Publicado
em 05/04/2012 por *Mair Pena
Neto
Em
1982, como repórter de O Globo, integrei a equipe responsável pela cobertura da
Copa do Mundo, na Espanha. A mim, coube acompanhar a seleção anfitriã, que jogou
a primeira fase em Valência, contra Honduras, Iugoslávia e Irlanda do Norte. A
Espanha ainda não contava com craques do nível de Xavi, Iniesta e companhia, e
passou a duras penas para as oitavas de final. Mas havia um outro assunto em
pauta, tão presente, que interferia na disputa esportiva: a Guerra das Malvinas,
que terminaria um dia após o jogo de abertura.
Os
argentinos distribuíram a todos os jornalistas a tradicional revista esportiva
El Grafico, que trazia na contracapa a mensagem “As Malvinas são argentinas”.
Embora a Argentina estivesse dominada por uma sangrenta ditadura militar, que se
valia do conflito para se manter no poder, havia uma solidariedade ao país
vizinho pelo sentido imperialista da possessão pela Inglaterra de um território
a 14 mil quilômetros de distância.
O
desfecho da guerra foi mais uma tragédia para uma geração de argentinos, mas,
também, o tiro de misericórdia na ditadura militar, que pouco mais de um ano
depois entregou o poder ao primeiro presidente eleito desde 1976. Desde então, a
Argentina vem revendo corajosamente a sua história, e a questão das Malvinas não
poderia ficar de fora. O direito sobre às ilhas volta novamente à pauta, lançado
por Cristina Kirchner, sem ações beligerantes, mas com o discurso da razão. Não
existe sentido no domínio inglês sobre um arquipélago próximo à costa argentina,
que geograficamente se inclui como extensão da Terra do Fogo e da parte sul do
país. Concordar com o direito inglês é legitimar um domínio colonial anacrônico
e ilegítimo exercido por uma grande potência, saudosa dos tempos em que foi a
maior do planeta.
Na
disputa verbal sobre o controle das Malvinas, o primeiro ministro britânico
David Cameron ganhou o prêmio Nobel da cara de pau ao mencionar “pretensões
colonialistas” da Argentina sobre as ilhas que seu país ocupa desde a primeira
metade do século XIX. Os governantes ingleses também evocam o desejo e o estilo
de vida, tipicamente britânico, dos habitantes das Malvinas como argumento para
a manutenção do território sob seu domínio. Ora, se os ingleses tivessem
invadido Fernando de Noronha há 200 anos e lá estabelecido uma colônia
britânica, com chá das cinco e cabines de telefone vermelhas, teriam direito ao
território brasileiro?
Isso
é tudo uma grande piada e uma forma de desviar o eixo central da questão. O que
está em jogo no domínio daquelas terras geladas na ponta do continente é o
controle do sul do Atlântico, direitos sobre a Antártica e, sobretudo, petróleo,
identificado pela primeira vez em 1998, e cuja extração se torna viável agora
com a escalada dos preços do barril.
Analistas
econômicos preveem um impacto violento na disparada dos preços do petróleo
–acima de US$ 100 - sobre uma economia global fragilizada, sobretudo na Europa.
O Reino Unido encontra-se tecnicamente em recessão, e o peso do petróleo será
cada vez maior para o país. A produção do Mar do Norte está em declínio, e novas
fontes são necessárias para evitar um cenário de grave dependência
energética.
Projeções
técnicas estimam reservas de quase 8 bilhões de barris na bacia norte das
Malvinas. Isso significa quase o triplo das reservas comprovadas do Reino Unido,
de 3 bilhões de barris. As Malvinas são estratégicas geopolítica e
economicamente. Se fosse apenas por meia dúzia de carneiros e um estilo de vida
inglês de 3 mil pessoas, o território já teria sido devolvido, pois não valeria
o custo de sua administração.
*Mair
Pena Neto é jornalista,
carioca, trabalhou em O Globo , Jornal do Brasil, Agência
Estado e Agência Reuters. No JB foi editor de política e repórter especial de
economia.
Enviado
por Direto
da Redação
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