1/4/2012, Grigny, Essone, PlaceauPeuple
Discurso
transcrito e traduzido pelo pessoal da Vila Vudu do vídeo a
seguir:
Jean-Luc
Mélenchon (“Bairros Populares, bairros solidários”) –
Há muito mérito em vocês terem vindo me encontrar. Li nos jornais, que vocês não
estão aqui por ideias, mas para “assistir a um show” [vaias]. Obrigado.
Viemos todos até aqui, porque aqui
é como uma fronteira, entre a zona industrial mais importante e mais rica da
Europa, e a cidade mais pobre de toda a região de Île de France [1]. Esse contraste apaga os
discursos pretensiosos que já ouvi sobre os centros e as periferias, os
subúrbios (banlieues) e os
bairros. Como aquele discurso poderia explicar que aqui, num mesmo lugar,
concentrem-se imensa pobreza sempre crescente e os polos mais avançados do
espírito, da pesquisa, bem ao lado do Syncotron [2], com uma estação do trem-bala TGV
[3], um aeroporto?
Como
se pode explicar que aqui, onde há de tudo, haja também tanta pobreza, tanta
dificuldade para viver? Esse é o escândalo que vim apontar, aos que se dizem sem
máscara. Ainda agora ........ queria que eu não viesse falar aqui. Como se fosse
o caso de se manter à parte, preservado entre os iguais, impedir que viéssemos
falar aqui, tomar a palavra, quando todos deveriam, isso sim, vir até aqui, e
falar aos companheiros. É preciso que a França inteira veja o que se passa aqui
[bravo!].
O
que se passa aqui é essa estigmatização favorecida por um punhado de
energúmenos, sempre postos em cena. É preciso que os apontemos. Temos de mostrar
nossos bairros, nossas cidades, para que eles também vejam essas imagens, para
que tenhamos também o direito à imagem, para que deixemos de ser pretexto da boa
consciência da boa sociedade, que precisa de que haja esses bantustões, onde
prendem, onde cercam uma parte da população, que eles põem a viver em círculos,
presos em suas misérias e sofrimentos [bravo, bravo].
Que
a França toda veja o que foi feito dessas crianças que todos discriminam. Por
isso todas as descriminações que se conhecem têm de ser apontadas. Por isso, é
preciso acrescentar, na lei, a discriminação pelo endereço, que é a mais infame,
talvez, que temos a suportar, pois propõe um princípio de culpabilização
coletiva inaceitável.
Aqui
se vê, vocês que me ouvem de longe, a infinita paciência dos suburbanos
(banlieues).
O
que mais queremos é mostrar a força e a potência de nossa vontade de estar
reunidos, numa França unida e indivisível [Viva a França!], na qual recusamos a
guerra entre nós, pela cor da pele e pela religião [Resistência! Resistência!].
Meus
amigos, antes de tudo, expulsem do coração de vocês o veneno do autodesprezo e
do ódio ao outro, que essa é a pior das cadeias às quais poderiam prender
vocês.
Claro
que vocês verão gente que têm as soluções já prontas, pequenos grupos ou grandes
partidos, que se apresentarão como se soubessem, melhor que os que se encontram
aqui, o que seria preciso fazer. Sempre há listas de medidas prontas. Mas nunca
serão melhores listas as que sejam feitas pelas pessoas que se organizam. Vocês
ouvirão muitas ideias prontas, da boca de uns e outros que só porque são
candidatos apresentam-se como se soubessem melhor que vocês o que seria preciso
fazer.
Nós
somos sempre mais fortes quando nos amparamos na nossa inteligência coletiva, do
que quando ouvimos propostas de um ou outro que se apresenta como se soubesse
melhor que nós, o que é preciso fazer.
No
fundo, o problema é um só. Só há um problema: é o problema da distribuição, da
partilha da riqueza.
