David Meyer |
30/12/2011, David Meyer (editor de
Tecnologia),
BBC-Londres
Traduzido pelo
pessoal da Vila
Vudu
Ver
também
14/11/2011, 30
anos de hacking
político
A
comunidade hacker planeja pôr a Internet fora do alcance dos
censores. Para isso, trabalham para pôr em órbita seus próprios satélites de
comunicação. O esquema foi delineado no Congresso Caos de Comunicação, em
Berlim, em agosto de 2011[1].
Os organizadores
do projeto dizem que sua Rede
Hacker-espacial Global [ing.
Hackerspace Global Grid] também implica desenvolver uma rede de
estações em terra, que fará a intercomunicação entre os satélites e as estações
em terra.
Como projeto de
longo prazo, trabalham para pôr na Lua um astronauta-hacker amador.
Sputinik - 50 anos depois hackers pretendem colocar em órbita seu próprio satélite. |
Amadores e
aficionados já puseram alguns pequenos satélites em órbita – quase todos por
curtos períodos de tempo –, mas o rastreamento dos satélites revelou-se difícil,
para projetos de baixo orçamento.
Nick Farr,
ativista hacker, lançou a
primeira convocação, à procura de interessados em participar do projeto, em
agosto. Disse que a ameaça crescente de censura à internet foi a principal
motivação para esse trabalho.
“O principal
objetivo é criar uma internet completamente incensurável, no espaço. Precisamos
tirar a internet que conhecemos, do alcance dos censores. Para isso, é preciso
pô-la fora do alcance das entidades terrestres que funcionam hoje” – disse
Farr.
Além dos balões
Farr lembrou a
lei SOPA [Stop Online Piracy Act (Lei de Combate à Pirataria Online) nos EUA, como exemplo do tipo
de ameaça que já existe contra a liberdade nas redes e na Internet. Se aprovada,
a lei SOPA nos EUA permitirá que algumas páginas na
Internet sejam bloqueadas, sob o argumento de que agridem direitos comerciais de
autor.
Até agora, todas
as ações e intervenções no espaço sideral têm sido prerrogativa de agências
nacionais e de empresas gigantes de comunicação. Mas alguns amadores dedicados
já puseram em órbita, recentemente, alguns pequenos
satélites.
Aqueles
“satélites” já lançados foram postos em órbita com balões, mas é extremamente
difícil rastreá-los da Terra.
Segundo Armin
Bauer, 26 anos, de Stuttgart, que já trabalha no projeto da Rede Hacker-espacial Global, o principal
problema são os custos do projeto.
“É perfeitamente
possível rastrear os satélites a partir de bases em solo, mas em geral ninguém
precisa fazer isso, porque, se você tem muito dinheiro [e usa um foguete para
lançar um satélite e pô-lo em órbita], você já põe o satélite exatamente na
órbita na qual você deseja que ele fique” – explicou
Bauer.
Trabalhando com um
prazo de 23 anos, já há a ideia de um projeto aero-hacker-espacial para
pôr na Lua um hacker astronauta
amador. Bauer explicou que
“É viável, mas
muito ambicioso. Então pensamos: vamos começar por uma coisa menor”.
A
rede terrestre de rastreamento
A
conferência de Berlim foi a mais recente, organizada pelo “Chaos Computer
Club”[3], grupo de hackers alemão que trabalha há décadas e já
comprovou sua influência, não só entre os interessados em explorar ou em
aprimorar a segurança dos sistemas computacionais, mas também entre amadores que
exploram, como hobby, os limites
dos equipamentos e programas de computação.
Quando Farr lançou
sua convocação, à procura de interessados em trabalhar no projeto da Rede Hacker-espacial Global, Bauer e
outros decidiram concentrar-se nos aspectos da infraestrutura de comunicação do
esquema.
Bauer diz que os
satélites podem garantir a comunicação, e ajudarão a pôr um amador no espaço
sideral. Ele e sua equipe trabalham nessa parte do projeto com o grupo Constellation, iniciativa já existente
na pesquisa aeroespacial alemã, que é, basicamente, uma rede interconectada de
projeto de estudantes.
No espírito hacker, de sempre defender o código
aberto, Bauer e alguns amigos tiveram a ideia de produzir uma rede de estações
de rastreamento em terra, de baixo custo, que pudesse ser comprada ou produzida
pelos próprios usuários.
