6/4/2012, *MK Bhadrakumar, Indian Punchline (com atualização)
Traduzido pelo Coletivo de
tradutores da Vila
Vudu
Hafiz Saeed |
Imaginem o dia em que o líder
islamista paquistanês Hafiz Saeed [1] talvez
meta um terno & gravata e embarque no avião rumo aos EUA [2] . E
talvez o vejamos saltando da limusine preta à porta da Casa Branca, para ser
calorosamente recebido pelo Conselho Nacional de Segurança dos
EUA.
Em
seguida, ele parte para reunião agendada com o Sen. John McCain. Ora! Isso,
precisamente, foi o que fizeram ontem representantes da Fraternidade Muçulmana
do Egito, em Washington.
Para surpresa de ninguém, a Casa
Branca pouco divulgou a visita dos Irmãos, os quais, como Saeed está hoje,
estiveram por muito tempo incluídos no panteão dos radicais incorrigíveis,
difamados e condenados pelos EUA. Diga a Casa Branca o que disser, na
justificativa que está divulgando para aquela visita [3]... Que
grande virada na política dos EUA para o Oriente
Médio!
Bem
feitas as contas, nada há aí, de novidade (além, talvez, da divulgação,
discreta, mas, afinal, alguma divulgação!). Durante o julgamento muito
comentando do caso das ONGs egípcias que recebiam secretamente dinheiro do
governo dos EUA, todos ficamos sabendo que Washington, rotineiramente, já molha
a mão dos Irmãos da FM; e que, desde a revolução da Praça Tahrir, há um ano, os
EUA não deixaram pedra sobre pedra no trabalho para direcionar os impulsos
revolucionários na direção que mais interesse aos seus próprios objetivos
geoestratégicos.
Mas
os Irmãos da Fraternidade Muçulmana (FM), por sua vez, também jogaram
brilhantemente. De início, mostraram simpatia contida pela revolução jovem em
Tahrir; e trataram de mergulhar na revolução, quando viram crescer a onda de
apoio popular. Depois, quando a revolução entrou em período de esvaziamento, os
Irmãos da FM esconderam-se atrás dos salafistas ou dos militares, como parceiros
mais garantidos.
E
agora, depois que conquistaram a maioria no Parlamento e já decidiram que
apresentarão candidato próprio nas próximas eleições, a fase de ambiguidade
tornou-se impraticável. Foi quando os Irmãos da FM tiveram de assumir posições
claras.
Os
Irmãos da FM já não podem ocultar a sua verdadeira cara, de reacionários
decididos a controlar completamente o processo de elaboração da nova
Constituição do Egito. Seus acertos com os militares e com as forças religiosas
de centro encabeçadas por Al-Azhar são fluidos.
Se a Fraternidade Muçulmana vencer
essa batalha pela Constituição, a Tunísia, o Egito, a Líbia, o Iêmen (e, sabe-se
lá, talvez também a Síria) – e o mundo árabe estarão entrando numa era de
“internacionalismo islâmico”. A Casa Branca, espertamente, aposta na esperança
de controlar os Irmãos da FM e joga aí todo o seu capital político. [4]
Há aí uma mensagem também para
Saeed. Se esquecer a oposição à reabertura, para a OTAN, das rotas de passagem
pelo Paquistão, a Casa Branca, sem problema algum, desenrolará o tapete vermelho
também para ele [5].
De
fato, o modo como os EUA vão aos poucos “se engajando” com o Islã político é
fascinante. Permitam-me tomar emprestada a exortação do Manifesto
Comunista: “Irmãos de todo o mundo, uni-vos! Nada tendes a perder, além de
dólares norte-americanos”.
________________________________________
...
e os EUA já subornaram a Fraternidade Muçulmana no Egito.
8/4/2012, *MK
Bhadrakumar, Indian Punchline
Traduzido
pelo pessoal da Vila
Vudu
(...) A Agência KUNA
(Kuwait News Agency) [6] informa
que os EUA já garantiram imediata ajuda financeira de 1,5 bilhão de dólares ao
governo egípcio liderado pela Fraternidade Muçulmana, depois de os Irmãos serem
recebidos na Casa Branca na 5ª-feira, 5/4 [7].