O
mais absolutamente necessário de tudo é que a imensa riqueza acumulada no nosso
país, seja partilhada. Que deixe de acumular-se só num polo da sociedade,
enquanto o outro nada tem. Como se vê nesse mapa inverossímil segundo o qual ao
longo da linha do trem transeuropeu, se se parte de Luxemburgo até o fim da
linha, vê-se que tudo se vai degradando, ao longo do percurso: o que se tem, o
número de médicos por metro quadrado, o número de professores sem os quais os
nossos jovens não podem fazer o progresso humano do qual nossa sociedade carece
para crescer e encontrar o equilíbrio.
Não
acreditem nos que dirão a vocês que há soluções locais. Não estamos numa eleição
municipal ou cantonal. Estamos numa eleição que diz respeito a todo o país, no
coração da Europa.
Nosso
objetivo, apesar de tudo que dirão contra nós, é quebrar essa cadeia que, em
toda a Europa, procura manter o povo na austeridade e na dependência do grande
capital que decidiu aumentar, a favor da dívida, a predação sobre toda a
sociedade. Temos de consagrar a isso toda a nossa energia, toda nossa
inteligência, toda nossa mobilização. Esse é o problema que temos de vencer.
Partilhar
as riquezas. Imponham a partilha! O problema e as soluções andam juntos. Nada há
aqui de diferente do que se vê por toda a parte. Faltam professores, falta
saúde, transporte, segurança, esses não são problemas locais, são problemas
gerais. Ataquem o coração do sistema! Ataquem onde se acumula a riqueza.
Partilhem, imponham a partilha [Resistência! Resistência!] Sim, resistência!
Resistência!
Agora,
no caminho, antes de chegar aqui para encontrar vocês, encontrei uma senhora,
uma mulher honesta, que vive de seu trabalho e luta para manter sua família,
virou-se para mim e disse: “O senhor sabe, Senhor Mélenchon, essas coisas sempre
andam muito depressa. Pensamos sempre que só acontece com os outros, até que, um
dia, cortam a eletricidade da nossa casa. E então, como fazer, para cuidar das
crianças, da família?” E outra me disse: “Na minha casa, cortaram a água”.
Qual
é a primeira coisa que temos de dizer entre nós, uns aos outros? Que só contamos
conosco. Nada se deve esperar dos que chegam com boas palavras. Comece cada um
dando a mão a quem esteja próximo. Seja cada um fraterno, todos vocês fraternos
entre vocês mesmos. Ajudem o companheiro que vacila, que cai. Lembrem-se sempre
que, em todas as circunstâncias, a fraternidade, a solidariedade que une vocês,
sempre será mais forte que qualquer adversidade. Lembrem sempre que, sim, nós
podemos tomar as medidas que tenham de ser tomadas. Não é verdade, não, de modo
algum, que estamos condenados ao fracasso.
É
o que digo, não só no meu programa, mas sempre e imediatamente. É o que
mostraram nossos camaradas da ....., que religam a energia elétrica dos que
tenham tido a energia cortada. Glória ao Robin Hood! [aplausos]. Como eles
fizeram, amigos e camaradas, que o primeiro faça o que tiver de ser feito.
Quero
dizer: as coisas sem as quais a vida não é possível, o primeiro metro cúbico de
água, o primeiro Kw/h, deve custar o mesmo preço que o último. Mas o primeiro
metro cúbico de água, o primeiro Kw/h sem os quais não se pode viver com
dignidade, esses têm de ser mais baratos. E que se aumentem os preços dos metros
cúbicos de água usados para encher piscinas e para outras finalidades desse
tipo.
Criar
tarifas sociais para os bens essenciais, essa é a primeira medida que terá de
tomar a nova República que queremos construir, a República social, a 6ª
República.
Meus
amigos, quantas vezes, quando se ouve falar dos subúrbios (banlieues) e
dos bairros, vê-se que quem fala esquece a imensa riqueza humana que vive aqui.
E quando se fala da humanidade, as reclamações pesam contra nós, e nada se diz
contra os que creem que o principal valor da existência é o lucro, o dinheiro.
