matéria (NTs)], e a conferência será ocasião, apenas, para
divulgar o documento final e tirar fotografias para os arquivos.
Entreouvido na Tendinha do Oco do Mundo na
Vila Vudu: Pelo que se sabe
hoje, um mês depois desta matéria, dia 10/11/2013, a conferência Genebra-2 pode
ser ocasião também para que o mundo veja, bem exposta, a violência da entidade
sionista e o papel vergonhoso que a França de Hollande & Fabius faz hoje,
ante o mundo, como a última “aliada” que resta aos sionistas ocupantes.
Mapa político do Oriente Médio (clique no mapa para visualizar melhor) |
As
abordagens sobre a possibilidade de um acordo amplo na Região diferem entre os
analistas políticos. Alguns entendem que o curso dos eventos aponta para um
alívio, que resultará de acordos amplos a serem firmados, mas que demorarão até
chegarem à forma definitiva; um acordo que comece na Síria, para incluir
negociações de questões regionais, até que se possa considerar a possibilidade
de um pacote que trate do futuro da região; outros analistas preferem não se deixar
levar por excessivo “otimismo”.
O
telefonema de Obama a Rouhani
Todos os
analistas concordam que, à falta de qualquer acordo, a guerra é risco real,
guerra que várias partes regionais não se cansam de buscar. Ninguém nega que as
questões que estão começando a ser negociadas são, todas, extremamente
sensíveis.
Falando à
página Internet da rede Al-Manar, o analista político libanês Hussein
Khalil entende que as coisas caminham rumo a um impasse, porque as exigências
dos EUA não são itens que os iranianos considerem negociáveis. Khalil lembra
que os EUA insistem em dar prioridade à segurança da entidade sionista, em
todas as negociações regionais; mas, em todos os casos, para ele, Israel está
bem consciente de que o Irã tem mais capacidade para defender-se, do que a
entidade sionista ocupante, para atacá-lo.
Em outra
entrevista, o especialista libanês em assuntos da Turquia, Mohammad Noureddine,
lembra, com cautela, que a crise síria é sempre sujeita a surpresas, apesar de
todos os pontos importantes que o Exército Sírio continua a obter em solo; mas
há interferência de muitos elementos, internos, regionais e internacionais, o
que só faz aumentar a complexidade da questão síria.
Amir
A-Moussawi, especialista iraniano em questões estratégicas, considera que há
indicações de que as coisas encaminham-se para um possível acordo, apesar de
ainda haver questões pendentes entre a República Islâmica do Irã e os EUA,
porque o Irã negocia na defesa de seus princípios, e os EUA tentam defender a
liderança que lhes resta, no “eixo da arrogância global”.
“Abordagem”:
os EUA encaminham em direção ao Irã
“O
telefonema que sacudiu o Oriente Médio e os países que decidem pelo Golfo”, foi
o tema escolhido por Abdul Rahman
Al-Rashed, escrevendo no jornal Asharq Al-Awsat para comentar o
telefonema que o presidente Obama fez ao presidente do Irã, Sheikh
Hasan Rouhani. Para Rashed, esse telefonema foi, mais, um anúncio do início de
um movimento político, cujos resultados ainda não podem ser determinados.
O telefonema Obama - Rouhani |
O governo
dos EUA, que não conduz suas ações em termos de negociações, mas exclusivamente
a partir de “fatos em campo”, acabou por se convencer de que a única via que
lhe restava para arrancar-se do fracasso regional no qual naufragara, seria
através do Irã. Segundo matéria assinada pelo Dr. Hussein Khalil, isso
aconteceu porque o Irã tem ampla influência no Iraque e mantém boas relações no
Afeganistão. É o aliado n. 1 da Síria, que se manteve inabalável ante todos os
tipos de ataques globais, além de apoiar os movimentos de resistência que
mudaram as equações do poder no Líbano e na Palestina. Além disso, Teerã tem
sido acusada de estimular o caso dos houthis no Iêmen e tem simpatias pelas
demandas da oposição no Bahrain, num momento em que já há mais de dois anos, os
planos dos EUA-Ocidente para derrubar o governo sírio só conhecem derrotas e
fracassos.
