11/5/2012, “Le Blog de Jean-Luc Mélenchon”
Traduzido pelo pessoal da Vila
Vudu
Jean-Luc Mélenchon |
Apesar
do esforço da mídia-empresa para fazer sumir do mundo o resultado da campanha da
Frente de Esquerda, a análise dos resultados do 1º turno das eleições mostra que
a Frente de Esquerda foi, dentre todos os concorrentes, o que obteve maior
avanço nas presidenciais francesas de 2012. E que a estratégia de enfrentar
diretamente Le Pen fez recuar fortemente os votos que a direita recebeu em
muitas cidades e áreas populares.
As
urnas desmentiram a “análise” da mídia-imprensa, segundo a qual a campanha pela
presidência não teria mobilizado os franceses. A participação alcançou 80%,
nível alto e relativamente homogêneo em todo o país.
O
que aconteceu foi que os eleitores rejeitaram a cobertura das eleições oferecida
pela mídia-empresa e o tratamento ‘midiático’ das questões e das discussões.
Sarkozy
e Hollande monopolizaram, durante meses, pelo menos 75% do tempo de transmissão
por rádio e TV. Mesmo assim, somados, os votos para esses dois candidatos não
chegaram, no 1º turno, a 43% do total. Maioria significativa dos eleitores,
portanto, não escolheu os candidatos midiatizados que chegaram ao 2º turno.
Cerca
de 80% dos eleitores não votaram, no 1º turno, no candidato que, eleito, terá
todos os poderes da presidência. E esse, sim, é sintoma grave de o quanto a
monarquia presidencial midiática da 5ª República pouco tem a ver com democracia.
VERDADE:
Sarkozy perdeu eleitores
Nicolas
Sarkozy perdeu 1,8 milhão de eleitores, em relação a 2007. A análise dos
resultados por região mostra que só a grande burguesia manteve-se fiel a
Sarkozy. Nesse grupo, os votos mantiveram-se praticamente idênticos: 46,5% em
Versailles hoje, e 47% em 2007; no VIIème. arrondissement [1]
de Paris, Sarkozy até seduziu novos eleitores: passou de 56 a 58%; e também em Neuilly,
onde teve 72,64%. As grandes fortunas, pois, cerraram fileiras em torno do
presidente dos ricos.
Nos
bairros populares, foi onde a direita mais encolheu. Em Pas de Calais , Sarkozy perdeu
50 mil eleitores. Em Saint-Quentin dans l’Aisne, Sarkozy caiu, de
31 a 25%
dos votos. E em Perpignan, região popular, ou em Meaux, caiu de 34% a 27%.
VERDADE:
A Frente Nacional moveu-se mais para a direita
Marine
Le Pen acrescentou 2,6 milhões de votos ao resultado que seu pai obteve em 2007.
Com cerca de 18%, ela superou o recorde histórico da Frente Nacional em 2002,
mas não ultrapassou a soma dos votos dados a seu pai e a Mégret (19%). 70% desse
aumento é resultado do fracasso de Sarkozy. Os votos que Sarkozy perdeu na
direita migraram diretamente para Marine Le Pen.
O
que se viu portanto foi uma aceleração da direita rumo à extrema-direita, não
algum avanço de Marine Le Pen sobre novos eleitores ou sobre o voto popular. Por
exemplo, em Florange, comunidade em torno dos altos fornos da indústria Arcelor
Mittal, Sarkozy perdeu 606 votos e Marine Le Pen ganhou 636. Mas, aí, a Frente
de Esquerda ganhou também 654, votos que, bem claramente, foram conquistados
contra a abstenção.
Os
vasos comunicantes que ligam Le Pen e Sarkozy à direita são especialmente
visíveis no norte e no leste da França, onde a Frente Nacional alcançou seus
melhores resultados. Marine Le Pen obteve praticamente o mesmo número de votos
que Nicolas em várias áreas: Picardie, Lorraine, Nord-Pas-de-Calais, mas também
em Languedoc-Roussillon. Sem o trabalho da Frente de Esquerda, para conter o
avanço da Frente Nacional, o cenário em que Sarkozy seria derrotado pela Frente
Nacional não estaria muito distante. Le Pen de fato ultrapassou os 20% de votos
em 11 regiões (uma, de cada duas) e em 43 departamentos.