O
primeiro valor da humanidade é o amor e a fraternidade. Por isso digo a esses
jovens que estão aqui, lembrando dos meus pais: jamais desprezem ou se
envergonhem de seu pai e de sua mãe imigrantes, que tiveram a coragem de partir
para oferecer a vocês um futuro melhor. Pensem nos filhos de vocês que nascerão
e crescerão aqui, bem vindos.
Nós
somos todos um povo só, a nova França, somos a vanguarda desse país que
construímos juntos. Somos todos parecidos, somos todos iguais na França
republicana, cada vez que renovamos o juramento inicial “Liberdade, igualdade,
fraternidade”.
Não
escutem os que dizem a vocês que é preciso manter submissos os que hoje não têm
os documentos legais exigidos pelo Estado! Porque, se não dermos a eles o
direito de viver livres, de se organizar em sindicatos, se lhes negamos o
direito à resistência, nós os estaremos condenando ao sofrimento do medo
cotidiano, eles e seus filhos. E assim, a iniquidade se instala entre nós,
surgem trabalhadores que lutam uns contra os outros. E nos condenamos, nós, não
eles, a combater entre nós mesmos, uns contra os outros.
Por
isso digo, olhando nos olhos a quem me pergunta e me
acusa:
“Sim,
nós daremos todos os documentos legais necessários a todos os trabalhadores
indocumentados (sans-papiers)! Daremos a eles
esses documentos, porque não podemos esperar pelos professores de Direito
Comparado, que nos digam qual seria a fórmula perfeita de prestação social. As
coisas não se passam assim. O inimigo é a miséria. A miséria é madrasta. É
preciso combater a miséria.
Que fazem vocês, poderosos, que
reclamam que nós, que partimos pela trilha do imigrante [4], sempre o rumo sul, com risco de
nossa própria vida, se vocês destruíram toda a agricultura nos nossos países de
origem? Prestem contas! Por que desperdiçam, por que vendem a preço vil o
produto da agricultura intensiva que a Europa subvenciona, e que destruiu toda a
agricultura de subsistência nos nossos países? Vocês são culpados de toda aquela
miséria! Por isso queremos acabar com a miséria, mudando as políticas que geram
o que vivemos hoje!”
Jamais
diremos outra coisa. O problema central é sempre organizar a distribuição da
riqueza, seja no plano nacional ou internacional.
Assim
também, não aceitarei jamais o discurso que aponta o dedo para algumas áreas da
França ou a alguns bairros das cidades, e voltam sempre à conversa fiada da
segurança, como se fosse o mal dos males e fosse assim por responsabilidade ou
consentimento nosso, dos pobres. Como se houvesse uma única casa, uma única
família, onde o pai e a mãe não se desesperem se o filho se atrasa na volta para
casa, onde o pai e a mãe não sofram se o filho não vai bem na escola. Mas há
também os que fazem tudo certo, que vão bem na escola, mas, mesmo assim, são
condenados pelo endereço, ou, ainda pior, porque são desempregados e
discriminados! Os pais e mães que vivem aqui são iguais aos pais e mães de
qualquer lugar. Todos os pais e mães amam seus filhos e querem o sucesso deles.
A todos horroriza o sofrimento que vêm à sua volta.
Mas...
a televisão mostra sempre os nossos bairros, sempre para mostrar cenas “de
tráfico” – que, sim, acontece pela cidade inteira, inclusive nos bairros ricos.
Onde estão os grandes traficantes de armas? Porque é claro que o armamento
pesado não é comprado na esquina. Quando veremos na televisão os grandes
traficantes de droga, de armas? Esse tráfico é organizado! Quando os veremos?
Eles zombam de nós!
Zombam
também de nós, quando tentam fazer crer que praga abominável do tráfico de
drogas brota aqui, nos nossos bairros. Não. Ela brota longe daqui, poderosos da
terra! Será que não veem que essa praga brota, sobretudo, nos países onde não há
assistência social, nem salário mínimo, onde o Estado é “mínimo”, em resumo,
onde reina o paraíso de vocês e seu mercado livre, onde a violência é mais
extrema, com seus bandos que fazem a lei e seus exércitos
privados?
