Marcio Thomaz Bastos |
Publicado
em 24/05/2012 por Mair Pena
Neto*
Tão
ou mais incômoda que a atitude do contraventor Carlinhos Cachoeira diante da CPMI
que investiga suas atividades criminosas é a presença, a seu lado, do brilhante
advogado e ex-ministro da Justiça do Brasil, Marcio Thomaz Bastos. Não deixa de
causar estranheza ver ali, na defesa de um homem que corrompia as estruturas da
sociedade, outro homem que, até bem pouco tempo, era responsável justamente por
zelar pelo bem destas mesmas estruturas.
É
ponto pacífico que todo cidadão tem direito à defesa jurídica, por pior que
tenha sido o seu crime, mas não deixa de ser constrangedor ver o ex-ministro da
Justiça orientando o contraventor a como proceder e empenhando toda a sua
capacidade profissional para livrá-lo de acusações que custaram muito ao Estado
para serem fundamentadas.
Carlinhos
Cachoeira está preso em decorrência de duas operações da Polícia Federal, que
constataram o alcance de sua ação criminosa entre os poderes constituídos. A
organização do contraventor tomou de assalto um estado inteiro da federação, o
de Goiás, numa microrrepresentação do que acontece atualmente no México, onde o
crime se infiltrou de tal modo no aparelho de Estado, que se torna a cada dia
mais difícil combatê-lo.
A
influência de Cachoeira se via no Executivo goiano, a partir do próprio
governador Marconi Perillo (PSDB); no Legislativo, não apenas local, mas entre
os representantes do estado na Câmara Federal, com destaque para a figura do até
então impoluto senador Demóstenes Torres (ex-DEM); e no Judiciário, a ponto de
levar a ministra do Superior Tribunal de Justiça, Laurita Vaz, a se declarar
impedida de julgar o habeas corpus do contraventor pelo fato de ser goiana e de
ter tido contato social ou profissional com autoridades públicas supostamente
envolvidas com Cachoeira.
Ou
seja. Não há dúvida do papel pernicioso do contraventor e de sua contribuição
decisiva para que a corrupção continue infiltrada na vida brasileira,
dificultando o combate a uma das principais mazelas do país. Diante de tantas
evidências, e, principalmente, das implicações políticas que envolvem a
investigação das atividades criminosas de Cachoeira, o que leva um advogado como
Marcio Thomaz Bastos a aceitar sua defesa?
Seria
mesquinho acreditar se tratar dos honorários - fala-se em R$ 15 milhões - porque
o escritório do ex-ministro é recheado de causas polpudas e não seria mais uma
que faria a diferença. Por sinal, é pertinente questionar a origem de tanto
dinheiro da parte do cliente, já que sua fortuna deriva primordialmente do
crime. Segundo a Polícia Federal, Cachoeira já estava no nível 3 do crime
organizado, o da lavagem de dinheiro em atividades
lícitas.
Outra
hipótese poderia ser a vaidade. Como advogado brilhante, Thomaz Bastos mostraria
a todos, principalmente a seus pares, ser capaz de livrar das barras da Justiça
um cliente tão enveredado em irregularidades e com exposição midiática tamanha
que já o condena de antemão. Embora demasiadamente humano, seria difícil supor
que um jurista com a idade, a experiência e o prestígio do ex-ministro ainda se
encantasse com tal deslumbramento
Restaria
o dever de ofício, mas parece pouco. Pela deontologia do Direito, o advogado
pode recusar toda a questão que não considerar justa. O Código de Ética e
Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil estabelece no Art. 2º do capítulo 1,
sobre as regras deontológicas fundamentais, que “o advogado, indispensável à
administração da Justiça, é defensor do Estado democrático de direito, da
cidadania, da moralidade pública, da Justiça e da paz social, subordinando a
atividade do seu Ministério Privado à elevada função pública que
exerce”.
É
difícil contemplar estas questões na defesa que Thomaz Bastos faz de Carlinhos
Cachoeira. Bons juristas certamente poderão contestar os argumentos aqui
expostos e demonstrar a legalidade da atuação do ex-ministro. Mas é pouco
provável que consigam convencer sobre a moralidade da
mesma.
Mair Pena
Neto*, jornalista carioca; trabalhou em
O Globo, Jornal do Brasil, Agência Estado e Agência Reuters. No JB foi editor de
política e repórter especial de economia.
Enviado por Direto
da Redação
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