Nas
conversações nucleares com o Irã
14/4/2012, Gareth Porter, Asia
Times Online
Traduzido
pelo pessoal da Vila
Vudu
Gareth Porter é
historiador, analista político e jornalista investigativo sobre a política
externa e militar americana.
WASHINGTON
– O governo Barack Obama encampou a exigência, nas conversações nucleares com o
Irã que começam sábado em Istambul, de que a usina Fordow de enriquecimento de
urânio seja fechada e eventualmente desmontada; essa exigência é parte de uma
negociação paralela entre EUA e Israel e é meio caminho andado para levar ao
fracasso qualquer conversação com o Irã.
Ainda
não se sabe, contudo, se o governo Obama introduzirá essa exigência seja qual
for a posição inicial do Irã, ou se a exigência será “guardada” para ser
apresentada adiante, nas conversações. Supõe-se que Washington tenha interesse
em obter, no mínimo, algum acordo que mantenha as conversações abertas e em
andamento durante a campanha eleitoral e, se possível, depois
dela.
O
governo do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, por sua vez, anda extremamente
ansioso quanto à possibilidade de algum acordo que admita a continuação do
programa iraniano de enriquecimento de urânio. Os israelenses contam, portanto,
com a “pílula de veneno”: a exigência de que Fordow seja fechada e desmontada,
que tem potencial para interromper qualquer conversação com o
Irã.
Em
entrevista à agência Inter Press
Service (IPS), Reza Marashi, que trabalhou no setor do Departamento de
Estado para Assuntos Iranianos entre 2006 e 2010, disse que “Se a exigência de
que os iranianos fechem Fordow for apresentada como inegociável, o mais provável
é que fracasse qualquer conversação com o Irã”.
O
Irã já disse que não aceita essa exigência. Em resposta à exigência já noticiada
de que suspenda o enriquecimento de urânio a 20% e feche a usina Fordow,
Fereydoun Abbasi-Davani, presidente da Organização Iraniana de Energia Atômica
[orig. Iran’s Atomic Energy Organization] disse: “Os iranianos não vemos
qualquer justificativa para essa exigência do Grupo P5+1” . P5+1, conhecido também como
os “Irã-6” ,
é o grupo em que se reúnem os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança
da ONU – EUA, Grã-Bretanha, França, Rússia e China, mais a Alemanha – que
está envolvido nas negociações sobre o programa nuclear
iraniano.
Ahmadinejad na Usina de Fordow |
Pelo
que já se pode ver, o governo Obama fez o que Israel exigiu e incluiu o
fechamento da usina Fordow na lista de exigências do grupo EUA-europeus,
em troca de
Israel aceitar que, no primeiro estágio das conversações, só se
discuta a questão do enriquecimento do urânio iraniano até
20%.
Há
crença generalizada de que é possível que os iranianos aceitem pôr fim ao
enriquecimento de urânio até 20% e entreguem seus estoques de urânio
enriquecido, que seriam trocados por bastonetes de combustível nuclear
fabricados em outros países, mantendo em funcionamento, assim, o Reator de
Pesquisas de Teerã. Isso, se houver alguma troca, e se os iranianos entenderem
que obterão algum benefício significativo em troca do que venham a
conceder.
Dia
4/4/2012, o ministro da Defesa de Israel Ehud Barak revelou que mantivera
conversações com autoridades dos EUA e de países europeus no final de março, nas
quais trabalhara para convencer todos a aceitar as exigências israelenses, de
que Fordow seja fechada; de que todos os processos de enriquecimento de urânio a
20% sejam cancelados; e que todo o enriquecimento de urânio, mesmo abaixo de
20%, seja deslocado para outros países.
Barak não disse a que resultados
levaram esses seus contatos, mas três dias depois o New York Times
noticiou que funcionários dos EUA e de países europeus exigiriam, nas
negociações com o Irã, “o imediato fechamento e desmonte definitivo” da usina
Fordow como “urgente prioridade”, além da transferência para fora do Irã do
estoque de urânio enriquecido a 20% que há no país. [1]
A agência Reuters noticiou, dia
8/4, que “altos funcionários dos EUA” disseram que a suspensão do enriquecimento
de urânio a 20% e o fechamento da usina Fordow são “prioridades de curto prazo”
para os EUA e aliados. [2]
A
Reuters também noticiou, no mesmo dia, que Israel concordara, em março, com uma
“abordagem por etapas” nas conversações nucleares; e que, na primeira etapa, as
conversações seriam focadas só no fim do enriquecimento do urânio a
20%.
Localização das plantas de enriquecimento de urânio do Irã (Clique na imagem para visualizar melhor) |
Nem
Israel nem os estados ocidentais disseram qualquer coisa, até agora, sobre a
transferência para fora do Irã, do urânio iraniano enriquecido, o que sugere que
a questão ainda não esteja acertada entre eles.
Os
encontros de alto nível e a conexão evidente entre as posições que EUA, europeus
e israelenses vazaram simultaneamente para a imprensa não deixam qualquer dúvida
sobre o fato de que, sim, já há uma posição conjunta; e que os EUA levarão a
posição de Israel às conversações com o Irã.
Respondendo
à agência IPS, Erin Pelton, secretária-assistente de imprensa do Conselho de
Segurança Nacional dos EUA, disse que não tinha qualquer informação sobre
acertos explícitos entre EUA e Israel sobre a posição dos EUA nas conversações
nucleares. E explicou: “Houve consultas entre EUA e Israel sobre a política para
o Irã. Não é preciso que haja qualquer tipo de acordo
explícito”.
