Robert Fisk |
25/1/2012,
Robert Fisk, The Independent,
UK
Traduzido
pelo Coletivo da Vila
Vudu
É
muito difícil, no jornalismo, voltar atrás na história – e raras vezes pode ser
mais difícil que voltar atrás na história, no caso do Irã. Irã, a sombria ameaça
da revolução islâmica. Irã xiita, protetor e manipulador do Mundo do Terror, da
Síria, Líbano, Hamás e Hezbollah. Ahmadinejad, o Califa Louco. E, claro, Irã
Nuclear, preparando-se para destruir Israel numa nuvem-cogumelo de ódio
antissemita. Irã pronto a fechar o Estreito de Ormuz – no instante que forças
ocidentais (ou de Israel) ataquem.
Dada
a natureza do regime teocrático e a repressão à oposição em 2009, para não falar
dos vastíssimos campos de petróleo, qualquer tentativa de injetar algum senso
comum na cobertura precisa vir com alerta do ministério da saúde: “NÃO, a vida
não é possível no Irã.” Mas...
Examinemos
a versão israelense, segundo a qual, apesar de repetidas provas de que os
serviços de inteligência israelenses são no mínimo tão eficientes quanto os
sírios, continua a ser repetidamente trombeteada pelos amigos de Israel em todo
o mundo – nenhum deles mais subserviente que os jornalistas ocidentais. O
presidente de Israel avisa que o Irã está às vésperas de produzir sua bomba
atômica. Que Deus nos proteja. Sim. Mas nenhum jornalista escreve que Shimon
Peres, então primeiro-ministro de Israel, disse exatamente as mesmas palavras em
1996. Há 16 anos. E ninguém tampouco escreve que o atual primeiro-ministro de
Israel Benjamin Netanyahu disse, em 1992, que o Irã teria sua bomba atômica em
1999. Deveria tê-la tido há 13 anos. Sempre a mesma velha
história.
A
verdade é que ninguém sabe se o Irã está ou não está construindo a bomba
atômica. E, depois do Iraque, chega a ser engraçado ver que as velhas armas de
destruição em massa voltam a pipocar com a mesma frequência com que pipocavam
denúncias sobre o titânico inexistente arsenal de Saddam. Para nem falar da
questão das datas. Quando tudo isso começou? O Xá. O Xá queria poder nuclear.
Chegou a dizer que queria sua bomba “porque EUA e URSS têm bomba atômica” e
ninguém reclamou. Os europeus correram a satisfazer o desejo do Xá. Quem
construiu o reator nuclear em Bushehr foi a empresa Siemens – não alguma
Rússia.
Aiatolá Khomeini |
E
quando o aiatolá Khomeini, Terror do Ocidente, Apóstolo da Revolução Xiita etc.,
assumiu o poder no Irã em 1979, imediatamente ordenou que todo o projeto nuclear
fosse cancelado, porque era “obra do demônio”. Só quando Saddam invadiu o Irã –
com nossas bênçãos ocidentais – e pôs-se a matar iranianos com gás venenoso
(feito de componentes químicos que o ocidente lhe fornecia, é claro) foi
possível convencer Khomeini a reiniciar o programa nuclear do
Irã.
Tudo
isso foi apagado dos registros históricos; quem inventou o programa nuclear
foram os mulás de turbante negro, associados a Ahmadinejad, o doido. E Israel
está obrigada a destruir essa arma terrorista para salvar-se da destruição, para
salvar o ocidente da destruição, para salvar a democracia etc.
etc.
Para
os palestinos na Cisjordânia, Israel é potência brutal, colonial, ocupante. Mas
no momento em que se fala do Irã, a Israel brutal, colonial, ocupante é
convertida em pequeno estado frágil, vulnerável, pacífico, que enfrenta iminente
ameaça de extinção. Ahmadinejad – e aqui, mais uma vez, são palavras de
Netanyahu – é mais perigoso que Hitler. Todo o arsenal de bombas atômicas de
Israel – absolutamente reais e existentes estimadas hoje em quase 300 – some da
cobertura jornalística. Os Guardas Revolucionários do Irã estão ajudando o
regime sírio a destruir a oposição. Talvez estejam. Mas até hoje ninguém viu
disso uma prova sequer.
O
problema central é que o Irã venceu praticamente todas as suas guerras recentes,
sem precisar disparar um tiro. George W & Tony destruíram o arqui-inimigo do
Irã, o Iraque. Mataram milhares do exército sunita ao qual o Irã referia-se como
“o Talibã negro”. E os árabes do Golfo, nossos amigos “moderados”, tremem de
medo em suas mesquitas douradas, quando nós, no ocidente, pintamos o quadro de
seu destino no caso de uma revolução iraniana xiita.
Não
surpreende que Cameron continue a vender armas a essa gente repugnante cujos
exércitos, em todos os casos, mal conseguem operar fogões de quatro bocas,
imaginem se saberão operar as sofisticadas armas aladas de bilhões de dólares
que nós lhes empurramos goela abaixo, sob a sombra do medo de
Teerã.
Que
venham as sanções. Convoquem também os palhaços.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Registre seus comentários com seu nome ou apelido. Não utilize o anonimato. Não serão permitidos comentários com "links" ou que contenham o símbolo @.