Cesar Altamira |
30/12/2011,
Cesar Altamira, Uninomade 2.0
(excerto. Só um pedacinho traduzido,
porque encheu o saco!)
Traduzido
e comentado pelo pessoal da
VilaVudu
(...)
A
teoria da dependência em tempos de
Império (Hardt &
Negri, 1993)
Desde que foi criada em 1948, a CEPAL [1]
pôs no
Estado e nas burguesias nacionais os elementos propulsores da mudança. Para a
CEPAL o desenvolvimento latino-americano exigia que se superasse o obstáculo
estrutural da Deterioração dos Termos da Troca Comercial (DTTC). A queda
relativa dos preços das matérias primas em relação ao preço dos produtos
manufaturados importados dos centros capitalistas limitava a integração ao
mercado mundial, lançando os países num atraso perpétuo, ao mesmo tempo em que
os distanciava os países capitalistas avançados dos países capitalistas
atrasados. O DTTC consolidava uma estrutura mundial capitalista assentada em
dois polos, centro e periferia, tendencialmente cada vez mais afastados um do
outro. Frente àqueles obstáculos estruturais, a CEPAL promoveu o fomento da
industrialização mediante a substituição de importações, tarefa cuja
responsabilidade caberia ao Estado e às burguesias latino-americanas. A crise
econômica de meados dos anos 1950s pôs em crise também as ideias cepalinas, deixando como resíduo teórico
a “Aliança para o Progresso”, criada no governo Kennedy.
Simultaneamente,
o capitalismo latino-americano ganhava, nessa época, um dinamismo específico:
endividamento externo, penetração massiva de capitais estrangeiros,
especialização no mercado mundial que ligava os países latino-americanos mais
dinâmicos, mais estreitamente, ao ciclo de acumulação mundial. Nesse contexto,
surge a Teoria da Dependência.
Os
pontos principais do dependentismo são:
A) o
capitalismo mundial é sistema bipolar em que o centro explora a periferia pela
expropriação de seus excedentes mediante o comércio, a inversão de capitais e a
dependência tecnológica. O sistema reproduz-se e gera diferenciação crescente
entre países e polarização também crescente.
B) O
mundo dependente não tem dinâmica própria e sua existência interna é o reflexo
de suas relações com o mercado mundial. O atraso do mundo dependente não é
consequência de condições internas, mas, sim, fundamentalmente, produto das
condições de dependência do exterior, que bloqueia toda possibilidade de
progresso social. Para recuperar a própria dinâmica social, os países
dependentes teriam de romper, ou reduzir drasticamente, suas relações econômicas
com o mercado mundial.
C)
Segundo a teoria da dependência, a história do capitalismo mundial é a história
das mudanças nos tipos de exploração da periferia, pelo centro; e das relações
de hegemonia e dependência dentro do sistema internacional: períodos em que se
explora o livre comércio (imperialismo britânico); períodos em que a exploração
se faz à base de investimentos do exterior (imperialismo norte-americano).
D) A
única possibilidade de desenvolvimento interno para os países da periferia
depende de romper a dependência. Como se trata de dependencia econômica, esse
objetivo só será alcançado mediante a eliminação, ou redução drástica dos
investimentos estrangeiros e a limitação do comércio com os países centrais,
identificando-se a independência política e o isolamento do mercado
mundial.
E) O
desenvolvimento nacional dependerá de superar a dependência, motivo pelo qual
todas as aspirações nacionais devem-se subordinar ao objetivo de superar a
dependência. Nesse contexto, o papel das classes e setores populares será
resistir contra a penetração imperialista e defender suas tradições nacionais e
populares, sem
questionar os aspectos atrasistas da exploração ou da opressão patriarcal
burocrática ou capitalista.
ATENÇÃO! A
parte sublinhada, aí acima, só pode ter sido acrescentada pelo autor do artigo, porque nunca esteve escrita em
nenhuma teoria da dependência – nem na Teoria da Dependência da UDN, meu
saco!
