7/5/2012, Pepe Escobar, Asia Times Online [de Moscou, Rússia]
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Vladimir Putin pretende aproveitar o potencial de recursos até extremo oriental do território da Rússia. |
Vladimir Putin – o ápice de um sistema muito altamente
personalizado – está de volta à presidência da Rússia.
Esqueçam qualquer ideia de
revolução de veludo, para mudança de regime. Mas não deixem de prestar atenção
aos agitos da classe média russa (25% da população, 40% da força de trabalho).
Primeiro, viraram consumidores; agora, estão virando cidadãos.
Isso implica que não desistirão da
demanda por um judiciário genuinamente independente; por proteção aos direitos
de propriedade; e por uma burocracia que não seja infinitamente corrupta.
O Putinator dedicar-se-á agora a
descentralizar a Rússia. Todos aprovam: Moscou e as províncias. Será batalha
dificílima –, mesmo sem incluir o objetivo de melhorar o crescimento de 3,5% ao
ano (muitos, na União Europeia, morreriam por tal crescimento) e diminuir o
aparentemente incansável voo dos capitais.
Três temas serão chave para o
futuro imediato da Rússia: a economia; a conquista dos territórios orientais; e
as pedregosas relações entre Rússia e OTAN. Esperemos para ver que plano de jogo
o Putinator concebeu para enfrentá-los.
É a economia, camarada
A Rússia não sobrevive, se o
petróleo for vendido a baixo preço no mercado global. Para equilibrar o
orçamento – e também a conta corrente – Moscou precisa do barril a, pelo menos,
US$115. [1]
Putin não deseja desvalorizar o
rublo, nem permitirá que encolham as massivas reservas do país.
Portanto, idealmente, a Rússia não
pode continuar a depender de exportar commodities. Qualquer administrador de
fundo hedge em New York ou analista financeiro em
Londres dirá que a Rússia precisa demonstrar que é governada por leis, não pelos
impulsos do Kremlin.
Esse é o modo suavizado de eles
preverem o colapso, no caso de a Rússia não se por a privatizar adoidadamente,
pelos padrões anglo-norte-americanos. De fato, é muito mais complicado que isso.
Empire – A Rússia de
Putin
O Putinator com certeza terá de
tomar alguma medida radical, para convencer os investidores estrangeiros a levar
para lá sua riqueza; e, os investidores locais, a não exportarem para paraísos
fiscais (apesar do magro imposto de renda, de 13%) toda a riqueza que juntaram.
É onde se encaixa o fim da burocracia, demanda chave da classe média. Crescer 5%
ao ano seria ótimo para a Rússia. 5% seria o número mágico, nas expectativas de
Putin.
Sim, claro, haverá algumas
privatizações, mas não será o que se viu nos anos de Faroeste à moda Yeltsin. E
os empresários russos terão de ser mais competitivos, depois de a Rússia afinal
for admitida na Organização Mundial do Comércio (OMT), por acordo que deverá
estar concluído em agosto de 2012.
A empresa Gazprom – proprietária
de nada menos que 25% das reservas de gás do mundo – continuará a ser gerida
como braço da política externa russa (é a síndrome do “país Gazprom”). Mas
também será administrada como empresa global altamente lucrativa – mais
lucrativa, de fato, que a Exxon.
Putin sabe que a Rússia não pode
competir com a China (onde o preço da mão-de-obra é um terço do que custa na
Rússia). Sabe também que a China produz tecnologia de ponta. Contem portanto com
que Putin coordenará políticas para diversificar a base de manufatura russa,
selecionando indústrias de serviços de ponta, com conhecimento de alto valor
acumulado. Bom ponto de partida é o novo Vale do Silício, nos arredores de
Moscou. E melhorias (já visíveis) na infraestrutura, nos transportes e nas
comunicações.
Jovens russos, o Oriente os
espera!
Na prática, uma empresa estatal
russa será encarregada da dura tarefa de desenvolver o leste da Sibéria e o
extremo leste – aquela vastidão de terra e recursos naturais que cobrem 60% do
território russo.
O projeto de lei federal que
criará essa empresa – redigido sob supervisão de Putin – foi apresentado semana
passada aos ministérios da Energia, de Recursos Naturais, do Comércio e da
Indústria.
Com sede em Vladivostok e isenta
de impostos sobre os lucros, a empresa terá participação de 17 bilhões de
dólares dos recursos, energia e infraestrutura de empresas como a RysHydro,
Ferrovias da Rússia e da empresa de diamantes Alrosa, além de poder para tomar
decisões no campo da energia, que envolvam as gigantes Gazprom e Transneft.
Rostislav Turovsky,
vice-presidente do think tank Centro
para Políticas Tecnológicas, definiu a ideia como “organizar um governo paralelo
que será controlado pessoalmente por Putin” e quem venha a assumir o lugar de
Dmitry Medvedev como primeiro-ministro.
Podem-se esperar tempos de bonanza nos investimentos: ouro em
Irkutsk, minas de ferro e campos de petróleo em Krasnoyarsk e carvão em Tuva.
Esses recursos serão importantes para que a Rússia ganhe impulso e velocidade na
corrida à caça dos minérios. O timing
também é essencial, porque a próxima reunião da Cooperação Econômica
Ásia-Pacífico [orig. Asia-Pacific
Economic Cooperation (APEC)] acontecerá em setembro, em Vladivostok.
