Baby
Siqueira Abrão- Correspondente
no Oriente Médio: 16/01/2012
Ashraf
Abu Rahmah foi condenado pelo Tribunal Militar de Israel a seis meses e meio de
prisão
Ashraf reclamando com o soldado que o empurrava contra a cerca, em Nabi Saleh |
O
Tribunal Militar da prisão israelense de Ofer condenou no domingo, 15 de
janeiro, o ativista de direitos humanos Ashraf Abu Rahmah a seis meses e meio de
prisão e ao pagamento de 3 mil shekels (a moeda de Israel). O “crime” de Ashraf:
participar das passeatas não violentas contra o muro e as colônias construídos
ilegalmente por Israel em terras palestinas.
A
reportagem de Brasil de Fato estava presente à manifestação de Bil’in em que
Ashraf foi preso e viu sua prisão. Em 21 de outubro de 2011, uma sexta-feira
nublada e enevoada de outono, ele pouco se aproximou do muro que separa a área C
do vilarejo da colônia judaica de Modi’in Illit. Permaneceu quase o tempo todo
numa colina próxima, conversando com um amigo inglês que não via há anos. No
final da manifestação – particularmente violenta, com o exército israelense
atirando, quase sem parar, balas de metal cobertas de borracha, granadas e
bombas de gás que provocavam queimadas –, Ashraf tomou a estradinha que leva ao
centro de Bil’in, de volta para casa.
Mas
jipes do exército entraram no parque Abu Lemon, onde as manifestações terminam.
E prenderam Ashraf. Ativistas palestinos e israelenses, e a reportagem de Brasil
de Fato, correram em sua direção. Alguns ainda tentaram evitar o aprisionamento,
conversando com os soldados, mas não houve jeito. Ashraf foi empurrado para um
dos jipes e levado para a prisão.
Para
justificá-la, e para mantê-lo atrás das grades, os soldados alegaram que Ashraf
atirara pedras contra eles. Na primeira audiência, fotos, vídeos e testemunhas
desmentiram essa versão. Por isso, o tribunal precisou de outra justificativa.
Para casos assim, ela é bem conhecida: o acusado estava em zona militar fechada,
onde só é permitido o acesso do exército de Israel. Essa é outra solução
encontrada pelos sionistas para criminalizar os ativistas de direitos humanos
que participam das passeatas não violentas das sextas-feiras, organizadas na
maioria das vilas palestinas. Ao declará-las zonas militares fechadas, eles se
dão o direito de prender e punir não apenas os ativistas, mas, se quiserem,
todos os habitantes dos vilarejos.
Ashraf
é irmão de Bassem e Jawaher Abu Rahmah, assassinados por soldados sionistas em
abril de 2009 e janeiro de 2011, respectivamente. Bassem foi atingido por um
cânister de diâmetro largo, atirado a pouca distância com uma espingarda de alta
pressão, e morreu na hora. Jawaher, intoxicada pelos gases expelidos por bombas
e granadas, desmaiou e foi levada ao hospital de Ramala em 31 de dezembro de
2010. Morreu um dia depois. Alguns médicos desconfiam de que, pelos efeitos
devastadores dos gases no corpo de Jawaher, foi adicionado fósforo branco à
composição das bombas.
Apesar
do drama familiar, Ashraf é um homem bem-humorado, que gosta de estar com os
amigos, de visitá-los. Suas gargalhadas altas costumam ecoar pelo centro da
vila, provocando empatia nos moradores. É um ativista corajoso, que conhece os
riscos e não foge deles. Sua bravura e sua admiração por Che Guevara fizeram com
que recebesse o apelido de “Che Guevara palestino”. Vítima do desemprego causado
pela ocupação israelense, ele coloca seu tempo à disposição de todos, ajudando
no que for necessário. Nos sete meses em que a reportagem de Brasil de Fato
ficou sediada em Bil’in, Ashraf foi presença constante, levando notícias sobre a
vila e a resistência, convidando para o falafel vendido na esquina e para cafés
em sua casa.
Os
soldados o conhecem bem. Sabem que ele é incapaz de cometer atos violentos e de
causar mal a quem quer que seja. Sua prisão se deveu a motivos políticos:
humilhar os palestinos até que saiam de suas terras, para que elas possam ser
anexadas a Israel. Uma lei israelense torna possível, ao governo, a posse de
qualquer propriedade palestina da qual o dono tenha se afastado por um
determinado período. Mas os palestinos, como se sabe, continuam resistindo. E,
como Ashraf sempre fazia quando em liberdade, afirmam que nada os fará
desistir.
A
Coordenação dos Comitês da Luta Popular Não-Violenta Contra o Muro e as
Colônias, com sede em Ramala, Palestina, declarou que a prisão de Ashraf não vai
impedir a realização das passeatas das sextas-feiras em toda a
Cisjordânia.
Veja
o vídeo da manifestação e da prisão de Ashraf:
Aqui,
momentos do ativismo de Ashraf, homenagem prestada pelo amigo Hamde Abu Rahmah e
postada no dia seguinte à prisão:
Neste outro vídeo
você
verá o parque Abu Lemon e, atrás do muro construído em Bil’in, a colônia de
Modi’in Illit. Também ouvirá Ashraf criticar os organizadores das passeatas,
ligados ao Fatah (maior partido da Palestina), os quais, segundo ele, cooptam os
moradores de Bil’in, bem como ativistas israelenses e estrangeiros, para servir
à propaganda da Autoridade Palestina.
O
resultado dessa cooptação é a queima de oliveiras e de carvalhos, além de
ferimentos, prisão, mortes, intoxicações e incursões militares que espalham
terror nas vilas. “Quem perde com isso?”, Ashraf questiona. E responde: “Nós
perdemos”.
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