A
parte sublinhada, aí acima, é o tipo da ideia anacrônica, assíncrona -- porque
apaga a “consciência possível” no momento em que surgem as teorias -- que esses
caras metem em toda a parte, para, adiante, na reflexão, a reaproveitarem, com
oportunismo salafrário digno da má fé do PSOL, da ignorância “ética” dos
petistas, da mania-doença persecutória histérica das feministas PSOListas e
petistas e de uns ôtrinhos por aí, que pararam de ler Marx “por causa” de Stálin
– o que é estupidez equivalente a abdicar de ser esperto e de lutar pela vida,
“por causa” dos otários matadores.
Nenhum
partido comunista, em nenhum dos países da América Latina, jamais deixou de
questionar os aspectos atrasistas da exploração (etc.) capitalista na região. O
fato de discursos “feministas” e “ecologistas” e “democráticos” em geral e de
defesa de direitos humanos essencialistas transcendentes só terem chegado às
manchetes da imprensa-empresa e às novelas da Rede Globo nos anos 70 e 80 – de
onde esses revolucionários de araque recolheram seus “saberes” políticos –,
absolutamente não significa que os comunistas já não fossem igualitaristas nas
questões de gênero e atentos ao meio ambiente desde o século 19. Embora, sim,
nunca tenham sido fundamentalistas românticos naturistas puristas ou feministas
grupelhistas, nem ‘ecológicos’ à moda Marina Silva/Natura/Al Gore.
Limitações
da “consciência possível”, em cada momento histórico, são fatos DA REALIDADE,
que não podem ser apagados, assim, no grito, só pq alguns obcecados identitários
querem, porque-sim, porque-sim, porque-sim. E, reescrevendo a história, eles vão
“dando um jeito” no mundo, pra fabricarem legitimidade social para os seus
discursos produzidos ainda na linha de montagem e repetição das “escolas de
pensamento” e da moda.
Essa
tradução pára por aqui mesmo. Os interessados podem ler em espanhol, sem
dificuldade, se quiserem. O que já foi traduzido vai aí, porque pode ser útil
prôs que não tenham nenhuma ideia do que foi a Teoria da Dependência. Mas
NADA do que vem daí pra frente nos ajudará.
No
Brasil, a teoria dependentista levou, sim, ao extremo mais extremado e mais
equivocado da galáxia, e gerou o golpe de 1964 -- porque, então, o Brasil JÁ
RESISTIA àquele dependentismo obcecado. Então, o Golpe de 64 veio, CONTRA a
resistência que já havia ÀQUELE DEPENDENTISMO cepalino.
O
general Golbery era APAIXONADO dependentista, dependentismo que ele aprendeu
diretamente dos EUA, como sabe quem tenha lido o que o general Golbery escrevia
em 1952 (por exemplo): "Temos de construir nosso desenvolvimento ancorado ao
desenvolvimento dos países adiantados". Golbery escreveu isso em 1952. Getúlio
ainda era vivo e mandava muito.
Depois
da “redemocratização”, o mesmíssimo discurso golberysta foi retomado, por aqui, pelo
PSDB, DEM e alguns petistas, que são os vários grupos que resultaram, por aqui,
da divisão da velha UDN, aquela, aquela, que parece, é quase
imatável!
Mas
nem Getúlio, nem Brizola nem Lula nem Dilma JAMAIS foram dependentistas à moda
daquele dependentismo que houve por aqui. Por isso, precisamente, todos, antes,
foram derrubados pelos dependentistas, que também nos derrotaram TRÊS VEZES,
depois da “redemocratização”, até que o Brasil, afinal, em 2002, conseguiu
eleger o presidente Lula, primeiro dos nossos governos Lula-Dilma, que NÃO SÃO, afinal, governos
dependentistas. Ver neles “dependentismo residual” é não ver as lutas
históricas na América Latina e não ver o que, afinal, começa a aparecer, de
novo, a partir de 2002 e já está aí, ativo, há quase dez
anos.
Se
se pode arriscar umazinha, pode-se dizer que, assim como a ideologia “se
objetiva” no espetáculo – como escreveu Debord no artigo que NÃO TRADUZIREMOS,
citado acima - a ideologia SUBJETIVA-se.