Não
permitimos isso, aqui. Por isso queremos construir essa 6ª República, na qual
todas as questões, inclusive a questão da segurança, será questão a ser
discutida e encaminhada também pelo povo, para que o povo possa cuidar, ele,
dele mesmo.
A
solução de todos os problemas de vocês é política! Ela depende de poder
político! Da orientação política que vocês darão a nosso
país.
Em
poucas semanas, vocês terão a possibilidade de abrir uma brecha, não só na
França, não só num partido onde tudo estava arranjado para se passar como
sempre, entre os mesmos. Vocês poderão quebrar esse círculo infernal.
Depois
de vocês abrirem uma brecha aqui, pela mesma brecha passarão outros, depois de
vocês, em eleições que haverá na Grécia, na Alemanha, na Bélgica, numa grande
revolta de toda a Europa, para nos libertar todos.
Se
agirem como ovelhas, vocês serão degolados. Se se entregarem aos que lhes dizem,
em todos os tons, que vocês têm de curvar-se à austeridade, vocês, que já têm
quase nada, terão nada e, depois, terão menos que nada.
Se
vocês não se ocuparem da política, a política se ocupará de vocês! Disso, podem
ter certeza.
Mas temos uma dificuldade imediata
[5]. Vivemos hoje um momento em que,
por nossos esforços, pelo trabalho de muitos, não de um só homem, o movimento
que lançamos e que se verifica mais uma vez hoje pela presença de vocês, já não
é movimento de campanha eleitoral, já não é só movimento da Frente da Esquerda,
e já se converte em Frente do Povo, do qual ninguém se livrará, seja qual for o
resultado das eleições, mesmo que se livrem de mim. [Resistência! Resistência!]
A maior força desse movimento da Frente do Povo que vocês estão construindo vem
de vocês, de cada um e cada uma.
É o resultado que já conseguimos
pela potência de nossa manifestação na Bastilha, em nosso comício de Lille, em
breve, com suas bandeiras vermelhas, lenços vermelhos, camisas vermelhas,
sapatos vermelhos qualquer coisa, desde que vermelha, as próximas manifestações
em Toulouse, em Marselha, que estamos organizando. Tudo isso é, sim, movimento
revolucionário! Sim, Mme. Parisot [6], é movimento revolucionário! É a
revolução cidadã que avança!
Pois
aquela senhora disse, que eu represento o terror... À carteira de dinheiro dela,
talvez seja, concordo, dessa gente de cérebro pequeno, cujo coração limita-se à
carteira de dinheiro. Para nós, é o contrário. Que nos derrotem, que nos
arrasem, é normal, é a democracia. Que digam o que queiram. Eles dizem, nós
dizemos. Somos livres: eles, das nossas suas opiniões; nós, das
deles.
Mesmo
assim, não é possível errar tanto, tão completamente.
Digo-lhes
que é pena, grande pena, enorme pena, que, no momento dessa formidável
mobilização de vocês todos, quando vocês estão conseguindo levar a candidatura
comum da Frente de Esquerda que eu encarno à frente da candidatura da Sra.
LePen; no momento em que, pelos esforços pacientes de vocês, quando souberam
resistir às caricaturas, às críticas que fizeram e fazem, de mim, e também de
vocês mesmos; quando por efeito do trabalho de vocês, que souberam todos levar
suas opiniões aos amigos, aos vizinhos, argumentando, respeitando a palavra do
outro, exigindo argumentos, para poder responder, contra-argumentar, no momento
em que chegamos até aqui...
É
pena que, nesse momento, vejo armar-se contra mim um infernal fogo de barragem,
“fogo amigo”, inacreditável.
Mas,
afinal o que significa isso, esse ataque contra mim, dos que se dizem de
esquerda? Prestem atenção à direita! Preocupem-se com Sarkozy, não conosco!
[Resistência! Resistência!].
