Resenha de
Occupy de Noam Chomsky (NY: Penguin, 2012, 128
p.)
9/5/2012, George Eaton, New Statesman,
Londres
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Em outubro de 2011, no ponto mais
alto a que a água subiu no movimento Occupy, Bill Gross, Republicano,
administrador do maior fundo de investimento do mundo, PIMCO, tuitou:
“Os 99% fazendo luta de classe?
Claro, estão reagindo, depois de 30 anos que passaram sob intenso tiroteio”.
George Eaton |
O mais recente livro de Noam
Chomsky inicia com a declaração de que Occupy é “a primeira resposta pública
forte a 30 anos de luta de classe”. É boa medida de avaliação do sucesso do
movimento, que o administrador de fundo de investimentos e o intelectual de
esquerda o definam por palavras e critério idênticos, mas não chega a
surpreender. O slogan de Occupy – “O 1% versus os 99%” – merece a
rara honraria de ser reconhecido pela verdade empírica.
Nos últimos 30 anos, os EUA
conheceram uma das maiores transferências de renda e riqueza, dos pobres para os
ricos, da história moderna. Em 1980, membros dos infames “1%” embolsaram 10% da
renda nacional. Hoje, embolsam 25%. Em 2010, 93% dos $288 bilhões que os EUA
cresceram foram diretamente para o 1%. A “Grande Compressão” dos anos 1940s
deram lugar ao que o colunista Paul Krugman do New York Times chama de “a grande
divergência”. O mais espantoso sobre Occupy, portanto, é que tenha demorado
tanto a nascer.
Noam Chomsky |
O panfleto de Chomsky (dedicado às
“6.705 pessoas presas, até agora, por apoiar Occupy”) reúne a fala de Chomsky à
ocupação de Boston, onde os manifestantes plantaram 150 barracas no distrito
financeiro; uma entrevista a Edward Radzi Vilovskiy, aluno da New York University; uma “InterOccupy teleconference”; uma sessão
de perguntas e respostas sobre “ocupar a política exterior”; e o tributo do
autor ao falecido historiador Howard Zinn.
Chomsky jamais teve grandes dotes
de oratória, e os que esperavam rompantes de retórica à Shelley ficarão
desapontados. De fato, se comparado aos ofegantes comentários que Occupy desencadeou, o que mais chama
atenção no Occupy de Chomsky é a
moderação.
A um manifestante que lhe
perguntou: “Deveríamos estar trabalhando declaradamente pela revolução, ou o
melhor é nos aproximarmos dela por outras vias?”, Chomsky respondeu: “Antes de
qualquer outra coisa: ainda nem nos aproximamos do muito que se pode obter pela
via das reformas.” Para evidente surpresa dos muitos reunidos em Boston, na
Praça Dewey, Chomsky manifestou nostalgia do período do pós-guerra e saudou o
crescimento “igualitário” dos anos 1950s e 1960s. Citou a legislação do New Deal dos anos 1930s como exemplo dos
ganhos que se podem obter daquele “ativismo popular de larga escala”. Esse
autodescrito anarquista fala, mais, como um social-democrata. Convidado a apoiar
uma greve geral, Chomsky oferece a resposta cautelosa, provisória, que se
poderia esperar de um ministro trabalhista de um shadow cabinet: “Pode-se pensar nisso
como ideia possível, quando a população esteja pronta para ela.”
Noutro ponto, não mostra qualquer
simpatia pelos que fazem eco ao que Norman Mailer disse, sobre o clima político
nos EUA ser “pré-fascista” e observa que “há cerca de um século (...) as classes
dominantes perceberam que já não conseguem controlar a população pela força”.
Marcha do Movimento Occupy
Wall Street |
Os
que acusam Chomsky de antiamericanismo, também se surpreenderão com sua certeza
de que “nos EUA, podemos fazer quase qualquer coisa que queiramos fazer. Não
somos como o Egito, onde você será assassinado pelas forças de segurança”. Ao
mesmo tempo, quando teorias e paranoias conspiratórias florescem no campo da
esquerda, há algo de entusiasmante na apaixonada sanidade de Chomsky. Por mais
que, às vezes, seja irritantemente banal (“Gosto de Gramsci. É importante”),
mais vezes consegue realizar o prodígio orwelliano de “ver o que está diante do
nariz de todos”.
As virtudes do “dizer a verdade ao
poder”, disse ele uma vez, são virtudes muito frequentemente superestimadas,
porque o poder já conhece a verdade. Muito mais importante e necessário seria
dizer a verdade à opinião pública que, essa, ignora a verdade. Quanto a isso,
Chomsky saúda acertadamente o movimento Occupy como oportunidade de
conscientização.
Pesquisa realizada pela Pew Foundation mostra que 66% dos
eleitores nos EUA acreditam que há conflitos “muito fortes” ou “fortes” entre
ricos e pobres nos EUA – aumento de 19% em relação a 2009. Chomsky considera
essa transformação como lei, ao mesmo tempo, macro e micro.
A “Lei Buffett”
recentemente proposta pelo presidente Obama, que introduziria um imposto federal
mínimo de 30% a ser pago por todos que tenham ganhos superiores a $1milhão/ano,
pode ter sido sabotada pelos senadores Republicanos, mas é apoiada por 72% do
público norte-americano. As reformas a favor das quais Chomsky advoga –
financiamento público de campanhas eleitorais, emenda constitucional para abolir
direitos da personalidade jurídica, sistema tributário progressivo – já não são
meros itens de discussão entre esquerdistas.
Mas a ampla simpatia que Occupy tem merecido de tantos é,
simultaneamente, uma bênção e uma maldição. Como Nicholas Lemann escreveu
recentemente na revista New Yorker,
“99% é categoria ampla demais para ser efetiva força política”. [1] O livro da vida dos EUA, mais
provavelmente, continuará sem marcação especial, até que brote uma coalizão de
interesses menos disparatados. Nesse sentido, por hora, tudo parece aconselhar
que se abrace o pessimismo radical de Chomsky.
Nota dos
tradutores
[1] 23/4/2012,
Nicholas Lemann, “Evening
the Odds”, The New
Yorker.
E
quem se declara a favor da “política da desigualdade”?
(redecastorphoto)
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