8/1/2012, *M K Bhadrakumar, Indian
Punchline
Traduzido
pelo pessoal da Vila
Vudu
A visita do ministro de Relações Exteriores da Turquia Ahmet Davutoglu ao Irã parece não ter ido muito bem. A retórica ficou por conta da Turquia – e a imprensa oficial do Irã sutilmente ironizou (“Os laços entre Irã e Turquia alcançam o ponto mais alto em 400 anos: Ministro turco”). Fato é que a Turquia não tem como manter relações complicadas com quase todos os seus vizinhos – com Irã, Síria, Iraque, Armênia, Chipre, Israel. E também com França e União Europeia os contatos são espinhosos.
Teerã não vê com
bons olhos as operações turcas de subversão clandestina na Síria, nem a
interferência dos turcos no Iraque, nem o “eixo” que a Turquia constituiu com
Arábia Saudita e Qatar. Mais importante, a Turquia está admitindo que os EUA
instalem seu sistema de mísseis antibalísticos em território turco, sistema cujo
único objetivo é monitorar, para Israel, os mísseis iranianos.
Por tudo isso, a
declaração de Davutoglu, de que a Turquia estaria fazendo funções de mediação na
questão nuclear iraniana, não passa, se se o diz claramente, de vento. O
ministro de Relações Exteriores do Irã Ali Akbar Salehi usou seu tato persa para
enunciar, exclusivamente como ‘opinião pessoal’, que o Irã não tem problemas com
Istambul para uma rodada de negociações.
As negociações sobre a questão nuclear serão duras,
sobretudo sob a sombra da ameaça, pela União Europeia, de suspender os negócios
com petróleo iraniano. O Irã trabalhará sob a desconfiança de que o ocidente
usará as conversações para finalidades de propaganda. Trita Parsi, que conhece
excepcionalmente bem o tema, que estudou por dentro (e como conselheiro do
governo dos EUA), publicou artigo
muito certeiro no
Independent, sobre o
duplifalar dos EUA e países ocidentais.
Além do mais, o Irã também alimentará profundas
desconfianças quanto à propaganda do salvamento, pela marinha dos EUA, de
marinheiros iranianos ameaçados por piratas somalianos. A mídia iraniana deu
pouco destaque ao evento; a mídia
ocidental superinflou-o. O Irã tem longa e sólida experiência com as armadilhas
no front da propaganda. A propaganda EUA-Israel trabalhará muito para apresentar
o Irã como irracional e impenetrável aos atos “amigáveis” do ocidente.
As atenções voltam-se agora para a visita que o
presidente Mahmoud Ahmedinejad fará a cinco países da América Latina, em
movimento de publicidade. Há um
aspecto diplomático , também, porque a viagem mostrará que o
Irã absolutamente não está isolado, nem no próprio “campo” dos EUA. As
declarações de Ahmedinejad serão acompanhadas de perto, em suas andanças pela
Venezuela, Nicarágua, Equador e Cuba; e como convidado de honra na cerimônia de
posse do presidente (de esquerda) recentemente eleito na Guatemala.
É modo de responder a Obama, que iniciou sua presidência
com uma rápida passagem pela América Latina. Simultaneamente, Teerã toma
precauções em relação aos planos de guerra de EUA e Israel. O que mais importa,
do ponto de vista de Teerã, são ações reais em campo. Por exemplo, o
deslocamento dos britânicos será tratado com máxima atenção, dado o longo currículo de Londres na linha de
identificar-se com a opinião dos falcões do lobby israelense em Washington, e a
disposição da Grã-Bretanha para, em algum momento, tentar “acertar as contas”
com o Irã, depois do recente rompimento de laços
diplomáticos.
O Irã não está baixando a guarda. Os Guardas
Revolucionários Islâmicos iniciaram exercício de manobras militares na região
leste do país, na fronteira com o Afeganistão. A mensagem
é clara – “mais de 100 mil soldados estão
estacionados como patos-alvos em suas bases afegãs e podem ser as primeiras
vítimas de qualquer ataque de EUA-Israel contra o Irã”. E no sábado o Irã
anunciou a intenção de promover outro grande exercício de manobras navais no
Estreito de Ormuz.
Bem claramente, se a estratégia de EUA-Israel visava a
“baixar a crista” de Teerã, não está funcionando. No sábado, o Irã anunciou que
deixa o dólar norte-americano nas futuras
negociações com a Rússia, que passarão a ser feitas nas moedas
nacionais. O Irã começa a ver com
novos olhos a proposta russa para a questão nuclear. Claro que, se a unidade do
grupo 5+1 é minada, é vantagem para o Irã.
A
Rússia criou espaço diplomático para que o Irã
negocie mediante sua proposta flexível, que virtualmente mina a “estrada das
sanções” pela qual está andando, até aqui, o Conselho de Segurança da ONU. A
Rússia já começou a pedir o fim das sanções da ONU contra o Irã.
Tudo isso já se reflete no modo
confiante como o Irã está recebendo a equipe de inspetores da IAEA que estão,
nesse momento, visitando o Irã. O Irã expôs
suo
moto suas
capacidades locais, em tom de quem, como Parsi relata em seu artigo, esteve
realmente disposto a aceitar acordo com os EUA, nos termos da troca negociada
entre Brasil-Turquia-Irã. E Teerã prometeu anunciar mais “boas
novas” de capacidade nuclear “nas próximas
semanas”.
A notícia que o Kremlin
divulgou, da
conversa por telefone entre os presidentes Dmitry Medvedev e Ahmedinejad chama a
atenção para o considerável nível de entendimento sobre várias questões
regionais. A imprensa russa vê íntima correlação entre a pressão ocidental sobre
a Síria e o Irã, partes da mesma estratégia para controlar Oriente Médio, com
efeitos diretos sobre os interesses russos. Interessante: a Rússia está fazendo novos deslocamentos
navais na Síria – o que sinaliza apoio ao presidente Bashar
al-Assad.
*MK Bhadrakumar foi diplomata de
carreira do Serviço Exterior da Índia. Prestou serviços na União Soviética,
Coreia do Sul, Sri Lanka, Alemanha, Afeganistão, Paquistão, Uzbequistão e
Turquia. É especialista em questões do Afeganistão e Paquistão e escreve sobre
temas de energia e segurança para várias publicações, dentre as
quais
The
Hindu,
Asia
Online e Indian Punchline.
É o filho mais velho de MK Kumaran (1915–1994), famoso escritor, jornalista,
tradutor e militante de Kerala.
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