segunda-feira, 11 de novembro de 2013

Rússia avança com sucesso no Oriente Médio

9/11/2013, [*] MK Bhadrakumar, Indian Punchline
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu


Vladimir Putin - por Maurício Porto
Está-se firmando um padrão, entre os aliados dos EUA no Oriente Médio: se algum deles tem algum problema com Washington, a solução está a um trago da vodka russa, de distância. Com o muito visível afastamento e a evidente retirada dos EUA de seu envolvimento nos pontos quentes do Oriente Médio, como parte da estratégia norte-americana de reequilibramento em direção à Ásia, os países regionais trabalham na direção de uma renovada função para os russos. Moscou, é claro, entrou no jogo – pelo menos por hora.

Netanyahu
Quem mais recentemente recorreu a Moscou foi o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu. Na 6ª-feira, teve conversa tumultuadíssima sobre o Irã com o secretário de Estado dos EUA, John Kerry na pista do aeroporto Ben Gurion. Kerry pousou ali, vindo de Amã, para tentar, em poucas palavras, sensibilizar Netanyahu sobre o desejado acordo provisório que os EUA esperam conseguir firmar logo com Irã. Netanyhau, claro, enfureceu-se e deixou o aeroporto sem nem esperar pela fotografia oficial; e Kerry partiu para Genebra, para seu compromisso seguinte – com o ministro de Relações Exteriores do Irã, Mohammad Javad Zarif.

Mais tarde, no mesmo dia, o presidente Barack Obama telefonou a Netanyahu, para acalmar os ânimos. O release distribuído pela Casa Branca diz que:

(...) o presidente Obama atualizou o primeiro-ministro sobre os recentes avanços nas negociações em Genebra e destacou seu total compromisso com impedir que o Irã consiga sua bomba atômica, que é o objetivo das negociações em curso entre o P5+1 e o Irã. O presidente e o primeiro-ministro permanecerão em contato, nessa questão.

John Kerry e Sergey Lavrov
Mas Netanyahu não se deixou consolar. Telefonou, ele mesmo, para o Kremlin. Dia 20/11 próximo estará visitando Moscou, a convite do presidente Vladimir Putin. Antes, só se encontraram em Sochi, em maio.

Via de regra, Netanyahu só se reúne com Putin para suplicar que os russos não deem mísseis sofisticados ao Irã ou à Síria. Mas dessa vez a agenda será provavelmente mais ampla e construtiva. Claro que Netanyahu quer encontrar um meio de usar sua conexão-Moscou, que o reponha no jogo, já em andamento, do engajamento EUA-Irã.

A já iminente volta de Avigdor Lieberman ao gabinete de Netanyahu como ministro de Relações Exteriores dá nova verve à diplomacia de Netanyahu para a Rússia. Lieberman é “judeu russo” (da Moldávia) e tem, sim, laços com o establishment político em Moscou, que podem ajudar Netanyahu.

Avigdor Lieberman
Lieberman sempre se opôs à ideia de um ataque militar de Israel ao Irã. Mas agora, com o engajamento EUA-Irã, a opção de Israel atacar o Irã deixou de existir, o que por outro lado, remove a principal diferença que havia na aliança política entre Netanyahu e Lieberman. Matéria de DebkaFile discute a possibilidade de que Lieberman acompanhe Netanyahu na visita a Moscou.

Verdade é que há sinais no vento – Israel pode estar começando a delinear uma política mais realista vis-à-vis o Irã. Os israelenses são realistas experientes e saberão ver a inevitabilidade de corrigir a rota, no que tenha a ver com o Irã. Sabem que estão gravemente isolados.

A visita de Netanyahu a Moscou pode enviar alguns sinais interessantes. A Rússia, é claro, só tem a ganhar, se Netanyahu der sinais de receptividade ao interesse da Gazprom, que quer participar das reservas gigantes do campo de Leviatã, no leste do Mediterrêneo, reputadas como as mais fabulosas no cenário da energia mundial. E a Gazprom já tem um pé no campo de gás israelense de Tamar.

Para a Rússia, é mamão com açúcar, também em outro importante sentido. Há notícias de que os ministros de Relações Exteriores e da Defesa da Rússia estarão no Cairo na próxima semana. Tudo indica que Moscou esteja apostando no declínio da influência dos EUA no Egito, para voltar aos bancos egípcios, dos quais os russos foram expulsos por Anwar Sadat há mais de 30 anos.

Fala-se também de negócio gigante, de armas, entre Rússia e Egito. E já há obscuros rumores de que a Rússia pode conseguir uma base naval no Egito. Fato é que Israel pode ser muito receptiva à presença russa como fator de estabilidade, dado que a situação no Egito ainda é perigosa, e a capacidade de os EUA influenciarem o Cairo está hoje muito próxima do fundo histórico do poço.

Tanque russo T55 sucateado no Egito a ser substituído por equipamento mais moderno
A grande questão é como a Arábia Saudita encaixa-se nisso tudo. As relações EUA-sauditas também se deterioraram nos últimos tempos. Mas na Síria, pelo menos em tese, sauditas e russos ainda estão em campos opostos. Contudo, e isso posto, sabe-se que esses dois países são famosos pelo pragmatismo.

Ainda considerada a reaproximação EUA-Irã, alguma convergência entre sauditas e russos pode vir a ser muito provável, em algum ponto futuro. Seja como for, é inconcebível que a junta militar no Cairo, teúda e manteúda dos árabes do Golfo ao som de $12 bilhões de dólares, por-se-ia a valsar com Moscou sem sequer avisar Riad.

Se houver alguma verdade nas notícias que estão circulando sobre uma possível base russa no Mar Vermelho, é razoável assumir que a Arábia Saudita aprove o desenvolvimento de laços estratégicos entre Egito e Rússia. Com certeza os sauditas sentir-se-ão em casa com esse total e inequívoco repúdio da Primavera Árabe, pelos russos.



[*] MK Bhadrakumar foi diplomata de carreira do Serviço Exterior da Índia. Prestou serviços na União Soviética, Coreia do Sul, Sri Lanka, Alemanha, Afeganistão, Paquistão, Uzbequistão e Turquia. É especialista em questões do Afeganistão e Paquistão e escreve sobre temas de energia e segurança para várias publicações, dentre as quais The Hindu, Asia Times Online, Strategic Culture, Global Research e Indian Punchline. É o filho mais velho de MK Kumaran (1915–1994), famoso escritor, jornalista, tradutor e militante de Kerala.

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