22/5/2012, Pepe Escobar,
Asia Times Online - THE ROVING EYE
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Pepe Escobar |
Um espectro ronda a
Europa
[1].
Não, não é o comunismo. São as agências norte-americanas de avaliação de risco.
A Grécia está quebrada; a Eurozona está a ponto de rachar; o banco JP Morgan
comete “erros” de bilhões de dólares; empregos, não há (nem futuro) para as
novas gerações. E, mesmo assim, o braço armado do 0,1% das elites ocidentais
ocupa Chicago – convertida em cidade-estado policial orweliana – para discutir
uma “defesa inteligente” [orig. smart defense].
No
Afeganistão, a “inteligente” Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN)
prepara-se, de fato, para uma fuga humilhante. “Defesa inteligente” é palavra em
código para “o dinheiro sumiu”. Só cinco, dos 28 estados-membros da OTAN gastam
2% dos respectivos PIBs com os militares – como quer a OTAN. Um desses era –
surpresa! – a Grécia. Eis a trilha rumo ao desastre certo, para o neoliberalismo
armado. Primeiro, a Grécia foi mais ou menos obrigada a comprar submarinos
caríssimos, de franceses e alemães; depois, foi obrigada a fazer cortes no
orçamento. É o plano de ajuda da OTAN: “food for subs”, vocês nos dão
comida, nós lhes vendemos submarinos.
Os
EUA pagam nada menos que 75% das contas da OTAN – mais uma demonstração cabal de
que a OTAN é o braço europeu, armado, do Pentágono. Mas, em 2011, os membros da
União Europeia (EU) gastaram nada menos que $180 bilhões, em Defesa. Agora,
acabou. Ninguém mais tem dinheiro. Quer dizer: doravante, o Pentágono, sozinho,
terá de manter a máquina em operação.
E
mantê-la-á – com folga. Como esperado, ontem, domingo, na Chicago ocupada, a
OTAN aprovou – melhor ainda: o presidente Barack Obama dos EUA e seus aliados
“acabam de decidir” – dar prosseguimento à primeira das quatro fases do escudo
norte-americano antimísseis para a Europa.
Na
prática, significa um navio de guerra dos EUA armado com interceptores ancorado
no Mediterrâneo; e um sistema de radar da OTAN, instalado na Turquia e
controlado do quartel-general em Ramstein, na Alemanha. A vasta (e crescendo)
base militar em Ramstein é comandada por um general norte-americano. Mas,
segundo o jornal turco Zaman, haverá um general turco, lá, como
subcomandante. É a cenoura que coube à Turquia, por ter feito campanha a favor
de mudança de regime na Síria.
Cheeseburger na Russia |
Os
que acreditam no que a OTAN diz pelos veículos da imprensa-empresa – que o tal
escudo nada tem a ver com a Rússia e é defesa contra os mísseis do Irã “do mal”
– melhor fariam se se aliassem a Alice no País das Maravilhas. Para todos os
objetivos práticos, o comandante do exército russo, general Nikolai Makarov, já
disse que a Rússia responderá, com uma base de mísseis Iskander de curto-alcance em
Kaliningrad, junto à fronteira com a Polônia. É fácil tirar a OTAN de dentro da
Guerra Fria, mas ninguém tira a Guerra Fria de dentro da OTAN.
No
ponto, nem mal-passado nem bem-passado, sem ketchup
Sobre
o Afeganistão, o que a Casa Branca espalha pelos veículos da mídia-empresa é que
Obama recomendou ao presidente afegão Hamid Karzai que “implemente a reforma
eleitoral, ponha fim à corrupção e pressione os Talibã para um acordo”. É além
de delírio desejante: acreditar que o sistema super corrompido de Karzai se
“autorreformará” é como crer que a Casa de Saud seja amante da democracia
jeffersoniana. Se houver qualquer coisa semelhante a “reforma eleitoral”, os
aliados de Washington perderão, por muito tempo, todas as eleições que se
inventem. E é o Talibã quem pode obrigar Karzai a fazer algum acordo, não o
contrário.
Assim
sendo, o que sobra, para salvar a civilização ocidental? Com batatas fritas à
francesa, não à moda “liberdade”.