Ideologizam-se
e supervalorizam-se, sempre ideologicamente, os traços pressupostos “humanos” (a
criatividade, por exemplo), e tenta-se fazer, disso, justificativa para NÃO
FAZER a luta que está aí, à nossa frente, obrigatória e dificílima, e que terá
de ser lutada COM OS GOVERNOS LULA-DILMA (e outros, na América Latina, hoje), e
não, nunca, de modo algum CONTRA esses governos. Não
contra eles, com certeza, HOJE.
Se
esses pensadores quiserem fazer seu (bom) discurso contra o Estado-nação e os
nacionalismos fascistizantes, ou seu tão lúcido discurso sobre o precariato, o
cognitariato e o novo trabalho, que tanto ajudam os pobres, aqueles bons
discursos, a entender as transformações pelas quais passa o trabalho hoje, nesse
momento do capitalismo, MUITO BOM! Então, que cresçam e apareçam.
Mas
terão de aprender a seguir as lutas reais dos pobres. Empurrando pra frente,
sim, mas reunindo os diferentes, baixando a crista individual identitária e
recolhendo de cada etapa o que haja para recolher, e sem excluir
‘preventivamente’ outras tentativas e outros esforços que também tentam andar
para o mesmo lado com os muitos. "Construir a hegemonia" -- como Gramsci,
leninista, ensina -- não é IMPOR, no grito, a própria força.
“Construir
a hegemonia dos pobres” (até, pelo menos, que não haja tantos pobres e que os
pobres sejam menos pobres e explorados e enganados) implica PERSUASÃO,
convencimento, e implica discursos que busquem alcançar o maior número possível
de ouvidos. Por isso, precisamente, "construir a hegemonia dos pobres" implica
negociar os discursos, argumentar, ouvir, rever, reconstruir os próprios
argumentos, passo a passo. Assim se constroi multidão revolucionária. Assim
estamos #OCCUPY WALL ST.
Sem
isso, se constroem partidos políticos conservadores. Sem isso, a esquerda
europeia se autodetonou. Sem isso, os restos semimortos da esquerda europeia
AINDA TENTAM detonar os pobres do resto do mundo.
Os
grupos e partidos, que falem DENTRO DOS GRUPOS, quando sentirem imperiosa a
necessidade de DESTRUIR, pressupondo que DESTRUIR seja criticar. Mas, sim, claro
que muitas vezes é preciso destruir. Então que os grupos se dediquem a DESTRUIR
o que tiver de ser destruído, DENTRO DOS GRUPOS.
Se
se exclui da conversa a ânsia doentia pelo poder dentro dos grupos e partidos, à
discussão DENTRO DOS GRUPOS DE OPINIÃO chama-se “centralismo democrático” e é
ABSOLUTAMENTE NECESSÁRIO, se a resistência não quiser se deixar destruir pelo
discurso “geral” -- que se divulga pelas universidades e, sempre, pela
imprensa-empresa, claro, sempre.
Nós
não podemos NOS CRITICAR com ânimo de NOS FAZER CALAR, nós mesmos, uns os
outros. Nem esses porra-loka autistas podem dizer o que bem entendam, pensando
só, cada grupo e grupelho, em se constituir, em fechar-se cada vez mais, como
frente que não é "hegemônica" e é sempre autoritária, sempre em busca de ser a
voz única, o partido único, a verdade única e acabada.
Afinal,
“autonomia” é bom e eu gosto! Mas “autonomia” erigida em palavra de ordem, é
parente bem próxima de aristocracia e de oligarquia (governos dos poucos, sempre
pressupostos ou iluminados, ou bons, ou certos, ou “lúcidos”, e sempre
perigosamente próximos do “nenhum governo” que sempre interessou muito às elites
liberais e jamais interessou aos pobres). E “autonomia” também é palavra bem
próxima de autarquia e de autismo.
Por
que excluir os próximos diferentes que as lutas reais vão mostrando, passo a
passo? Só para prometer – mais uma vez?! – aos muitos pobres -- aos pobres que,
com a internet, afinal têm chance de ouvir discursos e argumentos QUE JAMAIS
OUVIRAM ANTES! -- alguma “a felicidade” perfeita final, em natureza virginal e
imaculada, e em sociedade de paz e amor e democracia e éticas e ecologias à moda
espetáculo & farsa, mais uma vez?
Não
é verdade que o calote da dívida, na Argentina, tenha sido má solução. Não foi.