Israel continua a usar, para
pressionar as políticas de EUA e europeus, a ameaça sempre repetida de atacar o
Irã. Um dia antes de Barak falar sobre suas conversas com funcionários
norte-americanos e europeus sobre a estratégia da negociação com o Irã, o jornal
Jerusalem Post noticiou que “altos funcionários da Defesa” disseram que o
possível ataque ao Irã “pode ser adiado até 2013” , porque o “establishment da
Defesa” esperará o resultado das conversações nucleares. [3]
Já
há muito tempo Barak fala da capacidade que o Irã tem para transferir suas
centrífugas para Fordow – construída num túnel de grande profundidade na encosta
de uma montanha, o que neutralizaria a capacidade de destruição dos aviões
israelenses. Esse, aliás, é o único argumento que Israel tem repetido nos
últimos meses, como única justificativa para a ameaça de ataque militar contra o
Irã.
Em postado no blog The National
Interest, Paul Pillar, ex-agente de inteligência e especialista em Oriente
Próximo e Sul da Ásia, escreveu que “a mensagem ocidental a Teerã” parece ser
que “nós [o “ocidente”, quer dizer, EUA e Israel] podemos até aceitar que o Irã
mantenha algum tipo de programa nuclear, mas só no caso de o programa ser
instalado em local acessível a bombas, para o caso de EUA ou Israel, a qualquer
momento, decidirem bombardear tudo”. [4]
Greg
Thielmann, alto membro da Associação para o Controle de Armas [orig. Arms
Control Association], disse em entrevista a IPS : “Alguns
americanos acreditam que é importante manter sob ameaça todas as instalações
nucleares do Irã, para o caso de Teerã decidir construir armas
atômicas”.
Mas
para Thielmann, ex-diretor do setor de Assuntos Militares, Estratégicos e de
Proliferação do Gabinete de Inteligência e Pesquisa do Departamento de Estado
dos EUA, disse também que o fechamento e desmonte das instalações de Fordow
“interessa mais aos israelenses que aos EUA”.
Reza
Marashi, ex-especialista em Irã do Departamento de
Estado, atualmente diretor de pesquisas do Conselho Nacional Irã-EUA, disse que
funcionários dos EUA têm algumas preocupações com Fordow, mas foram os
israelenses que converteram em questão central a evidência de que Israel não tem
capacidade para destruir Fordow”.
Thielmann
disse que espera que o governo Obama esteja “fazendo isso para acalmar os
israelenses; e que não insistirá nessa exigência, depois de os iranianos a terem
rejeitado”.
Embora
a exigência de fechar e destruir Fordow pareça ser resposta dos EUA para acalmar
Israel, mesmo assim faz pleno sentido no conjunto de esforços do governo Obama
para intimidar o Irã, fazendo crer que só restaria uma “janela” de tempo aos
iranianos, para encontrar solução diplomática. O governo Obama deixou bem claro,
nas últimas semanas, que Israel atacaria as instalações nucleares iranianas,
caso não haja qualquer avanço na direção de um acordo que assegure que o Irã não
terá armas atômicas.
Esse tom de ameaças sempre
repetidas corresponde ao que dizem os ‘linha-dura’ desde o início do governo
Obama. Dennis Ross, ex-conselheiro de Obama, que se acredita que ainda tenha
acesso pessoal direto ao presidente, foi citado no New York Times dia
29/3. Ross disse que “para que a diplomacia funcione, é preciso haver alguma
capacidade de coação. Se os iranianos pensarem que estejamos blefando, nada
conseguiremos deles”.
[5]
Em artigo recente publicado
em Times of Israel, Ross deixou claro que o que chama de “diplomacia
coercitiva” de modo algum envolveria a promessa de suspender as sanções, porque
os EUA continuam a exigir “mudança de atitude do Irã em relação ao terrorismo,
aos seus vizinhos e aos seus próprios cidadãos”. [6]
Essa
“diplomacia coercitiva”, se esse for, mesmo, o conceito que subjaz à estratégia
de negociação do governo Obama, explicaria o absoluto silêncio de qualquer
vazamento para a imprensa sobre o que os EUA planejam oferecer aos iranianos, em
troca das concessões que exigirão. Reza Marashi observou que o governo “esconde
bem as próprias cartas, bem fechadas sobre a mesa”, sobre o que será oferecido
ao Irã, nas negociações nucleares.
A
ausência de qualquer incentivo significativo leva Marashi a concluir que o
governo Obama está confiando mais em ameaças do que em incentivos para levar o
Irã a render-se às suas demandas.
O
governo Obama parece estar apostando tudo no único incentivo que está disposto a
oferecer nas conversações: o reconhecimento do direito do Irã a enriquecer
urânio em instalações em solo iraniano (mas EUA e europeus, certamente,
continuarão a impor limites estritos ao número de centrífugas e ao nível máximo
de enriquecimento admitido).
Se
os EUA e Israel esperam que o Irã aceite essas limitações, terão de considerar a
introdução de mudanças significativas nas políticas norte-americanas para o Irã:
fim das sanções e reconhecimento de que o Irã tem papel político-diplomático
plenamente legítimo a desempenhar na região.
Notas
dos tradutores
[1 ] 9/4/2012, New York Times
em: “Iran's
Nuclear Program (Nuclear Talks, 2012)”
[2] 8/4/2012, Reuters em: “West
to target Iran's nuclear fuel work”
[3] 4/4/2012, Jerusalem Post em: “Confrontation with
Iran may be delayed to 2013”
[4 12/4/2012, The National Interest – Paul Pilar em:
“Self-Fulfilling Prophecy on
Iran”
[5] 29/3/2012, New York Times
em: “Hard
Line on Iran Places White House in a Bind”
[6] 6/4/2012, The Times of
Israel em: “What
could diplomacy with Iran produce?”
Pelo Amor de Deus, deixem esses caras em paz, pq vai dar MERDA
ResponderExcluir