Dessa
nova diplomacia cheeseburger, selada no Salão Oval, entre Obama e o novo
presidente da França, François Hollande, espera-se que salve a Grécia, erga a
Eurozona e dê nova partida, afinal, na economia dos EUA, bem a tempo para as
eleições presidenciais de novembro nos EUA. Como é que os indômitos "Cinco", da
cadeia EUA de búrgueres, não pensaram nisso antes?
Eis
o cálculo de Obama:
Se
o Republicano Mitt Romney for eleito em novembro, estaremos ainda mais ferrados
do que estamos hoje. Preciso de empregos. Preciso de economia em recuperação.
Preciso que os malditos europeus ponham ordem na casa. Não posso ficar sentado
aqui, à espera de que eles resolvam o problema grego: tenho de vencer uma
eleição!
Eis
o cálculo de Hollande:
Minha
eleição está vencida. Prometi empregos e crescimento. Agora, preciso de uma
coalizão de vontades só minha – para o crescimento; ou seremos atropelados pela
extrema direita, em todas as urnas. Mon Dieu, por que “Onxelá” –
codinome, chanceler alemã Angela Merkel – não entende isso?
Para
o duo franco-americano, é situação de ganha-ganha. A política econômica de
Hollande é, de fato, a economia política do Obama Team. Com certeza já
expuseram a (nova) lei a “Onxelá”, no plácido retiro de Camp David, no G-8 – protegidos das
agruras do mundo real por um exército suficiente para executar qualquer mudança
de qualquer regime em qualquer lugar, em cinco minutos.
Problema
é que, nem Barack, nem François avisaram o Deus do Mercado – nem os bancos
europeus e norte-americanos – sobre seus projetos. Os Mestres do Universo não
dão bola alguma para a Grécia, berço da democracia; querem é a grana deles, de
volta.
Obama
tem pressa. O atual Supremo Interventor italiano, Mario Monti – ex-Goldman Sachs
– talvez tenha credibilidade de mercado, para convencer Berlim e a Troika (Banco Central Europeu, Comissão
Europeia e Fundo Monetário Internacional) de que, ou a Europa cresce, ou não
haverá dinheiro para ninguém. Mas Obama também precisa de um aliado estratégico
político. E, com certeza, não será “Onxelá”, a dominatrix da austeridade.
Filet mignon à iraniana |
Prefiro
um bife
O
problema é que esses cheeseburgers estão encharcados de óleo. Petróleo
iraniano. Obama faz-se de durão contra o Irã, essencialmente por razões
eleitorais. Nos próximos cinco meses, bem poderia conseguir redirecionar o
debate, não fossem os europeus que – obedecendo ordens suas, de fato – podem
fazer valer o boicote contra o petróleo do Irã, a iniciar-se dia 1º de julho
p.f.. Obama teme a consequência inevitável do boicote: os preços do petróleo, na
estratosfera. Se isso acontecer, bye bye recuperação europeia, a ser
seguido, claro, por bye bye reeleição de Obama.
Isso
é que torna ainda mais sumarenta a próxima rodada de conversações em Bagdá, essa
semana, entre o Irã e as nações do P5+1. Do ponto de vista do Obama Team,
o melhor cenário possível seria... Vamos concordar que temos de conversar um
pouco mais.
Com
isso, Obama ganharia uma janela pela qual pressionar – com a ajuda de Hollande –
a favor da ideia de a Europa esquecer o boicote ao Irã, pelo menos enquanto
prosseguirem as conversações entre as partes e, no mínimo, pelos próximos seis
meses. Afinal, o pacote de sanções ultra debilitantes lá está e lá continua – e
não há dúvidas de que está fazendo sofrer a população iraniana, muito mais do
que a liderança em Teerã.
A
única coisa que importa ao Obama Team, acima de tudo no mundo, é garantir
a vitória, dia 4/11. Essa diplomacia cheeseburger funcionará? Ou Mitt
Romney contra-atacará, prometendo política de “nenhum bife abandonado na
retaguarda”, com muito ketchup iraniano?
Nota
dos tradutores
[1]
É a frase de abertura do Manifesto
Comunista (1848), de Marx e Engels. Acesse
o “link”, excelente tradução.
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