O aspecto do “Oleo-gasodutostão” é
chave, outra vez; nesse caso, trata-se dos dois mega gasodutos que partem da
Sibéria.
Moscou e Pequim estão disputando
preços ferozmente. A Gazprom disse a Pequim que pode vender a mesma quantidade
de gás para a Europa com lucro muito maior; e Pequim disse que não pode aumentar
o preço da gasolina em casa, sem perder a vantagem competitiva na manufatura.
A China está agora propondo um
“novo modelo” – o que indica que já há algum acordo à vista.
Os interesses dos BRICS Rússia e
China sobrepõem-se. O oleoduto ESPO (East
Siberian-Pacific Ocean – bombeia 300 mil barris/dia, de Skovorodino, Rússia,
para Daqing, China – entrou em funcionamento ano passado.
A China é agora o principal
parceiro comercial da Rússia; o comércio bilateral alcançou $79 bilhões em
2011. A
empresa CIC (China Investment Corp) –
administradora do fundo soberano de Pequim – investirá cada vez mais na Rússia.
Globocop, go home
Apertem os cintos. Com a Rússia,
hoje, sob o comando de Putin, nada será fácil para a OTAN.
Enquanto a aliança atlântica
continuar a perder miseravelmente aquela guerra no Afeganistão, ela simplesmente
nada cederá à Rússia na discussão sobre os mísseis de defesa e a ampliação da
OTAN.
Na Cúpula de Lisboa, no final de
2010, quando a OTAN expôs seu mapa do caminho da dominação global virtual, um
detonado Conselho OTAN-Rússia apoiou o que foi chamado de “Revisão Conjunta dos
Desafios de Defesa Comum para o século 21” , que incluía Afeganistão, terrorismo,
pirataria, proliferação de armas de destruição em massa e desastres naturais e
provocados pelo homem.
Ficou mais ou menos combinado que
continuariam a discutir os mísseis de defesa.
E por isso, há apenas duas
semanas, ainda estavam discutindo contraterrorismo, contrapirataria, guerra às
drogas (na Ásia Central), treinamento de técnicos da Força Aérea afegã e
arranjos para liberar o trânsito para a OTAN no Afeganistão. A Rússia foi
convidada a enviar representante à reunião sobre o Afeganistão, esse mês,
durante a Conferência da OTAN em Chicago.
Putin já várias vezes denunciou a
OTAN como “relíquia da Guerra Fria”. Mas admite que, vez o outra, a OTAN
“desempenha papel de estabilização” em locais como o Afeganistão.
Esse é o argumento que explica que
o Kremlin ainda considere a possibilidade de um aeroporto subutilizado em
Ulyanovsk ser alugado como armazém de trânsito para equipamentos não letais da
OTAN que têm de ser retirados do Afeganistão.
Os comunistas russos entraram em
surto e iniciaram imediatamente uma campanha batizada “NATO Nyet!” [OTAN, Não!]. Que ultraje! A
OTAN, na cidade onde nasceu Lênin!
Mas até o ex-embaixador da Rússia
na OTAN, Dmitry Rogozin, defende o acordo de Ulyanovsk como bom negócio, que
estimularia a economia local. Os aviões cargueiros, disse ele, carregarão itens
não letais – dentre outros, “o papel higiênico da OTAN”. Os comunistas não
perderam a deixa e jogaram rolos de papel higiênico contra prédios do governo da
Rússia.
Mas o Putinator não acalenta
ilusões sobre a OTAN. [2] Há dois
meses, disse que “a aliança já nos oferece “fatos em campo” que não contribuem
para construir confiança”.
A questão chave é que a OTAN, mais
uma vez – extra oficialmente – está dentro da Georgia, com soldados
norte-americanos e turcos, e a Georgia continua a enviar soldados para operações
da OTAN. Para o Putinator, ter a OTAN ativa na fronteira sul da Rússia é caso
absoluto de não-não-e-não.
O secretário-geral da OTAN Anders
Fogh Rasmussen fala muito de uma “cooperação funcional” com a Rússia. Para
Moscou, não passa de retórica oca. Fato é que, quando o presidente da Georgia,
Mikhail Saakashvili, visitou o quartel-general da OTAN, há um mês, Rasmussen
disse: “A Georgia é parceiro especial para a OTAN. Vocês estão envolvidos em
nossas operações, na questão do acesso, estão comprometidos com as reformas. Em
resumo, a Georgia é parceiro modelo”. [3]
A quantidade de fogos de artifício
deve aumentar à frente. Para Putin, a OTAN sempre trata a Rússia em tom e termos
da Guerra Fria. O governo Obama só fez “reiniciar” [orig. reset] mais da mesma retórica oca. Nesse
momento, todos os olhos estão voltados para a Conferência da OTAN em Chicago.
Não haverá reunião OTAN-Rússia. A Guerra Fria parece estar, não encolhendo, mas
inchando. Muita atenção! O Putinator sabe jogar esse jogo.
Notas de
rodapé:
[1] 22/7/2011, GasDay - “Putin
Sees High Oil Prices, Balanced Budget This
Year”
[2] 27/2/2012, The Embassy of Russian Federationto the
United Kingdom of Great Britain and Nothern Ireland em: “Russia and the changing world – article by
V.Putin on foreign policy”
[3] 3/4/2012, “NATO Secretary General
praises Georgia’s commitment and reforms”
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