8/5/2012, Helena Smith,
The Guardian, UK (de
Atenas)
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Alexis Tsipras, líder da coalizão Syriza de partidos de esquerda, disse que o compromisso que Atenas assumiu com o “resgate” é nulo e inválido (Foto: Louisa Gouliamaki/AFP) |
O
destino da Grécia estava, na 3ª-feira à noite, nas mãos do líder de um partido
de extrema esquerda que, ao abrir as negociações para formar o novo governo
grego, declarou que o país rejeita os termos do acordo considerado indispensável
para a obtenção de mais um empréstimo internacional que manteria à tona a
economia grega.
Helena Smith, repórter |
Depois
de aceitar oficialmente a incumbência de organizar um governo multipartidário,
depois de eleições sem vencedor majoritário, Alexis Tsipras disparou ondas de
choque na direção dos mercados financeiros, ao declarar nulas e sem valor as
promessas feitas por Atenas para receber fundos de resgate, da União Europeia e
do FMI.
“O
veredicto popular declarou nulo o acordo do resgate” – disse Tsipras,
em nome de
Syriza , a coalizão de partidos de esquerda radical que sempre
foi estridentemente antiausteridade, e a qual, para grande surpresa dos
analistas, saiu das urnas com 16,8% dos votos. – “Esse é um momento histórico
para a esquerda e para o movimento popular, e de grande responsabilidade para
mim”.
Com
apenas três dias para constituir um governo que preencha o vácuo de poder que
emergiu das eleições gregas, Tsipras disse que procurará outras forças de
esquerda, num esforço para “por fim aos acordos de subserviência”.
A
assinatura daquele acordo de empréstimo “não foi a salvação; foi uma tragédia”,
prosseguiu Tsipras, 38 anos, e o mais jovem dentre os líderes de partidos
gregos. Os dois partidos que assinaram o acordo do empréstimo, “Nova Democracia”
e PASOK – e que até domingo e por 40 anos foram as forças dominantes da política
grega – devem, continuou Tsipras, retirar seu apoio ao acordo com a União
Europeia e o FMI:
“Os
partidos pró-resgate já não têm maioria no Parlamento e não podem continuar a
aprovar medidas que estão destruindo o povo grego. Essa vitória eleitoral da
coalizão de esquerda foi muito importante para toda a nossa
sociedade”.
Rasgar
as cartas de garantias que deram aos credores será prova de que “eles [ND e
PASOK] realmente lamentam o que fizeram ao povo grego”, disse Tsipras. Em
seguida requereu a suspensão temporária dos pagamentos que os gregos devem fazer
aos credores.
Mais
de uma vez avaliado como “peso leve”, Tsipras está agora em luta declarada
contra as forças da crise da dívida, depois de denunciar, sem meias palavras, as
desigualdades geradas pela chamada “austeridade”. Sua coligação de partidos,
Syriza, por sua vez, não para de acumular cada vez mais prestígio, numa
população de eleitores acossados por repetidas ondas de aumentos de impostos e
cortes em pensões e aposentadorias. Há esperança na Grécia, também, de que a
derrota do presidente Nicolas Sarkozy na França, suplantado pelo socialista
François Hollande, seja mais um sinal de que afinal a Europa começa a superar a
obsessão pela “austeridade”, em nome de um projeto de desenvolvimento e
crescimento com menos desigualdade no continente.
“Os
gregos não se transformaram em esquerdistas, do dia para a noite. O apoio
eleitoral à coalizão Syriza foi um modo de punir os dois grandes partidos
pró-resgate” – disse Haris Papasotiriou, professor de ciência política na Panteion University em Atenas. “Mas os
gregos, sim, decidiram dar uma chance a Tsipras. Embora haja pequeno espaço de
manobra, os eleitores entendem que Tsipras poderá arrancar da União Europeia e
do FMI, no mínimo, um acordo melhor”.
Não
será fácil para Tsipras construir uma verdadeira aliança política do grupo de
partidos que se uniram em coalizão eleitoral – ex-comunistas, maoístas,
trotskyistas, socialistas e verdes, que obtiveram 52 cadeiras, das 300 do
Parlamento grego (uma complexa legislação eleitoral assegura mais 50 cadeiras,
como bônus, à coalizão que alcance a maioria eleitoral).
A
coalizão Nova Democracia, de centro direita, cujos esforços para formar um
governo fracassaram na 2ª-feira, mal chegaram aos 18% dos votos, mais que a
coalizão de esquerda. Mas, com apenas 108 membros no Parlamento, não fez maioria
segura e não conseguiu formar novo governo.
As
declarações de Tsipras foram consideradas insanas pelos comunistas do KKE, cujo
secretário-geral, Aleka Papariga, recusou-se a reunir-se com Tsipras. O Partido
Comunista Grego é dos mais dogmáticos da Europa, e jamais perdoou jovens
reformistas como Tsipras por rejeitarem a doutrina marxista-leninista ortodoxa e
abraçarem o espírito da
glasnost.
Tsipras
procurou Fotis Kouvellis, líder do partido da Esquerda Democrática, do qual
obteve o compromisso de apoiar “um governo de coalizão anti-resgate”, sob a
condição de que o projeto implique manter a Grécia na zona do euro.
“Talvez
pareça impossível chegarmos a um acordo, mas abordaremos todos os partidos
[exceto os ultranacionalistas do Chrysi Avgi], para tentar que, se não quiserem
participar do governo, pelo menos entendam nosso projeto e não lhe façam
oposição” – disse um membro de destaque do bloco Syriza.
Nas
capitais europeias a preocupação cresce, com a Alemanha a insistir que os gregos
devem cumprir os acordos assinados com credores que se comprometeram a emprestar
um total de €240 bilhões, sem os quais o país não sobreviverá. (...)
Para
alguns deputados da coligação Syriza, o ultimato “resgate ou quebra” é exagerado
e não passa de tática de medo, usada pelos grandes partidos para obter apoio
para as “medidas bárbaras” reunidas no programa de ajuste fiscal que acompanha
os empréstimos e que são vastamente antipopulares.
Tsipras,
cujas maneiras descontraídas encobrem o político que, segundo alguns, seria
politicamente “frio como aço”, disse ao
Guardian
na
véspera das eleições do domingo: “Não somos contra o euro. Somos contra as
políticas que estão sendo impostas em nome do euro”.
“Dizem
que, agora que deixaram de ser partido de passeatas e talvez consigam formar um
governo, já começaram a ouvir mais os economistas” – disse Papasotiriou. – “Acho
que jamais imaginaram que estariam hoje na posição em que estão”, acrescentou.
“Mas acho que, se houver novas eleições, é possível que Syriza obtenha resultado
ainda melhor do que nas eleições passadas e cheguem, afinal, à posição de
maioria no Parlamento”.
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