Reunidas numa rede
global, essas estações poderiam rastrear e localizar os satélites a qualquer
momento, o que, ao mesmo tempo, tornaria mais fácil e daria mais confiabilidade
à operação dos satélites, de enviar dados de volta à Terra. “É uma espécie de
GPS ao contrário” – explicou Bauer.
“O GPS usa os
satélites para calcular a exata localização de cada um de nós. O mesmo processo
serve também para nos dizer onde estão os satélites. Podemos usar as coordenadas
de GPS, mas também podemos melhorá-las, se tivermos pontos fixos, em locais
perfeitamente localizados”.
Armin Bauer |
Bauer garante que
a equipe já terá três protótipos de estações em terra, na primeira metade de
2012; e, no próximo Congresso de Comunicação do Coletivo Caos, em 2012, espera
já poder mostrar alguns modelos em operação.
O equipamento será
vendido, sem finalidades lucrativas. Bauer explica que “Nosso preço limite é 100
euros (£84) por estação em terra. É o que o pessoal nos disse que pode gastar
para comprar a estação.”
Complicações
Os especialistas
dizem que o projeto do
hacker-satélite é exequível, mas enfrentará limitações
técnicas.
“Satélites de
órbita terrestre de baixa altitude, como os que já foram lançados por amadores,
não são fixos: eles se movem em órbita; em teoria, mudam de posição a cada 90
minutos” – diz o professor Alan Woodward do departamento de computação da University of
Surrey.
“Não significa que
não possam ser usados para comunicação, mas, obviamente, só por curtos períodos
de tempo, só enquanto nós os vemos. É difícil ver como esses satélites poderiam
ser ligados numa rede viável de comunicação, porque a comunicação aconteceria
“com saltos”, mesmo que se reunisse uma constelação de estações de rastreamento
em terra”.
Esse problema pode
ser evitado, se os hackers conseguirem pôr seus satélites em órbitas
geoestacionárias acima do Equador. Com isso, os satélites acompanhariam o
movimento da Terra e estariam como que imóveis, vistos da Terra. Mas isso
criaria outro problema.
“Os satélites
estarão tão distantes da Terra, que haverá atraso considerável na recepção dos
sinais, o que pode interferir em alguns aplicativos de Internet” – disse o
professor Woodward. – Mas ainda uma interessante dimensão legal no projeto,
porque o espaço sideral não é governado por cada país “abaixo” dele. Por isso,
sim, em teoria, o espaço sideral pode ser lugar ideal onde fazer prosperar todas
as comunicações ilegais. O corolário, nesse caso, é que cada país tomaria a lei
nas próprias mãos e neutralizaria os satélites.”
A
necessidade de construir conhecimento
Até hoje, satélites foram considerados caros demais para grupos amadores |
Além da rede de
rastreamento em solo, outros aspectos da Rede
Hacker-espacial Global estão sendo explorados, entre os quais o
desenvolvimento de novos objetos eletrônicos que possam sobreviver no espaço, e
de veículos de lançamento, para começar.
Segundo Farr, o
“único motivo” que inspira a ideia de uma Rede
Hacker-espacial Global é o conhecimento. Diz que muitos presentes
ao Congresso do Coletivo Caos lembraram que desde a Missão Apollo 17, em 1972,
ninguém mais for posto em órbita terrestre.
“Essa comunidade
[hacker] pode, afinal, dar algum sentido à ideia de pôr a humanidade de
volta no espaço sideral” – disse Farr. – “Nosso objetivo é voltar ao ponto em
que estávamos nos anos 1970s. Os
hackers não entendem por
que, se já tínhamos a tecnologia necessária para nos pôr no espaço desde antes
de muitos de nós termos nascido, nunca mais voltamos para lá. Muitos se sentem
ofendidos, excluídos”.
Perguntado sobre
se não os preocupam as implicações de segurança da ideia de haver hackers ativos também no espaço sideral, Farr disse
que o único problema é “haver quem se interesse tanto por censurar nossa
internet.”
“Os hackers só se interessam por garantir informação
livre e aberta” – acrescentou Farr.
– “Nós acreditamos
que a comunicação é um dos direitos humanos básicos”.
Notas
dos tradutores
[2] Leia o Projeto e veja
uma lista de “tarefas
abertas”, para quem se interesse em trabalhar junto com o Coletivo
Caos.
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