Foi boa. Não é verdade, tampouco, que o Brasil tenha feito, com pagar a dívida
com o FMI, alguma “integração” burra dependentista “residual” ao capitalismo
transnacional.
E
não há xchilique metido a “ético” ou a “democrático-tipo-farsa- eleitoral”
purista fundamentalista, no mundo, que apague do mundo a história de Cuba e da
China e, até, da República Popular Democrática da Coreia, da República
Democrática Islâmica do Irã e, até, da Jadalya Socialista Líbia – que foi
assassinada, porque ainda fazia, à sua moda tresloucada, a luta contra o
capitalismo predador transnacional imperial dos EUA-França.
Seja
como for e em todos os casos, sobreviver contra o mundo do capital e de Wall Street e do Pentágono, hoje, é,
sim, vitória a ser acumulada a favor dos pobres do mundo. Para ser acumulada,
essa vitória tem, antes, de ser DITA.
Os
povos latino-americanos (e, como aprendi hoje, ATÉ OS RUSSOS!) que sobreviveram
ao descomunal ataque DA PRIVATARIA, que sofreram nos anos 1980s e 1990s não são
perfeitas bestas, que só os “autonomistas” e “imperiais” de Império
(1993) saberiam salvar. E, com certeza absoluta não serão salvos por
esses sub-Negri (porque Negri é MUITO MELHOR que esses seus epígonos e/ou
aspirantes a epígonos que vivem de colher louros de alguma pressuposta
“radicalização”, à custa de PTizar e PSOLizar ou espetacularizar pensamento
forte). Se quiserem, os “autonomistas”
sub-Negri que traduzam tudo. Que vão se catá!
Prôs
que se interessem, aqui vai um parágrafo de um artigo do IPEA que, por acaso,
estamos revisando nessas “Festas”, para um camaradinha nosso. Dado que o artigo
(sobre seguridade social no Brasil), ainda não foi publicado, não se pode ainda
indicar autor e fonte. Nem é necessário: é como se nós mesmos tivéssemos escrito
isso aí:
“Definitivamente,
a agenda brasileira não é aquela que os organismos internacionais querem impor
ao mundo.
A singularidade do
caso brasileiro está em que o movimento social acumula mais de quatro décadas de
luta para construir um modelo de proteção social inspirado na experiência da
social-democracia europeia do pós-guerra. Nesse sentido, e pelas razões
expostas, entende-se que a agenda da OIT está superada para o Brasil no campo da
Seguridade Social.
Nas últimas
décadas, a sociedade brasileira foi acumulando êxitos na difícil tarefa de
construir patamares mínimos de seguridade social. Nessa árdua marcha, foram
demarcados fóruns de debates democráticos, arranjos financeiros e articulações
institucionais (baseados na cooperação federativa). Mais importante: a maior
parte desses avanços foram constituintes e já encontram amparo legal na
Constituição da República (outra luta da sociedade brasileira, sob as duras
condições em que trabalhou a Assembleia Constituinte, até 1988). E, no Brasil de
Lula-Dilma, começamos novamente a andar adiante na trilha das lutas sociais que
se fazem, no Brasil, desde antes do golpe de 64.
De todas aquelas lutas, a luta em
que menos vitórias conseguimos até agora é a luta pela Reforma Agrária. Mas,
simultaneamente, a luta pela Reforma Agrária foi-se convertendo, na luta, no
movimento social mais radical e fortemente estruturado, de todos os movimentos
sociais no Brasil. Assim, avançamos também na luta pela Reforma
Agrária”.
Nota
dos tradutores
[1]
A
Comissão Econômica para América Latina (CEPAL) foi criada pela Resolução n. 106
(VI) do Conselho Econômico e Social da ONU, em 25/2/1948. Em 1984, passou a
chamar-se Comissão Econômica para América Latina e
Caribe. Em fevereiro de 2010, afinal, foi criada em Caracas a Comunidade
de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC), que reúne 33 países da AL,
inclusive Cuba e sem a participação dos EUA e Canadá. A CELAC visa a avançar no
caminho de construir a autonomia política da AL em relação aos EUA, separando-se
definitivamente da CEPAL-ONU.
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