Aiatolá Khamenei |
Quanto a
isso, os iranianos não exageram quando falam de “abordagem séria”: o ministro
de Relações Exteriores do Irã correu, imediatamente
depois do telefonema entre Obama e Rouhani, e disse que nada daquilo
implicava normalização de relações entre os dois países. Imediatamente, na
sequência, foi o Imã Khamenei, em declaração para reafirmar “que o governo dos
EUA não é interlocutor confiável e vive a quebrar promessas”, e que o povo
iraniano já provara sua firmeza na defesa dos próprios direitos e benefícios, e
na afirmação de seu desejo de coexistência pacífica.
Amir
Moussawi diz que a República Islâmica do Irã valorizou devidamente alguns
passos dados pelos EUA, como o presidente americano não ter assinado novas
sanções já aprovadas pelo Congresso sobre a venda do petróleo iraniano; e que
também apreciou a posição da União Europeia, que levantou as sanções contra
navios mercantes iranianos... Mas, mesmo assim, o Irã espera mais, depois que
manifestou sua disposição para cooperar plenamente com os estados do P5+1 na
discussão de seu programa nuclear.
O
especialista em assuntos regionais explica que as relações entre EUA e Irã
estruturam-se por dois eixos: posições e benefícios.
Entende que
o primeiro eixo está desativado, porque só leva a becos sem saída, porque nem o
governo dos EUA está preparado para abandonar a defesa dos interesses da
entidade sionista ocupante, nem o Irã abandonará a causa palestina e dos
movimentos de resistência. Assim sendo, as duas partes estão convencidas de que
qualquer entendimento possível terá de ser construído, antes, no eixo dos
benefícios para os dois países; e adia-se para depois disso outro entendimento
mais amplo. Por isso, Moussawi entende que o período pré-Genebra-2 é mais
importante que qualquer anúncio que se faça durante a conferência, porque os
resultados da conferência internacional já estão sendo negociados hoje [outubro/2013, data da matéria (NTs)], e
a conferência será ocasião, apenas, para divulgar o documento final e tirar
fotografias para os arquivos.
Visita de
Rouhani, como reconhecimento pela exclusão de Bandar e Faysal
Abdul Rahman Al-Rashed |
“Muitos dos
que esperavam pelos mísseis Tomahawk, como castigo ao governo sírio, e cartada
que poria fim ao enriquecimento de urânio pelo Irã, foram profundamente
abalados pelas notícias sobre o telefonema”. É a opinião do editor-chefe do
canal de notícias Al-Arabiya, Abdul Rahman Al-Rashed, em coluna
publicada no jornal saudita Asharq Al-Awsat. Para ele, “o telefonema”
abalou os centros decisórios no Golfo, na Jordânia, na Turquia, em Israel e
outros”.
Em seguida
surgiu a informação, revelada pelo Canal 2 israelense, de uma reunião
Golfo-sionistas, acontecida em Telavive. A informação foi depois confirmada,
quando a imprensa publicou os nomes da delegação do Golfo, que incluía: o chefe
da inteligência saudita Bandar Bin Sultan; o vice-presidente do Conselho
Executivo e Conselheiro Nacional de Segurança em Abu Dhabi, Hazza bin Zayed
Al-Nahyan; além do chefe da inteligência do Bahrain, general Adel bin Khalifa
Al-Fadhel, um dos funcionários da inteligência do Golfo que tem laços mais fortes
com o Mossad israelense.
Nesse
contexto, a recusa do ministro de Relações Exteriores saudita, Saud Al-Faisal,
que não leu seu discurso anual à Assembleia Geral da ONU, também foi
interpretada como clara mensagem de objeção contra o movimento dos EUA de se
aproximarem do Irã.
A posição
obcecada dos sauditas veio acompanhada de discussão sobre se o presidente
Rouhani aceitaria ou não o convite dos sauditas, que chegou dia 15/9, para que
viajasse à Arábia Saudita como peregrino. Adiante, o presidente declinou o
convite, sob o argumento de que qualquer atmosfera positiva que talvez se
criasse durante a visita seria imediatamente destruída pelas intrigas do chefe
da inteligência e ministro do Exterior saudita.