VERDADE:
A esquerda avançou graças à Frente de Esquerda
O
total de votos de esquerda aumentou muito em relação à eleição presidencial
anterior: passou, de 13,3 milhões (36,4%) para 15,7 milhões (43,7%). É o melhor
resultado eleitoral da esquerda em eleições presidenciais na França, desde 1988.
François Hollande é responsável por apenas uma pequena parte dessa dinâmica:
teve apenas 770 mil votos a mais que Ségolène Royal. Em Evry, o número de votos
dos socialistas estagnou; e em Lille o Partido
Socialista perdeu eleitores entre as duas presidenciais.
A
parte essencial da dinâmica de avanço da esquerda veio, visivelmente, da Frente
de Esquerda, que trouxe 2/3 dos novos votos que a esquerda conquistou.
VERDADE:
A Frente de Esquerda sai constituída e fortalecida das eleições
Com
cerca de 4 milhões de votos (11,11%), a Frente de Esquerda ganhou 3 milhões de
votos, a partir do lançamento de Jean-Luc Mélenchon como candidato às eleições
europeias de 2009 (6,5%). A força assim constituída deve ser considerada sólida,
sobretudo porque está distribuída por todo o país: em nenhum dos departamentos a
Frente de Esquerda teve menos de 7% dos votos; teve 10% e mais em 70
departamentos; e mais de 13% dos votos em 20 departamentos.
Assim
se define uma nova força política, que se afirmou em todo o território, em todos
os casos com mais votos do que os registrados na implantação histórica das
organizações que formam a Frente de Esquerda. Grandes cidades sem qualquer
tradição comunista deram mais de 15% de votos ao candidato Jean-Luc Mélenchon da
Frente de Esquerda: por exemplo, Grénoble, Toulouse, Lille ou Montpellier. E
houve avanços espetaculares, em cidades nas quais Jean-Luc Mélenchon provocou
fortes clivagens políticas. Foi o que aconteceu em Alsace, onde a Frente de
Esquerda trabalhou a favor da abolição do Concordat, e aumentou o número
de seus eleitores em mais de 300%.
Também
em Marseille, o discurso claro e sem meias palavras de Jean-Luc Mélenchon sobre
os benefícios da mestiçagem encontrou eco popular de massa e empurrou a Frente
de Esquerda para cerca de 14% na cidade e para mais de 20% em vários bairros
populares da periferia no norte da cidade. Lá também, foi a estratégia de
combater diretamente a Frente Nacional que polarizou a discussão e levou a
Frente de Esquerda a derrotar a Frente Nacional.
Fato
é que, diferente do que disse a mídia-empresa, os muitos votos dados a Marine Le
Pen não são votos que teriam sido dados a Jean-Luc Mélenchon. O processo é
completamente diferente: nos pontos onde houve avanço da FN, também houve avanço
da Frente de Esquerda. Foi o que se viu sobretudo em áreas operárias, que de
modo algum foram ‘seduzidas’ por Marine Le Pen.
Por
exemplo, em Petit-Couronne na Seine
Maritime , onde o fechamento da refinaria Petroplus ameaça com o
desemprego 900 trabalhadores – e cidade que foi visitada por todos os candidatos
em campanha -, o resultado foi claro: Sarkozy perdeu 249 votos; Hollande ganhou
114; Le Pen, 436; e Mélenchon, 693 e um claro maior avanço dentre todos os
candidatos.
Sinal
também dos bons resultados da estratégia da Frente de Esquerda, que se dedicou a
fazer recuar a direita, os dois departamentos nos quais Sarkozy teve seus piores
resultados – Seine-Saint-Denis e Ariège – são os mesmos nos quais a Frente de
Esquerda obteve os melhores resultados, com cerca de 17% e picos de 25% em
numerosas cidades populares.
TAREFA:
Desmentir o discurso da mídia-empresa sobre os resultados
Uma
semana depois do 1º turno, os principais veículos apresentaram quadro
extremamente deformado da realidade dos resultados. Aqui, um primeiro desmonte
das principais mentiras publicadas (e repetidas).
MENTIRA:
Marine Le Pen fez 20% e alcançou seus objetivos
Marine Le Pen |
A
desinformação sobre os resultados da Frente Nacional começou logo às 20h da
noite das eleições, quando vários veículos anunciaram, erradamente, que Marine
alcançara e ultrapassara os 20% dos votos. De fato, chegou só aos 17,9%. Além de
oferecer números errados (erro de mais de 11%), essa notícia mentirosa deforma
completamente o significado do resultado da FN. Porque faz crer que Marine Le
Pen teria sido bem-sucedida e teria conseguido o que se propôs conseguir. Não
foi bem-sucedida e não conseguiu. A mesma mentira levou a uma comparação errada
com o resultado da extrema direita em 2002. De fato, se tivesse recebido 20% dos
votos, Marine Le Pen teria ultrapassado o resultado histórico da extrema direita
em 2002.
