Publicado
em 15/01/2012 por
Mário Augusto Jakobskind
Cuba
é realmente uma caixa de surpresas. Nestes dias renovando as baterias fiquei
distante cerca de 180 quilômetros do Eliakim. Eu
em Havana (foto), Eliakim no sul da Flórida estávamos a 25 minutos de avião.
Mas se por acaso o Eliakim quiser ir a Cuba não poderá fazê-lo desta forma,
porque o governo dos Estados Unidos proíbe residentes e de nacionalidade
norte-americana de viajar para Cuba. Eliakim, portanto sofreria represálias e
pagaria multa. É uma das facetas do bloqueio. Barack Obama só permite que
familiares visitem Cuba quantas vezes quiserem por ano e levando a quantidade de
dólares que acharem necessário. O hediondo W. Bush filho tinha restringido esse
deslocamento.
Cuba
vive há mais de 50 anos sob um bloqueio sem precedentes na história
contemporânea. Os prejuízos totalizavam 975 bilhões de dólares em fins de 2010,
segundo o governo cubano. Raúl Castro, que a mídia de mercado se refere apenas
como o “irmão de Fidel”, como se ele não tivesse vida própria e ocupasse o cargo
de presidente em função dos laços familiares, está conduzindo o processo
revolucionário cubano, que na fase atual tenta se inserir no mercado mundial.
Segundo analistas, Cuba se adapta ao mundo e não como era antes, quando Cuba
queria que o mundo se adaptasse a Cuba.
Independente
do bloqueio de mais de 50 anos, hoje Cuba enfrenta também outro perigo, tão ruim
ou pior, nas palavras do Presidente Raúl Castro, do que o criminoso bloqueio
estadunidense.
Raul
Castro está preocupado com a corrupção do tipo colarinho branco, que provoca
grandes danos ao Estado, consequentemente ao povo cubano.
Burocratas
de colarinho branco agem de forma perniciosa e acumulam grana em detrimento do
povo. O próprio Fidel Castro, que continua a acompanhar os acontecimentos em
Cuba e no mundo com suas reflexões, mesmo não ocupando mais a Presidência, já
havia advertido em discurso para estudantes em 2005 que fenômenos internos
negativos ameaçam a revolução socialista cubana.
Agora,
ao discursar no encerramento do VIII Período Ordinário de Sessões da Assembleia
Popular, no último dia 23 de dezembro, Raul Castro foi incisivo e não deixou
dúvidas ao afirmar que:
“...
estou convencido que a corrupção é hoje um dos principais inimigos da revolução,
muito mais perniciosa do que a atividade subversiva e de ingerência do governo
dos Estados Unidos e seus aliados dentro e fora do
país”.
Nesse
sentido, vale lembrar o que se passou em determinado momento no Vietnã, quando
dirigentes socialistas advertiam sobre os malefícios que a corrupção provocava
ao povo. Indignados com o que acontecia nessa matéria alertavam que se os
vietnamitas tinham conseguido derrotar militarmente o imperialismo da potência
hegemônica estadunidense, não poderiam perder a batalha contra a corrupção
praticada até mesmo por alguns “companheiros” colocados em postos
importantes.
No
discurso de fim de ano, Raul Castro citou o exemplo das
“...
fraudes
nos produtos agropecuários nos mercados da capital, que não existiram, nem se
cultivaram, gerando um desfalque de mais de 12 milhões de pesos devido à atuação
de diretores, funcionários e outros trabalhadores de empresas estatais que
praticam o comércio, bem como de pequenos agricultores que se prestaram como
testas de ferro”.
E
a todos eles, acrescentou Raúl Castro:
“...
serão exigidas responsabilidades administrativas e penais, de acordo com a
gravidade dos fatos”.
Cuba,
em suma, não é nenhum paraíso, como entendem os áulicos e acríticos da revolução
socialista. Não é nenhum inferno como dizem os setores radicais de direita
cubano-americana. É apenas um país da face da terra com qualidades e defeitos.
Quando a chamada mídia de mercado ataca o regime cubano, o motivo de um modo
geral é mais pelas qualidades do regime do que por seus
defeitos.
A
ilha caribenha tem um grande capital que nos dias de hoje vale muito mais do que
qualquer cotação na bolsa de Wall
Street. É a questão da segurança. Ao contrário do que acontece no México, no
Brasil, na Venezuela e agora mesmo em países europeus que enfrentam grave crise,
em Cuba o visitante circula com a maior tranquilidade, mesmo por ruas pouco
iluminadas. Não corre riscos como nos países mencionados.
À
noite, nas ruas pouco iluminadas de Havana, o visitante pode ter a certeza que
nada lhe acontecerá em matéria de assalto à mão armada ou sem arma. Pode até
tropeçar ou cair numa falha do asfalto imperceptível no escuro. E só. Dirigindo
automóvel pode parar em sinal a qualquer hora, pois estará certo que nada lhe
acontecerá. E isso hoje em dia na América Latina é de grande
valor.
As
reformas estão presentes e merecem análise mais aprofundada. Para muitos os
resultados não tardarão. E tudo está sendo feito com a máxima cautela, para
evitar que amanhã ou depois Cuba se veja atropelada pelos
fatos.
Muita
coisa que era proibida em décadas anteriores, hoje é absolutamente legal. Por
exemplo, cubanos possuírem moedas estrangeiras e assim sucessivamente.
Recentemente, o governo cubano permitiu a compra e venda de moradias e veículos.
O número de trabalhadores por conta própria já supera os 350 mil, sendo que 80%
deles optaram por se associarem a Central dos Trabalhadores Cubanos
(CTC).
Assim,
em síntese, caminha a ilha caribenha nesta nova fase de adaptação ao mundo
atual. A direita golpista e terrorista em vários quadrantes continua furiosa e
utilizando os valores da época da Guerra Fria quando diziam que Cuba era
satélite da URSS. Como a URSS já era, a direita velhaca passou a utilizar outros
adjetivos, que tentam induzir a opinião pública a repudiar o regime cubano.
Querem Cuba como nos velhos tempos de prostíbulo do Caribe. Este tempo acabou em
1 de janeiro de 1959.
Mário
Augusto Jakobskind é
correspondente no Brasil do semanário uruguaio Brecha. Foi colaborador do
Pasquim, repórter da Folha de São Paulo e editor internacional da Tribuna da
Imprensa. Integra o Conselho Editorial do seminário Brasil de Fato. É autor,
entre outros livros, de “América que não está na
mídia”,
“Dossiê Tim Lopes - Fantástico/IBOPE”
Enviado
por Direto da
Redação
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