Enviado
em 10/4/2012 por *Urariano Motta
No
firme e forte, ou melhor, sonhado propósito de virar um escritor de
bestseller,
andei pesquisando como um louco, como um morcego de guincho sem eco a bater no
escuro das cavernas, procurando a fórmula, a receita ou o
segredo.
Antes,
confesso, eu pensava que um bestseller
se fazia pelo título. Quero dizer, antes eu pensava que os livros se vendessem
como os artigos de jornais e revistas, que atraem nossos olhos pela fraude e
falsidade das manchetes. Assim, imaginava que os livros mais vendidos
ostentassem chamadas, que eu julgava fossem títulos, como “As perversões sexuais
de Hitler”, ou “A cama secreta da Rede Globo”, ou mesmo “O sexo descoberto da
Madre Teresa de Calcutá”. Engano meu, porque ao consultar a lista dos últimos
mais vendidos – últimos, porque mais veloz que o bestseller só
a velocidade da luz – vi títulos que, em si, não eram um apelo imediato aos
instintos ou à curiosidade mais censurável.
Estavam
lá: Ágape,
O melhor de mim,
Para sempre,
É tudo tão simples… e eu complicando.
Mas
na pesquisa que andei fazendo sobre como virar um autor bestseller,
se não descobri o sexo secreto, pude ver o que antes não sonhava: uma certa e
certeira uniformidade de características.
Entendam.
Não
é que sejam comuns para eles, os bem-aventurados dos autores, temas, assuntos,
épocas e, mais importante, idioma. Apesar de muitos editores pensarem que
o Best venha
do inglês, está aí Padre Marcelo, que pegou uma distensão de tanto autógrafo,
mas abençoou e abençoou filas intermináveis de leitores, está aí Paulo Coelho , que só escreve
em inglês quando traduzido. Não, a uniformidade a que me refiro é outra, ou são
outras.
Em
primeiro lugar, um escritor best se
assemelha às bestas-feras de vendas nos temas. Umberto Eco, um bat writer que
não se perde nas cavernas, já diagnosticou que o primeiro passo é encontrar um
magnífico tema. E recomenda algo como Trevas, Idade Média, Maçonaria, anel
dourado, Santo Graal, sociedades tumulares, subterrâneas. E haja pesquisa, para
que se movam os crimes e criminosos.
Bom,
se olharmos as listas, esse é apenas um tipo de best,
porque para vender bem a primeira condição, na diversidade de temas, é se
afastar léguas de qualquer sofisticação na língua, na complexidade de pessoas e
personagens. É sempre se manter em uma visão de mundo conservadora, nunca,
jamais, never more contestar a
organização da sociedade.
Os
sofredores, porque há peripécias e enovelados enredos antes em que o herói sofre
e sofre, os sofredores vencerão, porque deles é a palma ao fim, quando hão de
subir ao pódio sob as regras vigentes.
Bem-aventurados
os que sofrem…
Os
editores de arrasa-quarteirão, em concordância com os maiores vendedores e
empresários, possuem uma fórmula infalível para seus bests:
é preciso realizar as necessidades e desejos do público-alvo. Isso é mais que
um nec plus ultra,
é o tudo, o todo e o total. Pois o que deseja toda a gente? Conforto, riqueza,
amor e felicidade, conforme as leis do mercado e da justiça secular do mundo.
Então, passa a ser bom o machucado corpo de coitados – em tudo semelhantes e
iguais a quem lê as páginas – para que ao fim recebam o prêmio do paraíso, na
terra e no céu. É justo. Todos ganhamos, ainda que se roube a literatura. Mas se
assim é como alvo, espírito e conteúdo, como escrever, produz essa alegria
geral? Os autores/editores bests recomendam
nada mais, nada menos que não se elabore algo mais alto, difícil, que leve à
pausa ou à reflexão.
“Desde
a antiguidade os leitores buscam em livros o mocinho ou mocinha para torcer. Tem
toda aquela história de que ele precisa passar por momentos difíceis antes de se
tornar herói. A sua criação tem que ser diferente, não elabore algo maçante, que
todos já saibam o que irá acontecer, descreva melhor os acontecimentos. Cuidado
com invenções, nada de tornar sua escrita rebuscada. Os estilos literários podem
ser utilizados e dar incremento a obra. Deixe o texto fluir de uma forma que o
leitor não precise interromper a leitura para pensar no que o determinado
parágrafo quer dizer. Por exemplo, se tratar de alguma investigação explique
alguns detalhes de como é feito. Isso deixará o leitor com curiosidade para
entender o caso. Mas o que muitos também procuram em um livro é o aprendizado.
Buscam algo que possa acrescentar e que lhes ensine”.
Santas
palavras. Se olhamos na lista dos mais vendidos o Jogos Vorazes,
dele se fala que em suas páginas aparecem adolescentes forçados a participar de
um jogo de vida ou morte, transmitido pela televisão. Quem vencerá, ou sairá
vivo desse mortal Big Brother? Já no escritor Nicholas
Sparks, no lindo livro livres lágrimas O Melhor de mim,
vem o gênero “romântico”. Nele dois adolescentes se apaixonam e se separam até
um reencontro, hum… Fala o herói para a reencontrada:
“Porque
você não é só alguém que amei no passado. Você era minha melhor amiga, a melhor
parte de quem eu sou, e não consigo me imaginar desistindo disso outra vez. –
Ele hesitou, buscando as palavras certas. – Eu lhe dei o melhor de mim e, depois
que você foi embora, nada jamais voltou a se o mesmo”.
Agora
vocês entendem o que é livro lindo livres lágrimas. E por último, porque meu
coração anda meio balançado entre a boca e a náusea, vem o maravilhoso
livro Para
sempre.
Inolvidável, Para sempre é
para sempre um grande exemplo de amor, fé, esperança e determinação. Uma
história real de superação admirável, cujo resumo
canta:
“A
vida que Kim e Krickitt Carpenter conheciam mudou completamente dois meses após
o casamento, quando a traseira do seu carro foi atingida por uma caminhonete que
transitava em alta
velocidade. Um ferimento sério na cabeça deixou Krickitt em
coma por várias semanas. Quando finalmente despertou, parte da sua memória
estava comprometida e ela não conseguia se lembrar de seu marido. Ela não fazia
a menor ideia de quem ele era. Essencialmente, a ‘Krickitt’ com quem Kim havia
se casado morreu no acidente, e naquele momento ele precisava reconquistar a
mulher que amava”.
E
reconquista! É de dar convulsões.
Terrível.
Firme, forte e fulminante, desisto. Ou melhor, amigos, mea culpa, mea culpa, mea maxima culpa,
eu pecador confesso: dou um tempo, porque resistir invencível ao dinheiro futuro
que há de? Nem mesmo o amor secreto da Madre Teresa de
Calcutá.
*Urariano
Motta é natural de Água
Fria, subúrbio da zona norte do Recife. Escritor e jornalista, publicou contos
em Movimento,
Opinião , Escrita, Ficção e outros periódicos de oposição à
ditadura. Atualmente, é colunista do Direto da Redação e colaborador do
Observatório da Imprensa. As revistas Carta Capital, Fórum e Continente também
já veicularam seus textos. Autor de Soledad no Recife (Boitempo, 2009)
sobre a passagem da militante paraguaia Soledad Barret pelo Recife, em 1973, e
Os corações futuristas (Recife, Bagaço,
1997).
O
livro de Urariano Mota, Soledad
no Recife,
já está à venda em versão eletrônica (ebook), com
preço de R$10,00.
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