Ah,
mas nem precisam se explicar! Basta ver a propaganda no caminhão! Lá dentro,
eles levam o grande cão de guarda, que gira em torno do próprio rabo, para fazer
medo a todo mundo. E assim a democracia se agacha, se encolhe, se acanalha,
reduzida a uma espécie de Pnud (?). Só sabem calcular probabilidades, quem tem
mais chances, quem não tem chances... Para nunca dizer o que tem de ser dito,
para nunca se comprometer, para nunca tomar qualquer posição séria, madura, numa
decisão em que se joga o futuro da França por cinco anos!
Ah,
mas nós fizemos o trabalho das ruas! Nos livramos do cão de guarda e estamos
agora dedicados a libertar a palavra política na França. Isso, graças ao nosso
trabalho político!
Dizem
que... Até acho engraçado. Um jornal financeiro pagou alguém – e há quem pague
por isso! – para fazer um estudo de imagem. Depois do estudo, concluíram que o
Sr. Bayrou controla-se muito bem, porque não mostrou os tiques; e que o Sr.
Sarkozy é homem muito sincero, porque não esconde a agitação. E de mim, disseram
que agito demais os braços, não porque venho do Mediterrâneo, mas porque pareço
um macaco. [Risos. Vaias.].
Meus
amigos... Eu não poderia ter recebido mais belo elogio!
A
verdade é que nem isso é invenção deles. Já li sobre isso. Também chamaram Ivo
Morales, de macaco. Logo depois de eleito, porque Ivo Morales é índio. Também
chamaram Obama, de macaco, porque é negro. Também chamaram Hugo Chávez de
macaco, porque é moreno. Pois muito me alegra ser incluído nesse clube de
macacos! [Aplausos].
Preparem-se.
De agora até as eleições, vocês não serão poupados de nenhuma ofensa, de nenhuma
provocação. Mesmo agora, estão por aí, aqui mesmo. Ah, não duvidem! Conhecemos
bem tudo isso. Eles não se deixam derrotar assim tão facilmente. E nós somos a
força, o grande número, a inteligência! Sob o cabelo de macaco, há cérebro!
Enquanto a direita me compara a um
macaco, há esse pobre Sr. Gérard Collomb, prefeito de Lyon, [7] que diz que o que lhes proponho é
o que já fracassou no Camboja. Muitos talvez não saibam do que se trata.
Explico: no Camboja, houve um massacre de dois milhões de pessoas. Eis como me
fala gente que posa como socialista! Acusa-me de propor à minha pátria um plano
de extermínio de dois milhões de pessoas. Vejam a que ponto chega o discurso que
só ofende, agride, separa, segrega. E, em seguida, aparecem os mesmos, com sua
pose arrogante. Para dizer que o problema dessa eleição seríamos nós?!
Mas
quem leva com coragem a palavra da esquerda, se não nós? Quem reúne outra vez a
esquerda nas ruas, em grandes números, se não nós? Mas a palavra da esquerda
afinal tem nome! Partilhar! Partilhar! Partilhem!
Aumentar
o salário mínimo, salário mínimo a 1.700 euros! Reembolso da saúde, 100%! Porque
não é normal que, conforme o endereço, na linha do trem, se morra mais num
ponto, que noutro, por falta de assistência médica! Mais professores! Tudo é
questão de partilhar.
E
me dirijo a vocês, aqui reunidos. Não permitam que nosso subúrbio
(banlieue) seja capturado por mercenários que oferecem financiamento aqui
ou ali, para calar vocês. Não admitam que o gueto se estabeleça no próprio
coração de vocês. Não admitam que nossos bairros, nosso subúrbio
(banlieue), o interior do
país sejam o mais triste deserto político que os bon vivants esperam ver
e ao qual querem condenar vocês. Porque se fizerem o que eles pregam, vocês
estarão renunciando àquele momento de grandeza, de dignidade, que o poeta Victor
Hugo descreve tão bem, dizendo que, ali, somos todos reis: à boca da urna.