Na
verdade, com seus 17,9%, Marine Le Pen recebeu menos votos que seu pai e Bruno
Mégreta em 2002. Quanto aos jornalistas que tomaram como prova de alta
inteligência esquecer esse argumento, e puseram-se a repetir que ela teria tido
1 milhão de votos a mais, esqueceram também que, em comparação com 2002, havia
agora novos 4,8 milhões de eleitores inscritos.
Estranhamente,
todos os veículos da mídia-empresa repetiram incansavelmente que a Frente de
Esquerda não conseguira ultrapassar Marine Le Pen, mas nenhum se lembrou de
dizer que Marine Le Pen fracassou no esforço para alcançar as metas que ela
mesma fixara. Não chegou aos 20%. Nem, como também dizia que aconteceria, chegou
ao 2º turno. Tampouco os jornais e televisões noticiaram que Marine Le Pen
também fracassou no projeto de impedir que Jean-Luc Mélenchon chegasse à metade
dos votos que ela receberia. Tivemos mais que isso: foram 62%.
NÃO
DEU NA TELEVISÃO: a Frente de Esquerda fez recuar a Frente Le
Pen
Embora
ainda não tenha tido sucesso no plano nacional, a Frente de Esquerda já começou
por alcançar a meta a que se propôs, de aparecer à frente de Le Pen em várias
grandes cidades e muitos bairros operários. Em Lille, a Frente Nacional caiu, do
3º lugar em 2002, para o 4º lugar em 2012. A Frente de Esquerda subiu
muito: para 15% dos votos. Mesmo cenário em Montpellier: do 2º lugar em
2002, a
Frente Nacional caiu para o 4º lugar em 2012. E também aí a Frente de Esquerda
teve mais votos e apareceu à frente de Le Pen, tendo subido para o 3º
lugar.
A
degringolada da Frente Nacional foi ainda mais acentuada nas áreas populares das
grandes cidades, como Vaulx-en-Velin, Aubervilliers, Stains ou Mantes
la Jolie.
Várias vezes vista no 1º lugar nessas regiões em 2002, em
2012 a
Frente Nacional apareceu em 4º lugar, amplamente derrotada pela Frente de
Esquerda. Em
Vaulx-en-Velin , a Frente Nacional passou, da posição de mais
votada em 2002, para o 4º lugar em 2012 (21/7% dos votos para o pai, em 2002, e
13,83% para a filha em 2012). E a Frente de Esquerda derrotou a Frente Nacional
e chegou ao 2º lugar, com 18,42% dos votos. Em Grigny, na cidade da Grande
Borne [aprox. “grande favela”] em Essonne, a Frente Nacional caiu de 17 para
11%; e a Frente de Esquerda apareceu com mais de 21% dos votos.
MENTIRA:
Os trabalhadores votam Le Pen
Mais
uma ficção criada e divulgada pela mídia-empresa: que os trabalhadores teriam
votado Le Pen. Para criar essa ficção, os veículos acreditaram mais em pesquisas
que nos números saídos das urnas. Foram “pesquisas de boca de urna”, feitas em
amostras não significativas, com apenas algumas centenas de trabalhadores.
Estimaram que os votos operários para Le Pen ficariam entre 29 e 35%, variando
conforme a pesquisa. E os votos operários para Jean-Luc Mélenchon não
ultrapassariam 11% (IPSOS) e 18% (IFOP)! Já a simples diferença entre as
estimativas obrigaria a não confiar demais nas “pesquisas”. Mas, mesmo quando
são mais confiáveis, as mesmas pesquisas significavam que 65-70% dos operários
não votam com a Frente Nacional. E sem considerar a abstenção entre os
operários, que os pesquisadores situam em torno de 30%.
Se se correlacionam os votos para
a Frente Nacional e o universo dos operários inscritos para votar, 80% dos
operários não votam com a Frente Nacional. Pois, nesse contexto, a mídia-empresa
falava, já há um ano, de “verdadeiro plebiscito operário, para Marine Le Pen”
(Journal du Dimanche, 24/4/2011) ou a apresentavam, generosos, como
“candidata preferida dos trabalhadores” (Le Monde, mesma data [2]).