Até
pelos padrões lábeis da diplomacia americana, as barras do pragmatismo tiveram
de ser ajustadas para acomodar os Irmãos da FM.
Tecnicamente, a Fraternidade
Muçulmana ainda está empenhada numa Jihad contra os EUA e Israel. As
ideias e o projeto da FM não são menos radicais que os de Hafiz Saeed. Quem
tenha dúvidas, leia no Jerusalem Post, em artigo de Barry Rubin , especialista
norte-americano em questões do Oriente
Médio , os pontos principais do Manifesto da Fraternidade
Muçulmana [8]. E o
resto é política.
Agora, interessa aos EUA deixar de
lado o passado, e fazer negócio com os Irmãos da FM no Egito – o que o Repórter
Diário da Fraternidade Muçulmana Global apressou-se a divulgar, como se lê em
“Egyptian Muslim Brotherhood Delegation
Meets With White House Staffers”. É isso.
Ponto final. Novo parágrafo.
Os
EUA também estão esquecendo os laços muito íntimos que há entre a Fraternidade
Muçulmana e o Hamás – organização terrorista, nos termos da lei norte-americana.
O Conselho das Relações Exteriores, dos principais think tanks do
establishment em New York, ofereceu a casa para os Irmãos da FM
visitantes.
O
que ofereceriam a Hafiz Saeed – se ele estivesse/estiver à venda –, em troca da
autorização para deslocar, pelo Paquistão, os materiais da
OTAN?
Notas
dos tradutores
[1]
Sobre
ele, há informação recente em: “Profile:
Lashkar-e-Taiba” (em
inglês).
[2]5/4/2012, Middle East Online em:
“Fraternidade
Muçulmana do Egito recebida na Casa Branca”, em inglês.
[3]4/4/2012, Voice of America
News em: “Islamist
Political Party Reps, US Officials Meet”, em
inglês.
[4] 5/4/2012, Russia Today, em: “Muslim
Brotherhood US charm offensive belies domestic reality”, em inglês.
[5]
Em
entrevista exclusiva à rede Al-Jazeera, sobre a recompensa que os EUA
instituíram, Saeed diz:
“Não
vivo escondido em cavernas, para que tenham de criar recompensas milionárias
pela minha prisão. Todos os dias, falamos a centenas de milhares de pessoas no
Paquistão, e todos nos veem. Os EUA estão frustrados, porque estamos organizando
manifestações em todo o país, contra a reabertura das rotas de suprimentos para
a OTAN, pelas quais transitam também armas e equipamento para os aviões-robôs,
drones assassinos. Os EUA nada sabem e tomam decisões a partir de
informações que recebem da Índia. Tudo isso só faz crescer o sentimento
antiamericano na região” (3/4/2012, Al-Jazeera, entrevista completa, em:
“Al
Jazeera exclusive with Hafiz Saeed”, em inglês).
[6]5/4/2012 KUNA – Kuwait News
Agency : “White
House releasesUSD 1,5 bln aid to Egypy, meets Brotherhood figures”, em
inglês.
[7]5/4/2012, Middle East
Online, matéria e imagens em: “Egypt's Brotherhood
welcomed at White House”, em inglês.
[8] 10/10/2010, Jerusalem
Post em: “The
Region: The declaration of war that went unnoticed”, em
inglês.
*MK
Bhadrakumar foi diplomata de
carreira do Serviço Exterior da Índia. Prestou serviços na União Soviética,
Coreia do Sul, Sri Lanka, Alemanha, Afeganistão, Paquistão, Uzbequistão e
Turquia. É especialista em questões do
Afeganistão e Paquistão e escreve sobre temas de energia e
segurança para várias publicações, dentre as
quais The
Hindu, Asia
Online e Indian Punchline.
É o filho mais velho de MK Kumaran (1915–1994), famoso escritor, jornalista,
tradutor e militante de Kerala.
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