Seja
qual for a decisão que cada um tome, com seu voto, o mais miserável é igual ao
mais poderoso. Jamais renunciem a essa dignidade, porque vocês são muitos,
portanto são a força, e a decisão está nas mãos de vocês. Não acreditem nos que
lhes pedem que digam só o que acham melhor para o seu bairro. Pensem no que
desejam para toda a pátria.
Constituiremos
Comitês da Frente do Povo nos bairros, para fazer o levantamento global dos
pontos fortes e dos pontos fracos. E com essa lista assim estabelecida, a ação
política será dirigida a partir de instruções que virão de baixo.
É
preciso governar por Indicadores de Desenvolvimento Humano. Temos de ter a
coragem de aplicar aos nossos bairros, ao interior da França, os mesmos
instrumentos de medida que se aplicam pelo mundo e que aqui se desprezam, sob o
pretexto de que a França seria “país desenvolvido”. Quero que todos saibamos
qual é o nível de mortalidade infantil em cada bairro, em cada vila. O nível de
alfabetização, de acesso à cultura, bairro a bairro, para que todos se vejam e
para que se estime com clareza o que falta fazer. Erradicar o analfabetismo,
melhor cultura para todos, porque esse é o caminho para que o ser humano
melhore. E com melhor coração, o ser humano é melhor para a sociedade inteira.
Assumam
o lugar de vocês mesmos no grande movimento que estamos construindo. Deem-me a
chance, não a mim, porque nada quero para mim, que, eu, já tive tudo, mas para
muitos tenham acesso a todos os benefícios que tive a sorte de ter.
Não
apliquem a moral do egoísmo, do “aproveite-se você mesmo”. Olhem à volta e vejam
toda a inteligência que é preciso liberar, toda a inteligência que está aqui
sufocada.
Só
tenho mais uma palavra a dizer, que, do resto, vocês sabem tudo.
Aconteça
o que acontecer, o movimento continuará, sim, mas temos o dever de derrotar
Sarkozy. Que seja derrota completa, grande, ampla derrota, a de Sarkozy. Não por
ira pessoal, que não somos gente de ódio. Mas temos de derrotar uma política que
arrasta com ela a infelicidade de muitos.
Mas
vejam o que está acontecendo na Grécia de Papandreou que se rendeu
imediatamente. E os gregos foram esmagados por sete planos de austeridade.
Nós
podemos afinal, dar a toda a Europa um sinal de é possível uma nova organização
política da sociedade, que partilha a riqueza, protege o mundo natural e parte
da ideia de que o valor principal é o valor humano.
Aos
mais jovens, quero dizer que não duvidem, que não se deixem arrancar de vocês
mesmos, que não se rendam à caricatura de vocês que lhes queiram impor nem ao
folclore que lhes sugerem. A França é nossa. Esse país é nosso. Não importa de
onde vieram vocês, os pais de vocês, seja qual for a cor da pele, seja qual for
a religião. A França é grande, porque vocês são grandes.
Viva
a França, viva a República, viva a Internacional!
Notas
dos tradutores
[1]
Centro-norte da França.
[2]
Laboratório Europeu de Pesquisa da Radiação Síncroton [European Synchrotron Radiation
Facility, ESRF], é onde está instalado o acelerador de
partículas para pesquisa física de alta tecnologia. O equivalente brasileiro do
mesmo projeto está em Campinas, Laboratório Nacional de Luz
Síncrotron (LNLS).
[3]
Trem de alta velocidade, Train à Grande Vitesse,
TGV.
[4]
Jean-Luc Mélenchon nasceu em Tanger, Marrocos (19/8/1951).
[5]
Aqui, o discurso foi ligeiramente editado, para deixar mais claro o
argumento.
[6] Ver, sobre isso, 1/4/2012, Le Monde, em: Parisot voit en Mélenchon “l'héritier d'une forme de Terreur”.
[7] Sobre isso, ver
2/4/2012, Le Point, em: Gérard
Collomb : “Le modèle que défend Mélenchon a été essayé en URSS et au
Cambodge!”
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