29/4/2012, Ross
Ruthenberg, Global Research
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Que fim levou a
“Responsabilidade de Proteger - R2P” - os cidadãos, na
cidade-zona-de-guerra?
A cidade de Chicago será invadida
por uma conferência da OTAN, mês que vem, operação que custará mais de 100
milhões de dólares aos contribuintes norte-americanos. Esse é o custo de dar
condições de infraestrutura e segurança a 50 delegações estrangeiras, incluídas
cerca de 100 autoridades de Estado além de milhares de assessores.
Mas, em vez de assistir à
instalação de um anel de ferro “seguro” para os burocratas da OTAN, o que os
super flagelados cidadãos de Chicago muito apreciariam seria um show de aplicação da doutrina da
“Responsabilidade de Proteger” (R2P), que as potências da OTAN tanto se orgulham
de impingir a outras partes do mundo, tão devastadas pela violência quanto
Chicago.
Nos últimos tempos, a violência em
Chicago já ultrapassou todos os recordes passados. A cidade vive hoje uma
epidemia de tiroteios com vítimas fatais. No ano passado, houve cerca de 2.300
tiroteios nas ruas da “Cidade dos Ventos”, que resultaram em 441 homicídios nos
quais morreram homens, mulheres e crianças. Só nos primeiros três meses de 2012,
já foram 656 tiroteios, com 145 homicídios. Nesse ritmo, até o final do ano,
serão cerca de 2.600 vítimas de tiros na cidade e 580 homicídios.
A população de Chicago, claro, não
se sente segura na própria cidade, e as autoridades estaduais e federais são
visivelmente incapazes de cumprir o dever de proteger os cidadãos.
Faz portanto perfeito sentido que
a população de Chicago ou alguns grupos de cidadãos preocupados estejam
invocando o princípio da “Responsabilidade de Proteger” – R2P, tentando obter
para a cidade os mesmos benefícios que as potências da OTAN oferecem, sempre
lépidas, em intervenções militares pelo mundo, sempre, como dizem, para
“proteger direitos humanos”.
Afinal de contas, a
“Responsabilidade de Proteger” ensina que “a soberania não é direito: é
privilégio” e, se os estados não conseguem proteger o direito dos próprios
cidadãos, perdem o direito à soberania, o que daria à ONU ou a OTAN autoridade
legítima para invadir e garantir a segurança de cidadãos cuja vida esteja
ameaçada.
É exatamente o caso, como se pode
argumentar, de exigir que a OTAN invada e intervenha em Chicago, com seus
“zeladores da paz” armados até os dentes, falando línguas que ninguém por aqui
entenda, cercando vastas áreas da cidade com tanques, impondo por aqui também
zonas aéreas de exclusão, com os céus engarrafados de drones que vomitam mísseis sobre
qualquer grupo de pessoas das quais alguém desconfie que possam perpetrar
violências contra cidadãos que deveriam ser, mas não são, protegidos pelas
pressupostas autoridades pressupostas competentes.
Analisemos as mortes por arma de
fogo, por ano, em Chicago, num contexto sírio. Mantida a proporção entre as
respectivas populações (a Síria com 20,5 milhões de habitantes; Chicago com 2,8
milhões), os números proporcionais de mortos alcançariam 18.815 civis mortos em
Chicago, contra 4.160 na Síria. Morre proporcionalmente mais gente em Chicago
que os números sempre crescentes, jamais conferidos e com certeza muito
exagerados que a ONU divulga de vítimas sírias, desde o início dos conflitos
naquele país, há 13 meses.
Se os duvidosos números de vítimas
sírias causaram tal preocupação nos governos ocidentais, na grande
imprensa-empresa e no Conselho de Segurança da ONU, por que ninguém dá qualquer
atenção à matança de civis em Chicago? Como se diz pelas ruas
pobres de Chicago: “O que somos nós? Fígado moído?”
Não há qualquer exagero em dizer
que há áreas de Chicago que, para a população desassistida, equivalem a zonas de
guerra. As crianças têm de ser escoltadas pela polícia, sempre que a classe sai
da escola para visitar uma biblioteca em outro bairro. As minorias
étnicas vivem sob risco ainda maior, ameaçadas de morte violenta apenas por
andar por algumas ruas da cidade.
Não há dúvidas de que Chicago é
caso que está a exigir intervenção da ONU ou análise por alguma corte
internacional de justiça que julgue as autoridades municipais por não
cumprimento do dever de proteger os próprios cidadãos em Chicago.
A ONU ou a OTAN devem portanto ser
autorizadas a intervir para garantir segurança aos cidadãos de Chicago
(assumindo-se, evidentemente, que o princípio e a prática da “Responsabilidade
de Proteger” signifiquem alguma coisa a sério e sejam legítimos, legitimamente
construídos).
Outro fator que torna plenamente
justificável a aplicação da “Responsabilidade de Proteger” à cidade de Chicago é
o nível de violência sistêmica gerada pela atividade de gangs armadas e mercenários assassinos.
Muitos dos tiroteios na cidade são atribuídos a gangs pesadamente armadas ou a milícias
privadas que trabalham no negócio das drogas que, em Chicago, alcança proporções
industriais. E, tanto quanto se sabe, esses exércitos privados são comandados e
pagos por estrangeiros – mexicanos e colombianos.
Nas próximas semanas, durante a
Conferência da OTAN em Chicago, todos ouviremos governos ocidentais e os grandes
veículos da imprensa-empresa, dedicados a muito elogiar a intervenção da ONU e
da OTAN na Síria, onde o governo de Bashar Al Assad não estaria protegendo os
cidadãos sírios contra a ação de gangs armadas (embora as tais gangs armadas estejam sendo armadas e
pagas pelos mesmos governos ocidentais e respectivas imprensa-empresas suas
aliadas que se reunirão em Chicago).
Por tudo isso, aplicando-se os
mesmos – cínicos – critérios, pode-se exigir que a OTAN seja mandada “libertar
Chicago”. É mais que hora, também, de a OTAN promover, urgentemente, uma
“mudança de regime” por aqui.
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