Em
entrevista à página Al-Manar na Internet, Moussawi também reconheceu que
qualquer abordagem Irã-sauditas resolverá muitas questões e ajudará a reduzir
as tensões sectárias na região. Mas lembra que o discurso moderado dos
iranianos jamais será aceito pelos sunitas mais linha-dura; assim, o valor de
troca a ser exigido para que essa aproximação se faça tem de ser a exclusão de
personagens como Bandar Bin Sultan e Saud Al-Faisal das negociações e dos
possíveis benefícios; para tanto, tratar-se-á de dar papel mais destacado aos
filhos do rei Abdullah, como os príncipes Mutaib e Abdul Aziz Bin Abdullah.
Bashar al-Assad |
O fracasso
do golpe atentado contra a Síria exige que Bandar seja aposentado
Os
iranianos têm hoje consciência clara da posição forte em que negociam, depois
do fracasso da conspiração contra a Síria, que não conseguiu derrubar o governo
do presidente Bashar Al-Assad. Além disso, a Síria vê hoje uma batalha entre
facções de uma “oposição” armada, sobretudo entre o chamado “Exército Sírio
Livre” apoiado pela Turquia e brigadas islamistas apoiadas pela inteligência
saudita. Aqueles combates expõem as diferenças que há entre Turquia e Qatar,
por um lado; e entre Turquia e Arábia Saudita, por outro.
Moussawi
sabe que o conflito entre grupos da “oposição” síria é mortal; e que a luta
entre eles é mais feroz e sem lei que os combates contra o Exército Sírio.
Além disso,
entende que a luta hoje, na Síria, trava-se para definir quem “representará” a
“oposição” nas negociações que virão; hoje, os sauditas assumiram o controle
sobre a “Coalizão Síria” presidida por Ahmad Al-Jarba, homem dos sauditas; o
que excluiu o homem do Qatar, Mouaz Al-Khatib.
Bandar Bin
Sultan supõe que quanto mais consiga “esmagar” o “Exército Sírio Livre” e
controlar os pontos de fronteira entre território sírio e territórios da
Turquia, Iraque e Jordânia, mais firmemente conseguirá manter-se como parte das
negociações.
As intensas
batalhas em solo e o controle das brigadas islamistas (Daesh, Islamic Army, Al-Nusra Front …)
confirmam a informação publicada pelo jornalista britânico Robert Fisk, sobre
conversas entre membros do “Exército Sírio Livre” e alta fonte muito próxima do
presidente Bashar Al-Assad, e de possíveis negociações entre o governo sírio e
o “Exército Sírio Livre” que acredita numa solução síria para a guerra. Essas
informações foram seguidas, imediatamente, por notícias de membros do ESL e de
facções turcas armadas que combatiam contra brigadas islamistas, que se renderam
ao Exército Sírio.
Bandar bin Sultan (E) de Saud al-Faisal (D) |
Os combates
mortais que se veem hoje acontecem porque nenhum dos dois lados conseguiu impor
a causa pela qual fizeram guerra contra a Síria, uma vez que nem o Exército
Sírio foi destruído, nem o presidente Assad foi deposto, nem a Síria desistiu
do apoio aos movimentos da resistência na região. Assim sendo, quem pagará o
custo do fracasso da operação para destruir a Síria?
Analistas
têm lembrado que o envolvimento da Arábia Saudita na crise síria vem reforçar a
influência de uma segunda geração que disputa o poder na Casa de Saud...
especificamente os filhos do príncipe Sultan Bin Abdul Aziz. Por isso os
combates se expandiram no cenário sírio, visando a alcançar também o Iraque e o
Líbano, na tentativa de pressionar os aliados da Síria a mudar a equação do
poder, antes de a guerra aproximar-se do fim.
Funcionários
sauditas engajados na crise síria, e os filhos do príncipe Sultan,
especialmente os que controlam o Exército e a Inteligência provavelmente
pagarão o preço do próprio fracasso, em benefício dos filhos do rei Abdullah e
príncipe Nayef… De sua parte, os iranianos apostam em mudanças dentro do reino,
depois da aposentadoria de Bandar Bin Sultan e do ministro Al-Faisal – que os
iranianos definem como “linha-dura”.