Os jornais e televisões da mídia-empresa não reconheceram o erro e, pior,
insistiram na mesma via de deformar a realidade, como em matéria de i-télé, no dia seguinte às eleições de
2012, que requentava a metáfora “Marine Le Pen vence o plebiscito operário”.
[3]
Outro
resultado, que se lia evidentemente nas mesmas sondagens, jamais apareceu em
manchetes e “análises” jornalísticas: a tendência de voto de comerciantes e
chefes de empresas, afinal, votos quase tão importantes quanto o voto operário.
Nenhum jornal, revista ou televisão da grande mídia-empresa jamais escreveu,
sobre Marine Le Pen, que é “a candidata preferida dos patrões”.
Especialistas
em repetir avaliações dos institutos de pesquisa e jamais interessados em
analisar detalhadamente os resultados das urnas, os jornalistas da grande
mídia-empresa fizeram silêncio absoluto sobre os avanços da Frente de Esquerda
entre os operários. Isso, apesar do que se viu em Florange
(Arcelor-Mittal ), em Montbéliard (PSA
Sochaux ), em Saint-Nazaire (instalações da transnacional
Alstom) ou em Douai; e em Lens, no Nord-Pas-de-Calais, a Frente de Esquerda
conquistou mais votos que a Frente Nacional, entre 2007 e 2012.
Os
resultados eleitorais em Montbéliard mostram bem a dinâmica operária da Frente
de Esquerda.
Essa cidade, que é há muito tempo feudo eleitoral do coordenador geral da campanha de François Hollande, Pierre Moscovici, foi visitada por Jean-Luc Mélenchon dia 24 de janeiro, em apoio à luta dos trabalhadores da empresa PSA - Peugeot Citroën, no principal polo industrial da França.
MENTIRA:
Não se viu avanço da esquerda
François Hollande |
A falsa impressão de que não teria
havido avanço na esquerda francesa resulta de todos os jornais e redes de
televisão terem dado atenção exclusiva aos resultados da Frente Nacional. É
resultado também de vários veículos da mídia da direita francesa terem
apresentado os resultados de Nicolas Sarkozy como se fossem muito maiores do que
o previsto. O próprio Sarkozy trabalhou também na direção desse tipo de
propaganda de manipulação. Sarkozy disse no jornal republicano Est, dia
25/4: “Não houve qualquer arrancada
da esquerda. O total da esquerda foi inferior aos números de outras
eleições”. [4]
Nicolas Sarkozy |
Os
votos dizem exatamente o contrário. A direita perdeu 3,2 milhões de votos
(Sarkozy perdeu, só ele, 1,7 milhão) e a esquerda ganhou 2,3 milhões, um dos
melhores resultados de toda a 5ª República.
Ao
subestimar o avanço da esquerda, a mídia-empresa fez calar também completamente
a origem do avanço que houve. 2/3 dos votos que a esquerda conquistou foram
votos para a Frente de Esquerda. Foi a primeira vez, em 30 anos, que dois
candidatos do campo da esquerda alcançaram porcentagem de votos de dois dígitos.
Os votos dados a Jean-Luc Mélenchon permitiram também deslocar o centro de
gravidade de toda a esquerda, afinal, para aesquerda. A esquerda autônoma que
havia no Partido Socialista sempre representou menos de 20% dos votos. Hoje,
representa 30%. E afirma-se, com a Frente de Esquerda, como o único voto útil
para fazer recuar a Frente Nacional e forçar adiante o avanço de toda a esquerda
francesa.
Notas dos
tradutores
[1] Uma das 20 áreas administrativas
em que se divide a cidade de Paris. Sobre o VIIème. Arrondissement lê-se na Wikipedia:
“É a região da cidade onde vivem os mais ricos, desde o século 17, quando se
tornou novo endereço da mais rica nobreza da França”.
[2] 24/4/2012, Le Monde em: “Sondages
: Marine Le Pen, candidate préférée des ouvriers”
[3] Também, um ano depois, dentre
outros, em: 23/4/2012, i>TÉLÉ, em:
“Marine
Le Pen plébiscitée par les ouvriers?”
[4] 25/4/2012, Est Républican, em: “NICOLAS
SARKOZY: JE SUIS TRÈS DÉTERMINÉ”
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