4/6/2014, [*] MK Bhadrakumar, Indian Punchline
Traduzido pelo pessoa da Vila Vudu
Ler também:
4/6/2014, Patrick
Cockburn, ICH, redecastorphoto em: “Revelações
de Bowe Bergdahl: E-mails mostram extensão do fracasso dos EUA no
Afeganistão”.
Bode assado com arroz ao curry, prato típico do Afeganistão |
O chefe
Talibã, Mullah Omar, está coberto de razão, ao declarar uma “grande vitória” a
troca de Prisioneiros de Guerra com os EUA. Muitos
bodes foram carneados, e a tradicional ceia celebratória está sendo
servida, nos vales e vilas de montanhas do Hindu Kush — curry de bode e
arroz.
Fato é que os
Talibã venceram em quatro diferentes modalidades:
Uma: não importa o que seja dito contra
eles, os Talibã foram reconhecidos pela comunidade internacional. Pode ser
pouco reconhecimento, mas reconhecimento é reconhecimento, e quando alguém é
reconhecido, o reconhecimento tende a aumentar.
Duas: é imenso reforço na moral do movimento
Talibã como um todo, que os EUA tenham sido forçados a libertar cinco altos
comandantes Talibãs. É como prêmio à determinação obcecada dos Talibã, que
qualquer acordo tenha de ser precedido pela libertação de seus comandantes
ainda presos na Baía de Guantanamo.
Mullah Omar |
Três: é claro que o Mullah Omar esteja sendo
pintado como homem de 3m de altura, no bazaar afegão. Os afegãos
respeitam muito uma boa barganha, e Omar venceu uma, das melhores, e
barganhando contra uma superpotência.
Quatro, e por fim, o presidente Hamid Karzai
termina sua presidência como força já completamente exaurida, e os Talibã, mais
uma vez, veem confirmado o que sempre disseram com incansável insistência: que
Karzai jamais teve qualquer importância para o futuro do Afeganistão.
E para onde
vão os Talibã, a partir desse ponto a que chegaram? A declaração
oficial diz que a libertação dos comandantes Talibã foi obtida pela
“benevolência de Alá e pelos sacrifícios dos valentes e heróicos Mujahideen”.
É justo. A declaração reconhece que houve “negociação indireta” entre os Talibã
e os EUA, “mediada” pelo Qatar.
São fatos já
de domínio público, mas é importante que os Talibã os tenham reconhecido
oficialmente. Interessante: a declaração oficial dos Talibã afirma que as
negociações podem continuar, para obter a libertação dos demais Talibã que
permanecem presos em Guantánamo. A declaração não diz palavra sobre a
resistência, nem traz sequer um termo de propaganda condenando os EUA.
Hamid Karzai ficou furioso... |
Não
surpreendentemente, Karzai está lívido
de fúria por não ter sido envolvido nas negociações Talibã-EUA. Mas, já
se sabe: no bazaar afegão Karzai sempre foi considerado sem importância
para o futuro do Afeganistão. Não há dúvidas de que Washington humilhou Karzai
além de qualquer limite reparável. O campo político de Karzai insiste que ele
continuará a ter papel influente mesmo depois que deixar o poder. Mas é falar
por falar.
O Dr.
Abdullah Abdullah ou Asharf Ghani – os dois principais candidatos que disputam eleições
dia 14 de junho, talvez não processem Karzai, mas tampouco quererão alguma
eminência parda a pairar sobre eles. Perder poder implica perder capacidade
para garantir apadrinhamento efetivo e quem não tem capacidade para apadrinhar
efetivamente perde importância. É a lógica da vida desde tempos imemoriais na
sociedade afegã.
Abdullah Abdullah e Asharf Ghani |
Significativamente,
nem Abdullah nem Ghani criticaram os EUA por negociarem com os Talibã. Claro:
agora, como o resto do mundo, os dois também já sabem que o Paquistão está
arbitrando todo o jogo envolvendo os EUA e os Talibã, e que o Qatar só está empurrando
o carrinho com a bolsa de tacos. Há aí implicações para as políticas
futuras de Abdullah e Ghani em relação ao Paquistão.
Como na
Índia, há um campo barulhento nos EUA que também clama que a guerra contra os Talibã
deve prosseguir até ser “vencida”, não importa o quanto demore ou custe. Uma
avalanche de críticas apareceu no circuito de Washington contra o presidente
Barack Obama. Mas logo amainará, porque há mais gente nos EUA que entende que
essa não é guerra dos EUA e que os soldados têm de ser trazidos do Hindu Kush,
de volta para casa, o mais depressa possível.
Barack Obama e Bowe Bergdahl |
Claramente
Obama está do lado certo da história. A troca de prisioneiros de guerra melhora
consideravelmente as chances de negociar acordo que envolva os Talibã
como elemento basilar da estabilização do Afeganistão. Os EUA estão caindo fora
e tentando prender a maior quantidade possível de “fios soltos”: a troca
de prisioneiros com os Talibã é movimento nessa linha.
Não esqueçam
nem por um segundo que o sargento Bowe Bergdahl realmente desertou, desiludido com
a guerra, há cindo anos: deu as costas e saiu andando da base dos EUA. Mesmo
assim, Obama decidiu trazê-lo de volta para casa, ele também; e sabia que
pagaria alto preço por isso. Minha opinião é que comandante-em-chefe existe
para isso. Boa leitura o artigo
de Paul Pillar, ex-analista da CIA, sobre a controversa
decisão de Obama.
[*] MK Bhadrakumar foi diplomata de carreira do Serviço Exterior da Índia. Prestou serviços
na União Soviética, Coreia do Sul, Sri Lanka, Alemanha, Afeganistão, Paquistão,
Uzbequistão e Turquia. É especialista em questões do Afeganistão e Paquistão e
escreve sobre temas de energia e segurança para várias publicações, dentre as
quais The Hindu e Ásia Times Online, Al Jazeera, Counterpunch, Information Clearing House,
e muita outras. É o filho mais velho de MK Kumaran (1915–1994), famoso escritor,
jornalista, tradutor e militante de Kerala.
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