A Turquia
fracassou... e o Qatar está pagando a conta!
Mohammad Noureddine |
Quanto à
Turquia, o Dr. Mohammad Noureddine, especialista em assuntos turcos, entende
que a Turquia definiu como seu alvo, desde o início da crise síria, a deposição
do presidente Assad. Nesses termos, qualquer acordo que exclua a derrubada de
Assad marca claro fracasso da política turca.
O Dr.
Noureddine concorda com análises que veem a Turquia como um dos grandes
derrotados na região, especialmente depois da deposição do governo da Fraternidade
Muçulmana no Egito.
Falando à
página da Internet da rede Al-Manar, ele acrescenta que:
(...) o governo de Erdogan perdeu os curdos dentro
e fora da Turquia, por causa do apoio que deu aos militantes que combateram
contra os curdos na Síria. Também perdeu prestígio nos planos político, público
e social (na Síria, no Líbano, no
Iraque e no Irã) e perdeu a confiança
dos eleitores, que dificilmente recuperará.
Mas a maior
perda da Turquia, segundo o Dr. Noureddine, acontecerá se as repercussões da
crise síria invadirem pesadamente o território turco, “especialmente se a
Al-Qaeda e seus aliados escolherem lado, no confronto dentro da Turquia”.
Nesse
contexto, os analistas concordam que, em todo o projeto, o “maior perdedor” foi
o Qatar.
O Qatar recebeu uma tarefa, e quando não
conseguiu dar conta dela, sofreu o peso da derrota – diz o
analista político libanês Hussein Khalil.
Toda a
derrota do ocidente e dos EUA foi empurrada para cima do Qatar e, na sequência,
os EUA tentaram desvencilhar-se das políticas que o Qatar praticou. O
ex-Conselheiro Especial do Departamento de Estado dos EUA, Jeremy Shapiro, escreveu
na revista Foreign Policy:
O pequeno mas ambicioso emirado do Golfo
tentou usar sua imensa riqueza de petróleo para financiar a armar guerras civis
na Líbia e na Síria, apoiar o Hamás em Gaza, e mediar disputas no Sudão e no
Líbano. Algumas vezes seus interesses coincidem com os interesses dos EUA – mas
na maioria das vezes, não coincidem.
Na
sequência, Shapiro lembra também que:
Tamim [Tamim bin Hamad bin Khalifa Al Thani,
Emir do Catar] é considerado um dos
arquitetos da política do Qatar para a Líbia e a Síria nos últimos dois anos,
incluindo o patrocínio que dá à Fraternidade Muçulmana.
Jeremy Shapiro |
Hoje, o
fracasso dos EUA está sendo impingido ao Qatar. É o que Shapiro sugere bem
fortemente, ao dizer que o governo dos EUA quer minimizar a influência do Qatar
na Síria, dando mais peso ao papel dos sauditas. O analista insiste na
importância de que o reino receba a oposição qatari e as vozes dissidentes que
não reconhecem a legitimidade do atual regime.
Shapiro
indicou também que:
(...) o governo dos EUA pode sugerir que
universidades e think tanks convidem membros de ramos colaterais da
família Thani, que fazem oposição ao emir e ao seu ramo familiar, para eventos
nos EUA e em outros países, para expor as fraturas ou, pelo menos, para
sinalizar que conhece as fraturas que há no interior da família reinante.
E mais:
Os EUA devem considerar a ideia de uma
campanha sistemática para divulgar as condições deploráveis em que vivem um
milhão de trabalhadores migrantes, no Qatar. Essa publicidade negativa também
abalaria a reputação do Qatar, sensível sobretudo agora, quando se prepara para
sediar a Copa do Mundo de 2022.
O Qatar
sabe perfeitamente que é a carta mais fraca, que o ocidente queimará em
qualquer acordo futuro. Tanto sabe que, segundo várias fontes, já começou a
propor novas políticas para a região. Por trás das cortinas, há notícias de que
o Qatar está colaborando num acordo para libertar reféns libaneses sequestrados
em Azaz, [1] como mensagem amistosa do emirado.
Nota dos tradutores
[1] Já foram libertados. Ver “Discurso
de Hassan Nasrallah”, 28/10/2013, Al-Manar TV.
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